terça-feira, 31 de maio de 2022

Sentimento incomodo sobre publicação "Assassinado por falta de capacete?"

Continuo endossando meu próprio texto sobre a brutal morte de Genivaldo, mesmo sentindo um incômodo. Parece muito frio a forma como trato a situação, abordando capacete e segurança no trânsito, mas depois de passado o brutal fato (que me embrulha o estômago) a única forma de evitar que se repita é indo para as causas, todas, até as que não importa se são cômodas ou profundamente incômodas para o momento. E quanto antes tratar do assunto melhor. Se já teve parente morto resolva todas as pendências o mais rápido possível. Exemplo simples e direto é a questão da documentação legal e divisão dos bens; a lei diz que se fizer e encerrar o inventário num prazo curto paga muito menos imposto. Se o inventário demorar, tiver discórdia, briga, não só o imposto sobe e muito, como o defunto continua circulando pela casa.
  
Falar sobre violência policial neste país não preciso, até porque é o que mais se fala nos meios de comunicação. Ademais, não entendo do assunto. E o que aconteceu com Genivaldo está gravado e não tem contra argumentação; ou tem, no corporativismo generalizado deste país. Aliás, falar sobre violência neste país cansou e não se faz nada para frear a barbárie.

Sobre corporativismo devo comentar as primeiras palavras de Bolsonaro, de um diretor da PRF, e da OAB que só veio a se posicionar dois dias depois. É o famoso "Vamos com calma" que só serve para proteger os responsáveis diretos e indiretos. Como fica quem treinou? Como fica quem comanda os 3 policiais que não estava no local, mas é responsável? Como fica, como fica, como fica... os indiretamente envolvidos? O que se tem que mudar, este é o ponto? As cenas do assassinato de Genivaldo são claríssimas, mas o que mais?

Na rádio acabei de ouvir que os treinamentos da PRF estão cada dia mais curtos, que nestes últimos 3 ou 4 anos foi tirada a matéria de direitos humanos e que precisa dar treinamento específico para abordar pessoas com problemas mentais. Em muitos casos é simplesmente impossível perceber a patologia. Até mesmo psiquiatras e psicólogos erram, o que dirá de um policial.

"Capacete parece um detalhe, mas não é" escrevi, e não é mesmo. Assim como o que se faz com engenharia de trânsito, engenharia de segurança no trânsito e educação para o trânsito também não é um detalhe. É a base de boa parte de nossos problemas. Uma cidade mal gerida é adubo perfeito para uma sociedade torta. 
Os problemas que temos são tão absurdos que muitos deles tem que ser resolvidos não através da lei, do que seria aparentemente lógico, mas de como é possível resolvê-los, de como se come o mingau fervendo. Sopra, deixa esfriar por si só, dá uma bronca na cozinheira, muda o prato, coloca num raso, passa pomada nos lábios.... e aí, o que vai ser.
Lembro daquela escola de Capão Redondo, o CIEJA - Centro de Integração de Jovens e Adultos -  Campo Limpo, que foi considerada a escola mais problemática do Estado de São Paulo e que ninguém conseguia resolver. Um dia entrou uma nova diretora que depois de um tempo tentando colocar ordem usando os ditames formais e não conseguir qualquer resultado, decidiu conversar com os alunos e perguntar o que eles queriam. A resposta pareceu absurda: "Não queremos aula, não queremos matéria, não queremos ficar dentro da classe", e ela comprou o pedido deles. Absurdo? Não! Não sei como está agora, mas durante muitos anos foi considerada uma das escolas modelo pelo UNESCO, simples assim. 

Por último, na primeiro publicação, da original, onde se lê "Sob este prisma (da sanidade mental), Bolsonaro, Lula e todos seus fanáticos seguidores são exemplos de normalidade?" faço uma correção seguindo a mesma linha de pensamento do resto do texto e generalizando. Leia-se: Fanáticos seguidores de políticos, religiosos e ideologias são exemplos de normalidade? Da forma que está só gera discussão de quem é mais louco nesta história e na verdade estamos todos completamente loucos.

segunda-feira, 30 de maio de 2022

Carro voador, delírio, futuro ou o quê?

Acabou de passar um avião em cima de minha casa. Moro na rota final para a aterrissagem em Congonhas e das 6:00h às 22:00h passa direto todo tipo de avião, o que mais tem são os 737 e similares. Comprei esta casa em 1987, tempo que ainda voavam com turbina charutinho, aquelas fininhas que fazem um barulho infernal e que hoje estão proibidas em praticamente todo o mundo. Hoje usam umas grandonas que são muito mais silenciosas, mesmo assim bem audíveis. Para completar a barulheira ainda tem os helicópteros. Dois heliportos ficam do outro lado do rio, um próximo ao Parque Villa Lobos e outro na Eliseu de Almeida quase em Francisco Morato, também não muito longe daqui. Enquanto escrevo este parágrafo já passaram três aviões e nenhum helicóptero, aliás, aproveitando, o número de helicópteros depois da pandemia diminuiu muito. 

Silêncio! Um dia em Milão tomei um susto com o barulho de um helicóptero dos grandes cruzando os céus. Só então me dei conta que estava na Itália fazia 15 dias e não tinha ouvido ou visto um helicóptero sequer. São Paulo tem uma das três maiores frotas de helicópteros do planeta. Que riqueza! Não penso assim. "Que pena", significa que a cidade não funciona. Aguente-se o maldito barulho deles.
Cidades são barulhentas, as nossas mais ainda porque o controle de poluição sonora que se faz no Brasil é patético, para surdo ver. É da cultura brasileira considerar um chato de galochas quem reclama do barulho da conversa alheia ou do bate-estaca do churrasco a cinco quarteirões de distância. Passa avião e ninguém mais olha para cima, virou coisa normal não importa quão barulhento seja.

Mas, senhoras e senhores, preparem-se! Vem aí os automóveis voadores, ou carros voadores, ou sei lá o que. O sonho a tanto tempo esperado de voar sobre os congestionamentos está para se realizar. Aqui, para que motoristas aviadores não tenham suas cabeças degoladas pela fiação elétrica, telefônica, de internet, de TV a cabo... Bom se fosse um fio só creio que degolaria, no caso deste emaranhado de fios creio que seja caso para o Homem Aranha. De qualquer forma por estas paragens ainda demorará um pouco mais, nossa fiação aérea não mente. A não ser que os bem-aventurados proprietários destas novíssimas maravilhosas máquinas voadoras queiram ter, aí sim, seus escalpos arrancados pelas hélices dos inúmeros helicópteros que nos sobrevoam constantemente um pouco mais acima. Vai que a moda pega...: "Quem tem arrancou o escalpo?" "Foi um Robinson 22" "Que pobreza! Da próxima vez faz teu corte cabelo pelo menos num 44. Vai ao casamento? Então decola quando tiver um Esquilo da PM por perto. Corte militar está na moda. Top Gun na cabeça!" 
Nestes tempos modernos, tão esperados, é provável então que teremos saudades dos tempos de um avião após o outro aterrissando em Congonhas, dos helicópteros decolando do alto do edifício do outro lado da rua. Mas tudo tem seu lado bom: acostumados com o zumbido dos drones perderemos o medo de enxames de abelhas. Olhem só que maravilha! Quem não tiver dinheiro nem para um carro voador nem para botox vai acordar todo inchado, sem uma única ruga. 

Carros voadores deixaram de ser ficção, estão aí, alguns prontos para venda e uso. Como nós, brasileiros, ainda não temos sinal de internet com um mínimo de qualidade e estabilidade a coisa aqui não vai funcionar nas cidades e vai virar brinquedo. Aí, meu Deus! Será que além do maldito som dos jetski agora nossas praias e lagos terão o som de abelhas pilotadas? Jetsky?

domingo, 29 de maio de 2022

Assassinado por falta de capacete?

