quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Sonhos para 2018

Feliz Ano Novo. 2018. Tem que ser ou tem que ser. Olhar para frente. Pior que está não fica (pelo menos esta é a vontade, porque pior sempre pode ficar)....
2018. Quem sabe o que será? Incertezas, incertezas. De certeza só o fato comprovado que é nas crises que surgem as grandes oportunidades. Oportunidades. 
Tai a Mega Sena que não nega e deve pagar mais de R$ 250 milhões. Odeio a certeza que não vou ganhar, mas adoro a brincadeira de sonhar com o prêmio. Mais ou menos R$ 1.750.000,00 por mês só de juros. Dá para viver. Dá para pensar um monte de besteira, dar risada. Se ganhar já sei qual será meu primeiro ato?: vou me internar num hospício. Vou deixar um monte de gente feliz.
Sonhar sai muito mais barato que uma psicologa. A fezinha semanal vem carregada de sonhos. Sonhar faz bem, gera esperança, principalmente quando se tem um pouco de bom senso para entender no que pode dar o sonho. Tem sonho prático, realizável, assim com tem delírio e estupidez completa. Somos mais propensos ao último. Igualzinho ao que fazemos do nosso dia a dia. 
Se ganhar na Mega Sena nunca mais uso papel higiênico fura bolo nacional, isto é certo.
Para algumas coisas dinheiro é inútil. Para outras por mais dinheiro que se tenha não se resolve nada. É impossível reverter os efeitos de uma doença crônica, de uma cegueira, da burrice... Fato consumado é fato consumado, não aceita sequer suborno. Mas sonhar permite ficar exercitando a inteligência sobre o que faria com a própria vida. O egoismo vem antes. Ajudar amigos, família, quem mais? Como ajudar os moradores de rua? Casar ou comprar um bicicleta nova? Esta é fácil: fico com a bicicleta e faço a mesma recomendação a todos. Bicicleta não abre a boca e quando range basta umas gotas de óleo que ela te leva para frente
Sonhar pode ser divertido ou angustiar muito. 
Uma coisa é fato: não dá para simplesmente torrar dinheiro. Dinheiro não aguenta desaforo, nem nasce em árvore. 
Não dá para torrar a vida em sonhos, utopias, mentiras. Vida não leva desaforo para casa. Sonhar, ter utopias, esperanças não só faz parte da vida, como deve ser um vento que ajuda a ir em frente, mesmo no vento contra. Vai fazendo zig-zag, mudando a vela, engolindo as ondas e a água que respinga furiosa na cara, mas segue em frente, sempre em frente. Demora mais chega lá.

E nunca esqueça: se tirar a Mega Sena ou ganhar um dinheirinho extra mantenha a boca fechada, não conte nem para a sombra. Dinheiro é como merda; atrai um monte de mosca.

Finalmente: se tirar a Mega Sena não se interne no hospício. Saia dele. Interne sua sogra, o irmão chato, o filho malcriado e eternamente adolescente, o primo, a tia que não para de falar, o amigo sem noção, os politicamente corretos... Seja bondoso, tem montão de gente que precisa desesperadamente de um internamento. Com R$ 250 milhões dá para construir um hospício novinho com lindas camisas de força. Deve sobrar um trocado para umas cadeiras de choque elétrico. Não gostou? Então manda o pessoal para um fim de semana no califado do Estado Islâmico, eles vão adorar. Dinheiro faz milagres.

beijos e abraços
Feliz 2018

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Londres Victoriana, 1900

Este filme é cheio de detalhes interessantes. As ruas estão cheias de bosta de cavalo, um problemão que afligia todas as grandes cidades na virada no século XIX para o XX e que foi uma das razões do sucesso primeiro da bicicleta e depois do automóvel. Aos 1:40 é possível ver um carro de bombeiros a direita. Aos 2:40, no canto à esquerda, um sujeito tenta aprender a pedalar uma bicicleta e toma um tombo. Ele é levantado e tenta de novo pedalar com ajuda de alguém. O aprendiz consegue descer a ladeira na frente do bonde, mas para logo e não consegue seguir.

sábado, 23 de dezembro de 2017

Feliz Natal

Os dois enormes golden retridever vem arrastando seu gordo proprietário. O velho de camiseta vermelha que mal lhe cobre o barrigão, barba por fazer, branca, e cara bonachona parece se divertir com o exercício forçado. Não dá para ser diferente com tão simpática raça de cachorro. É véspera de Natal e o velhinho faz lembrar Papai Noel a algumas horas de sua entrada em ação. Tropical, bem tropical, pernões brancas e gordas ao vento, chinelão de dedo, urbano sem dúvida. Provavelmente mora num dos apartamentos e tem que sair com seus maravilhosos golden para fazer pipi umas tantas vezes por dia, mas tal figura nunca foi vista antes. Segura uma coleira em cada mão como se estive sob o comando do grande trenó puxado pelas renas. Dá passinhos apressados como se estivesse voando sobre nossos tetos, corpo inclinado para trás como se freando o trenó para entrar na próxima chaminé.
O pequeno de passos ainda incertos se segura no carrinho de bebe da irmã que dorme sob a luz suave do fim do dia olha para o velhinho e seus golden. Vai girando a cabeça até que o Papai Noel passe por trás do arbusto. Agarra e puxa a saia da mãe que segue em frente meio apressada e esta pergunta meio impaciente "o que é?". O pequeno gira a cabeça e o corpo para procurar o velhote gordo, quase cai, a mãe num gesto rápido consegue segurar o pequeno. Ela para, agacha-se, segura o filho com mãos delicadas, maternal, olha nos olhos do menino que tem uma expressão de espanto e magia enquanto estica o bracinho e aponta para trás no vazio. A mãe sobe o olhar, percebe uma fachada ricamente iluminada, cheia de pingos de neve brilhantes num pinheirinho. O velhote e seus golden desapareceram, mas o instinto maternal de alguma forma sabe que ele passou por lá.
Cruza caminhando leve um senhor mulato, magro, mochila velha com ferramentas de carpinteiro visíveis, provavelmente voltando para casa de um bom dia de trabalho. Sorridente deseja um Feliz Natal a todos.

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Sobre a lei anticiclovia

O que falar? Primeiro porque quando me falaram sobre esta Lei anti ciclovia eu não dei importância porque acreditei que fosse mais um exagero típico dos anos Haddad 400 km, aquela época onde ou se era inquestionavelmente a favor das ciclovias ou você era um criminoso contra toda e qualquer liberdade, o bem de todos (não sei bem de quem, mas que seja), os direitos, bons costumes, e um futuro melhor para a cidade (qual?). Achei que havia mais um exagero tipico de resquício de tempos recentes. Conhece aquela historinha de Pedro e o lobo? Mas a lei está aí.
E ai me perguntaram se eu daria um depoimento sobre a dita Lei anti ciclovia. Talvez de lá, mas aqui e agora vai: 
A física reza, e nem mesmo as mais fanáticas ideologias negam tal verdade, que para cada ação existe uma reação. Na vida é igual, principalmente em país de índio bravo e branco todo poderoso. Fosse país de gente civilizada provavelmente se conversaria. 
O discurso dos cicloativistas durante bem mais de quatro anos, não só os de Haddad dos 400 km, foi "Vocês vão ter que nos engolir". Esqueceram fazer um cálculo básico: o número de ciclistas e de viagens pela cidade faz um percentual (ainda) muito baixo, nem vou tomar o cuidado de ver quanto, mas uns 5% se tanto, e que vocês, ciclistas, esqueceram que os outros 95% estão um pouco chateados com o tal discurso. Aliás, já estavam chateados com as portas chutadas, os motoristas xingados, agredidos, reações de apoderamento, e outras delicadezas mais. "Tá tudo tomado!" Infelizmente mesmo avisados vocês, ciclistas, repetiram tintim por tintim a história dos motoboys, que parece, assim, parece, que não deu certo e até hoje causa pequenos problemas, para dizer o mínimo. 
Teve o discurso "motorista assassino", "carro mata", "um carro a menos" exatamente quando o PT de Lula e Dilma, aqueles do "Brasil do nunca antes" socializaram o sonho do carro a preço reduzido para uma população de baixa renda que queria que ciclista se ______ . E outros que tais, o que vamos dizer é uma acusatória generalizada meio tipo..., Preciso colocar em palavras ou está subentendido? Enfim, não foi uma estratégia muito inteligente.
Para piorar a posição dos ciclistas estamos vivendo um momento, que espero que seja só uma transição, onde ciclista é visto com terror pelos pedestres, que como sempre diz Reginaldo Paiva sabiamente somos todos, 100% da população. E finalmente tem muitos ciclistas mal educados que apavoram outros ciclistas nas ciclovias. Enfim, no momento os ciclistas não estão nem um pouco bem na fita.
Num contexto deste vou falar o que sobre a dita lei anti ciclovias? 
Eu nunca fui a favor de introduzir a bicicleta como modo de transporte na porra louca, de ir fazendo sem grandes preocupações com os desacertos (ô palavrinha politicamente correta!) ou sem se preocupar com gastos tipo "faz depois conserta" e outras pérolas nunca antes ouvidas. 
Tem que ter projeto, tem que ter alguma demanda que justifique (a lei já exigia), tem que ter lógica, bom senso, diálogo. Assim como acho que tem que ser feito sem demora, mas num dentro de um projeto maior para a cidade, ou vamos ter muito mais problema para frente. 

