segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Olhe-se no espelho. O que eu gostaria de ter sido e vivido - revisão

Quanto mais velhos ficamos, mais olhamos para trás.

Uma das qualidades que adquiri com a maturidade é rever, revisar e repensar o que fiz - passado - para avaliar o que ainda posso melhorar e desta melhora o que posso oferecer para as pessoas, principalmente para os mais próximos, os que acho que valem a pena. 
Estou cansado de apostar em cavalo manco, o que deveria ter feito muito antes. 

Sempre fui muito crítico em relação aos mim próprio. 
Um dia fiz alguma besteira, sei lá qual, e minha mãe me puxou pelo braço para dentro do banheiro, me colocou frente ao espelho, e disse com voz baixa, calma e firme "Olhe-se no espelho" (para descobrir quem você realmente é)". Sempre me olhei no espelho procurando ver-me, mas foi muito tempo depois que eu realmente me vi, me enxerguei, frente ao espelho. Ali começava mais uma revisão de vida, quem eu era, quem eu gostaria de ser, e o que eu gostaria de ter vivido, provavelmente. 

A ideia deste texto surgiu quando tive que resolver umas questões de família. É voz comum o "evitar que eles repitam nossos erros", e estou nesta, gostaria que não repetissem erros básicos. Tenho consciência que tentar passar para eles é uma tentativa, e nada mais, mas quero tentar.
Não sei como, mas eu gostaria de encontrar o caminho para educar meus netos a não ter que olhar para trás e pensar "O que eu gostaria de ter vivido" com alguma dor. Tudo, ninguém consegue, mas organizar o que vale mais, isto é possível. É aí que eu gostaria de entrar. Educar, informar, falar ao vento, qualquer coisa que possa ajudar.

Agora, neste domingo quente e ensolarado, enquanto tomava café da manhã reli, como normalmente faço, alguns textos que publiquei para repensá-los e corrigir pequenos erros que sempre passam desapercebidos. Esta publicação em particular, o "O que gostaria de ter vivido", achei longo, cansativo, um porre. Ruim.

Ter sido simples, claro e direto, com uma comunicação fácil de entender, que não deixasse dúvidas, o que definitivamente não é do meu feitio, teria sido o melhor de minha vida, com certeza facilitaria e muito alcançar todas vivências que quisesse. Sigo fazendo um grande esforço para me comunicar melhor. O escrever me ajuda uma barbaridade, recomendo a todos.

Vou deixar o texto original publicado e publicar esta revisão aqui, mas fica para mais tarde. Neste exato momento, saio desta revisão e vou aproveitar o domingo maravilhoso. Aproveitei bem os fins de semana, mas poderia ter aproveitado mais ainda. Upa! lembrei de uma oportunidade que deixei passar e que me arrependo. Lá pelos anos 90 teve um final de ano que o trânsito ficou praticamente parado de Santos até aqui, São Paulo. Vi tudo parado, pensei em descer para Santos pedalando, mas voltei para casa e fui. Se arrependimento matasse...

Que mais? O que gostaria de ter vivido?
Nenhuma sombra de dúvida que gostaria de ter estado pessoalmente na queda do Muro de Berlim e no atentado terrorista de 11 de setembro em NY. O Festival de Woodstock, que cito no texto original, pensando bem, dispenso.
  • Ter corrido a pé desde sempre.
  • Ter jogado futebol com conhecimento das técnicas para diminuir significativamente minhas lesões, que foram muitas, muito mais que se possa lembrar. 
  • Ter ido buscar informação com donos de bicicletarias e seus mecânicos para fazer menos besteiras. Leitura é uma ferramenta preciosa, mas precisa ser complementada.
  • Ter acompanhado meus amigos surfistas nos primórdios, quando praias e natureza ainda eram praticamente virgens. 
  • Ter feito skate com este mesmo pessoal do surf, que foi quem começou o skate no Brasil. Tenho uma ponte de inveja dos skatistas.