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

A história de Genivaldo de Jesus Santos é sintomática:

Um cidadão foi parado e assassinato por (pseudo) agentes da PRF é notícia por si só. O cidadão brasileiro circulava em moto sem capacete, o que é costume trivial no Nordeste, e por isto foi parado numa rodovia, daí para frente "houve uma (completa) perda de controle da situação" resultando na morte violenta do mesmo cidadão. Muitas das reportagens realizadas expuseram a condição clínica do cidadão, o que provavelmente servirá à defesa dos assassinos e manterá o maldito estigma que assola pessoas diferentes. Sob este prisma, fanáticos seguidores de políticos, religiosos e ideologias são exemplos de normalidade? 
A barbárie ocorrida aponta mais uma vez e sem deixar qualquer dúvida para o grave problema de seleção, formação e treinamento continuado dos policiais de todos níveis deste país.
A outra questão é sobre capacetes que parece só mais um detalhe. Não é, muito pelo contrário, é sintomático. O não uso de capacete no norte e nordeste, ou em qualquer região tórrida, tem várias razões, talvez a mais óbvia seja o calor. O problema de fato é a forma como é tradada a questão, ineficaz e míope, senão burra. Serve para esconder as deficiências graves no que diz respeito à engenharia de segurança no trânsito, o que se pode perceber na precária sinalização em até cidades médias e ricas deste país. Serve, isto sim, para manter intacto o nosso famigerado corporativismo. 

Caso a engenharia de trânsito e a educação para a segurança no trânsito sejam norma impecável, o que definitivamente não ocorre, a importância do capacete no salvar vidas diminui sensivelmente, podendo até a desaparecer. O que temos é condutores despreparados circulando em locais inseguros. Do jeito que as vias de nossas cidades estão não estará o condutor salvo sequer vestindo uma armadura militar, o que dirá de um simples capacete. Em razão da falta de nosso interesse, população brasileira, não temos dados precisos sobre o que realmente acontece. Não nos interessa nem perícia nem legistas, é fato. Mais, é sabido que boa parte dos acidentes são subnotificados em pelo menos em 35% e que dependendo da área mesmo os B.O.s contêm erros crassos. Não há uniformização nacional dos B.O.s e da coleta e distribuição de dados, o que torna impossível dar as razões reais sobre causas e consequências dos acidentes, e por que não dizer mortes violentas. Nunca se houve falar em erro das autoridades. O corporativismo dá vivas a este silêncio. 

Bolsonaro foi filmado circulando em moto com um capacete próprio para alpinismo ou skate levando um bombado sem capacete na garupa. Quem vai parar Bolsonaro? Que importa o capacete?

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Opções da vida: o indivíduo ou o coletivo? Em que mundo estamos vivendo?

Estive tão atarantado com coisas que são minhas e ao mesmo tempo não são minhas que acabei esquecendo de colocar o lixo na rua, dois saquinhos e um sacão imenso com o que foi podado do jardim. Enterrei a cara no notebook e publiquei "Lei de Murphy por 3 diaS" que saiu de enfiada, coisa rara, já disse - não sou jornalista, e ia trabalhar mais uma vez no rascunho infinito do "Pensamentos perdidos sobre cidades, economia e turismo no Brasil". A questão é que entre um e outro texto saí da telinha e fui para a telona ver o jornal e com isto não podia ter outra reação a não ser ter um chilique completo. 
"Que país é este? Que país é este? Que país é este?" letra de punk genial.
Em que mundo estamos vivendo? Não é só Brasil, mas neste exato momento é especialmente Brasil, república de casca de banana. A banana ou já foi roubada ou foi comida, de qualquer forma patinamos na casca que sempre jogam no nosso chão.   

Que escolha se deve ou devo fazer na vida? OU, temos escolha? Olhamos para o indivíduo ou para o coletivo? 
A resposta é o equilíbrio, sempre. Sem cuidar do indivíduo, de si próprio, não temos condição de cuidar do coletivo. Acompanhei o caso de uma pessoa com raríssima capacidade de transformar indivíduos com seríssimos problemas em gente (as hipérboles aqui são mais que justas) até o momento que ele próprio foi obrigado a se tratar devido a inúmeros problemas físicos e mentais consequência justamente deste olhar coletivo. Ou seja, incapacidade de cuidar-se, cuidar da própria individualidade.

Por um momento esqueço de vocês, leitores, e intimamente me faço a pergunta: Qual é minha opção de vida, indivíduo ou coletivo? Equilíbrio? Estás brincando? Reconhecendo minha própria insignificância respondo sem medo: sei lá!   

Mais ou menos na mesma época que minha prima adoeceu abriu-se a possibilidade de ajudar Socorro na feitura de um plano de mobilidades ativas, caminhar e pedalar para começar. Mas acabei sendo atropelado pelo meu instinto de ajuda ao indivíduo.
Num gesto típico de nossa sociedade minha prima foi praticamente deixada à própria sorte. Acabei descobrindo a situação real meio que por acidente e entrei de cabeça. Socorro e o MMC, museu de motos e bicicletas, tchau. Fui cuidar de um indivíduo, de uma figura que pela vida foi boa gente. Valeu a pena, mas perder a oportunidade de ajudar o coletivo, Socorro, dói, como dói. 
Aqui entramos em outro plano: cuidar do indivíduo, no caso o outro, ou cuidar do coletivo, no caso o conjunto de indivíduos? E isto leva a outra pergunta: E eu?
Indivíduo = egoísmo? That's the question?

A melhora que minha prima vem apresentando é uma benção para mim. Resolver os problemas dos outros me faz respirar leve. Não conseguir resolve-los agonia. Simples assim.

O dilema extrapola e muito o que pensa Arturo Alcorta e tem a ver com instinto de sobrevivência. Se der merda em volta o mínimo que vai acontecer é ter que limpar a merda da sola do meu tênis, e quem já limpou merda da sola do tênis sabe a merda que é. Enfim, se pelo menos eu não deixar a merda de meu cachorro no meio da calçada já é de grande ajuda para o coletivo e por consequência para mim, o individuo. Individualismo ou egoísmo?
Cuidar do coletivo é a melhor forma de auto preservação. Quando ajo em prol do coletivo estou de certa forma sendo egoísta e agindo em causa própria. Portanto não é sobre desejos ou vontades, mas sobre as necessidades coletivas que afetam cada indivíduo.

Não sei no que daria Socorro. Sei que minha prima melhorou. O trabalho que está sendo feito com ela de alguma forma está sendo documentado. Diz Vânia, que coordena o tratamento, que nunca viu uma melhora assim. O individual oxalá servirá para o coletivo. 

"O que nós estamos fazendo? O que nós estamos fazendo? O que nós estamos fazendo?..." 
Almoçando em Santos com minha prima e as duas cuidadoras dentre outras besteiras que falávamos para rir, as santas cuidadoras soltaram que Anitta fez uma tatuagem no cu e tem um link sei lá onde que ela cobra para quem quiser ver. Mais, que ela, Anitta, encheu o cu de dinheiro com as visualizações da dita tatuagem. "Como?" Confesso que não acreditei, ok, acreditei porque as meninas (cuidadoras) são sérias, mas não acreditei acreditando. Afinal, dá para acreditar que uma das referências sociais desta Pátria Amada Brasil não só fez uma tatuagem no cu como está enchendo o 'bolso' com o pequeno detalhe. Bem no centrão, se quiserem e melhor, bem no Centrão.
Tiro ao alvo?

segunda-feira, 23 de maio de 2022

Pensamentos perdidos sobre cidades, economia e turismo no Brasil - estou louco?