Eu fico profundamente triste com tudo que aconteceu e está acontecendo. 

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Que merda!

Venho pedalando pela calçada da Ponte Cidade Universitária devagar e com cuidado com os pedestres. Um pouco a frente está a entrada para a rampa da ciclovia do Rio Pinheiros e mais a frente dois corredores a pé trotam lado a lado numa conversa amiga. Num relance vejo uma bicicleta vindo rápido, empurrando para o lado os corredores, passando com cara de bravo por ter sido atrapalhado e entrando a minha frente na rampa. Com roupa, luvas, capacete, sapatilhas, tudo de primeira, muito chique, uma Scott de estrada de fibra de carbono para bem poucos, desce o primeiro lance da rampa no embalo, desclipa furiosamente dos pedais e num passinho curto e apressado segue a descida empurrando a bicicleta, batendo os tacos no concreto. Sua expressão é mal humorada, de quem está desesperado para dar uma pedalada no que ainda resta de tempo daquela tarde. Enquanto vou descendo acompanho sua descida com um olhar recriminatório lembrando da agressividade com que tirou os corredores da frente. Estou curioso para ver para onde sai pedalando e quem sabe dar uma bronca, mas ele não vai para a ciclovia. Entra furiosamente no estacionamento dos banheiros, quase joga a cara bicicleta no paraciclo, sai em disparada sem se importar que a linda Scott de estrada está solta, destrancada, e se tranca no banheiro. UFA! E eu que estava até então furioso com a forma como ele havia aberto caminho na ponte empurrando para o lado os corredores a pé. A verdade é a seguinte: entre borrar as calças ou deixar a caríssima bicicleta jogada à sorte, conclui-se que todo homem almeja desesperadamente sentar com os fundilhos limpos no trono! Um peido para vocês.


sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

União e segurança

Setores público e privado se unem para aprimorar segurança nas estradas. Sob incentivo da ONU, empresas se engajam e trocam informações para reduzir óbitos no trânsito (4º Fórum de Segurança da Arteris publicado pelo O Estado de São Paulo). 
E eu incluiria aí a população. E como já estive no meio da história me recuso a entrar no discurso que "eles não querem conversar" porque não é verdade. Diria que nós, sociedade civil, temos um problema de comunicação. Quando nós, sociedade civil, permitimos que alguns falem por nós o que lhes dê na telha a comunicação fica suja, difícil ou termina. Deve ser uma conversa, não uma imposição de vontades. Lembre-se sempre que por trás deles, setor público e privado, tem uma complexa rede de interesses pessoais e legais. Tente descobrir o caminho para um diálogo produtivo, sem acusações, e os bons resultados virão mesmo que com alguma demora. Pressão é uma coisa, agressão é outra.
Cada vez que cai o índice de acidente todo mundo sai ganhando, poder público e privado tem uma sobra maior de caixa e podem investir em outras áreas também importantes para a segurança geral. É bom negócio para todos.
O fato é que sem união de todos, disse todos, jamais conseguiremos a união, a segurança e a paz desejada por todos. 

Exterminar o achismo

Por onde começo? Ontem tive um ótimo exemplo de achismo:
Passei pela esquina av. Lineu de Paula Machado (a do Joquey) com a av. Lopes de Azevedo e dei de cara com esta obra que está nas fotos e uma funcionária da CET olhando a obra. Conversei com ela que disse que a obra era desconhecida pela CET. Ou seja, a Sub Prefeitura do Butantã tomou a iniciativa e fez. Isto é bom ou não? 
foto 1: A geometria do acalmamento para os veículos que descem a Lopes de Azevedo tem 45º, o que induz os motoristas a ir para a contramão. Não sei exatamente o que pensaram os projetistas, mas creio que o correto seria 90º.  É provável que mudem a mão de direção dos veículos antes do obstáculo, mesmo assim 45º é um erro porque também induz o motorista que sai da Lineu de Paula e sobe a Lopes de Azevedo a ir para contramão depois do obstáculo. 




foto 2: A geometria da esquina em curva aberta faz com que os veículos possam sair da Lineu de Paula e entrar na Lopes de Azevedo com velocidade maior do que a ideal para segurança dos pedestres. Com uma geometria mais "quadrada" a pedestre (na foto) teria mais facilidade de visualizar os veículos porque estaria mais próxima do alinhamento da Lineu de Paula




foto 3: A geometria do obstáculo criado não está alinhada com a Lineu de Paula o que daria maior proteção aos pedestres, evitando, por exemplo, que a pedestre fique pouco visível para motoristas e que veículos possam estacionar no meio da faixa de pedestre para descarregar passageiros.


foto 4: Um motorista sem entender o que deve fazer  invade a ciclovia para seguir em frente, resultado da forma confusa do obstáculo (foto 1) que está em 45º. Ok, a sinalização não foi instalada, mesmo assim o projeto é confuso e continuará com sinalização. 






O primeiro caso de Sub Prefeitura tomando a dianteira e agindo sem o expertise da CET aconteceu em Parelheiros. Construíram uma ciclovia com vários problemas técnicos que resultou na morte de um ciclista. Abriu-se ali um caminho de pressão contra a CET e Secretaria de Transporte eficiente e ao mesmo tempo perigoso. Parte do princípio, verdadeiro, que há um lado da CET duro de roer, mas não leva em consideração as razões para haver tanta resistência. 
Eu acho... e creio que ninguém duvida que acalmamento de trânsito e ciclovia melhora a segurança de pedestres e ciclistas; isto se bem feito! Do contrário há uma enorme possibilidade que seja dinheiro mal gasto e leve ao aumento da insegurança não só de pedestres e ciclistas. Exemplos é que não faltam por ai. De boas intensões o inferno está cheio! De achistas então...

No mesmo suplemento sobre o 4º Fórum de Segurança da Arteris publicado pelo O Estado de São Paulo, sobre o qual já escrevi aqui lê-se o título ABOLIR O "ACHISMO" e apertar fiscalização são medidas vitais para diminuir acidentes. Coleta sistematizada de dados tem de ser ponto de partida das políticas do setor, afirmam especialistas. O que adianta repetir? Quem se interessa?

Porque este país não vai para frente? Se você tem um mínimo de consciência sabe que esta é "a" pergunta. A meu ver por que o achismo impera sobre corações e mentes, continua sendo a ordem do dia. É sabido que somos 200 milhões de técnicos de futebol, todos vencedores, assim como temos opinião perfeita e fechada sobre todos assuntos. Ciência, cultura acumulada, história, para que? O dito melhor Brasil da história não foi resultado de um mandante que recitava seu orgulho de só ter lido um livro na vida? Que se dane a boa cultura, a ciência, o erro mínimo. 

Achismos tem um custo absurdo. Bobagem, burrice, mediocridade, falta de interesse pela verdade... mata, nunca duvide disto. 
Achismo é inerente ao ser humano, mas tem limites. Nós aqui no Brasil extrapolamos todos os limites.

PS.: Vão mudar a mão de direção no último quarteirão da Lopes de Azevedo. Previsível. O que não se justifica é que não tenham desviado o trânsito desde o início da obra.

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

pedal pelo direito de ir para Santos

Não vou mexer no texto abaixo. Ele é uma resposta ao pessoal da UCB que está discutindo a questão da ligação São Paulo capital a Santos e o pedal que aconteceu no último domingo quando uns 3.000 ciclistas tentaram descer a serra e foram impedidos. Infelizmente não estava lá porque estou com o joelho inflamado, coisa de velho.
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É fato que por diversas razões não sai a ligação São Paulo - Santos. Algumas entendo, outras acho que é hora de serem superadas. 