Lembrei de uma interessante: eu deveria ter trabalhado como office-boy para aprender o que é a vida de fato. Ter sido filhinho de classe média alta me incomoda profundamente.
Pensando nisto, queria ter tido a infância num bairro popular, com um monte de crianças para brincar e brigar no meio da rua. Nasci e cresci até meus 11 anos no meio do Jardim Europa, um porre total. Zero crianças por perto, zero rua, zero zero. 

Tenho que sentar com outros e perguntar o que eles gostariam de ter vivido. 

Bom, fim.

terça-feira, 21 de novembro de 2023

O que gostaria de ter vivido - texto publicado, o original

Quanto mais velhos ficamos, mais olhamos para trás.

Vou manter o texto original publicado muito mais para minha referência; porque achei longo, cansativo e chato, a bem da verdade rui. Se quiser encarar, divirta-se.


São três eventos da história que me lembro de bate pronto e gostaria de ter vivenciado: a queda do Muro de Berlim, o atentado terrorista de 11 de setembro em NY, e o Festival de Woodstock.

Woodstock em particular, sempre sonhei ter vivenciado, pelo menos no meu imaginário, porque se estivesse pessoalmente sei que não iria ficar ali por muito tempo, se é que ficaria. Desde de novo não sou chegado a bagunça e barulheira. 
Ouvir música demanda um ambiente favorável, é muito diferente de show ao vivo, de sentar no barro e ouvir um som distorcido pela distância e ventos no meio de gente falando, gritando, se agitando, passando... . Show ao vivo é uma experiência multi sensorial, e eu não dou conta.
Se é para sonhar em ter estado em Woodstock, eu teria sido um dos poucos que teria ido pedalando, isto sim seria divertido. Se estivesse de carro no meio daquele congestionamento brutal com certeza teria dado meia volta ou largado o carro. Moto? Talvez. Odeio filas e congestionamentos.

A queda do Muro de Berlim, em 09 de novembro de 1989, foi transmitida ao vivo e assisti dando pulos na frente da TV. Chorei, disse para minha mãe, que também assistia, que daria a vida para estar lá no meio da festa. Não menos emocionado fiquei quando não faz muito estive em Berlim e vi um pequeno pedaço do muro que agora serve como marco histórico. Para mim é monumento sagrado, mas para o brasileiro que o pichou não, é simplesmente um bloco de concreto que serve para rabiscar seu nome. De qualquer forma, o pedaço do muro na minha frente só aumentou a vontade de ter vivido sua queda, e de novo com lágrimas e voz embargada.

Ainda em Berlim, não muito distante do pedaço de muro, está uma imensa praça / monumento / escultura, o Memorial aos Judeus Mortos da Europa, um espaço de uma força indescritível, duro, muito duro emocionalmente. Me remeteu a tudo que ouvi, vi e li sobre a Segunda Guerra Mundial, outro momento histórico marcante que gostaria de ter vivido, ou não. Tenho algum conhecimento sobre a realidade brutal e não sei se aguentaria vivenciar aquela loucura. Passar por um muro contínuo de quase dois metros de cadáveres empilhados a beira da estrada deve ser uma experiência brutal para todos sentidos, principalmente para o olfato. A imagem gravada na minha cabeça vem de uma foto de três crianças caminhando na estradinha e olhando para os cadáveres sem grande espanto. Nos documentários "A WWII a cores" e "Revisitando a WWII" é possível 'vivenciar' por imagens brutais que agora estão sendo liberadas. Para mim talvez já baste. Melhor, já basta.


