segunda-feira, 28 de março de 2022

Quebrar o navio? Ideia de bobo.

Acordei muito cedo e na escadaria do andar de baixo ouvi um senhor conversando com dois jovens sobre o absurdo do navio não parar em Tenerife. Não deu para entender todo o discurso, mas ficou claro que o senhor estava tocando fogo no circo. Em resposta os jovens disseram algo como "eles pensam que brasileiro é bobo". 
Logo depois no café da manhã ouvi um diz que diz que o grupo de revoltosos vai quebrar o lobby do navio para forçar a parada em Tenerife.
Pelas conversas está claro que a maioria gostaria de parar em Tenerife, mas é absolutamente contra a desagradável bagunça ocorrida.

"Eles pensam que brasileiro é bobo". De minha parte acho que um povo que imagina que "eles pensam que somos bobos" está fragilizado. Nós, brasileiros, estamos nos fazendo de bobos, não eles, disto só tem dúvidas quem é muito ingênuo, vide nosso patético caos de cada dia. 

Vão quebrar o lobby e o navio se não parar em Tenerife? Se acontecer, que os idiotas sejam entregues às autoridades espanholas. Dizem que eles sabem cuidar "carinhosamente" deste tipo de gente.

Alguém que tenha um mínimo de instrução sabe que pela Lei Internacional o comandante é a autoridade máxima, com poder de decisão definitiva e incontestável, ponto final.

Meu herói é Fernando Gabeira. Saiu para o pau de verdade, havia boas razões para revolta e ação, mas amadureceu, reviu seus atos e descobriu que o uso da inteligência, do pensar, bom senso e diálogo trazem resultados bem mais produtivos e perenes.

Existem formas e formas de protestar. 

Protesto necessário e divertido foi o primeiro passeio de ciclistas nus pela Avenida Paulista. Divertido até a hora que André levantou a bicicleta e começou a gritar palavras de ordem, o que tinha sido previamente acordado que não aconteceria. Terminou em pancadaria, bomba de gás, no fim de uma manifestação que mundo afora deu resultado por ter muita visibilidade, melhor, voyeurismo, e principalmente ser pacífico, ou seja, permitir o olhar e dar tempo para pensar. "Todo mundo nú. Oba! Todo mundo nú. Oba!..."

Em Buenos Aires, em plena ditadura, fizeram uma genial ação "terrorista si, pero sin perder la ternura". Assaltaram a agência bancária vizinha de muro com a Delegacia Central da Polícia. Fizeram tranquilamente o assalto, sem tiros ou gritos, avisaram os funcionários e clientes que esperassem um tempo e estariam livres. Os terroristas se foram, o gerente se sentiu seguro, saiu deu dois passos, entrou na Delegacia Central, relatou o assalto e foi espancado pelos policiais que acharam o fato inconcebível, impossível, uma ofensa às autoridades. O assalto só foi aceito pelos policiais da Central que se recusavam a confirma-lo no banco quando chegaram militares que haviam retirado uma bandeira do grupo terrorista hasteada a duas quadras dali perguntando "Qué passo?" (O que aconteceu?). Óbvio que a ação não foi publicada em nenhum jornal, rádio ou TV, mas correu boca a boca e ganhou forte simpatia e apoio da população.

Um dos carnavais cariocas das Escolas de Samba mais marcantes foi quanto a Mocidade Independente de Padre Miguel do gênio Joãozinho Trinta foi proibida pela Igreja de sair com alegorias que incluíam Cristo. A inteligência de Joãozinho deu o xeque mate: cobriu tudo o que tinha sido proibido com plástico preto e foi para a avenida. Memorável, sucesso absoluto naquele e outros carnavais, um cala a boca inesquecível que ecoa até hoje pela igreja, umas três décadas depois. 

Tudo é uma questão de inteligência.

Correio Brasiliense - Cecília Sóter
postado em 28/03/2022 13:08 / atualizado em 29/03/2022 16:51
Esta matéria do Coreio Brasiliense está longe de espelhar o que aconteceu naquela noite. Caso estes 100 passageiros, como diz a matéria, tivessem conseguido mais adesão a situação no navio passaria de bem tensa para colocar a segurança de todos em risco. A simples ameaça de quebra quebra em alto mar está muito longe de ser uma brincadeirinha. Vou mais longe, alguns mais exaustados continuam colocando fogo no circo, agora instigando tripulantes.
Infelizmente o acontecido é reflexo da insanidade social que vivemos atualmente no Brasil.   

domingo, 27 de março de 2022

Motim no cruzeiro: não vamos parar nem Tenerife (ou Euroguai, o Paraguai daqui)

O excelente cantor sul africano entrava em sua quarta música, um reggae, quando pela saída direita do teatro lotado que aplaudia efusivamente cada fim de canção entrou uma turba braços ao ar festiva gritando palavras de ordem, cruzou à frente de todos e uns dez líderes subiram ao palco meio que dançando. O cantor a princípio deve ter pensado que queriam dançar com ele e ensaiou um bem-vindos, mas logo se deu conta que era um protesto e se retirou. De onde eu estava o vi sentado na coxia enxugando a testa suada e olhando a baderna instalada. Delicadamente veio um assistente de palco e o convidou a ir para o camarote. Fim deste show, ótimo por sinal.

A baderna estava completamente instalada, não completamente, eu dei uma boa pitada para tocar fogo na turba.

Um grupo pequeno no palco, um senhor no penúltimo degrau da escada voltado para a plateia tentando aos gritos, e no meio dos gritos da plateia “fora!”, esforçava-se furiosamente para se comunicar o que aquela plebe estava reivindicando, coisa que todos que assistiam o cantor já estavam fartos de saber. Desandei a gritar por respeito ao artista e fui acompanhado por boa parte do público. No meio do grupo aglomerado em frente ao palco e próximo a saída por onde haviam entrado uma mulher apontou para mim e enfurecida gritou a pleno pulmão “É sobre o meu dinheiro!”, upa!, o estopim para que eu rebatesse certeiro e indefensável com um também cruel urro “POBRE! POBRE! POBRE!” E foi assim que o circo pegou fogo de vez.