Na época do Governo Montoro eu estava próximo do que acontecia e não fiquei sabendo da construção dos bicicletarios então instalados. Não sei quem fez a coisa acontecer, ou não me lembro. Talvez o Reginaldo Paiva saiba ou talvez seja ele o agente. 
​Contam que no Governo Quércia foram fechados os bicicletários por falta de uso. Moro ao lado da estação da CPTM Pinheiros e sou prova que durante anos vi uma ou duas bicicletas estacionadas lá, se tanto.  Sei que aconteceu o mesmo em outros bicicletários. 

​Tendo vivido aquela época posso dizer que um dos maiores problemas foi o erro de estratégia para melhorar a questão da bicicleta, o que realmente aconteceu. Muitas vezes foram pedidas coisas que eram irreais ou fora do tempo, o que prejudicou muito conseguir melhorar a vida de ciclistas. Infelizmente poucos sabiam ou entendiam, por diversas razões, que havia um número sensível de ciclistas, operários principalmente, circulando na Grande São Paulo, principalmente no ABC, área industrial. 

Uma coisa é o Legislativo, outra, complemente diferente, o Executivo. Eu não recomendo responsabilizar o Executivo por todos os males. Outra coisa, quem já viu o Executivo por dentro sabe que algumas vezes alguém do primeiro escalão quer, mas o projeto não sai porque o segundo ou mesmo terceiro escalão mela, para tudo. Existe uma lei sobre responsabilidade técnica nos projetos que dá mais força a um técnico concursado do que os mortais possam pensar. O projeto São Paulo Dá Pedal que tinha patrocinador para 255 km com tudo, ciclovia, ciclofaixa, partilhado, sinalização, totens, orientadores ciclistas, site, comunicação, projeto educativo.... foi negado numa canetada de terceiro escalão - ponto final. 
Outro ponto é que não se pode confundir a pressão que havia naquela época, praticamente zero, com o que aconteceu nesta década. Hoje tem bicicleta passando na cara de todo mundo , tem grupos organizados... 

​Para mim é muito mais importante dar uma força aos operários que circulam tanto pela Anchieta como Imigrantes do que abrir uma rota turística para Santos. Eu gostaria de ver acontecer os dois, mas um passo por vez. 
​Entendo a preocupação da concessionária, que não para na segurança de trânsito. Com se faz com os constantes assaltos que acontecem nas rodovias? Por que a gente não pede providências para dar mais segurança aos trabalhadores que pedalam ou caminham pela estrada?
​Também tomaria cuidado com o discurso porque temos exemplos de concessionárias que agiram. Na Ayrton Senna, em Rio Claro, e outros. Na Dutra, em Guarulhos, passava em 2011 um ciclista a cada 27 segundos em horário de pico, mas ninguém vê, ningue´m fala, ninguém se interessa. Na Ayrton Senna um grupo de funcionários implantou uma ciclovia para diminuir os constantes acidentes com operários que desapareceu e ninguém falou uma palavra. Vamos com calma com o discurso, procuremos saber o que acontece de fato para então pensar numa estratégia. 

​Ideia ou proposta apresentada ao Governo de São Paulo de uma ligação para Santos existe deste 1982, diferente desta que está ai, mas apresentada oficialmente. Não deu certo. Eu adoraria, melhor, eu sonho ver esta ligação acontecer, mas como? Qual a forma?

​Em anexo um documento de proposta para o cicloviário do Litoral Paulista. Não sei onde está o funcional. 

abraços
Arturo

sábado, 9 de dezembro de 2017

Ataque de TPM no trânsito

No cruzamento um motorista parou para que três senhoras cruzassem a rua. O motorista que estava atrás disparou a buzina e não parou até que o carro saísse de sua frente. Ainda abriu a janela e gritou sei lá o que aos montes. Ultrapassei o desagradável incidente e sinalizei com a mão que o outro carro estava parado por causa dos pedestres. O motorista furioso acelerou em minha direção, emparelhou, abriu a janela, empurrou com brutalidade a senhora sentada no banco de passageiros que fez uma cara de apavorada, e voltou gritar coisas que confesso não entendi (de verdade), acelerou e parou logo a frente noutro semáforo. Eu voltei a ultrapassa-lo e sua janela estava aberta com o homem gordo aos gritos. Olhei pelo para-brisa e vi a expressão de terror da senhora, não comigo, mas com o motorista. Não houve de minha parte xingamento, só o movimento com a mão pedindo calma. Talvez a forma de fazê-lo. Por precaução parei do lado esquerdo da esquina, longe daquele homem com ataque de TPM. Abriu o sinal, ele fechou a janela, dobrou a direita e se foi. Infelizmente nada a fazer.
Fosse em um país civilizado eu teria chamado a polícia. Provavelmente com rapidez teria chegado um carro policial, ou moto, teria abordado o furibundo para saber o que estava acontecendo. Vi isto acontecer em vários países e a eficiência da polícia é impressionante. Eu teria pedido providências ao policial principalmente por causa da agressão dele contra a senhora que viajava com ele, provavelmente sua mulher. Como estamos aqui neste Brasil de guerra civil oficialmente não declarada*, e mesmo estando numa das pouquíssimas áreas que tem padrão de segurança aceito pela UNESCO, é uma perda de tempo chamar a polícia que tem mais o que fazer. Entre parar um histérico ou um ladrão, fico com a opção do ladrão.

A velhice me trouxe sabedoria. Fosse no passado eu teria armado o maior barraco no meio da rua que não serviria para nada além de provar a mim mesmo que sou justo, que tenho bons propósitos, que consigo combater o mal que aflige nossa sociedade. Hoje tenho certeza absoluta que isto é uma besteira que não tem tamanho, uma atitude completamente contraprodutiva. Para mudar de verdade não se combate o efeito, mas as causas.
Há pesquisas e estatísticas que provam sem qualquer sombra de dúvida que ter um chilique no meio do trânsito diminui muito a segurança de todos em volta, principalmente a segurança de quem teve o chilique. Paz no trânsito vai muito muito além de uma simples frase publicitária.
Quer ajudar a melhorar o trânsito e a vida de todos? Controle-se, tenha autorrespeito. Só o autorrespeito leva ao respeito coletivo. Dar bom exemplo faz milagres.

*Ontem foi "publicado um informe da Small Arms Survey, referência mundial para a questão da violência armada que aponta o Brasil com 12,5% das mortes violentas no mundo em 2016, ou, O Brasil tem maior número de mortes violentas do mundo" (tirado da matéria de Jamil Chade em O Estado de São Paulo, A14, Metrópole, 08 de Dezembro de 2017). Quem se importa?

sábado, 2 de dezembro de 2017

Um mês sem telefone fixo Vivo: que Brasil queremos?


02 de Dezembro de 2017
O Estado de São Paulo
Fórum do Leitor:



Pela gentileza e ótimo serviço prestado pelo técnico Edson acabo de ter de volta meu telefone fixo da VIVO depois de um mês e três dias mudo. O primeiro pedido de conserto foi feito dia 30 de Setembro, 21:15 na agência do Shopping Eldorado, isto porque foi impossível completar a ligação para o 10315 tentada inúmeras vezes, e no site Meu VIVO dava como errado meu CPF, mesmo eu tendo o telefone e pagando em dia todas contas desde 1987. A partir daí foram 4 chamadas para o 10315 e, pior, 5 ligações para a Ouvidoria VIVO, sendo que em duas ocasiões conversei com supervisores. Tenho os protocolos e datas. Ouvidoria foi prestativa, mas ficou claro sua limitação. Uns 10 dias depois do primeiro protocolo veio um técnico e aí descobri que fora aberto um pedido de conserto para internet fibra, o que nunca fiz ou sequer citei. Tentei corrigir o problema nas ligações que fiz, mas em vão. Mais uns dias encontrei outro técnico na frente de casa consertando outras linhas fixas, uma a 10 dias muda, mas que não tinham ordem de serviço para meu caso. E hoje apareceu o técnico Edson, novamente com uma ordem para internet fibra. Quando lhe contei toda a história ele, calado, foi e resolveu o problema rapidamente; melhor, os problemas. A ventania de 30\11 partiu o fio aéreo. Dentro da caixa da VIVO, por qual razão um mistério, meu fio também estava partido. Não tenho como agradecer ao Edson. Quanto a VIVO... Vou mais longe: casos ridículos como este se repetem com uma frequência assustadora e ficamos quietos. Quem não viveu uma ou várias situações surrealistas de ineficiência ridícula de grandes empresas? Este é o Brasil que queremos? 