  • Os documentos sobre a privatização do Estádio do Pacaembu estão sobre sigilo da Justiça? Como assim? 
  • Um prefeito ganhou na justiça o direito de vender terras quilombolas?
  • Famílias que estão num terreno invadido a mais de 40 anos e lutam a 30 anos para ter o direito de posse estão sendo despejadas por ordem de uma Juíza para construir um viaduto?
  • Enquanto o dono do restaurante pesa os pratos alguém numa fila de uns 7 rouba o velho celular de vidro quebrado que tocava músicas?
  • Em vez de acertar a questão da lei do silêncio a Câmara dos Vereadores quer aumentar o volume de ruído no entorno dos estádios de 55 decibéis para 85 decibéis?
  • A Vale vende terras ricas em manganês avisando que não tem condição nem quer colocar seus pés lá. Será possível? A violência é tanta que nem a Vale consegue tomar posse de suas próprias terras?
Como?
Estamos todos loucos? 

Eu devo estar. Fico preocupado com cidades, economia e turismo neste Brasil? Fico. 
Em razão de minha sanidade mental solto este longo texto abaixo, Pensamentos perdidos sobre cidades, economia e turismo no Brasil, sem revisão, pelo menos até recuperar o fôlego.

Em Ilha Bela vi uma das situações mais civilizadas neste Brasil, não me lembro o ano, se 2008 ou 2009. Tivemos que ir até o centro para pegar pão logo cedo, lá pelas 7h30 ou 8h00 na manhã seguinte à festa de Ano Novo, que aliás foi bem animada e terminou com o dia amanhecendo. Sei por que ouvimos a barulheira toda a noite. O ponto é que tinha varredores por tudo quanto era canto e o centrinho, como eles chamam, já estava praticamente limpo, isto às 8h00. Bravo!
Me lembra a história que Leo contou sobre um Campeonato Mundial de Balonismo que aconteceu no Japão. Terminado o evento a organização juntou todos os participantes, entregou imensos sacos de lixo para as equipes, orientou que cada equipe fosse para as bordas e voltasse catando todo lixo, por menor que fosse, a juntar-se novamente no centro do imenso espaço. Quando o imenso local do evento estava completamente limpo todos foram liberados. Bravo!      

O sul do país atrai o turismo da argentina, o que é ótimo, mas não tem o valor agregado dos turistas de
primeiro mundo. O que alegam é que Brasil é longe do primeiro mundo, uma espécie de ponta para o turismo internacional, e que isto faz com que a opção seja para outras paragens. Quem sou para contradizer especialistas, mas, pensar não ofende, será que se tivéssemos uma infraestrutura turística de melhor qualidade não atrairíamos mais turistas estrangeiros, por exemplos que vão para as praias do Índico?

As belezas deste país são incríveis, mas é necessário corrigir alguns pequenos detalhes, tipo, arrastão nas praias, farofeiro com som (horroroso) ensurdecendo toda a praia; nas montanhas os quartos dos hotéis e pousadas ter vedação apropriada para evitar que se congele mesmo debaixo das cobertas, não ficar esperando a bebida por mais de hora, manter as praias, cachoeiras, ruas e tudo mais limpo...
Mingau quente se come pela borda, é de uma sabedoria sem tamanho. É imperativo que alguém corrija os erros básicos, patéticos, que nosso turismo tem, e não poucos.
Caminho da Fé.
Quem já não ouviu falar no Caminho de Santiago de Compostela? Tem tanto "peregrino" que é difícil encontrar lugar para dormir depois da caminhada. É uma caminhada muito bem vendida, com uma forte imagem mágica não só para os religiosos.
Não faço ideia do que seja a paisagem do Caminho de Santiago de Compostela, mas conheço a Mantiqueira do Caminho da Fé e é um desbunde! Seja para um passeio, caminhada, pedalada, é um turismo com uma paisagem de matar de linda, e com certeza com um clima muito mais ameno, muito mais agradável que o da Europa. Quem divulga? Turista estrangeiro ali? Nunca vi ou ouvi falar. Europeu ou americano quando vê nossa natureza fica alucinado com a riquíssima beleza. 
Infelizmente o Caminho da Fé está organizado para um pequeno e específico público. Os hotéis, pousadas e quartos para dormir são precários, os banheiros, até mesmo de ditos hotéis mais chiques, são patéticos. Choque de chuveiro elétrico... pois tome cuidado. Escada pomposa, imitação de gran hotel internacional com coluna no meio da escadaria que não permite a passagem da mala... Janela que não abre por completo tendo uma paisagem maravilhosa... Falta de orientação para os turistas ou peregrinos... Exagero um pouco, exagero sim, mas está muito longe de ser exagero. Falta dar um tapa, orientar, ter o Estado como participante, como fomentador, como educador... 

A Represa de Guarapiranga é em boa parte de uma beleza rara. Alguns trechos muito deteriorados foram recuperados pela Prefeitura administração Serra junto com o Projeto Córrego Limpo. Dentro de uns dias vou voltar a vê-los para saber como estão. O projeto das ciclovias em torno da Guarapiranga que trabalhei simplesmente evaporou junto com o megaprojeto de transformação da represa. Me foi contado que era ligado ao projeto para trazer o Museu Guggenheim para São Paulo / Brasil. Fofoca, exagero, mentira ou verdade de quem disse jamais saberei, o que sei é a ciclovia seria contrapartida de um projeto. Mais um projeto que não sai do papel.
Fui chamado para começar a fazer o trabalho de campo num outro megaprojeto, o da recuperação da av. Celso Garcia que evolveria US$ 1 bi. Evaporou, ninguém viu, ninguém sabe, ninguém nunca ouviu falar de tal coisa. "Esquece" foi a resposta que recebi quando perguntei quando começava; e assunto encerrado, ponto final.

Tem uma verdade que ninguém pode negar: shopping center é tudo igual. Pode ser mais rico ou mais pobre, mas o conceito, as lojas, a praça de alimentação, o estacionamento... se não é tudo exatamente igual, é tudo praticamente igual.
Qual é a vantagem de fazer turismo numa cidade onde a rua principal, a de maior atrativo, aquela que concentra o grande público, tem exatamente a mesma poluição visual que qualquer outra cidade?
Qual é a vantagem de fazer turismo em uma cidade típica onde todas as casas foram reformadas para ficarem "mudernas" e parecer com as do comércio de uma cidade grande ou shopping center?
Já bati nesta tecla e não vou me cansar de continuar neste samba de uma nota só: poluição visual.

Em Santa Catarina, por exemplo, que tem cidades bem simpáticas, colocando regras e limites para placas, anúncios e cartazes. Evitar que o patrimônio histórico da cidade seja desmantelado seria melhor ainda. O que aconteceu em Joinville definitivamente não pode se repetir.
Cidade Limpa de São Paulo mostrou-se um sucesso até por mostrar a arquitetura do passado. Mesmo o temor do "vou perder clientes, como eles vão me ver" não só não se realizou como, pelo contrário, os negócios acabaram descobrindo que menos poluição visual traz clientes. Dã! não, se jura?