Imediatamente um casal vestiu a carapuça até a unha encravada do dedinho do pé esquerdo, ele subiu as escadas até onde eu estava sentado e começou a gritar que “Eu sou mais rico que você! Eu sou mais rico que você! Eu sou mais rico que você!”, no que respondi em voz normal que riqueza é cultura e que parar um show é uma pobreza. Depois de um certo tempo, situação mais calma, mas ânimos ainda bem inflamados volta o velhinho “Eu sou mai rico que você!, Já fiz mais de 40 cruzeiros”, é puxado de lado por rapaz jovem que repetindo o “40” diz que é culto porque já visitou “40 países”. Entre dois 40, que dá 80, entra uma cara que repete olho no meu olho "Você é burro? Você é burro? Você é burro?". Penso eu felizmente e com toda sabedoria "obrigado pelo elogio".

Gentilmente sou retirado do meio da confusão por um dos coordenadores da tripulação do cruzeiro que vai tentar acalmar ânimos. Volto para minha cadeira, sento e a bagunça se estende por bom tempo. Sobe ao palco o apresentador oficial dos shows e com muita dificuldade comunica que o capitão do navio está vindo. Urros de vitória.

O comandante chega, fala em italiano e é traduzido pelo apresentador. É interrompido seguidamente. As razões do porque não parar em Tenerife não são aceitas. Urros, gritos e dedos em riste dos que pararam o show. O comandante com muito esforço vai tentando justificar. Mais incompreensão dos amotinados. O comandante diz que é empregado, que trabalha para fazer os prazeres de todos a bordo, mas que recebeu instruções que Tenerife não dá garantias que haverá combustível e que as ordens da companhia MSC é reabastecer em Las Palmas e seguir direto para a primeira parada na Europa, Funchal, Portugal. Mais raiva, mais reações inflamadas, alguns sobem ao palco e colocam o dedo no nariz do comandante. Seguranças cercam a situação a distância. Impassivo o comandante ouve quieto. Depois de muito tempo a situação está temporariamente contornada e o teatro esvaziado.

O custo de parar em Tenerife com certeza é muito menor que o estrago que a turba da rede social pode fazer para a companhia MSC. E, para quem não sabe, dentro de um navio a autoridade máxima é o comandante, ponto final.

Quem contrata um serviço como deste Cruzeiro assina um contrato. Não li o contrato como tenho certeza que a maioria também não leu, mas duvido que uma situação como esta não esteja ali detalhada.

Parabéns pela habilidade e bom senso da MSC na lida com os revoltosos juvenis. A bem dizer, a qualidade de atendimento da tripulação tem sido impecável.

Existem formas e formas de protesto ou reivindicação. O que aconteceu aqui é juvenil, expressão que ouvi de alguém e adorei. É reflexo de um Brasil que vai de mal a pior. “A classe média vai ao paraíso”?. Neo l’age d’or? (Mui provavelmente) Apocalipse do capitalismo? Liberalismo midiático e intelectual? Kit “convite”? Terra plana? Estocar vento? O que quer que seja, brasileiros: estamos todos fodidos!


PS.:
  1. Rico que é rico vira letra e número. O resto é pobre rico pobre.
  2. Visitar 40 países é cultura? Parece que depende das compras e do shopping center.
  3. Cruzeiro é cultura? O mar que responda.

Quanto mais sei que nada sei, disto não tenho a mais remota sombra e dúvida.

A leitura atual é "Calibã e a Bruxa; mulheres, corpo e acumulação primitiva", de Silvia Federici. Ficou mais de um ano na cabeceira da cama porque a abertura do livro leva a pensar que é baboseira. Muitíssimo pelo contrário. Mesmo tendo um forte viés de esquerda, é leitura mandatária para quem acredita que a vida é nada mais que um aquilo deu nisso. Acabei a análise do que foram os movimentos sociais e econômicos na Idade Média, tudo baseado em pesquisadores de primeira linha, e parece uma crônica do que aconteceu ontem. O que está lá nunca soube, nem imaginava. Tem sido uma descoberta surpreendente a cada linha. Conclusão até aqui: fomos e continuamos sendo todos iguais, (temo fudido). Não mudamos nada nestes últimos 800 anos. Estamos fodidos! 

terça-feira, 22 de março de 2022

viajar de navio

Já pensou em viajar de navio por um custo / dia menor do que fazendo cicloturismo? Pois então, cá estou eu indo para Itália, Gênova, num destes navios de cruzeiros gigantes.
Ontem pela manhã me estalou fazer o cálculo de quanto está saindo a brincadeira e quando terminei quase caí da cadeira: R$ 400,00 / dia. Se não tivesse gasto com alguns luxos (?!?) teria saído R$ 350,00 / dia. Pedalando por aí mesmo em uma viagem bem barata, com hotel simples, por conta de minha diabetes que me força a comer de 3 em 3 horas o custo dia acaba sendo mais caro que no navio.
Fico admirado com quem tem paciência para ficar pescando na Internet preços baratos, o que não foi meu caso. Uma amiga foi convidada por uns amigos dela para participar de um grupo que iria comprar passagem de navio no meio da pandemia. Sairia sabe-se lá quando. Moral da história, o grupo não se entendeu, cada um queria uma coisa, todos desistiram, e eu já tinha comprado o cruzeiro por um preço ridículo. Adoro aposta de louco. Cá estou dentro do navio no terceiro dia de viagem. 
É a realização de um velho desejo, o de voltar a ver alto mar. E sonho que de algum ponto do navio eu consiga voltar a ver as estrelas, o que não se vê mais no meio das luzes das cidades. Tenho acordado às 5:00 h e vi amanheceres magníficos. Final de tarde com cores límpidas que não se veem mais em terra. A nossa poluição mata as cores da vida. 
Foto tem uma perda de cores sutil, mas crucial para a construção da emoção. O olho tem um milagre que não sei explicar, nem quero. Quero ficar parado cotovelos na balaustrada vento na cara em silêncio para olhar pasmado a beleza. 

Quase não embarco. Levei um teste de Covid que não servia para a companhia de navegação. Tenho em mãos um documento oficial europeu que me permite livre acesso a qualquer espaço público ou privado dentro da Europa, mas também não serviu. Tive que fazer um teste novo no próprio porto e acabei numa ansiedade controlada e cansativa sendo um dos últimos a embarcar. 
O bicho navio é imenso, descomunal, 19 ou 20 andares acima da linha d'água.