Esta foi a carta para o Fórum do Estadão. Aqui faço a mesma praticamente a mesma pergunta para os amantes da bicicleta: 
Quem não viveu uma ou várias situações surrealistas no atendimento das bicicletarias ou na qualidade das bicicletas e acessórios? Quantos fizeram valer seus direitos?
Só lembrando: Faz uns anos as concessionárias de rodovias  afirmavam que aproximadamente 35% dos acidentes fatais envolvendo ciclistas tinham relação direta com falha mecânica da bicicleta do ciclista. 

Fim de tarde mágico

A luz do sol de final de tarde entrava pela janela convidando a largar o trabalho e ir para a rua. Silêncio e olhar perdido. 
Dei um pulo da cadeira, desdobrei, montei e travei a bicicleta dobrável. Fazia tempo que ela não ia para rua, tive que encher os pneus. O fiz sem sentir culpa de abandonar o trabalho parado. Dei-me a desculpa de ter que comprar manteiga e queijo, e que teria obrigatoriamente que usá-la no dia seguinte. Desculpas, desculpas...
Peguei a mochila, abri a porta, o portão. Bicicleta no asfalto no calor da rua. Dobrei a esquina, apagou-se qualquer culpa. Dei de frente com o forte contraste do azul denso com o amarelo gritante cortado recortado com exatidão na torre da igreja e nos edifícios atrás dela. Que luz! Dobrei mais uma esquina jogando minha culpa, meu trabalho, minhas responsabilidades imediatas, jogando..., deixando para depois. Que importa? Nunca havia visto o Edifício Tomie Otake assim, banhado pelo amarelo forte, brilhante e apastelado daquele final de tarde. Parei no cruzamento e estiquei o pescoço para a grande construção. O Tomie Otake está envelhecendo com um buquê raro. O contraste de suas listras, ondas, formas, cores contrastantes, vermelho, preto, lilás, roxo, foram suavizadas pelo tempo, mais harmônicas com aquela luz estranhamente especial. O final de trade enche todo edifício e entra em dégradé próximo às árvores, calçada desenhada e asfalto. O trabalho de Rui Otake, seu arquiteto, mostra o peso que só as grandes obras têm: o tempo lhes muito é favorável. 
Não penso mais no supermercado. Seria um crime perder cada segundo da magia que está acontecendo. Vou em frente, sigo o pedal mágico. Praça Panamericana. Novamente paro, olho em volta, tento ver onde posso ver e viver melhor o que está acontecendo e logo se acaba. Ali próximo, ou Praça do Pôr do Sol ou Ponte Cidade Universitária, as melhores vistas. Não há tempo, a ponte está logo ali. E no meio dela já são 19:26 h. A ciclovia do rio Pinheiros fecha em 4 minutos. Um olhar profundo na beleza e quando abaixo a cabeça dou com um funcionário da ciclovia vindo para fechar o portão. Pergunto se ainda posso passar, faço comentário elogiando a beleza do fim de trade, ele sorri e me diz para entrar. Dou uma última olhada para o Pico do Jaraguá lá ao fundo imerso num alaranjado quase fluorescente. A semana nublada e de ventanias limpou o ar, provavelmente daí estas cores tão marcantes. Antes de descer a rampa giro o corpo e começo a rir de felicidade. Está laranja no Jaraguá e um suave cor de rosa a leste, o lado contrário. Rosa! Giro e volto a girar a cabeça e confirmo, laranja e rosa. Nunca vi igual. 
Peço desculpas ao funcionário pelo demora. Ele não se importa, também olha em volta feliz e sem tempo. Me diz para não me preocupar que sempre tem alguém na outra saída que vai abrir o portão. Cabeça erguida diz "Tá muito bonito", termina ele. 
Pedalo na ciclovia com rara felicidade com a vida, com a solidão momentânea, com a luz que me banha. A quem agradecer? A quem retribuir o que tenho, o que a vida me dá?
Cruzo a Ponte Euzébio Matoso e dou com a reta para a Cidade Jardim e Vila Olímpia com suas torres num amarelo alaranjado incandescente meio ao rosa do horizonte cada vez mais suave. Vou me aproximando delas e suas cores vão mudando, duas para prata azuladas, duas um amarelo ouro muito suave. 

Os funcionários me abrem sorridentes o portão e subo rapidamente a passarela do Parque do Povo. Paro, passa um trem, olho o trânsito das marginais e ponte, olho para o Parque do Povo. Ao fundo, lá na Faria Lima, um edifício teima em brilhar em prata. A luz da tarde vai baixando. A mágica vai se acabar. A quem agradecer?

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Riqueza, paz e pedalar

Sábado passado foi o encontro com meus colegas de escola, os de primário e ginásio. Fomos convidados por um deles para um almoço com prato principal leitão ao rolete. Confesso que quando estava entrando na fazenda onde aconteceu o encontro olhei em volta e pensei "Ué? não entendi que seria num hotel de luxo", tal a grandeza e beleza do lugar. E não era. A recepção que nos foi oferecida é difícil de descrever de tão tão. 
O encontro anual com os velhos ex colegas de escola fica cada vez mais agradável, não só porque os dois últimos tiveram recepções maravilhosamente indescritíveis, mas porque todos nós estamos deixando para trás nossas besteiras para dar lugar ao aproveitar os amigos que ali estão próximos, no pouco tempo que temos todos juntos, tirando amigavelmente uns dos outros preciosas sabedorias de vida. O agradecimento feito pela dona da casa na hora da foto coletiva foi o mais acertado possível: todos ali são abençoados. E somos, como somos.
A beira da piscina de horizonte perdido, quando uma das bordas faz a linha do horizonte, e olhando o entorno do casarão construído no topo de morro, começamos, eu e mais uns quatro, comentar sobre a beleza e a riqueza do lugar. Havia nas palavras maturidade, zero inveja, só muito desfrute. A sala onde estavam os aperitivos e o bar tem metragem seguramente maior que de toda minha casa, com seus aconchegantes 45 metros quadrados de telhado. Quando voltei para casa, abri a porta, liguei a luz repetiu-se a mesma deliciosa sensação de estar aconchegado e bem comigo mesmo. Por questão de trabalho necessitaria mais espaço, mas o que tenho é uma benção sem tamanho. Não tenho a mais remota dúvida que sou disparado o mais pobre de todos aqueles com quem partilhei aquela tarde maravilhosa, mesmo assim nem um pingo de insegurança. Entre eles tem de tudo, de funcionário público, assalariado, autônomo, pequeno empresário e uns ricos, poucos para valer que são iguais a nós mortais.
Uma vez por semana almoço com Tobias, um amigo que fez escolhas de vida inusuais para esta sociedade que vivemos, boa parte delas corretíssimas perante a situação social e ambiental que o planeta se encontra. Com a mão na água tíbia da piscina e olhando o pôr do sol por trás das montanhas lá longe fiquei lembrando das longas conversas que eu Tobias sempre temos. Demorou, mas passeio por mundos ditos opostos com facilidade, sei que somos todos humanos, nada mais, nada menos, simplesmente. Me sinto leve e feliz por ter conseguido chegar onde cheguei. Paz, segurança, insegurança, incertezas, paz.
Restam dores, ressentimentos? Ainda restam. O mais difícil de lidar vem de um erro de avaliação feito no passado sobre onde a bicicleta nos levaria. Esqueci de colocar na equação que somos brasileiros e que a bicicleta se transformaria no reflexo do que somos, brasileiros. Cada um vê o reflexo como quer ou consegue, mas um reflexo é literalmente o reflexo da realidade como realmente é, e eu não gosto do que vejo por aí. 
Humor sempre foi o caminho. "Ou você ri da vida, ou a vida ri de você" repetia minha mãe. Comecei a limpar esta sensação pesada quando ouvi de ex ciclistas profissionais que eles têm medo de pedalar nas ciclovias e preferem estar no meio dos carros. Ouvir isto deles foi um alívio; não sou o único. Creio que já escrevi isto, mas fazer o que? Velho fica repetindo seus resmungos. 

Bicicleta é de uma riqueza sem tamanho, hoje ninguém duvida. Mesmo que tivesse dinheiro aquele maravilhoso casarão não seria minha opção, meus sonhos são outros. Mas é do dono e ficamos felizes. Pedalar traz paz. Todos têm suas riquezas e nós, amadurecidos, as compartilhamos sem provocações ou hostilidades. Passou o tempo onde parecia fazer sentido colocar um sol pisca-pisca ofuscante no olho do outro para ser notado ou sentir-se falsamente seguro. Bobagens sem nexo. A vida ensina. 

domingo, 19 de novembro de 2017

Ser negro no Brasil e as distorções históricas


A revista Veja desta semana traz um especial sobre Negros no Brasil que deve ser leitura obrigatória para todos. Tem gente que de cara vai torcer o nariz por ser Veja, uma besteira, grande perda de ótima matéria. O conteúdo traz informações e pontos de vista que não me lembro terem sido publicados na grande imprensa. Dão uma visão clara, trágica, vergonhosa, do que é ser negro no Brasil, a reboque do que somos todos nós, brasileiros.