Tomei café da manhã com dois brasileiros que vivem em Brasília, ela ainda trabalha no CNPQ, ele aposentado do sistema de águas e esgoto. Conversamos sobre o absurdo da falta de esgoto encanado e tratado neste país. Enquanto ouvia a história deles, para mim os reais heróis deste país, passou pela minha cabeça tudo que já vi de ruim, como o córrego que vi em Guarulhos que tinha exatamente a mesma consistência de um milk shake de chocolate, ou os horrores que vi em favelas fazendo inspeção para projetos, ou ainda o cheiro insuportável do rio Pinheiros e finalmente o rio Tiete absolutamente coberto de espuma de Santana do Parnaíba até Bom Jesus do Pirapora, todas lembranças de passagem bem rápidas, doloridas, que gostaria de ter motivos para esquecer, mas ainda não tenho. Pelo menos já vi um córrego completamente recuperado, águas límpidas, já desaguando no Tiquatira, fruto do Projeto Córrego Limpo que um dia deu frutos e não se ouve mais falar.
Água e esgoto encanados e tratados dão muito melhores resultados e saem muito mais barato que população doente. Num país de uma farmácia a cada esquina duvido que saúde preventiva seja interessante.  

Informação é absolutamente crucial para a construção de qualquer sistema com qualidade. Uma das melhores formas de ver uma cidade é de dentro ou de um ônibus ou num bonde, na Europa chamado de "tram". Em Turim só encontrei o mapa dos bondes numa única parada. Nem na estação central de trem.

Em muitos hotéis da Europa a porta do banheiro é de correr. O resultado é que quem está no quarto consegue saber a evolução da cagada de quem se contorce no trono. Acho uma merda, um constrangimento, mas não há o que fazer, faz parte da cultura deles.
Quem é de minha geração viveu em casas que tinham um banheiro para toda tropa. Socialmente significa que todos tinham que controlar o que hoje, com banheiro para todo lado, parece ser incontrolável. "Espera seu irmão sair do banheiro" era aceito sem reclamação. Ontem uma jovem linda entrou na área dos banheiros visivelmente apertada. O banheiro feminino estava ocupado e ela cruzou as pernas. Eu abri a porta do masculino e disse para ela ir. Imediatamente entrou e ouvi uma explosão de alegria. Saiu sem constrangimento e me agradeceu umas dez vezes. O que teria acontecido nos anos 60? Flower Power?

Quanto melhor a qualidade do lugar, maior é a integração social e menor são os problemas sociais.
Depois de três dias viajando no navio de cruzeiro o comportamento dos passageiros acalmou, deixou de ser "eu sou bonito e gostoso" e começou a ser mais grupal. A ansiedade do embarque, da novidade, do deslumbre dos primeiros momentos se foi. O segundo fator para acalmar o pessoal, este preponderante, é a impecável qualidade do serviço prestado por toda a tripulação deste MSC. Confirma mais uma vez tantos casos onde a qualidade limpou problemas triviais com jeito de insolúveis. Não tenho receio de dizer que a equidade tão desejada está na qualidade total.
O exemplo da câmera de segurança da estação terminal Barra Funda que filmava a passagem dos usuários da antiga e decadente CPTM para o Metrô, isto lá pela década de 90, jogou luz confirmando a importância de dar a melhor qualidade possível para a população. O comportamento do povo na área CPTM, cheia de problemas, mudava completamente quando cruzavam a catraca para a área do Metrô. As imagens gritavam o caminho a ser seguido.

Lei de Murphy por 3 diaS

Amanhã tenho que levar minha prima para Santos. Vai ser bom. Vamos passar a semana lá. O apartamento dela vai ser dedetizado contra cupim e ela teria que ficar dois dias longe dele, porque não passar 4 dias próximo ao mar, em Santos, cidade adorável. Ela gostou da ideia. Já começaram os preparativos.

Sábado eu teria que ter ido ao apartamento para acertar alguns detalhes sobre a viagem. Não muito longe dali marcaram uma reunião de amigos que não se viam desde antes da pandemia; 3:00 h num bar / boteco / restaurante próximo ao apartamento. Teresa já tinha me pedido para visitar Thereza, minha prima, e porque não juntar tudo, a reunião com os amigos que ela também estava convidada e a visita. Acertamos dar uma passada na Thereza e chegar mais cedo para almoçar no mesmo bar / boteco / restaurante. Maravilha!
A bicicleta de Teresa quebrou e o que era fácil de consertar demorou, demorou, demorou. "Deixa a bicicleta, vamos de metrô. Almoçamos, vemos o pessoal, depois passamos na Thereza ". Maravilha! 
O almoço foi bom, mas tive que trocar meu prato porque o vidro de pimenta explodiu em cima do feijão, pelo menos só do feijão; roupa limpa. Pimenta forte, boa, que desperdício. Bucho cheio, ainda meia hora para o pessoal chegar, andamos um pouco, tomamos um sorvete para empurrar o almoço apimentado. Espera, espera, espera e nada, ninguém chega. "Tem certeza que é às 3:00 h?". Pego o celular não só para ver o horário, mas o local. Junto com o endereço, que estava correto, escrito num cinza meio apagado estava 19:00h. "Que porra é este 3 com reloginho aqui?". 
Volta para casa, Teresa vai para a dela com a bicicleta que não engata. Eu tiro uma soneca. Soneca? Cai duro e preto, acordei torto. "Toma vergonha, vai cumprir seus deveres. Ver velhos amigos e passar na Thereza". Torto subo na bicicleta, subo a Rebouças, ufa! chego lá, opa! festa, boas conversas. Thereza fica para amanhã.

Entre amigos, todos mais jovens, pergunto "Que porra é este 3 com reloginho aqui?". "É uma informação do Google de quantas horas terá o evento. Das 19:00h às 22:00h, 3 horas de evento. Você não foi único que fez confusão". Pelo menos!

Domingo. De volta Teresa e sua bicicleta que não engata. Agora vai, e foi rápido. Lubrifico os cabos e bingo! Quase funciona, mas funciona. "Quanto tempo esta bicicleta ficou parada?" "Ah, mais de 15 anos". Upa! Ela se vai, abro o Whatsapp e dou com o aviso da morte da mãe de uma amiga. Velório precisamente às 14:00h em Vila Alpina, longe, mas bela pedalada. "Não vou para aqueles cantos faz tempo. Vai se divertido. Passo antes no apartamento de Thereza, dou um beijo nela, vejo os últimos detalhes da viagem, colo a cadeira e parto. Como um burguer pelo caminho. Vai dar tempo para tudo". Subo, bato na porta, silêncio. Toco a campainha, silêncio. Olho o relógio. Abro a mochila e deixo a cola no móvel do hall de entrada. Chamo o elevador, ele chega, ouço um barulho. No vizinho. Dou meia volta e o elevador desceu. Aperto o botão de novo, ele sobe, ouço vozes, vou até a porta e coloco o ouvido na madeira. Vizinho de novo. "Com este cachorro (do vizinho) que não para de latir fica difícil". Foi-se o elevador de novo. Aperto o botão, sobe mais uma vez, chega lotado, entro mesmo assim perguntando se posso. 
Pego a bicicleta e faço o caminho para Vila Alpina neste domingo lindo de tempo agradável. Chego no Ipiranga babando de fome, louco por um tradicional burguer da região. Passo por ele, dou meia volta, encosto a bicicleta e quando vou colocar a trava vejo que estão assistindo na TV o Programa do Ratinho. "Aí não, não dá. Ratinho em domingo ensolarado ainda com volume alto, aí não dá. Morro de fome, mas aqui não" e parto para o próximo. Circulo pelas ruas tradicionais ruas do Ipiranga. Encontro uma padaria que é legal, das velhas, já conheço. Não tem lugar para estacionar a bicicleta. Ando de um lado para outro procurando, mas só há vagas para carros, várias, nem um espaço para a bicicleta. "Morro de fome, mas aqui também não". Sigo em frente. "Quem sabe em Vila Alpina"