Confesso que fiquei apavorado com as fotos que vi dentro de dentro do navio. Estes cruzeiros são ditos shopping centers navegantes para a classe média desesperada para chegar ao paraíso: brilho, luzes, rococó pós moderno, música full day, status para todos, todos atrás de seu status, muita comida e bebida, roupas o que imaginar, estilos também. Salvador Dali nunca delirou pintar um zoológico tão completo e complexo assim. 
O serviço é impecável. Conseguiram contornar uma dominatrix cabelo chapinha até a bunda num propositalmente transparente tecido preto e fio dental de babados que aos urros de sete ventos e trovões no lobby deixou claro quem paga a conta desta festa para o coitado do rapaz submisso que mantinha religiosamente quatro passos atrás e óculos escuros máscara que não engana ninguém. 
Em outra feita, também grande público presente, um homem meio gordo e já gasto, careca com longo rabo de cavalo ralo de fios caindo até quase as ancas, acabou sendo seguro pela pobre envergonhada mulher para não partir para cima de um educadíssimo tripulante duas vezes seu tamanho com treinamento primoroso para atuar de poste. A frente de todos no teatro lotado peitava a abraçante mulher aos gritos do impecável "você sabe com quem está falando?" Confesso que ainda quero saber. Mais tarde, cruzou o bar central peito empinado olhar fixo para frente, orgulho empertigado. Faltou peidar.
Ainda me descuido e fotografo roupas, sandálias, maquiagens, poses na escadaria, outra diversão, pura diversão. Politicamente incorreto, Graças a Deus. Infelizmente não fotografei no dia de embarque, quando o zoológico estava todo enlouquecido mostrando seus dentes, plumagens e pelagens. O imperdível que perdi eternizar em imagens. 
Hoje a noite vai ser de gala, como ontem chiquetérrimo!

O número de obesos e obesas é mais que notável, assim como a capacidade de flutuabilidade deste imenso navio. A tecnologia evoluiu uma barbaridade, assim como os quilos perigosos. Vou perguntar o que acontece com os que não conseguem entrar no box do chuveiro, e não são poucos, e aqui estou sendo sério.

Poucos vi que olham com atenção mar e céu. Por incrível que pareça a sensação que se tem em alto mar é que a terra é redonda, não sei explicar porque. Estamos a pleno vapor e nunca chegamos na borda e sua provável cachoeira. Ou a imensidão do mar será uma espécie de piscina de borda infinita?   

Prefiro o silêncio do quarto, o mar sem fim, o céu deslumbrante. Gostaria de voltar a sentir a insignificância humana que vivi no navio cargueiro. Mudou minha vida.  

Como mudou tudo. No meio deste moto perpétuo de agitação voltou a lembrança da quietude que foi a travessia no pequeno navio de passageiros de 1976. Bons tempos.  

Em 1975 consegui uma viagem de navio cargueiro, Frota Leste, ida e volta para os Estados Unidos, o que foi um divisor de águas em minha vida. Foram 3 meses entre a saída de Salvador e a volta para Santos, com paradas em Macapá, Baton  Rouge e New Orleans, Houston, Tampa, Barbados para reabastecer. Tripulação pequena, noites de luzes apagadas e um céu inesquecível, mar do Caribe com ondas que faziam sumir a proa do navio, mar zero ou tão liso quanto um chão de mármore que fez entender o que o mais profundo pânico humano e o tornado no dia seguinte. Embasbacante foi ver duas jangadas a 110 km da costa, normal segundo os marinhos do Frota Leste. 
Em 1976 voltei de Gênova no SS Cristoforo Colombo, um navio de passageiros que comparado com este seria um bote salva vidas. Cabine lá no fundo, próximo à hélice, tipo DiCaprio no Titanic, uma experiência memorável, divertida, e só.

Não tenho mais condição física para aguentar a travessia da Argentina para a Antártica que andei pesquisando para contratar. Fica para a próxima encarnação. Esta deve ser divertida.

sexta-feira, 18 de março de 2022

abandonados

Esta coisa linda é a Carlota, ou como gosto de chamar, Fraulein Carlota Joaquina. Foi adotada depois de ter sido resgatada pela equipe da Luiza Mel em um canil com 1700 cachorros que estavam praticamente abandonados em Piedade, próximo a Sorocaba. No primeiro filme sobre o resgate dos animais, no meio de uma completa algazarra da cachorrada, é possível ver uma única gaiola com uma coisa cinza quieta, no caso a própria Carlota. Ela era reprodutora, pelo que se supõe saia da gaiola só para cruzar, como prova estava com o grupo muscular traseiro atrofiado por falta de caminhar ou correr, ou seja, ela passou uns 4 ou 5 anos trancada. Tereza adotou um pano de chão sujo. Demorou alguns meses para se comunicar, interagir, atender aos chamados, perceber a vida nova. Carlota não tinha nenhuma referência de normalidade. Tem sido uma aula de como um ser bem estimulado ganha vida e inteligência, e como vem ganhando.
A história dela me faz lembrar o filme O enigma de Kaspar Hauser, do intensamente genial diretor alemão Werner Herzog. Vale a pena ver. O paralelo com Carlota é grande.

Faz mais um pouco de um ano tive que assumir a responsabilidade de administrar a vida de uma prima com Alzheimer. Organizada a parte financeira comecei entrar na realidade de um sem número de seres humanos doentes que são literalmente largados para trás e simplesmente desaparecem na teia social. Por muita sorte, com ajuda de Dra. Fernanda, consegui contratar uma profissional de alta qualidade, Vânia, que me ajudou muito a colocar praticamente todos os outros aspectos dos cuidados com a prima em ordem. Mesmo tendo alguma condição financeira falta um tanto para chegar ao que é recomendado pelos especialistas. O absurdo é que os mais próximos a esta prima, todos educados, simplesmente não procuraram nem leram sobre o que se trata a doença e os cuidados básicos que deveriam ser tomados. Está na cartilha da ABRAz, Associação Brasileira de Alzheimer. Para mim cuidar dela foi uma loucura porque passei a pensar o que deve ser a vida de quem não tem quem olhe por eles ou não tem condição financeira. Nem falar dos que tem condições e largam, que pelo que fui informado é bem normal.
Algum estudioso social disse que os doentes "desaparecidos" giram em torno de uns 700 mil só na cidade de São Paulo. Desaparecem lenta e dolorosamente atrapalhando a vida dos que estão por perto. O Estado nestes casos praticamente não existe. Passei a não conseguir dormir direito tendo pesadelos constantes com este drama social invisível e com minha incapacidade de ajudar a melhorar o mundo. Um delírio?