Eu me lembro bem quando tinha lá pelos 5 anos de idade e fui pela primeira vez ao Centro de São Paulo com minha mãe e Conceição. Fizeram tantas recomendações que muitos anos mais tarde, já próximo dos meus 18 anos, eu ainda chamava "aquilo" de "circo de horrores". As recomendações eram para nunca largar da mão de uma das duas, contaram histórias assustadores sobre criancinhas desaparecidas e maltratadas que nunca mais voltavam para casa... No Centro entrei num mundo de ruas lotadas de gente estranha à minha realidade, vestimentas, etnias e cores diferentes, falas estranhas, e para piorar o conto de terror sentamos no ônibus de frente para um senhor que literalmente não tinha nariz e as pontas dos dedos, provavelmente em consequência de lepra, ainda comum na época. "Não toque em nada!" 
Até meus 11 anos vivi numa casa na rua Sofia 20, Jardim Europa, um universo social rico, de ruas vazias, quase nenhuma criança e asséptico. Passavam poucos e variados carros, uma ou duas motos, e uma bicicleta a motor barulhenta que era meu sonho. Aquilo era era minha normalidade. Brincava só, desacompanhado, tendo contato só com meus primos nos fins de semana, isto quando os via. Meus irmãos eram mais velhos, pacientes, mas estavam noutra realidade. Na mudança para um apartamento fui levado para Buenos Aires, cidade rica, limpa, organizada, com forte influência europeia, de gente como os meus, carros de todos tipos, conforto e ótima comida. Caminhávamos muito, usávamos metro e micro (ônibus pequeno), meu avô me apresentava aos amigos com muito orgulho. Esta viagem só veio a reforçar naquela criança a ideia que o Centro de São Paulo era mesmo um circo de horrores. As imagens que tinha de lá não estavam dentro de minhas referências. 

E a mudança desta visão começou quando passei a olhar com calma a cidade, fui expulso de um colégio de elite, cai num colégio de expulsos (como?), praticamente parei de ver meus primos, e principalmente convivi com os meninos do edifício onde fui morar, todos judeus de famílias leves, carinhosas, centradas, de classe média, com outros valores práticos, onde o valor maior era a simplesmente a vida. Não tenho como agradece-los pelo que aprendi. O circo de horrores ficou para trás, se transformou em vida, nada mais que vida. Os meus preconceitos foram caindo um a um e seguem caindo. Alguns deles hoje entendo que não foram preconceitos, mas completa desinformação e desconhecimento, mediocridade digo sem medo.

Não existe história neutra, é sempre a versão de alguém ou de um grupo. De tanto ouvir contos distorcidos acabamos submergindo e vivendo neles. Todos nós somos frutos de distorções. O grau de distorção varia em relação ao ambiente onde se vive. Pavlov demonstrou cientificamente os efeitos dos condicionamentos na psicologia do comportamento. Aquilo que de tanto bater fica encrustado na cabeça, por exemplo.

Eu fui uma criança agitada que vivia aprontando. O que minha mãe e Conceição queriam mesmo era que eu não aprontasse. A intenção foi correta, a forma de me controlar típica para época, o que hoje em dia é tido como um absurdo. Perdi o contato com Conceição, mas minha mãe foi uma mulher sábia, inteligente, divertida, sem preconceitos, a não ser contra a mediocridade, o mal feito.

A leitura deste especial de Veja, Negros no Brasil, revê a nossa história. É interessante colocar a leitura no contexto íntimo de nossas próprias individualidades. 
Hoje a tarde vi mais dois programas Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil no History Channel. Imperdível! Desta vez foi sobre A coluna Prestes, Lampião, o cangaceiro, e a Guerra do Paraguai, lógico com versões distantes das oficiais contadas até hoje. Gostaria de rever o Revisitando a Segunda Guerra Mundial e tudo mais que me possa fazer reavaliar meu passado. Não culpo ninguém, somos todos humanos, os dias eram assim, mas para ter um futuro melhor precisamos evoluir, ter contato com o que mais se aproxima da verdade.


O Brasil segue sendo uma imensa farsa mesquinha. Todos nós aceitamos isto que está aí. Nos falta leitura, educação, capacidade de conversa e discussão séria e honesta. Nos falta vergonha e respeito às nossas próprias vidas.  





Saia na Noite 25 anos


segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Ciclovias no entorno da Estação Terminal Pinheiros? Como fazer barato?

Antes, minhas sugestões para o entorno da Estação Terminal Pinheiros:
Na rua Costa Carvalho colocar as vagas de estacionamentos a 45º alternando o lado da rua o que obrigaria os carros diminuir de velocidade porque a rua não seria mais uma reta, mas um zig-zag. Facilitar a criação de vagas vivas para os inúmeros restaurantes, cafés e outros existentes ali. O mesmo pode ser feito imediatamente na Eugênio de Medeiros. Testa a mudança aí e depois estende para o resto do bairro. Sinalização estabelecendo velocidade baixa, 30 ou 40 km/h, mais sinalização reforçando a prioridade legal para as mobilidades humanas: pedestres, pessoas com necessidades especiais e ciclistas. Segregação do ciclista? Não se quer uma cidade para todos?
O acesso à Estação Pinheiros para o Largo de Pinheiros: transformar a sequência de ruas Conselheiro Pereira Pinto, Atuau e Guaicuí em ruas preferencialmente para pedestres, o que já acontece, é fato consumado. Ciclistas já conhecem o caminho. As correções no entorno do Largo de Pinheiros são relativamente fáceis.

Como são estas ruas hoje?
O trânsito na rua Costa Carvalho é pouco talvez por isto é fácil ver motoristas andando mais rápido que o bom senso manda. A calma rua tem alguns restaurantes, um bom número de pedestres, alguns ciclistas. É uma das rotas para a Estação Terminal Pinheiros, onde há um bicicletário que sempre está ocioso, ao contrário do sempre lotado bicicletário da Estação Faria Lima Linha Amarela 4, uns 600 metros adiante. 
A rua Eugênio de Medeiros, paralela entre as ruas Costa Carvalho e Gilberto Sabino, rua da Estação Terminal Pinheiros, é muito calma, poucos carros, uns poucos ciclistas, só na hora do almoço é que há movimentação grande de pedestres a caminho de um dos 15 restaurantes nos dois quarteirões e duzentos metros entre as ruas Paes Leme e Sumidouro. Muitos escritórios no entorno. Fora do almoço fica às moscas. E às quintas-feiras tem a tradicional feira. Vida de interior. Do outro lado da Paes Leme a Eugênio de Medeiros vai dar na ponte Bernard Goldfarb e dali para o Butantã ou Cidade Universitária e movimento mesmo só na hora de pico. Conheço bem a vida do pedaço porque moro aí desde 1987. 
Qual o problema?
A cidade não está contando os centavos? Será que não tem outras prioridades? O dinheiro destinado às mobilidades não pode ir para outros fins, diz a lei. Não adianta, a coisa pública tem regras que só o diabo entende, se é que entende. Prioridade? O que é isto? Eu tocaria cada centavo de qualquer intervenção para ciclistas no ajuste de alguns problemas existentes no que já está feito para pedestres, pessoas com necessidades especiais e se sobrasse algo... Ou...
Será que dá para melhorar a situação do ciclista com menos gastos? Será que precisa pintar tudo de vermelho, que pelo divulgaram custa uma boa nota? Não daria só para pintar os cruzamentos de vermelho com já fazem outras cidades? Será que precisa colocar tachões em todo trajeto? As bicicletas pintadas no asfalto da rua Groenlândia não deram um resultado surpreendente? Por que não aplicar técnicas simples e baratas de acalmamento de trânsito já consagradas em vários países? Afinal de contas, a maioria dos ciclistas não pedala no meio da rua e seu trânsito até chegar nas ciclovias? Porque não acalmar todo o bairro e assim ajudar três mobilidades numa tacada só, pedestres, pessoas com deficiência de mobilidade e ciclistas (e skatistas, patinadores....)? Mais, porque não melhorar a vida dos restaurantes, bares, doceiras, padarias e outros geradores de empregos que estão em todos cantos do bairro.