Cruzando o viaduto, no meio dele, olho em frente e não faço ideia de onde estou. "Uai, não é aqui?". Termino de cruzar, paro, pergunto, sim é o caminho correto, estou em Vila Alpina, irreconhecível. Parece que nunca estive aqui e de fato nunca estive nesta novíssima Vila Alpina, irreconhecível. Na avenida dou com um fast food de comida japonesa que conheço da av. Jabaquara. "Legal!". Uma bosta! Nada a ver com o que provei antes da pandemia, nada a ver. Saio arrotando, mas alimentado. O velório é próximo.
Chego ao cemitério. Lotado. "Com licença. Com licença..." e assim vou cruzando a multidão. Encontro um funcionário e peço orientação. Ele olha a lista e diz que não faz ideia de quem é Terezinha. Não, não matei nenhuma Teresa, a morta de chama Teresinha, no diminutivo, mais precisamente Maria Teresinha. Parece piada, mas não é. Subo para o velório, encontro outro funcionário com lista na mão, ele também não faz ideia de quem se trata, pega o celular, liga para a chefia para mais informações, chega alguém com um caixão, ele sai andando com o celular no ouvido e some. Espero e nada do sujeito voltar. Olho o relógio, 13:56h. Volto para para o crematório. "Com licença. Com licença..." e sou agarrado pelo braço. Matheus, o neto. Ufa, cheguei a tempo. "Fica tranquilo que está tudo atrasado. Não se sabe que horas vai acontecer a cerimônia". Nada bom para quem ainda tem que dar uma passada no apartamento de Thereza. Saio de lá tarde e moído. De volta para casa. "Amanhã (segunda) vou até lá (Thereza)". O chuveiro quebra, banho gelado. "Amanhã acordo cedo e troco".
Faço uma lista do que será a segunda-feira corrida. 

Acordo às 4:44h. Como dizem no Whatsapp, KKKKKKK; melhor, qua, qua, qua. Não prego mais os olhos. Subo, trabalho um pouco nos textos. Chega 9:00h, loja aberta, lá vou eu. De volta para casa, ferramentas na mão, luz desligada, instalação completa, fiz correr água antes de religar a luz. Teste final e o chuveiro explode suave e docemente. Foi-se a resistência novinha. O que fiz errado? Penso, passo todos os passos, "Não, não fiz nada errado. Só pode ser piada, tenho que trocar de novo".  Lá vou eu, sol a pino não quente, mas queimando. Volto, repito todas operações, e... e... não funciona. Desisto. Vou almoçar. Paulo, o dono do restaurante, está furioso. Um cliente roubou o celular velho que só servia para tocar a excelente trilha sonora. Nunca vi Paulo tão bravo. "Ainda chamei e ouvi o celular tocando, mas (o restaurante) estava cheio, não deu para saber com quem, e não quis causar". 
Volto para casa, desmonto tudo, refaço, descubro que tem sujeira no cano. Desentupi e funcionou. Eu mereço uma soneca. Caí duro e preto, acordei no fim da tarde grogue. Pensa, pensa, pensa, meio acordado, meio chapado da soneca. "Que seja. Amanhã vai dar certo", e tem que ser por Thereza.

sábado, 21 de maio de 2022

Pensamentos perdidos sobre turismo e cidades no Brasil - parte 2

Milão vista da porta do Al Grissino, do outro lado da rua 

Milão e São Paulo têm algo que as une. É uma das cidades gastronômicas da Europa e do mundo, e segundo uma das mais importantes chefes deste país tem o melhor restaurante do planeta, Al Grissino, na Via Gian Battista Tiepolo. Milão é uma delícia de ser vivida, cidade que tem de tudo, incluindo o majestoso, impressionante conjunto Duomo, Galleria Vittorio Emanuele, e Teatro alla Scala de Milano. Junto com Amsterdam, paixão, é uma das minhas cidades prediletas, das poucas que se pudesse moraria. Dizem que no inverno a coisa é outra, gela para valer, mesmo assim moraria.
Milão lembra muito a São Paulo de um passado não muito distante. A bem da verdade Milão serviu um pouco mais que simples referência. São Paulo é a cidade com maior número de italianos e oriundos no mundo, incluindo as cidades da própria Itália. A diferença, ponto positivo para São Paulo, é que nosso clima que é temperado, ótimo. Era melhor ainda no passado, a terra da garoa, coisa que perdemos em consequência da brutal perda de áreas verdes e cimentação generalizada. Nosso crescimento foi e continua sendo caótico, burrice "que não pode parar".

São Paulo está sendo sistematicamente desintegrada. Segundo especialistas foi a cidade com a maior riqueza arquitetônica do planeta. A violência com que se está demolindo o passado e construindo edifícios descomunais é impressionante, o que vai ter novas consequências. "São Paulo não pode parar", o velho lema dos progressistas, está nos levando a um futuro cheio de incertezas para lá de perigosas. São Paulo da garoa já está irremediavelmente descaracterizada, não existe mais. A quem serve?
É bolha, voo de galinha.

Sempre se comeu bem em São Paulo, e de tudo, de uma variedade gastronômica rara. Era uma das riquezas dos novos paulistanos vindas de todas as partes do planeta. Italianos, libaneses, sírios, japoneses, alemães, franceses, nortistas, gaúchos... 

Foi inevitável São Paulo um dia ter sido reconhecida internacionalmente como uma cidade gastronômica. O grosso do turismo até o fim da década de 90 era de negócio, trabalho, curto, dois dias de estadia em média. Para executivos é hábito as reuniões ou serem realizadas ou terminarem nos então poucos e ótimos restaurantes da cidade, todos de padrão mundial. Virou regra entre alto-executivos ficar mais um dia hospedado na cidade para só para ir a restaurantes. Foi um processo natural, divulgado boca a boca entre os executivos, que hoje rende muito, gera muito emprego. O turismo oficial veio a reboque (se é que veio). A fama da culinária paulistana foi tão longe que desta vez na Itália ouvi mais de uma vez comentários elogiosos vindos de italianos e europeus que nunca estiveram no Brasil e não fazem ideia de onde está São Paulo no mapa.

O turismo numa na cidade maravilhosa, Rio de Janeiro, mingua. Falou em Brasil, falou Rio de Janeiro, falou em Rio falou em violência em estado bruto. 
- Você é do Brasil?
- Como é a capital Buenos Aires?
Várias vezes ouvi variações sobre a mesma pergunta, principalmente nos Estados Unidos. O pessoal de primeiro mundo costuma saber que existe uma cidade maravilhosa, uma floresta amazônica, e Argentina, Chile, Peru, Colômbia e por razões de noticiário político a Venezuela. Rio de Janeiro = violência.  
Para quem não sabe NY teve mais de 2.200 homicídios no ano de 1990, 6 homicídios/dia, um número apavorante. Não entra aí as agressões, assaltos, roubos, tráfico de drogas, gangues, e outras violências mais que tanto conhecemos. Com um planejamento bem-feito pensando em longo prazo reverteram. Em um pouco menos de 20 anos transformaram NY num dos principais destinos de turismo do planeta, competindo com Paris, por exemplo. O projeto Tolerância Zero vai muito, mas muito além do pensamento simplório traduzido em "intolerância". A diminuição da tolerância com até pequenos atos ilegais, como pichar ou fazer pipi no poste, fez e continua fazendo parte de inúmeras ações de recuperação da qualidade da vida pública na cidade. Tolerância zero foi e continua sendo um trabalho coletivo que envolve inúmeras áreas, da segurança à saúde, do bem-estar social ao acompanhamento da criança na escola.

NY cresceu muito estes últimos anos, mas de forma organizada, respeitando seu passado. O turismo se fortalece vendo a NY do King Kong pendurado no Empire State, não para ver o paliteiro de 100 andares de apartamentos irresponsável que está pipocando por Manhattan e que está gerando uma gritaria feroz por parte dos nova-iorquinos.  
Não é construir qualquer coisa de qualquer jeito em qualquer lugar como está acontecendo aqui em São Paulo. É planejado, pensando, discutido com gente que tem condição de pensar. Mesmo assim vira e mexe dá merda e das grossas.