Tudo nesta vida tem dois lados. Sempre me considerei um imbecil, literalmente e sem o menor chororô, tendo vários heróis como pontos de referência, alguns acreditei pela vida inalcançáveis. Com este trabalho que venho fazendo acabei descobrindo que não só não sou um imbecil como algumas das minhas referências de vida se não o são, beiram.

Faz dois dias foi assinado o último documento que dará um mínimo de estabilidade financeira para a doente, portanto dará boas garantias que ela terá um fim de vida com certa qualidade, não a ideal, mas a possível. Não é o que eu gostaria, mas é um ano luz da situação que a encontrei. Faz bom tempo que acertar na Mega Sena tinha deixado de ser um sonho, agora é um desejo porque aí dou a qualidade de vida que esta minha prima de segundo grau merece. Ela sempre foi do bem, pessoa gostosa de conviver que alegrava os ambientes, bem vinda em todos lugares. Os primeiros dias do Alzheimer são muito intensos e foi um drama. Meu convívio com ela pela vida foi bem pouco; o convívio de muitos foi perene; entendam como e o que quiserem.

Olho minha vida para trás e agora entendo claramente o que significa bullying ou bulling, em particular o familiar. A palavra idiota foi presente durante anos, dentre outros até não ditos. Ter virado ciclista foi então uma opção social intensa, para dizer o mínimo. Já faz tempo que tenho consciência plena que os problemas que tive, pessoais e de trabalho, foram causados pela minha dificuldade de expressão verbal, com certeza resultado de um problema clínico, dislexia provavelmente. Escrever também nunca foi um ato fácil.

Depois de minha prima ter assinado o documento que lhe deu garantias, e que foi fruto de meu trabalho e estratégia, fiquei completamente exausto, como raras vezes na vida fiquei. Não consegui chorar e se tivesse chorado seria compulsivo, visceral. Sou invisível e confesso que nesta sociedade que vivo até que dou Graças a Deus. 

quinta-feira, 17 de março de 2022

Ciclovia da Rodovia dos Bandeirantes: perguntas pertinentes



Foi anunciada a construção de uma ciclovia de treinamento no canteiro central da Rodovia dos Bandeirantes com 57 km entre São Paulo até o Distrito Turístico (Shopping) Serra Azul, anunciada como "Ciclovia Bandeirantes, o futuro da mobilidade". As imagens divulgadas levam a crer que vai ser um retão de ida e volta, com acesso no início e no fim. 
Só um detalhe: Mobilidade é uma coisa, área de treinamento é outra completamente diferente.

Perguntas:
  • quantos serão os acessos?
  • onde serão os acessos, nas pontas ou também nos km 28 e 58 como mostra a propaganda?
  • caso venha ter acesso nos km 28 e 58 será para os dois lados da Rodovia dos Bandeirantes?
  • os acessos nos km 28 e 58 serão para postos de gasolina / restaurantes. Qual a participação deles no projeto? Como será a circulação dos ciclistas nos postos? Como será a segurança dos ciclistas e bicicletas?
  • porque um acesso no km 58 e não um acesso para os ciclistas de Jundiaí onde a bicicleta é muito usada? 
  • como e onde será o acesso para a ciclovia aqui em São Paulo?
  • pela propaganda o acesso da ciclovia em São Paulo será fora do Centro Expandido, pelo outro lado do rio Tiete, em Pirituba. Como o ciclista fará para cruzar o rio?
  • os caminhos mais usados para chegar ao acesso em Pirituba, São Paulo, será em ciclovia, ciclofaixa ou sinalizado?
  • os caminhos para os outros acessos serão sinalizados?
  • o acesso no Distrito Turístico Serra Azul está na propaganda. A curva na rampa será de 90°? Se for é problema; vide o cotovelo da passarela de acesso no Parque do Povo. 
  • haverá campanha educativa? Qual? Como? Em que meio? Quem vai preparar?
  • no Serra Azul serão construídos bicicletários fechados com segurança? Shopping, hotel, parques de diversão.  
  • como será a segurança dos ciclistas em relação a assaltos em todo a ciclovia?
  • qual é o mapa dos problemas de segurança na Rodovia dos Bandeirantes?
  • haverá algum tipo de controle nas entradas?
  • haverá segurança circulando na ciclovia ou sistema de câmeras?
  • ciclista treinando em estrada pedala numa velocidade alta, muitos com média acima de 40 km/h. Nas descidas chegam a 60 km/h. Quanto mais alta a velocidade mais larga deve ser a via. Qual será a largura geral da ciclovia? Qual será a largura da ciclovia nas descidas mais acentuadas? 
  • qual será o material usado para o piso? O ideal é um asfalto de alta porosidade que escoa a água rapidamente e que já vem sendo usado em algumas vias e estradas. 
  • qual será o material de pintura e sinalização usado no piso?
  • pintar de vermelho todos os 57 km de ciclovia vai custar uma barbaridade e ambientalmente é um erro. Como ficará? 
  • qual a qualidade de drenagem? A pergunta é pertinente e importante dado a qualidade da drenagem da maioria das ciclovias implantadas em São Paulo. Uma poça d'água derruba fácil um ciclista esportista pedalando uma bicicleta de estrada. 
  • em alguns pontos da rodovia o vento é sensível até num carro. Haverá paisagismo para diminuir o vento nos ciclistas? É importante principalmente nas descidas. 
  • no meio do percurso, mesmo entre os km 28 e 58, haverá área de descanso para os menos preparados ou eles vão ter que parar no meio da ciclovia?
  • a diferença de velocidade entre um ciclista normal e um bem treinado pedalando uma boa bicicleta de estrada é de mais de 20 km/h. Haverá algum tipo de sinalização ou alargamento de ciclovia para prevenir os inúmeros acidentes que vem acontecendo na Ciclovia Rio Pinheiros?
  • como está prevista a verba de manutenção da ciclovia?
  • como será feito o controle de qualidade da ciclovia?
  • em que casos a ciclovia será fechada? Como será realizada a ação em relação aos ciclistas?
  • se por alguma razão a ciclovia for fechada como dar segurança aos ciclistas que irão continuar pedalando ou treinando no acostamento da rodovia? 
  • em que condições climáticas a ciclovia será fechada? 
  • que ação será realizada para tirar da ciclovia e para proteger os ciclistas que estão pedalando entre os acessos / saídas? Exemplo: chuva de pedra (que já peguei e dói muito) ou vento.
  • como será realizado os primeiros socorros na ciclovia? A ciclovia terá largura suficiente para circulação de ambulâncias? 
  • Quais serão os acessos para as ambulâncias? Como impedir que ciclistas sejam tentados ou usem os acessos de ambulâncias?
  • os socorristas vão ter treinamento específico para ciclistas? O atendimento dos socorristas é o que menos me preocupa porque são muito bons, mesmo assim se faz necessário um treinamento específico.
  • o canteiro central das rodovias serve para enterramento de cabos de vibra ótica e outros. Como se fará a manutenção destes; a ciclovia terá que ser fechada?
  • o projeto da Ciclovia Bandeirantes é voltado para lazer e esporte. Não há acessos  para os ciclistas trabalhadores que hoje já fazem uso da rodovia para vir e voltar do trabalho. Será realizada alguma ação para melhorar a segurança destes ciclistas que continuarão pedalando no acostamento da estrada conurbada?
  • como ficará a posição do Polícia Rodoviária em relação aos que estarão ou continuarão pedalando no acostamento depois que a ciclovia estiver pronta? 
  • qual o posicionamento dos administradores da ciclovia em relação ao CTB? Por exemplo: pelo CTB capacete não é obrigatório, luz piscando só para carros de emergência ou especiais.
  • alguns faróis de ciclistas pistam tão forte que interferem na segurança dos motoristas; qual será o posicionamento?
  • qual horário de funcionamento? Dependendo do horário é necessário ver a segurança do ciclista não só dentro da ciclovia, mas em seus acessos?
  • como ficará a segurança dos ciclistas em relação a assaltos nas redondezas dos acessos à Ciclovia Bandeirantes. Sempre houve um problema grave no entorno dos acessos de áreas de treinamento: Jockey, USP, ciclovias rio Pinheiros, estradas conurbadas... 
Isto é o que me ocorre de bate pronto.