Voltando a meus sonhos:
Pensando mais longe, se faz urgente a mudança da geometria viária do acesso da Marginal Pinheiros para a av. Antônio Batuira, aquela que vai direto até a Praça Panamericana. Como está hoje é um absurdo. É preciso forçar os carros diminuírem a velocidade antes de sair da marginal, o que se faz deixando a curva mais fechada. Fazendo isto se aumenta a segurança dos pedestres que vem pela calçada da marginal. Ainda na av. Antônio Batuira é necessário repetir no cruzamento da rua Guerra Junqueiro o acalmamento de trânsito simples e eficiente existente faz muito no cruzamento com a av. Semaneiros.
Na av. Prof. Manuel José Chaves, que liga a Praça Panamericana à Ponte Cidade Universitária instalar um segundo semáforo para pedestres e ciclistas no cruzamento da rua Banibas o que criaria um caminho alternativo, linha reta, mais curto entre o Parque Villa Lobos e quase a Estação Pinheiros, além de dar acesso a ciclovia de canteiro central. Passou do tempo de estimular ciclistas a usar caminhos alternativos, por dentro de bairros calmos, tanto para mante-los distante de avenidas como para cortar custos da implantação do sistema cicloviário, isto para dizer o mínimo. 
E mais longe ainda seria possível trazer os cilistas que cruzam a av. Diógenes Ribeiro de Lima para o interno de bairro, em especial na rua Alberto Farias. É muito mais calmo e agradável, além de ser plano.

Não falo aqui sobre o cruzamento do rio Pinheiros que também é comentado com um alargamento da calçada da Ponte Euzébio Matoso. Se querem mexer aí os questionamentos a serem levados em consideração são uns tantos muitos mais. 

Eu tenho um sonho: construir uma estrutura leve e independente sob a ponte Bernard Goldfarb para pedestres e ciclistas, com um mirante sobre o centro da ponte. É a vista mais linda que se pode ter do rio Pinheiros. 




quarta-feira, 8 de novembro de 2017

A percepção da sinalização como causa dos acidentes

-52% atropelamentos; -20% colisão lateral; -37% colisão traseira; -67% colisão frontal; -80% capotamento; -50% outros; -55% total. Esta é a redução dos acidentes na rodovia Régis Bittencourt, antes conhecida como "Rodovia da Morte". Ok, este texto é praticamente um ctrl C - ctrl V de um encarte publicado no O Estado de São Paulo dia 11 de Setembro de 2017 sobre o 4º Fórum de Segurança da Arteris, concessionária que cuida da Régis Bittencourt desde 2008, mas tem umas linhas que são bem interessantes. E seguindo o informe leia-se:
Um  estudo realizado com a USP, por exemplo, usou simulador para reproduzir uma parte crítica da rodovia e verificar a percepção do motorista em relação a diferentes sinalizações. "Mudamos a distância e a posição das placas, aumentamos e diminuímos seu tamanho, trocamos as cores e verificamos qual combinação resultava na reação mais rápida", descreve Angelo Lodi, diretor operacional corporativo da Arteris. "Implantamos a nova proposta de sinalização a partir desses resultados e tivemos declínio de acidentes. Agora estamos repetindo o estudo em mais pontos críticos". Ou seja, individualizaram os problemas e usaram a inteligência para encontrar soluções também individualizadas. Passaram a pensar na realidade e atuaram um pouco fora da regra (leia-se o uso burro e literal do CTB) para que efetivamente dessem resultados. 

"Precisamos pensar na segurança do ciclista". Como? Segundo quem falou a frase aplicando literalmente o CTB. Enquanto se pensar segurança no trânsito sob este ponto de vista continuaremos tendo o banho de sangue que temos aqui neste Brasil. O CTB é a lei, a regra, mas o próprio código dá chance para variações, inteligências, o que por diversas razões não é entendido e usado.

Pouco ou nada adianta colocar uma placa "PARE" direcionada para ciclistas numa ciclovia com tamanho, formato e altura estabelecidas pelo CTB, tida como própria para quem conduz veículo motorizado, como acontece em algumas das ciclovias paulistanas, em particular na av. Faria Lima. O ciclista passa batido e não vê; não vê porque não vê mesmo, não por má fé. Pior, em algumas destas situações o posicionamento da sinalização está em posição duvidosa: para quem será direcionada? 
Não adianta querer delirar com o CTB que reza que a bicicleta é um veículo e que seu condutor tem respeitar as leis. Primeiro, leis feitas por quem?; depois para quem? Alguma ordem, leis, tem que ter, é óbvio, mas que atenham-se a realidade, não ao delírio de um punhado de espertos, entenda-se ai o que quer que quiser da palavra espertos. 
A esta altura do banho de trânsito que corre pelo Brasil deveria ser obrigatório que os responsáveis pela segurança no trânsito fossem obrigados a ter formação prática em todas as modalidades de transporte, nas mais diversas situações de trânsito, centro, periferia, vias expressas... O que não se pode mais é aceitar que alguém com formação só em leitura, por mais leitura que tenha, dite o que é real ou não, o que é seguro ou não. É absolutamente inaceitável que alguém que simplesmente tenha medo de pedalar em situações reais, comuns aos usuários do dia a dia, dê consultoria técnica ou trabalhe em projetos de engenharia de trânsito. É lógico que dá merda, a prova irrefutável está ai em números apavorantes. 
A brincadeira - e só pode ser tomada como brincadeira - de multar pedestres e ciclistas a partir do ano que vem veio do DENTRAN é mais uma prova deste país da fantasia que eles vivem. Quem quer que tenha tido esta brilhante ideia, das multas, com certeza nunca caminhou numa estrada conurbada, tentou cruzar o rio Pinheiros da favela do Real Parque para Moema. Será que o pedestre infringe a lei porque é burro ou porque a próxima faixa de pedestre está a 500 metros, o caminho mais lógico e curto está ali na frente? Este pessoal nunca viu o que há de mais moderno e eficiente para sinalização voltada para ciclistas provavelmente porque não aceita que a leitura que o ciclista faz do trânsito é muito diferente da de um condutor de veículo motorizado. 
A bem da verdade tenho certeza que o olhar destes senhores é viciado, o que é absolutamente normal, humano, acontece com todos nós. O óbvio é um polvo grudado no nariz que somos incapazes de enxergar. A diferença é que não ver a realidade diária do povo custa vidas. E como custa! Os números trágicos não mentem.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

educação, formalidade, e o convívio social

Em 1975 me foi dada oportunidade de ir para os Estados Unidos em navio cargueiro, três meses de viagem, ida e volta, uma experiência única que mudou minha forma de ver a vida. No meio do oceano, a perder de vista da terra, sem absolutamente nada em volta e sem interferência da iluminação das cidades o céu de estrelas é pleno, infinito, e podemos ter um pouco de noção de nossa pequenez, insignificância. Tivesse eu tido filhos teria feito o possível e impossível para que tivessem a mesma experiência.
Minha falta de educação e ou timidez fizeram que eu não agradecesse a tio Francisco, quem me havia dado a viagem. Pior, anos depois descobri que uma atitude infantil minha no porto de Baton Rouge fechara as portas para todos que vieram depois querendo fazer a mesma viagem. Nada justifica que não tenha tido o mínimo de educação e formalidade para ir agradecer imediatamente tio Francisco. Por mais que naquele momento no íntimo o tenha agradecido muito, e sei quanto o fiz internamente, não o fiz pessoalmente; uma falta sem tamanho. Burrice!
Esta história me voltou a tona quando um jovem adulto muito bem educado teve uma atitude parecida com a que tive com Tio Francisco. Por pura falta de experiência na vida não devolveu uma chave da forma como havia sido combinado. Coisa boba, coisa de uma geração que acha que rede social resolve tudo. Ele agiu dentro dos parâmetros bit/digitais, normal para sua geração, mas a chave não chegou nas mãos devidas e fechou portas.