Se eu estivesse naquele fatídico 11 de setembro em NY sei que teria corrido no sentido contrário dos que fugiam das torres em fogo e desmoronando. Iria tentar ajudar o pessoal desesperado, está no meu sangue. 
Fui tomar um café enquanto minha mãe estava na cadeira da dentista. Entrei na Tabacaria Ranieri e umas poucas pessoas estavam lá vendo pasmadas na TV o incêndio na primeira torre atingida. No exato momento que perguntei o que estava acontecendo, com os olhos grudados na tela, o segundo avião bateu na segunda torre. Houve um silêncio profundo. Demorei para entender que aquilo não era trailer de filme de ação, que estava acontecendo de fato, até porque não houve tempo para alguém responder a pergunta que fiz quando entrei na tabacaria. Voltei para o consultório, peguei minha mãe, contei o que estava acontecendo para o espanto de todos, fomos para casa e enquanto víamos o resto do absurdo eu fiquei no telefone tentando saber se tinha alguém conhecido nas torres. 
Só muito tempo depois soube que a menina bonita, tímida, formal, muito educada, Anne Marie, que vi crescer, e que morava com a mãe e a irmã no 5° andar, foi uma das vítimas. Estar pessoalmente no memorial dos torres gêmeas foi uma emoção muito difícil de ser controlada. Ler o nome de Anne Marie gravado no parapeito foi... Não sei descrever. 

Sei que teria corrido no sentido das torres gêmeas porque quando desmoronou a construção da Estação Pinheiros, vesti uma bermuda e sai correndo para tentar ajudar o pessoal. Dobrei a esquina, muitos fugiam da cratera que ainda desmoronava, e fui para lá, no sentido contrário de todos, e para a borda do precipício que se abria, para ver no que poderia ajudar, e ajudei. Fui gravado uns momentos depois pela TV Record. Não tenho dúvidas que no 11/09 teria feito o mesmo e hoje provavelmente estaria morto, ou pelo desmoronamento ou pelo câncer que ele causou em muitos.

Infelizmente descobri a corrida a pé muito tarde, mesmo assim me diverti montão. Me lembro que quando jogava futebol e pedalava ter visto notícias e reportagens bacanas sobre corridas a pé, e ter tido uma coceirinha, mas nunca me mexi para ir atrás. Se arrependimento matasse... A bem da verdade, nunca corri, nem gostava, mesmo não sabendo o que era, tipo pirraça de criança. Não me lembro mais porque desandei a correr, acho que foi um no final dos anos 90, quando já tinha uns 35 anos. Talvez tenha sido um dos grandes erros de minha vida não ter começado antes. Encontrei faz pouco minha baba e ela vive dizendo que eu não parava de correr. Nunca deveria ter parado. Hoje não posso mais correr por conta de desgaste nas juntas e quando passo por um ou uma corredora sinto uma puta inveja. 
Cheguei a fazer umas 4 ou 5 São Silvestres e duas meias maratonas, mas meu sonho mesmo seria ter feito pelo menos uma maratona, o que não deu ou não teria conseguido, sei lá. O futebol detonou meus joelhos.
Correr na terra era mais que um prazer, era o santo remédio para qualquer saco cheio que estivesse a ponto de explodir. O Parque Volpi foi meu santuário até as últimas corridas. A mata da USP, mais curta, fui quando podia e ainda não estava cercada. Dar a volta externa do Ibirapuera fazia bem, mas correr em mata fechada é uma outra história. 
Minha corrida mais marcante foi em Jundiaí, numa mata virgem, primária, que só tinha uma picada. Fui uns poucos km mata adentro, uma corrida completamente diferente, com cada passada procurando onde aterrissar, com a perna solta para não torcer o pé ou joelho, uma técnica completamente diferente dos terrenos limpos, planos e lisos. O cheiro, o silêncio, a umidade, o pisar... nossa! Quando decidi dar meia volta e voltar, parei por um bom tempo no silêncio sombreado daquele verde maravilhoso e lá entendi pela primeira vez o que de fato é o corpo animal, humano, quem pode ser Deus, o Deus da natureza, de tudo, o que deve ser a vida de um índio, o que foi a vida dos desbravadores... No momento nem me lembrei que tive uma sensação paralela no meio do Oceano Atlântico olhando o infinito  do mar e das estrelas. Lá descobri que não somos absolutamente nada, nem insignificantes somos. 
Aquela corrida na mata simplesmente mudou minha vida, mas nunca se repetiu, só na lembrança sorridente quando corria no Parque Volpi. Cada vez que vejo um dos riquíssimos biomas brasileiros torrando choro. Gostaria de vivido tudo aquilo ainda virgem, ter trabalho em algum projeto de trabalho voluntário na minha época da faculdade.