Posso afirmar que faz muito tempo vem ocorrendo vários problemas nos trechos de estradas conurbadas, não só aqui da região metropolitana de São Paulo, mas de todo estado e a bem dizer em todo Brasil.  Estrada conurbada é grave problema para pedestres, ciclistas, separando bairros e ou grupos sociais. Número de acidentes nestas áreas é constante e muito sensível. Talvez o caso mais preocupante e que nunca foi resolvido é a SP 55, estrada litorânea que cruza de norte a sul do Estado de São Paulo. Nos municípios de São Sebastião, Caraguatatuba e Ubatuba, em especial, a situação é grave e merece há muito uma ação do Estado, que conhece bem o problema e simplesmente nada faz. 

Por outro lado, não há dinheiro para montar a passarela jogada na grama (maps. google -23.547609176487704, -46.73073382623541) e que deveria ligar a Ciclovia Capivara / Rio Pinheiros ao Parque Villa Lobos, nem a construção de uma rampa descente e segura para a ciclovia Rio Pinheiros Sul na Ponte Cidade Jardim. Não se resolve a segurança dos pedestres que enfrentam ciclistas nas pontes Cidade Universitária e Cidade Jardim. Ou alargar a ponte Ermelino Matarazzo - Guarulhos sobre o rio Tiete e a Rodovia Ayrton Senna, um drama para operários pedestres e ciclistas. Dentre outros tantos "detalhes" esquecidos(?). Para isto não tem dinheiro ou vontade política para resolver.

domingo, 13 de março de 2022

Denunciar é bom ou mau?

Roubo ou o que?
Em 2012 realizei um velho sonho e fiquei 3 meses na Europa estudando e viajando. Minha casa ficou meio que sozinha aqui, sempre sendo limpa pela minha santa Cida e visitada pela Teresa. Mesmo com o segurança da rua (que pouco serve) e o corredor de entrada varido com frequência pela Cida a casa foi invadida pelo menos 3 vezes. O roubo não foi de grande monta, levaram pequenas coisas, roupas e mais um monte de besteiras, nada de eletrônicos ou de valores altos, nada do que se ouve que normalmente os ladrões levam. Estranho. 
Fui à Delegacia fazer o B.O. e enquanto ia contando "o que tinha sentido falta" o escrivão ia fazendo uma cara de quem não estava entendo. Ele parou de digitar e me interrogou: "Tem coisa aí. Isto não é coisa de ladrão. O que está acontecendo?" Foi então que expliquei que não só minha casa tinha sido invadida e roubada, mas também cinco terrenos contíguos do meu lado da rua e mais cinco do outro lado da rua. "Agora faz sentido. Foi roubo mandado, ameaça." disse ele pedindo para seguir com meu relato. Eu estava esperando a hora para contar que logo depois de minha volta apareceu toda entusiasmada uma corretora de imóveis perguntando se queria vender a casa. Dei corda e ela contou que tinha uma grande construtora que estava interessadíssima em construir na rua. Estava explicado.
O que me deixou profundamente triste não foi tanto as invasões nem minhas perdas, mas que fui o único de todas as casas invadidas que fez B.O.. O resto dos atingidos pela ameaça se resumiram a responder o famoso "Para que?".
PorVamos olhar por um outro lado, o prático: a falta de união teria tido uma consequência burra e estaríamos fracos numa negociação com a empreitera ou construtora isto caso quiséssemos vender as casas, leia-se terrenos, o que era o desejo da maioria. Em outras palavras, perderíamos dinheiro, que no final das contas é o que realmente importa para o individualismo exacerbado deste mundo selfie.
Muito tempo depois descobri que o cara que invadiu as casas era figura conhecida no pedaço. Ninguém viu, ninguém sabe, ninguém falou. 
Denunciar teria sido bom ou mau?