O projeto Hudson Yards em NY, um dos maiores e mais caros empreendimentos urbanos da história, é grandioso, lindo no papel, imponente de ver ao vivo, mas está dando errado, muito errado. Já estava tendo sérios problemas comerciais antes da pandemia. A torre de babel, como gosto de chamar, uma escadaria em forma de torre de babel invertida, uma escultura maravilhosa, divertida, passou a ser o trampolim preferido de suicidas. O shopping center não vendeu o esperado e a loja âncora fechou. As imensas torres no entorno das praças também não venderam o esperado mesmo tendo apartamentos para os mais diversos orçamentos familiares, dos ricos para valer aos assalariados, um projeto com ideias "socialistas" para assim dizer. A monumental ideia genial de um novo bairro concentrado saiu pela culatra e passou a ser um problemão da cidade de NY, não mais só dos empreendedores. 
Uma coisa é inteligência de intelectual ou artista, outra é a realidade. Há um abismo aí. Não estou dizendo que intelectuais e artistas sejam dispensáveis, mas que em certos momentos precisam ser realistas. Aí deveria entrar a mediação do poder público, o que aqui no Brasil raramente acontece, quando acontece.

Brooklin preservado
O longo projeto de recuperação de NY, que foi uma das mais violentas capitais do mundo, vem trazendo bons resultados e alguns novos problemas. Com a diminuição da violência, da poluição, dos problemas sociais trouxeram trabalho e riqueza, junto veio uma troca do perfil de população. Há uma gritaria no Harlem com a mudança de perfil do bairro que empurra famílias tradicionais da área para longe. O ideal é que as melhorias não descaracterizem a área, como parece que está sendo feito no Brooklin. 
Sei como é uma mudança maluca porque moro no baixo Pinheiros, em São Paulo, onde está acontecendo a mesma coisa. Quando fui para lá minha rua era de pequenas casas, famílias de renda média, das velhas fofoqueiras e cheio de crianças brincando. Pipocam edifícios imensos, descomunais, de todos tipos. Em lugar dos tradicionais moradores, classe média baixa, hoje temos pequenos comércios. Só em 300 metros da minha rua antes de pandemia estavam instalados 19 restaurantes, a maioria faliu, a bem da verdade iriam falir de qualquer forma, a pandemia só acelerou o processo. O que era um bairro cheio de vida hoje a noite é morto, com muito dinheiro circulando e morto.

Não faço ideia de como ficará o negócio do turismo depois da pandemia, melhor dizendo, daqui para frente. A pandemia escancarou um planeta cheio de pragas que ninguém sabe para onde está indo, ou sabe e é melhor não pensar. 
O que todos tem certeza é que se precisa corrigir as mazelas das cidades. Todas cidades do planeta que cumpriram o dever de casa tem uma qualidade de vida descente. Não sei por que, mas aqui a cada dia se aprofunda mais o "último que sair apaga a luz". Do jeito que vai o último nem apagar a luz vai.

Uma lição tirada na Itália do E-saúde: se quisermos isto aqui, Brasil, funciona bem

Uma das razões para todos quererem vivenciar Itália é sua culinária, simples, sadia, maravilhosa. Mesmo antes de sair do Brasil já foi dito que para entrar em qualquer restaurante seria necessário apresentar o Green Pass (válido até 04 de maio), documento europeu em QR code que comprova a vacinação. Já no primeiro jantar em Gênova fomos impedidos de entrar no restaurante do hotel, o mesmo onde todos dias servem o café da manhã para todos hóspedes. Depois de um fuzuê, de longa discussão, de até mostrar um documento oficial europeu que nos foi dito que substituía o Green Pass conseguimos autorização para sentar e jantar. Outros passageiros do navio passaram pelo mesmo baile.
"Itália, linda Itália! O paese piu bello del mondo, mas que burocracia!" PQP! Tuti párlano, ninguém se entende! Foram três dias, cinco locais oficiais de vacinação, 4 folhas A4 fotografadas com informação das autoridades do Governo Italiano ditas precisas, pelo menos uns 10 agentes de saúde tentando ajudar. Nunca conseguimos uma informação correta, definitiva, sobre como transformar o nosso Passaporte da Vacina no Green Pass. Do caro Renato, paulistano do Tatuapé, passaporte italiano, veio a dica: "Entra no restaurante, senta, e quero ver os caras tirarem vocês de lá". Dito e feito.
O aplicativo E-Saúde que foi criado neste governo de São Paulo funciona maravilhosamente e fez os italianos ficarem pasmos com a qualidade e eficiência. Outro detalhe: Descobrimos que os outros estados do Brasil não têm nada semelhante. Que seja.
Já em Turim veio a solução do problema. No órgão de turismo as duas meninas nos deram a lei impressa onde se lê: não é preciso ter o Green Pass. Basta comprovar que tomou as doses que tem que ser as aceitas na Itália. A Coronavac aqui não foi aplicada, já na Espanha foi e é válida. Enfim, uma baderna. A única coisa sensata que ouvimos foi que é preciso unificar tudo (referente a vacinação).




sexta-feira, 20 de maio de 2022

Um bom usuário da bicicleta

Wagner mandou um Whatsapp pedindo para eu dar uma revisada na sua bicicleta. Faz tempo, não sei mais quanto, a com a pandemia perdi a noção de tempo, orientei a compra da bicicleta e fiz uma regulagem fina depois que a tirou da loja. Modelo básico, 21 marchas, aro 26, suspensão simples, sem segredos. Na primeira sexta-feira marcada para a revisão Wagner não veio por conta da chuva; apareceu ontem. Mesmo de longe pude ver que a bicicleta está inteira, bem cuidada. Cumprimentei ele enquanto ainda estava com o capacete laranja que combinava com o blusão vistoso. Entrou em casa, tirou o blusão quente, e quando foi pendurar vi que era da monitoria das Olimpíadas no Rio que ele fez. Tive uma discreta inveja.
Enquanto olhava feliz e admirado a excelente condição da MTB urbana básica, Wagner foi contando o que aconteceu com a bicicleta nestes sete meses que está pedalando. Nada demais: calibrou o pneu praticamente todos dias que saía, teve dois furos no pneu traseiro e um no dianteiro, e uma única reclamação: a corrente não está descendo com facilidade da coroa do meio para a pequena.

Mãos a obra.

Fiz a centragem fina das duas rodas por puro capricho; tinham com uma diferença mínima, muito bom sinal. Lubrifiquei e sequei a corrente explicando como fazer e deixando claro que não precisaria repetir a lubrificação por um bom tempo. Chequei como estavam os apertos de todos os parafusos e todos normais, bem apertados. Não precisou de mais nada. 
- Meu senhor, sua filha está ótima. 
- A menina se chama Marilia Pera. 
- Belo nome, está ótima, parabéns.
- Obrigado. 
- É possível ver como o ciclista pedala pelo estado da bicicleta. Principalmente os aros denunciam como pelada o ciclista. Estes pedais são ruins, nacionais, de um plástico frágil que quebra com facilidade. Se você pedalasse pesado, descendo guia na porrada, dando trancos no pedal, despreocupado com buracos, provavelmente já teriam quebrado. A bem da verdade é um espanto terem durado todos estes 7 meses. Você está de parabéns, é um ótimo ciclista; disse eu com toda sinceridade.
 
