terça-feira, 25 de janeiro de 2011

World Bike Tour e Ciclo Faixa de Domingo fechada

25 de Janeiro de 2011. Hoje, dia de seu aniversário, São Paulo teve seu mais importante evento de bicicletas, o World Bike Tour. O evento está melhorando a cada ano em vários aspectos: organização; bicicletas mais bem desenhadas, montadas e ajustadas; familiaridade e tranqüilidade entre os participantes. Você pega a bicicleta e vai da Ponte Estaiada até a USP onde está a chegada e termino do evento. A volta para o ponto de partida este ano teve a opção de ser pela própria Marginal Pinheiros, o que ajudou muito. Nos trens da CPTM foi avisado que em caráter excepcional seriam aceitas mais bicicletas que o normal no último vagão de cada composição. Mesmo assim o ponto crítico deste grande evento paulistano continua sendo a dispersão depois do termino do passeio. São 8 mil ciclistas afluindo para um mesmo local - e saindo dele - o que configura uma grande operação de trânsito, portanto de segurança.
 
O que muitos se perguntaram é porque a Ciclo Faixa de Domingo, dois dias depois de sua inauguração, em pleno feriado e tão necessária para a segurança daquela massa de ciclistas, estava inativa. Por que pelo terceiro ano seguido os ciclistas foram deixados a própria sorte nas ruas. A responsabilidade pela segurança no trânsito, inclusive do ciclista, cabe, por lei, à CET. Duvido que a ordem de não operar a Ciclo Faixa de Domingo durante o evento tenha partido do Prefeito e Secretários. Menos ainda do patrocinador do evento e Ciclo Faixa, que é o mesmo. Esta é mais uma demonstração que a prioridade continua sendo a fluidez do trânsito de veículos motorizados (mesmo em um feriado destes). Oferecer segurança, prevista em lei, aos ciclistas é secundário. Em domingo ensolarado, assim como esta manha de Word Bike Tour, a Secretaria de Esportes do Município diz circularem pela cidade 700 mil ciclistas. Depois do evento o número de ciclistas circulando à esquerda nas avenidas, marcadas ou não pela Ciclo Faixa, era grande, incluindo muitas famílias com crianças. Não havia ninguém para orientá-los sobre o grande perigo e a contravenção que estavam cometendo. Local de ciclista é no bordo direito da via (Art.: 247 - Código Brasileiro de Trânsito). Parabéns a organização do belo evento. Parabéns ao pessoal da Bicicletada, que prestou ótimo serviço cidadão como "Bike anjos", ou seja, mostrando o caminho mais seguro á massa de desorientados que queriam pedalar seguros de volta para suas casas.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Invasões, trilhas e desastres

Aconteceu de novo: o morro desceu e a força das águas varreu mais uma cidade. Alguns bairros simplesmente desapareceram. Culpa da chuva?

Quando se olha com cuidado as imagens dos morros que vieram abaixo na região serra do Rio de Janeiro quase sempre é possível ver situações que parecem ser a causa do colapso da encosta. Em uma destas imagens de destruição a mata parece intacta, mas olhando para esquerda da foto o topo da montanha há um caminho, provavelmente uma estradinha de serviço, que no ponto onde o morro desceu está escondida pela mata. Noutras o morro está pelado ou há grandes casas no topo. Quase sempre dá perceber algo estranho. A tromba d’água foi muito forte, isto não se discute, mas o que mais aconteceu?

Estou me perguntando se morros despencam desta forma quando a mata é de fato virgem. Será que houve problemas parecidos na época dos índios? Há relatos? Não se fala uma palavra sobre o passado longínquo. Não há referência. Tudo gira em torno de dramas e não sobre história e ciência, que é o que nos pode dar alguma resposta para o futuro. Não se trata situações como estas como casualidades da depredação humana.

O Estado São Paulo foi o primeiro a ter uma lei, criada por Asis Ab Saber no Governo Paul Maluf, de proteção a Mata Atlântica. Hoje há uma lei Federal, de autoria de Fábio Feldman, aprovada em 2006, depois de 18 anos tramitando no Congresso. Ontem o Jornal Nacional deu uma cronologia dos desastres similares acontecidos nestas últimas décadas e o roteiro é vergonhoso para todos nós, que a bem da verdade estamos cagando e andando para este e outros problemas. Ninguém faz nada, nem em relação ao lixo que vai para o chão. Ninguém consegue fazer cálculo: custa muito mais barato prevenir que remediar. É questão da nossa cultura.