Bom dia; boa tarde; boa noite; por favor; com sua licença; como vai?; posso ajudar?; e outras pequenas ações que valem ouro. Tão simples. Formalidades ou pequenas gentilezas que aplicadas ao dia a dia transformam para melhor tudo. 
Atualmente tenho que controlar meu vulcão, felizmente quase extinto (uma das poucas vantagens da velhice), para não lançar larvas ferventes sobre esta geração rede social que não tira a cara do celular. Me sinto como na viagem de navio para os Estados Unidos só que ao contrário, completamente certado de vidas iguais a mim em volta, mas completamente solitário. Quando a civilização vai aportar novamente no porto da vida? Pelo quanto estão no mar digital buscando direção num GPS aparentemente funcionando bem. Será? Eu prefiro ficar olhando as estrelas. 
Bom dia; boa tarde; boa noite; por favor... olhos nos olhos. Funcionou, funciona e continuará funcionando. Somos humanos, temos história, construímos uma civilização olhos nos olhos, conversa franca, longa e ao vivo. Tem seus erros, mas está ai cheia de boas coisas. Educação, formalidade, convívio sempre foi o caminho.
Andy Warhol não sabia, mas os minutos de fama para todo mundo se transformaram em bits cada vez mais rápidos e insignificantes. Agora fama e superpoderes está a disposição de qualquer um, basta estar na rede. Mas..., adianta dizer bom dia para um fone de ouvido?
Ande, pedale, viva olhando a vida. A vida é um mar de estrelas infinitas, linda, riquíssima. Viva!

Multa para pedestres e ciclistas

O Estado de São Paulo
Fórum do Leitor:

Multar pedestres e ciclistas? Da forma como se encontram as cidades brasileiras, onde a fluidez do trânsito motorizado continua sendo prioridade absoluta, a notícia de que vão multar as duas principais mobilidades ativas é mais uma prova que os responsáveis pelo trânsito usam a lei, o CTB, de forma a proteger suas próprias limitações. Pedestre não comete imprudências e ilegalidades por que quer, mas porque é induzido a elas. Ciclistas, os mais novos algozes de pedestres, comportam-se como comportam-se porque não foram educados e treinados, o que aliás é responsabilidade estabelecida pelo CTB e não cumprida pelas autoridades. O pouco que se faz pela educação para o trânsito é um faz de conta que pouco ou nada tem a ver com a realidade. O gravíssimo problema do trânsito no Brasil tem muito a ver com a falta de legitimidade social da engenharia de trânsito aplicada, obsoleta, medíocre, em alguns momentos irresponsável. Mas sobre isto pouco ou nada se fala. Prova irrefutável disto é o trânsito pacífico e respeitoso às leis nos raríssimos pontos deste país onde a engenharia de trânsito aplicada é inteligente e honesta com todos transeuntes.


terça-feira, 24 de outubro de 2017

Transitado e julgado ou linchado?

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

O primeiro grupo organizado e oficial de ciclistas mulheres de São Paulo e provavelmente do Brasil está comemorando 25 anos de sua fundação. Maria Teresa D’Aprile, uma das fundadoras e principal expressão do grupo, desde 1992 vem sendo entrevistada por todos meios de comunicação deste país, mesmo assim a Justiça do Estado de São Paulo deu como Transitado e Julgado um processo que começou a mais de três décadas tendo como uma das alegações que Teresa não foi encontrada mesmo procurada por 10 anos. Uma busca rápida na Internet e Teresa teria tido direito a uma defesa justa, já que sequer seu nome deveria estar incluso no processo, como agora aponta um Juiz Federal, dentre outras sutilezas surrealistas típicas da justiça brasileira. Procuramos saber quantos cidadãos estão Transitados e Julgados em situação semelhante à de Maria Teresa D’Aprile e simplesmente só conseguimos respostas “muitos”. Imaginem o que acontece com os menos instruídos e com menor renda. Da forma lenta, ineficaz, obsoleta e confusa como funciona a Justiça, Transitado e Julgado pode não passar de um linchamento oficial.

domingo, 22 de outubro de 2017

A alma que se transforma em lama

Domingo passado estava pedalando na av Brasil e dei de cara com um senhor nisei pedalando uma Caloi Aluminun hibrida 1991 cor vinho. Fora algumas poucas peças trocadas por desgaste a bicicleta está linda, praticamente original. Senti saudades da minha; igualzinha. Conversa vai, conversa vem, ele contou que comprou nova e na época pedalou pouco porque sentia medo de pedalar na rua. "Pedalar naquela época era uma delícia, bem mais seguro que é hoje", repliquei. E era, quem pedalou naquela época sabe bem, era o paraiso. E aí me bateu o badalar dos sinos e a lembrança da ladainha daquela época repetida aos quatro ventos por muitos ciclistas: "Sem ciclovia não tem (temos, os então ciclistas) segurança". Briguei o que pude e o que não pude contra esta besteira. Pensando bem sacanearam com uma geração  de possíveis ciclistas e retardaram muito o desenvolvimento sustentável da cidade. 
Fui guia de passeios de bicicleta pela cidade, sempre evitando levar o pessoal pelos mesmos caminhos preferenciais dos automóveis. A maioria só pedalava em avenidas, vias expressas, ruas movimentadas, exatamente os mesmos caminhos do trânsito, dos automóveis. Guiei muita gente com medo e pouca habilidade no pedal que voltava para casa com outra ideia sobre segurança e fascinados pela riqueza e beleza da cidade.
São Paulo era tranquila, muito tranquila. Pedalar era seguro. O número de carros circulando era muito menor que temos hoje, os motoristas pouco estressados, não havia esta praga de celular, assaltos, e outras coisas mais perigosas do nosso dia a dia. Bastava fazer caminhos alternativos por dentro de bairros, pulando de um para o outro como se fossem ilhas de tranquilidade cercadas por avenidas. Mas o discurso político revolucionário da época era o implacável "Sem ciclovia não tem segurança". E pedalando com o dono da híbrida 1991 me dei conta que foi uma tremenda sacanagem com os ciclistas e com a causa da bicicleta. Quantos perderam a oportunidade de vivenciar no pedal uma São Paulo mágica, única, cheia nuances surpreendentes? Conhecer aquela São Paulo tão heterogênea foi mágico, incrivelmente mágico; sinto profundamente por quem perdeu. 
Tenho a cabeça leve. Fui radicalmente contra esta besteira, diria burrice, de só ciclovia salva. Não adiantava falar em planejamento do espaço urbano levando em consideração toda e qualquer técnica que ajude a melhorar a segurança de ciclistas, pedestres e pessoas com deficiência. Não havia interesse. Por que? Porque uns eram muito radicais, muitos papagaios de pirata, vários achavam que sabiam pedalar, técnicos não sabiam projetar, pensar a cidade, pensar o trânsito, as mobilidades, aliás não sabiam sequer o que era um sistema cicloviário, como disco quebrado só balbuciavam “ciclovia”. 
O jornalismo brasileiro é muito responsável pela propagação da besteira porque é pouco investigativo e comprou as segas o "sem ciclovia não tem segurança". Aquilo deu nisto. "Nisto o que?" "Não deu certo? Não tem um monte de gente pedalando?" devem se perguntar. Deu? Deu mesmo? Será? Quantos pedalam? Onde pedalam? Como pedalam? Onde estão os números? Sem ciclovia não tem segurança? É mesmo? Então por onde pedalam os ciclistas até acessar as ciclovias? Então?
Não entendeu? Cidade ou ciclovia? 