Desrespeituso.
Entrou no elevador um senhor aparentemente bem educado, mas sem máscara. Subimos da garagem para o térreo, o elevador parou, entrou um outro senhor que pediu que o desmascarado "por favor vestisse a máscara" que estava em sua mão, o que não só não o fez como disse que ninguém pode chamar a atenção dele. Já estou acostumado com o discurso "ninguém tem o direito de chamar minha atenção". O senhor que pediu para colocar a máscara desceu no primeiro andar, então tentei conversar com calma com o desmascarado sobre a situação e ele ficou mais "macho" ainda, deixando o elevador dando bronca ou ameaçando, sei lá. 
Confesso que deveria ter feito imediatamente uma reclamação formal contra o dito desmascarado. Não fiz porque aquele é o edifício onde mora uma prima doente e não sei até onde o "macho" leva as coisas. Discutir comigo e me ameaçar é uma coisa, criar problema para ela, doente, é outra.
Denunciar: bom ou mau? Uma das formas de denunciar sem se comprometer ou comprometer os outros é deixar passar um tempo e só então agir, o estou fazendo agora. O que não pode é deixar passar batido. 

Por sinal, esta mesma prima vai precisar de uma cadeira de rodas. Procurei e achei uma cadeira de rodas alemã em liquidação com um preso ótimo, quase o mesmo das mais básicas. Acabei não comprando porque um conhecido me avisou que estão assaltando deficientes, jogando no chão e levando as cadeiras de rodas quando são boas. "Você está de gozação!", e recebi uma resposta seca e definitiva "Não, não estou!".
Boa parte dos moradores do bairro sabe quem são os meliantes do pedaço. Com um pouco de atenção é fácil descobrir. Suponho que se os mesmos meliantes continuam por lá é porque ninguém se dá ao trabalho de ir até a delegacia e denunciar. Então convivem e  aceitam.
Denunciar: bom ou mau?


Em 2006 tive que fazer uma vistoria num córrego que adentrava uma favela. Pedalamos umas 10 quadras favela a dentro e fiquei simplesmente embasbacado com a quantidade de motos grandes e caras circulando livremente lá dentro. Ninguém sabe, ninguém fala, ninguém viu, ponto final. É uma situação que imagino deva doer na imensa maioria que é trabalhadora e honesta, mas se abrirem a boca morrem. Fica a pergunta: como denunciar? Ou, adianta denunciar? É uma situação muito mais complexa.
O outro lado desta história vem da "zelite" que vive denunciando (entre amigos) ilegalidades, ladrões, a falta de justiça e outros que tais, mas tem uma biblioteca de DVD pirata.    


O casal simpático veio para São Paulo. Pela conversa, boa, nas entrelinhas ficou claro que estão fugindo de uma briga que tiveram em sua cidade. Venderam o negócio que tinham para quem parecia bonzinho na assinatura dos papeis. Tudo muito bonito até a hora de acertar o finalmente das contas. Mesmo sendo um casal bem quisto no pedaço, desde sempre respeitados pela comunidade, tiveram que fugir para não sofrerem as consequências de discordar do comprador. Ninguém, nem os velhos amigos mais próximos, ousou falar uma palavra, dizer pro macho vai com calma, todos calaram e enfiaram os seus rabos no meio de suas pernas. 
Esta história me faz lembrar a história de duas comunidades, uma no Rio e outra aqui em São Paulo, que um dia deram um basta na bandidagem e nos malandros do pedaço. Juntaram-se todos, peitaram, e colocaram para fora. As duas comunidades tiveram décadas de paz. Unidos venceremos.


Dedo duro é considerado a pior espécie humana aqui no Brasil. Quem denuncia é sujeito execrável, dito dedo duro, não importa se é para o bem ou do mal. Não pode "dedo durar", simples assim. Nem reclamar que jogou um papel no chão com o lixo do lado.
Pergunta:
Não denunciar no Brasil não terá virado uma valiosa ferramenta da instituição coorporativista? 

Países de primeiro são tão organizadinhos, tão limpinhos, tão bem preservadinhos, tudo sempre funcionando tão direitinho, sem assalto, sem maiores problemas porque o povo denuncia, aponta o dedo. 
Denunciar: bom ou mau?

quarta-feira, 9 de março de 2022

A cidade pós Covid... (já era). A cidade pós invasão da Ucrânia (estreia em breve)



As cidades pré Covid vinham em rápido processo de mudança para melhorar a qualidade de vida, saúde pública, acompanhar a transformação do trabalho, contornar o problema que o automóvel individual vem causando faz tempo, abrir espaço para movas mobilidades, respeitar o novo pensar a família, o coletivo, o individual... Havia "N" (maiúsculo) razões para mudar, para um novo olhar sobre o uso dos espaços públicos e privados e, mais importante, evitar o colapso financeiro, a falência, insolvência. Em última estância cidades são negócios sociais, se não tiver as contas em dia (zero+1) todos perdem, ricos, remediados e principalmente os pobres, é disto que se trata. Questões muito complexas. Estou exagerando? Simples assim: Detroit pediu falência e tenta desesperadamente não literalmente virar uma cidade fantasma. Só Detroit? Claro que não.
No Brasil estamos muito mal-acostumados porque o erário público cobre qualquer besteira ou maluquice. Bem entendido, quem cobre o rombo de centenas de cidades é o meu, o teu, o nosso bolso, o bolso de todos, sem exceção; e achamos normal. 

Um dos sinais deste novo tempo que já passou está refletido no que vem acontecendo com os shopping centers americanos, setor que vem desmoronando sem parar. Para entender melhor vale a leitura do bom artigo de Luís Alberto Marinho, Shopping centers estão vivendo seu “momento Kodak”, publicado no Mercado & Consumo. 
Cidades que viveram seus "momentos Kodak", como São Paulo, já tinham ficado para trás, agora então... Simples: o dinheiro para investimento que já era curto vai ficar mais curto ainda.

A cidade pós-Covid um dia voltará a ser a mesma? A mesma, mesma, tudo indica que não. A pandemia mudou as pessoas e faz sentido pensar que a cidade deva ser transformada por esta mudança. Um exemplo bem simples da mudança inevitável: está claro é que os espaços de vivência e convivência têm que ser melhor iluminados e ventilados, mais que uma questão de saúde pública, uma questão de sobrevivência. A ciência bate aposta alta que novas epidemias virão.