Provavelmente no meio da mata deve haver trilhas para pedestres, animais, que não costumam ser problema, e talvez até para motos, jipes e outros motorizados. O efetivo de policiais florestais é muito baixo e o controle é precário, mas com a lei foi dado um passo importante. Hoje, com o problema da escassez de água para a população da região metropolitana de São Paulo há a necessidade, cada dia mais urgente, de manter os mananciais produtivos, intactos e limpos. Água é mais valiosa que ouro. A proteção das matas ciliares, dos morros no entorno, e de todo do ecossistema correlato às águas passou a ser coisa séria. A discussão sobre construir desordenadamente passou para um novo patamar onde até os invasores e depredadores têm consciência que do jeito que foi e está não pode continuar.

Há uns meses ouvi uma conversa sintomática de uma moradora do Bororé, bairro as margens da Represa Billings, área com muitas construções irregulares, invasões nas margens dos córregos e morros. Dizia ela que há uma certa irritação do povo que é morador antigo, dos lotes legais, com o pessoal que invadiu o córrego que se vê de sua rua. A conversa tinha um tom forte no sentido de que não se considera mais aqueles invasores uns coitados, um pessoal igual que não tem para onde ir, que invadir área pública é normal. Ela tem uma consciência clara sobre o que é área legalizada e ambientalmente correta, e começa a pensar em agir para retirar o pessoal ilegal dali. A comunidade quer ter uma cidade urbanizada, quer seu parque linear, não quer mais ficar socorrendo quem sabidamente está onde não deveria estar. Efeito do projeto Córrego Limpo da SABESP que já foi implantado na represa Guarapiranga, não longe dali, e que para mim é o projeto urbano mais importante em andamento no país porque educa para as águas. Água nos mostra sua incrível força para a vida, a destruição ou a morte.

Este novo desastre da região serrano do Rio de Janeiro me fez lembrar as trilhas que fazemos em mountain bike, que não raro tem trechos muito erodidos pela passagem de moto ou jipe. Os buracos deixados por motos costumam ser os piores, mais profundos. Não sei quanto um talho no chão da mata, uma erosão causada pela simples diversão, pode ser causa de um desastre destes. Provavelmente em grande declividade uma situação destas desestabiliza toda encosta. O caminho deixado por uma bicicleta é muito menos danoso, mas de qualquer forma é um corte, uma cicatriz. Por isto há muitas campanhas nos Estados Unidos e Canadá para que o mountain biker seja amigo da natureza e evite deixar destruição para trás. Aqui Engenheiro Evangelista e Engenheiro Marsilac, os dois últimos bairros antes da reserva florestal de Capivari Monos, extremo sul e reserva florestal de São Paulo, houve (e espero que continue) uma ONG, se não falha a memória “Olhos D’Água”, que treinava ciclistas para fazer mountain bike amigo da mata. Acabavam servindo de fiscais e ajudando a preservar tudo.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Haiti, Complexo do Alemão e o ENEN

Só procuramos ver o que não nos incomoda ou o que não nos afeta.

Catástrofes naturais costumam expor o desastre criado pelo homem, pela negação de sua própria história, de sua cultura, sabedoria, pela prepotência, boçalidade que nos assola perene e sistematicamente. O conforto individual vale mais que qualquer indício inegável de que a individualidade só leva a um futuro errante. Conforto é o que nos trouxe aonde chegamos. Mas passamos do ponto sensato da noção do que é segurança e liberdade, o melhor dos confortos, que só é possível através do coletivo. Ou todos temos segurança e liberdade ou ninguém está totalmente seguro e liberto, esta é a mais pura verdade. O mesmo vale para o ponto de equilíbrio do conforto.