Marilia Pera, a bicicleta, é básica, com aros folha simples e V brake. É fácil saber se o ciclista freia bruscamente ou usa muito os freios, um erro para qualquer ciclista. "Ciclismo é a arte da suavidade". Os aros da bicicleta de Wagner estão muito pouco arranhados, mesmo ele tendo rodado bem. Fiz um cálculo muito por cima e ele rodou algo em torno de 100 km / semana, ou mais, o que em 7 meses dá uns 2.800 km, nada mal. Os aros estão ótimos. A bicicleta impecável.

Hoje não mais, mas num passado não muito distante eu ficava possuído quando via uma bicicleta maltratada, e é o que mais tem por aí. Não estou falando de ciclista que toda vez que chega em casa passa um paninho, de certa forma também um erro, mas daqueles que não tem a mais remota preocupação em cuidar do que tem, seja a bicicleta ou o que quer que for. Tudo esculhambado, dane-se. Eu não aguento. 
A bicicleta pode estar suja, o que é até bom por afastar ladrões, mas a parte mecânica tem que estar impecável.

"Wagner, meus parabéns! Não pelo estado da bicicleta, mas porque olhando para ela sei que você é um ciclista seguro no trânsito. Do jeito que você pedala, e está escrito na bicicleta, a possibilidade de você sofrer um acidente é muito baixa, quase zero. Parabéns!"

E hoje fui consertar a bicicleta de uma amiga que gosto muito. Posso chorar? É a terceira vez que ela arranca a gancheira do câmbio. "Não fiz nada!" As pastilhas do freio a disco terminaram em 3 meses. "Não fiz nada!" Conversa vai, conversa vem descobri o erro. "Não fiz nada! Só pedalei sem óculos". É provável que nem perceba os erros que faz. Não adianta explicar. Posso chorar? Que seja! Agora, neste momento, ou pelo menos no momento que deixei a bicicleta ela estava funcionando. Bom... até a próxima. Ai! Ai! Ai! como é mesmo o cântico zen para acalmar? aum........aum........aum.......aummmmmmmmm............. 

quinta-feira, 19 de maio de 2022

13 de maio... e o desperdício

A luta contra o racismo como estará? Creio que nunca o tema esteve tão no ar. A questão é como frear o pessoal que tem solidificado na cabeça conceitos não só sobre raças. A história da humanidade se repete em ciclos e faço votos que este ciclo que vivemos nos leve um passo à frente. Esperança é a última que morre. 
Hoje temos ferramentas de informação e de coleta de dados que nunca tivemos até então, e com isto temos um milagre, um santo remédio que nunca falha: a dor no bolso. Quem não entender isto não é cabeça dura, é estúpido.

Colocando a vida em termos práticos e usando princípios capitalistas ou liberais, também historicamente usados pelos comunistas, ou seja, somos todos humanos:
"Não desperdice as oportunidades que a vida lhe dá".
"Você vai colher muito mais frutos, mais saborosos e variados, numa floresta que no pomar de casa".
"O segredo do rápido desenvolvimento da China e Índia está no fato que em 1 bilhões de habitantes é muito mais fácil e provável encontrar mentes brilhantes". 
"Para ser competitivo é crucial usar toda a potencialidade disponível".

Em termos práticos o Brasil é brilhante em desperdiçar seus próprios potenciais. Imaginar que em bem menos de 5% da população, a dita elite educada e competente, se encontre mais inteligências acima da média que em mais de 50% da população é querer brigar contra a lei das probabilidades.
Brasil é um dos países com corporativismo mais arraigado, um dos maiores empecilhos para o nosso desenvolvimento. E é justamente este corporativismo, melhor, os inúmeros corporativismos deste país que simplesmente não conseguem olhar o próprio umbigo para ver que discriminar, portanto desprezar potenciais, é um tiro de 12 no pé. Não falo só sobre discriminação racial.    

Baseado em fatos reais. 
Ele entrou como office boy numa importante farmácia. Dentre outros trabalhos tinha que levar documentos jurídicos e entregá-los pessoalmente. Enquanto esperava lia os documentos, lia tudo que tinha à mão. Passado um tempo descobriram que ele tinha mais conhecimento jurídico que o advogado então responsável. Num determinado momento o proprietário da empresa, que crescia a olhos vistos, decidiu colocar o ex office boy como advogado e como este não tinha OAB foi montado um corpo de advogados para assinar por ele. Funcionou melhor que antes. 
O office boy / pseudo advogado negro foi invisível, assim como são inúmeros cidadãos brasileiros. Dá para desperdiçar gente assim? 

Não gosto porque não gosto e ponto final
- Por que você não experimenta o sorvete de chocolate? pergunta a mãe
- Eu só gosto de sorvete de morango.
- E de manga que você gosta.
- Eu só gosto de sorvete de morango.
- Tem sorvete de creme que é feito de leite que você adora.
- Eu só gosto de sorvete de morango....
Como se remove uma ideia fixa de criança? E de um adulto? E de uma pessoa culta e educada?

Ok, Você pode gostar de quem quiser, do que quiser, mas algumas pessoas são indispensáveis porque estão fora da curva, como se diz. Desperdiça-las é mais que estúpido, é o caminho mais curto para a pobreza, tua, nossa, vossa, de todos. 

"Existem empresas que trabalham com produtos difíceis de vender em países pobres e que mesmo assim dão dinheiro e existem empresas que trabalham com produtos fáceis de vender que em países ricos e vão a falência. A diferença está na forma de administrar".
Se não consegue entender a questão racial de forma racional, pelo menos entenda pelo lado prático. O mínimo que que qualquer ser humano quer é ir para frente e não se vai para frente remando para trás. Ninguém é obrigado a gostar, mas é muito mais vantajoso para todos, principalmente para indivíduos, ter um convívio civilizado, ou minimamente prático.

Procurei uma lista de nomes de personalidades negras que foram importantes para nossa história e dei com esta que está ai em baixo. Gostaria de saber quem escolheu os nomes, mas bato uma aposta que foi um jovem com tudo mais que a juventude traz consigo. Nana Vasconcelos não aparece, mas tem Emicida, boa pista. Jorge Amado, Dorival Caymmi, Emmanuel Araújo..?
Num país que sequer sabemos dizer uma lista das personalidades que estão fazendo diferença agora, o que sobre os fizeram diferença na história? Vai lá, recita uma lista de 10 nomes de personalidades brancos que estão fazendo diferença agora, neste momento. Vai aparecer políticos, jogadores, cantores, juízes, mas duvido que se lembre de nomes de cientistas. Qual é o nome da brasileira que está ajudando nas investigações do buraco negro? Pensou besteira? Falo sobre astronomia, não sobre besteira. Então, algum nome de brasileiro que está fazendo diferença no Brasil e no mundo?

Zumbi dos Palmares (1655-1695) 
Machado de Assis (1839-1908)
Milton Santos (1926-2001)
Carolina Maria de Jesus (1914-1977)
Pixinguinha (1897-1973)
Aleijadinho (1738-1814)
Grande Otelo (1915-1993)
Maria Firmino dos Reis (1825-1917)
Bezerra da Silva
Nilo Peçanha
André Rebouças
João da Cruz e Souza
Mãe Minininha do Gantois
Elza Soares
Gilberto Gil
Conceição Evaristo
Djamila Ribeiro
Benedita da Silva
Sueli Carneiro
Elisa Lucinda
Abdias Nascimento
Leci Brandão
Emicida
Milton Nascimento
Marina Silva
Glória Maria

Antes da notícia que se segue no YouTube pergunto: Quem é Mixirica?
   