Muito cedo para dizer o que deve acontecer com as cidades pós invasão da Ucrânia. Passados poucos dias de massacre a única coisa que se tem certeza é que o planeta não será o mesmo daqui para frente. Teoria da conspiração? Não, lógica pura, olhar para a história. Não preciso ler os inúmeros artigos e editoriais que estão sendo publicados para chegar a esta conclusão. Bloomberg soltou que há uma boa chance de o barril de petróleo chegar a US$ 200,00. Já tem gente falando em US$ 300,00. Já bateu em US$ 128,00 e segue subindo. Miriam Leitão deu poucas semanas para a economia da Rússia entrar em colapso, com reflexos em todo planeta. Nada será como antes... Se a geopolítica e a macroeconomia já mudaram as cidades de todo planeta mudarão no brutal vácuo que está criado.

Um ponto pacífico: empobrecimento geral e todas suas consequências, que não costumam ser boas.

Nas três situações, pré pandemia, pós pandemia e guerra na Europa, um fato já estava claríssimo: faz tempo que não tem mais dinheiro sobrando para jogar no lixo. Alguém tem dúvida que o dinheiro disponível será concentrado na reconstrução da Ucrânia? Em outras palavras, se já não dava para desperdiçar, a partir de agora é que não vai dar mais, um centavo sequer. Tem solução? Sempre tem. Que tal usar o melhor da inteligência? Administração confusa, desperdício de dinheiro, projetos ruins, construções mal executadas, quebras de contratos, indecisão, leis confusas, legislativo medíocre, falta de confiabilidade, é certeza de naufrágio de toda a sua população, aliás já era. (Não sei porque esta última frase me lembra um certo país)

segunda-feira, 7 de março de 2022

Ucranianas, brasileiras e a discussão de colégio de freiras

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Sou contra mulher pintar o cabelo. E me pergunto qual a razão da preferência nacional das mulheres pelas tinturas loiras. 
Tive toda minha vida de 67 anos cercado por mulheres, protegido por mulheres, educado por mulheres, ajudado por mulheres, e por que não dizer amado por mulheres, a quem devo todo meu respeito, admiração, empenho, a bem dizer minha vida. A discussão que se faz agora sobre a fala do jovem político (?!?) a respeito das mulheres ucranianas e brasileiras para mim beira a conversa de pré adolescente no patio de colégio de freiras. O buraco é muito mais embaixo. O que foi dito por mais este político despreparado é um retrovisor de uma moto costurando desembestada o trânsito de quem somos nós aqui neste Brasil. Como vive, é vista e tratada a mulher brasileira média é uma outra história que não aparece sequer nas entrelinhas. Na Rádio Eldorado Sonia Racy comentou sobre dados que apontam que mais de 50% dos lares brasileiros são sustentados por mulheres. Jornada dupla, tripla em razão do homem que sumiu, ninguém sabe, ninguém viu, mas todo mundo sabe. O Brasil tem sido discutido de maneira rasa, tipo assim Whatsapp, Twiter, pendendo para o politicamente correto, na busca de uma nova moral. Quem tem minha idade não consegue esquecer os politicamente corretos, os de boa moral e bons costumes, e outros que tais de tempos passados, alguns dos quais começam a ser desmascarados agora e que foram os bonitinhos daquela época. Como hoje, nos sobrou dedos apontados, nos faltou diálogo, honestidade e nos ater à realidade do momento. Qualquer mãe sabe que mingau quente se come pelas bordas.
Chico Anísio, Jô Soares, Agildo Ribeiro, dentre outros politicamente incorretíssimos, foram fundamentais para a derrubada da Ditadura e o repensar nossos costumes. Fundamentais porque inteligentes. Quando se dá atenção ao medíocre se abre as portas para a moral e os bons costumes do papo raso. Sensacionalismo, discussão rasa, falas whatsapp é prato cheio que alimenta radicalismo e mediocridades de todo tipo, de direita, esquerda, de populistas, ou de bandos de imbecis com milhões de likes. 
Quando a mulher brasileira vai comprar roupa a padronagem, o corte, o caimento, o desenho, o estilo do que está na moda, na vitrine e prateleiras, veste perfeitamente bem no corpo das loiras mulheres europeias, como as ucranianas em questão. A brasileira média tem dificuldade para se vestir, para ganhar o pão nosso de cada dia, luta para educar os filhos, para não vê-los assassinados, espera conseguir dormir em paz para acordar descansada para mais um dia de luta. Para que esta discussão serve de maneira prática para elas? Likes, dislikes, cancelamento faz diferença de verdade para quem?  
A tragédia que vivemos no Brasil é muito mais embaixo do que uma mensagem boçal de Whatsapp, a mulher brasileira que o diga.

Feliz dia das Mulheres

domingo, 6 de março de 2022

Mais um semáforo "sacaneado"; e postes que dão choque


Na rua Canada esquina com rua Bolívia mudaram a posição de um semáforo criando confusão para os motoristas, motociclistas e ciclistas que vão cruzar a rua Bolívia. Na foto é possível ver ter luzes vermelhas para parar o trânsito da rua Canada, e uma verde. Esta luz verde é do semáforo para quem vem pela rua Bolívia e vai cruzar a rua Canada, que foi reposicionada para criar confusão. Repete-se mais uma vez um fato criminoso que uma hora destas vai acabar em acidente ou até mesmo morte, se é que já não aconteceu. Mudar de posição um conjunto de luzes semafóricas é trabalho que demanda uma chave de boca ou estrela 19 e um bom tempo. O mesmo já aconteceu recentemente nas esquinas das ruas Groelândia com França, Haddoc Lobo com Oscar Freire. Não faz muito vi em outros cruzamentos. Não é coisa de manutenção técnica.
A modelo ciclista que morreu na esquina da av. Faria Lima com rua Chopin Tavares de Lima pode ter se confundido com as luzes dos semáforos que criavam a mesma ilusão do que vem acontecendo em vários pontos da cidade, agora na Canada com Bolívia. 
Outro ponto que é de se estranhar é a quantidade de postes que tem dado choque. Ontem foi um na rua Oscar Freire entre Padre João Manuel e Ministro Rocha Azevedo. Hoje foi na esquina das avenidas Angélica e Higienópolis. Há notícias de outros postes dando choque pela cidade, todos próximos dos Jardins. É de pensar que quem mexa em poste de semáforo deva saber como funciona um poste eletrificado.