O que acontece hoje só pode ser justificado pelo baixíssimo nível de educação social. Ninguém escapa desta verdade. Entre a elite pensante, que tem boa cultura, é assustador o silêncio, a falta de crítica. Bem simbólico, e acho que já contei esta simbólica história, foi vivenciar um dos principais intelectuais do Brasil, muito respeitado aqui e alhures, norte de uma geração, deixar a bosta de seu cachorro no meio da praça vizinha a sua casa, onde brincam filhos e netos de amigos. Remete ao senhor feudal. Os servos que limpem.


A cidade é pública, e o que público é de ninguém...

(Parece que) Sai de cena o ícone deste desatino, Lula, o “crustáceo”, como o próprio diz, o paizão de tudo de bom que nunca havia acontecido antes nestas paragens. Intelectuais calam perante a força populista e curvam-se perante o milagre brasileiro acontecido única e exclusivamente nestes últimos anos. Antes não havia nada, só malditos. Francis Fukuyama está absolutamente certo: “A história acabou”. Durante estes magníficos anos não houve porque nem o que criticar. A cavalo dado não se olha os dentes. Quem havia ficado de fora agora é dono da festa e sequer está preocupado com o bem casado da saída. Roberto da Matta, que o diga: (http://gilvanmelo.blogspot.com/2010/11/como-fazer-oposicao-roberto-da-matta.html). Já aconteceu antes, mas não nesta escala vergonhosa. As músicas das rádios que o digam.

O Brasil de Lula repete a Argentina e seu milagre; repete o silêncio criminoso da sociedade americana durante e depois da era Bush; repete inúmeras histórias vividas. Quer deixar a família e os amigos felizes? Abra seu cartão de crédito assim simplesmente.

Mediocridade mata!

ENEM (ou neném como chamam os furiosos) está ai para provar. Dos que produzem as provas aos que as fazem todos estão reprovados. O exemplo máximo do país, o estadista, como quer muitos, é esperto, inteligente, e isto basta. Basta?

Lula é fenômeno que foi sendo criado. Não se faz sucesso sem maquiagem. Papagaio de pirata faz milagres. Mundo afora há muitos como ele, criaturas de um momento histórico, de uns poucos ou do delírio da população. Lula, Kirchner, Chaves, Bush, Berlusconi, só para citar uns pouquíssimos da longa lista que em pleno século XXI. Estes senhores, são humanos, têm defeitos e qualidades, são fruto de uma grande distorção social. Construir com bases sólidas nem sempre faz muito sucesso. Os 15 minutos de fama de cada um de nós atende muito melhor ao próprio ego. Construir o futuro virou a política dos 15 minutos de fama e para isto basta uma frase de efeito, um chame especial, saber gritar em público, ficar bem na fita.

Nossas cidades são o melhor reflexo de quem somos. O governo Lula teve suas qualidades, a melhor delas foi saber propagandeá-las com esperteza. Outra foi cooptar, se não no participar, mas no calar, muito dos possíveis críticos. Continuo em minha posição que o que houve não foi socialismo muito menos um processo socializante porque as bases estão quase que exclusivamente fincadas no dar e no ter. Nossas cidades têm um monte de coisas e deixo a você, leitor, enumerá-los. Mas o que é a cidade brasileira? Portanto quem somos nós? Quem tem um grande guardião ou paizão é porque não condições de se segurar por si próprio.

Hoje, enquanto tomava café numa doceira com cadeiras na calçada com direito a vista de uma bela praça ajardinada, aproximou-se e entrou um miserável senhor, morador de rua, com o cheiro acre típico destes. Lembrei-me das descrições das cidades medievais e pós-medievais. Oswaldo Cruz foi violentamente combatido por suas campanhas de sanidade pública, isto numa Rio de Janeiro, então Capital do Brasil, em pleno nascedouro do século XX. Jogava-se então merda pela janela – literalmente. Não muito diferente do que ainda vejo em algumas áreas não tão periféricas como muitos podem crer. O índice de coleta e tratamento de esgoto de algumas cidades é mais que constrangedor, é vergonhoso, se é que algum cidadão brasileiro tem ou sabe o que significa de fato “vergonha”. O agradável café e paisagem, com o senhor tomando seu café calmamente na mesa, ao lado tinham provavelmente o cheiro tão comum às cidades de algumas décadas passadas. Quem entrou num ônibus apertado na Europa que o diga. Ou pelos nossos becos mijados. Ou pelas ruas do carnaval... A noção atual de cidade diz que não há outra forma. O mesmo com as pequenas embalagens de papel de bala que são jogadas no chão coletivo. Tudo isto que convive-se diariamente.