Pela primeira vez na história um africano, Biniam Girmay, da Eritréia, venceu uma etapa do Giro D'Atália, a 11ª. Domingo, na 10ª etapa, Biniam fez uma corrida impressionante até errar uma curva em descida e tomar um belíssimo capote. Vinha na ponta junto com um ciclista experiente e impressionava a facilidade como o acompanhava. Ficou claro que força tem, e muita. A forma como errou também deixou claro que não tem experiência ou não gosta de despencar. Os dois começaram descendo a mais 90 km\h. Chuto que ele não é muito chegado em descidas, fritou os freios e por isto passou reto.  Clássico.
Creio que seja a primeira vez na história que um negro vence uma etapa de qualquer destas principais provas de ciclismo. Abriram a porteira. Bem vinda força africana, boas futuras vitórias, que virão virão, isto é líquido e certo.  



terça-feira, 17 de maio de 2022

Alguém se importa que a eleição está definida?

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Ouso responder a todos que perguntam aos colunistas deste jornal e da Rádio Eldorado qual será o futuro deste país depois das eleições. Mesmo com gravíssimos problemas que nos afetam no dia a dia, empobrecem este país e a nós mesmos, não nos mexemos para mudar a situação. Pouco ou nada mudou nestas últimas décadas, nem mesmo nas situações mais escabrosas, vergonhosas, muito prejudiciais para todos nós, porque mudará com esta eleição? Quem disser o contrário está negando o comodismo atávico de nós, brasileiros. Drama social ou resgate moral são grandes discursos, corretos até, mas discursos não constroem, na prática pouco ou nada valem. Quem realmente se interessa corre atrás, faz acontecer, olha com algum respeito seus problemas. Nós não corremos atrás e não fazemos acontecer, não nos interessamos. O futuro do Brasil nas próximas eleições está definido por que somos nós os que vamos votar nestas próximas eleições e nós não nos interessamos.
Nestas últimas décadas de descalabros o máximo que se conseguiu foi reunir meia dúzia de gatos pingados, se comparado ao tamanho da população e seu drama real, em ditas grandes manifestações que no final das contas resultaram só em alento. Convenhamos, sejamos honestos, alguém se interessa pelo Brasil? A pergunta não é sobre seu próprio Brasil, individualista, egocêntrico, mas o real, o país onde vivemos. Quando vamos parar e discutir o futuro como adultos, não como crianças que brigam "foi ele!", "não, foi ele!", molecagem irritante e absolutamente infrutífera. Há muito que acertar, trabalhar, organizar, e sobre tudo mostrar dignidade.

segunda-feira, 16 de maio de 2022

Domingo de merda

Quem aí sabe o que é uma festa de criança? "Criança cansa"! Panqueca, cachorro-quente, pizzinha mole, pipoca, refrigerante, cerveja, gritaria, parabéns a você, bolo, brigadeiro, fica mais um pouco.... "Posso pular pela janela?" Pois bem, no sábado tive que ir a uma e saí de lá sonhando era no domingo ter um pouco de paz, ficar quieto, não ver ninguém, sair para pedalar um pouco e comer a comida mais sadia e leve possível. "Pelo amor de Deus, pensar em comida agora não!" 

Acordei cedo no domingo, olhei pela janela e vi que um dia lindo. Tomei o café da manhã vendo O mágico de Oz original enquanto esperava o começo do Globo Rural. Em minha santa inocência nunca tinha reparado que o leão é completamente gay.  E tocou o celular. Vejo TM, olho para o relógio e acho estranho. "Tão cedo?"
- Bom dia
- Acordei e olha o aconteceu, e saiu caminhando com o vídeo aberto. Minha ansiedade começou a subir. Quando a imagem parou vi uma bagunça que não entendi. - A estante (da cozinha) caiu a noite e eu não ouvi. Quebrou tudo.
- Ai!, ai!, foi todo o mel? 
- Foi tudo.
- Espera que vou para aí e te ajudo a dar ordem. Desliguei o celular e imediatamente passou o filme: "puta merda! Acabou meu domingo!"
Terminei rapidamente o café da manhã, fiz a barba, escovei os dentes e deixei minha casa sem olhar para trás com cara de quarto de adolescente revoltado porque foi acordado cedo depois de uma madrugada de rede social. Peguei a bicicleta, fui pelo caminho longo. Boa notícia, mesmo pedalando um pouco mais pesado foi a primeira vez que não senti o cansaço impiedoso que o pós Covid provoca. Horroroso, dolorido, completamente diferente de um cansaço sadio. Qualquer esforço um pouco além do normal e do nada, sem nenhum sinal prévio, como se você sem querer tivesse batido num interruptor, o corpo desliga seguido de uma dor macabra, sim, macabra. Estive com João uns dias antes e ele disse que está sentido igual, o mesmo João que antes da pandemia foi para Salvador pedalando. 
Suado entro no apartamento. Olho o desastre. "Ai! meu mel. PQP, foi também o mel da terra (muito raro e caro)". Mãos a obra. Deu trabalho e depois de umas duas horas o chão e tudo mais estava limpo, até os menores cacos que queriam continuar escondidos foram recolhidos. Caixa de papelão cheia, fechada num saco de lixo, aviso colado: Cuidado! Vidro, desastre levado para lixeira no térreo. Sem um corte na mão. Alegria!
- Espaguete alho e óleo?
- Opa! Cervejinha e depois soneca.
Ainda meio torto da soneca toca o celular. Pego de má vontade, olho a tela, Bel. "Bel? O que será desta vez?" Atendo e antes de entrar o vídeo ouço o pranto. Imagem a postos, palavras a mil, não entendo metade, meio rolo de papel higiênico limpando a chuva de lágrimas e melecas, muitas melecas.  
- O que houve? Mas antes dá para parar de tirar meleca ao vivo?
- Quando eu choro não para de sair meleca... E toca contar as novas, as velhas, as raivas... e eu ouvindo uma, duas horas. Enquanto tentava acalmar, ou, tentava acalma-la para desligar e me mandar para meu domingo sonhado... pensei, ora pensei, que Deus me perdoe, pensei "tenho que ser bonzinho", mas Deus que me perdoe pensei  "Puta que o pariu! acabou o domingo!". 
Uma, duas horas depois, terminada a conversa, conversa?, abri a porta e saí correndo. Atordoado, pego a bicicleta e... e... e... a porra da portaria eletrônica não lê minha digital. Portão aberto, bunda no selim, olho para o céu, final de tarde de outono. Lindo. "A pá puta que os pariu todos, inclusive eu, vou pedalar até a puta que o pariu. Foda-se! Sei lá o que tenho que fazer amanhã? A puta que o pariu o amanhã. Foda-se!" e disparo sem saber onde ir, nem tinha cabeça para tanto, as duas horas pela manhã, mais as duas horas à tarde, mais minha vontade de peidar alho, tudo junto na cabeça rodando como nuvem, e para ajudar passo rua França e sou cercado por carros manobrando para tudo quanto é canto. A barrulheira e gritaria não nega: festa de criança. "Pelo amor de Deus, deixa sair correndo daqui'. Para onde vou? Fui.






















Feliz. 
E cansado.
Paro, tomo um açaí. Ainda tenho fome. Paro de novo um pouco mais a frente e peço um hambúrguer de frango. Sento fora, começo a comer. Bom, feito na hora, crocante, "Vai cair bem". Sentados na mesa vizinha dois funcionários em hora de descanso conversam. 
- Não acreditei quando vi você lá dentro (da hamburgueria) travada (bêbada).
- Cheguei direto da balada. Amigo, você nem viu quando fui pro banheiro e despejei (vomito). 
- Não, acho que os outros também não.
- Amigo, não consegui no banheiro, então despejei no matinho (o jardim da hamburgueria, mas fiquei na dúvida, qual deles, o da esquerda ou direita?).
"O que eu faço? Caio na gargalhada ou despejo meu hambúrguer no colo desta idiota?"

Home, sweet home.
e gran finale, Lua de sangue. Amanhã as bruxas nos salvarão.