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Pedalar correto

Sai aqui em São José dos Campos para pedalar com um amigo, Zé. Ele estava a três meses parado e uns quilos mais pesado. "Vamos até a represa, que vai dar uns 40 km". Já estou escolado e imaginei como seria: saímos às 7:30 h e voltamos às 14:30 h, total 55 km. Bem antes do meio do caminho fiz delicadamente a pergunta óbvia: "Não seria bom voltar daqui", e recebi a resposta típica "Fica tranquilo, estou bem". Óbvio, mais uns quilômetros e ouvi um resmungar baixinho "Tô sentindo câimbra". Isto debaixo de um sol de mais de 35º C. 
Para praticamente tudo há uma técnica esportiva, inclusive para quando já deu pau. Paramos, ele desceu da bicicleta, pedi que ele desse muros suaves na musculatura dolorida, dei algo para ele comer, um pouco doce e um pouco salgado, tomou água, fez um leve alongamento e em seguida nos pusemos a caminhar. A situação melhorou, mas pela expressão dele eu sabia que era bem precária. De volta ao pedal.
Antes de outras dicas que ajudam nesta situação deixo a recomendação para que se respeite seu próprio limite. Se quiser ir até o limite é necessário conhecimento, prática e uso de várias técnicas esportivas que se aprendem principalmente lendo. Mas... quer saber, nunca chegue ao seu limite, principalmente se você não for um esportista profissional. Começou a sentir que vai complicar pára, descansa e se for o caso não tenha vergonha de fazer o caminho mais fácil e curto de volta. No caso ele foi sábio e intercalou pedalar e caminhar, principalmente nas subidas mais fortes.
Recomendo a leitura dos textos de Jeff Galloway, que criou uma técnica para corredores, a Run Walk Run. Os princípios servem bem para ciclistas amadores. Zé é experiente, pedala bem, é forte, resistente, só está enferrujado e neste caso algumas dicas de Jeff Galloway que conheço ajudaram muito.  
Outras dicas:
Ciclismo é a arte de preservar energia. Pedalando em qualquer situação a técnica mais preciosa é preservar energia. Quanto menos energia você gasta mais longe você vai. E dependendo de sua técnica, mais rápido também. Use e abuse do câmbio. Marcha, marcha, marcha, marcha... Marcha! A cada variação de cadência troque de marcha para manter o giro correto, entre 60 (mínimo) e 90 giros por minutos para amadores.  Use as marchas para manter sua musculatura trabalhando o mais suave possível. Na subida faça a troca de marchas de forma que sua musculatura vá aumentando aos poucos o esforço. Isto faz com que coração e pulmões também aumentem seus trabalhos suavemente. Use o peso da perna para girar os pedais, nas subidas isto significa girar um pouco mais rápido os pedais, nas descidas um pouco mais lento. 
Importante: mesmo que esteja muito cansado e sentindo a musculatura continue a pedalar depois da subida, mesmo que girando em falso, o que faz respirar a musculatura e limpar as toxinas. 
Controle sua ansiedade. Ansiedade cansa mais do que se possa imaginar. Limpe os pensamentos negativos da cabeça, tipo "onde esta subida termina, quanto falta ainda..." Olhe a natureza, converse, cante...
Quanto mais liso e menos inclinado for o trajeto menos esforço. Poucos se preocupam com os detalhes da chão por onde estão passando, seja terra ou mesmo asfalto. A maioria faz uma linha reta, não importando se está passando por pequenas imperfeições, buraquinhos, pedrinhas, areia... O melhor é ficar atento ao trajeto e sempre buscar o piso que faça o rodar mais fácil. Não precisa exagerar e ficar fazendo zig-zag, basta prestar atenção no que está na frente da bicicleta. Procure a melhor linha reta. Na terra pedalar por fora de uma curva costuma ser mais liso, um pouco mais longo, mas menos inclinado. Quando tem costela de vaca um dos bordes pode ser o melhor caminho.
Ciclistas inexperientes na estrada:
Indo de São José dos Campos para Aparecida do Norte peguei dois ciclistas sofrendo muito. O primeiro com uma bicicleta de supermercado barata, pesada, pneus de baixa pressão, e, pior, com suspensão traseira, completamente errada. Prefiro não falar do selim duro e com ponta para cima (ai meu saco!) porque vai que o sujeito estava pagando penitência. Ah!, sim!, a bicicleta era muito pequena para o ciclista. Enfim, uma cascata de erros, um pior que o outro. Que dica eu dou para este caso? Abandona a bicicleta no acostamento, pede carona, volta para casa e vai dormir. Ou carrega uma cruz de penitência até Aparecida que é mais fácil. 
O segundo ciclista estava com uma 29 correta para o tamanho dele, mas ele só tinha 3 meses de pedal, ou seja, não sabia pedalar. Cheguei muito rápido nele, recomendei que usasse mais as marchas, ele resmungou algo como "mas estou usando as marchas". E respondi "Não, não está. Tenho uns 30 anos a mais e estou com pelo menos uns 15 quilos mais pesado (alforges), e mesmo assim estou indo mais rápido. Usa as marchas que vai ser mais fácil". Ele me acompanhou por uns 20 km, emparelhou e confessou que iria parar porque estava morto. Qual a dica aqui: vai no teu ritmo, não se importe com os outros. 
Pedalar não é pagar penitência. Pedalar é arte de preservar energia. Preserva-se energia quando se sabe usa-la bem. Dai o respeito que se deve ter às técnicas, a ciência.

"Você foi pela estrada? É muito perigoso!..." ?

Sentamos para jantar e passamos por todos assuntos familiares e costumeiros, mas nenhuma pergunta sobre minha viagem em bicicleta para Aparecida. A cara do meu pai quando quis contar bastou para que eu voltasse a ficar calado. Ele, como a maioria, acha uma loucura pedalar em estrada. Será? Não, não é. 
Seguro, o que é seguro? Depende de uma série de fatores, mas há os preponderantes. A maioria dos acidentes envolvendo ciclistas acontece em cruzamentos; em estrada nas saídas ou acessos da estrada ou quando o ciclista cruza a pista. É raro ciclista ser atropelado por trás pedalando do meio para o borde do acostamento. Se o acostamento for largo, sinalizado, limpo e sem buraco, por diversas razões diminui mais ainda a possibilidade de acidente. Com o ciclista visível para os motoristas, vestido de laranja ou, melhor, pink fluorecente, o risco é baixíssimo. Óbvio que tem o imponderável e Jesus me chama faz parte da vida. Comparado com pedalar na cidade pedalar na estrada é muito mais seguro.
Nunca no trajeto vermelho
NUNCA pedale como se estivesse dirigindo um carro, principalmente numa estrada ou via expressa. Pedalar seguindo em linha reta nas saídas e acessos, principalmente nos que permitem sair ou acessar em alta velocidade, é fator de alto risco para o ciclista. O correto é acompanhar o acostamento até onde o cruzamento da saída ou acesso puder ser realizado na menor distância, de preferência a 90º, porque é a posição onde ciclista e bicicleta ficam mais visíveis, onde o cruzamento se faz mais rapidamente, e o ciclista tem uma visão mais clara do trânsito. Pense no motorista dirigindo a 80 km/h e é fácil entender que um visto por trás ciclista fica praticamente invisível numa estrada ou via expressa, mais ainda em saídas e acessos rápidos. Não se engane colocando luzinhas e pisca-piscas porque a visibilidade destes durante o dia é praticamente nula. Não acredita? Leia as especificações técnicas do fabricante da lanterna ou pisca-pisca. Inseguro mesmo é acreditar que está seguro baseado em informações falsas, besteiras ou crenças. 
É lógico que existem pontos onde pedalar na estrada não é fácil, até perigoso. Áreas conurbadas, onde a estrada está dentro da cidade, normalmente é desagradável, para dizer o mínimo. Ai vale bom senso, paciência e cautela redobrada; e se possível procurar caminhos alternativos. 
Mesmo aqui no Brasil não fugimos da regra mundial que diz que mais da metade dos acidentes são causados e responsabilidade direta do condutor do veículo, o que inclui bicicleta. Ficar culpando os outros pelos seus problemas não resolve nada, aliás, só gera novas situações perigosas.

Nesta romaria para Aparecida até onde soube morreram dois, um atropelado na Dutra e uma senhora que tomou um tronco de árvore na cabeça. Há locais onde não gostei nada de pedalar, todos em trechos de estradas passando por dentro de uma cidade. Antonio Olinto, respeitadíssimo cicloturista que já deu algumas voltas ao mundo pedalando, afirma que o problema é cidade grande, o resto é muito seguro. Palavra de papa.

sábado, 14 de outubro de 2017

Sobre matéria no Estadão expresso "Ser pedestre..."

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

'Ser pedestre é estar aberto às experiências e ao mundo'

Boa matéria se for vista como a primeira de muitas sobre pedestres e reconstrução das cidades. Mas no box "Caminho das pedras" onde Vitor Andrade "aponta fatores importantes para melhorar as condições de mobilidade a pé nas cidades brasileiras" não está citado a melhoria da técnica utilizada no desenho das vias e implantação de sinalização, onde estamos ainda na idade medieval. Faixa de pedestre posicionada de forma a não atrapalhar o trânsito de veículos motorizados e que obriga o pedestre a caminhar muito para poder cruzar uma rua é o erro mais frequente. Não interessa à engenharia de trânsito o caminho natural do pedestre, que normalmente é uma linha o mais reta possível. Semáforos para pedestres que demoram uma eternidade. Ou inexistência de semáforo, ou pior de faixa de pedestre em áreas de intenso fluxo de pedestres, como nos acessos a parques, vide o tratamento dado ao pedestre no Parque Ibirapuera X av. Pedro Alvares Cabral ou República do Líbano; dentre tantos outros exemplos. Para a engenharia de tráfego o pedestre que se vire, pelo menos esta é a sensação. Agora, especialistas (e ativistas) não conhecerem o trabalho de Michael King junto com ITDP, dentre tantos outros, no que trata sobre os caminhos do pedestre... sem comentários. Enfim, um dos fatores cruciais para melhoria da vida do pedestre no Brasil está o respeito ao desejo de trajeto deste mesmo pedestre. Para terminar: a bronca acima vale para todos jornalistas brasileiros, que também são pedestres. Ninguém fala ou escreve uma linha sobre os problemas técnicos, ninguém. Impressionante!