Consciente de sua situação, o senhor havia perguntado se poderia sentar-se ali. E por que não? Ao sair esqueceu seu saco de latinhas, já todo rasgado e furado. Eu e o manobrista ajeitamos as latinhas num novo saco e fui levar até o velho senhor quieto, ciente de si e bem educado. Ele agradeceu. Voltei ao café e fui lavar as mãos. Necessidade ou neurose? Por que ter consciência pesada por lavar as mãos?

Como controlar a baderna?

Passou mais de um ano e Porto Príncipe, capital do Haiti, continua um caos. Pelo que se lê ainda há corpos por todas as partes, agora vítimas da cólera. A reconstrução da área destruída pelo terremoto pouco avançou. O que fazer com o entulho? Para que investir dinheiro naquela baderna destruída que antes do terremoto já era uma baderna? Qual o valor daquilo? Pergunte aos aproveitadores e bandidos.

Parece que estão tentando fazer as escolas funcionar. Parece que a “coisa”, seja ela o que quer que seja, está muito devagar começando a voltar à normalidade. O que é normalidade? Qual é o parâmetro para normalidade daquelas pessoas? Na Rádio Canadá Internacional, emissão em francês, foi entrevistado dia 5 de janeiro de 2011 um haitiano que escreveu um livro sobre a cidade, Porto Príncipe, que desapareceu em minutos e sobre o povo que luta para sobreviver com sorrisos. A normalidade é o caos de antes. Quantos terão idéia do que deve ser uma cidade? Quantos fazem idéia do que é conforto?

Caudilhos e populistas permitiram a destruição da cidade durante décadas, um século. Desmoronar tudo num terremoto só foi a cereja do bolo. Tão parecido com nossas enchentes e desbarrancamentos, com a nossa violência instituída. De quem é a culpa? Por que ter consciência pesada por lavar as mãos? Quanto vale o silêncio? Quinze minutos de sabedoria ou o futuro da família?

Problema dele! Ele que se vire!

O absurdo do complexo do alemão é o tempo que a sociedade legalizada demorou para tomar uma atitude. E não foi ela quem o fez, mas um pequeno grupo de pessoas, ou policiais. Milhares de pessoas foram abandonadas. Elas se acostumaram à situação. Todos nos acostumamos à situação. Não há o habito de trabalhar um problema até sua solução final e definitiva. A libertação daquela população poderia ter sido um ato de toda sociedade? Poderia, mas isto demanda educação de fato, não esta coisa que recebemos. Não se consegue sequer explicar aos letrados o que hoje é chamado de “doença social”, no caso “câncer social”. Há muita gente que não consegue entender a sociedade como um tecido vivo que pode ficar doente, fora do equilíbrio, e que precisa de tratamento. Os letrados se trancam em seus carros de vidro preto e a cidade passa ser algo distante, tão irreal como uma imagem virtual. Há uma incapacidade geral de perceber que a solução pode ser mais fácil que imaginamos, que o problema é deixar crescer a bola de neve ladeira abaixo.

Nova Iorque tratou de seu câncer e está novamente em pé. Hoje eles têm todos os custos, da violência e do tratamento desta, planilhados. Sabem quanto custa um pichação, um mendigo, um assalto, o traficante; custo que recai sobre toda a sociedade, até mesmo nos que se crêem mais protegidos e seguros.

Na destruição entram os que acreditam que são estadistas, os que acreditam ser justos, os que acreditam estar fazendo o bem para si e suas famílias. O ponto em comum é a falta de noção do que é o processo construtivo que só a vivência recheada de cultura nos traz. Não existe cidade sem educação ampla geral e irrestrita. Não há solução mágica. Parece que ninguém faz idéia do que é uma cidade. A cidade é um caldo de cultura sem tamanho que só a educação pode dar rumo seguro. Dá para construir uma nova cidade, uma nova sociedade, uma nova civilização? Dá.

Recomendo a leitura deste artigo do Washington Novaes - http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20101231/not_imp660153,0.php