quinta-feira, 3 de março de 2022

São Bento do Sapucaí e Pedra do Baú (e Ucrânia)

São Bento do Sapucaí acabou sendo uma grata surpresa. A pequena cidade ainda está bem preservada, guarda o charme das cidades caipiras com suas estradinhas no entorno levam a paisagens lindíssimas cercadas de montanhas.
Cheia de residências e construções que preservam a fachada original, ruas estreitas, igrejinhas pequenas e charmosas ou acolhedoras, negócios de longa data, ou seja, uma rara cidade com personalidade. Senti falta de um "secos e molhados" da minha infância com seus sacos de milho, farinha, feijão, arroz e outros secos abertos no chão, monte de coisas penduradas, prateleiras cheias de utensílios, um balcão de bebidas e comes e bebes, coisa que sei lá se em algum lugar ainda existe, mas lá caberia. Estranhei tudo abrir depois das 9:00 h, para mim tarde, horário de Buenos Aires, não de interior brasileiro. Impossível tomar um expresso antes. Neste horário tem padaria aberta, mas o café definitivamente não é do meu gosto.

Não imaginei que iria ter Carnaval e por sorte dei com uma festa de família, cheia de crianças pequenas e pais, muito parecido com o mágico pré-carnaval que vivenciei em Olinda em 1986, uma das experiências mais mágicas e felizes que a vida me proporcionou. 
Ver em São Bento do Sapucaí bonecos grandes correndo atrás de crianças, rodando, brincando ao som de uma pequena banda de percussão, boa, tocando vários ritmos e andamentos diferentes, foi uma experiência maravilhosa. São menores e mais simples que os bonecos de Olinda, de Silvio, o criador dos grandes Homem da Meia Noite, Menina da Tarde, A Bruxa (pouco conhecido; sai a meia noite de terça-feira) e inúmeros outros que vieram depois e são tão populares. Chama a atenção os bonecos pequenos que são levados por crianças de uns 8 ou 10 anos. O bloco sai pontualmente as 19:00 h, dá a volta pela cidade e acaba em uma hora e pouco no mesmo ponto, diversão para todos, principalmente para a gurizada.  

Em São Bento do Sapucaí não há crianças e adolescentes vestidos de clovis, bate bola ou fantasminha como em Olinda, em compensação os bonecos interagem muito mais com o público, em especial com as crianças, e são bem poucos os fantasiados.
Desagradável foi ver um imbecil com um bebe de uns 4 meses sobre os ombros caminhando junto aos bonecos que volta e meia giram e suas mãos dão "tapas". eu diria bofetadas, nos foliões. O pai foi atingido enquanto protegia o bebe com uma mão e reclamava do boneco. Não era lugar para ficar com um bebe tão pequeno. Tomei uma "bofetada" enquanto filmava a saída dos bonecos e posso dizer que não é legal para uma criança, menos ainda para um bebe. Vi um óculos sair voando, pensei que fosse o meu, mas era do cara ao lado. 
As mãos dos bonecos giram numa altura que ao girar passa por cima dos guris, só pegando de adolescente para cima.


Óbvio que antes de que antes de ir para lá fiz uma pesquisa para ver o que tinha para pedalar e as subidas locais. O que mais chamou atenção foi a subida da Pedra do Baú, que pelo que vi era "braba" e na verdade é muito mais difícil in loco; com topografia bem diferente do que se vê nas altimetrias disponíveis. As outras subidas são para quem é jovem, está bem treinado ou tem uma redução para subir poste. Recomendo o pedal para a Cervejaria Três Orelhas que começa na mais bucólica estradinha rural do Município, para mim o pedal mais agradável. Vi muita gente pedalando na estrada, a SP 50, que tem bom acostamento e uma paisagem prazerosa. Ou seja, tem para todos gostos e pedais. A verdade é que a Mantiqueira é simplesmente apaixonante, um dos lugares mais lindos que conheci. 

Não consegui subir a serra da Pedra do Baú. Não sei ao certo se é o pós Covid, o que meu médico diz que provavelmente é, se falta de treino, se precisava de mais redução, se o calor infernal... Não consegui. Nos primeiros 200 metros de ganho de altimetria estava com o coração tão alto que tive a rara consciência de dar meia volta e descer; algo que não sou muito afeito. Todos para quem pedi informação disseram que é uma subida contínua de 7 km com média de 15% de inclinação, uma barbaridade. Não é exatamente. No último dia subi de carro até a Pedra do Baú e fiquei chateado com minha experiência no pedal. Até onde cheguei, uma curva antes do Acampamento Paiol Grande, caso tivesse pedalado mais uns metros e teria o primeiro trecho de descanso. A ladeira pós este trecho curto, a bem da verdade, talvez seja pior, mais inclinado, que o do começo da serra. São 8 km de tortura. Ainda volto e subo, assim espero.   

Que calor infernal! Fiquei numa casa muito bacana, projeto muito simpático, de construção esmerada, com uma vista lindíssima, mas muito muito quente. Meu corpo reage muito mal ao calor e não descarto que o derretimento sofrido tenha sido uma das causas do não conseguir pedalar bem, inclusive no plano.
Confesso que foi confuso pedalar naquela lindeza pensando na barbárie que passa a Ucrânia. Quantas emoções juntas!

A Pedra do Baú está recebendo melhorias, o que a princípio é bom. A estradinha que leva ao mirante e o recém-inaugurado Restaurante Bananada é de terra e deveria ser mantida. Está muito ruim. O mirante no topo está pela metade, estacas de madeira fincadas no solo e ponto final. Não sei quem projetou o restaurante, mas provavelmente não faz ideia do que é um carro e menos ainda o público que se desloca em um carro. O acesso ao estacionamento do restaurante é uma piada grosseira. Pena porque o local é simpático, com vista para a mata fechada, a comida é boa e farta. Eu não teria colocado o restaurante naquele ponto, mais isto é uma outra história que vai lá saber suas razões.
A pergunta que fica é porque a coisa pública não consegue fazer projetos com a qualidade encontrada em todo SESC? Porque sempre que tem Prefeitura ou Governo do Estado tem que ter uma qualidade duvidosa, um cheiro de baixa inteligência, e uma sucessão de erros idiotas?