Fazer trilha pedalando é outra coisa, a atenção tem que estar na trilha, tudo passa rápido, na velocidade da máquina bicicleta, é uma outra dinâmica, que se não respeitada acaba em chão ou com a bicicleta torta. A pé você você vira índio, vira parte integrante da natureza. Uau!

Gostaria de ter corrido acompanhado por um cachorro, mas também passou. Pena. Só cachorreiro entende o tamanho da magia.

Não faz muito quase comprei uma viagem em veleiro para a Antártica e, pensando bem, olhando para minha condição física, acabei desistindo. A possibilidade de ficar mal no meio da viagem e azedar a viagem dos outros me fez desistir. Já estive em mar revolto, daqueles que o veleiro entra de proa no meio da onda. Adorei. Vivi e gostaria de viver a loucura de novo, mas não sei se meu corpo aguenta.  
Meu sonho com mar ainda está vivo. Gostaria de repetir a viagem em navio cargueiro, para qualquer lado, mar adentro, dias e dias de solidão. Fui para Europa em navio de cruzeiro, por sorte com menos da metade da lotação, mas não é a mesma coisa. Num cargueiro onde o mar é praticamente o único companheiro. Muda a cabeça, muda tudo. 
Pegar um veleiro e fazer uma viagem longa em mar aberto... Pode ser. Sempre quis fazer uma, mas não corri atrás.

Fui de Caloi 10 na minha primeira romaria, para Bom Jesus do Pirapora. Cheguei lá no final da tarde, dormi no concreto de uma pracinha no meio dos romeiros, estes de fato romeiros, acordei no dia seguinte batendo o queixo de frio. E voltei para casa. Deveria ter seguido em frente, sei lá para onde, me perder no mundo.
Fui um dos que começou o mountain bike no Brasil, mas com certeza fui daquela adorável geração o que menos fez mountain bike. Não tinha dinheiro para ficar passeando. 

Das boas recordações, lembro de uma São Paulo que explodiu em festa quando ganhamos a Copa de 70. Só quem esteve na rua Augusta é que sabe o que foi aquilo, o tamanho da loucura. Ainda posso ver todos os semáforos mudando freneticamente vermelho, amarelo, verde, amarelo, vermelho, amarelo, verde, amarelo..., do Corcel duas portas onde um casal tirou a roupa e estava transando sem qualquer constrangimento e sem ser incomodado mesmo com janelas abertas. Do povo cantando, dançando, pulando, se abraçando sem parar, bandeiras por todos lados, verde e amarelas, do Brasil, de tudo quanto era jeito, de todos clubes, estados, cidades, até o dia seguinte, numa festa que só acabou dois dias depois.    

Fiquei feliz em ter ficado com o velho Arturo, meu avô, sentado no morgue ao lado de mesa onde estava seu corpo. Não sei quanto tempo fiquei com ele até aparecer o pessoal que faria os trabalhos finais. Estranho, mas quando cheguei lá estava com o rosto tenso, quando o deixei estava com o rosto leve e quase sorridente, como que agradecendo eu ter ficado ali em seus momentos finais. 

O que não gostei e voltaria atrás tem de monte. 

A vida nos leva por seus caminhos. Não sei como, mas eu gostaria de encontrar o caminho para educar meus netos a não ter que olhar para trás e pensar "O que eu gostaria de ter vivido". Tudo, ninguém consegue, mas organizar o que vale mais isto é possível. 

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Bicicultura Florianópolis - balanço

Faz de conta que alguém está me perguntando "O que achou do Bicicultura?" Minha resposta é "Tenho que tirar o chapéu para quem organizou, quem pôs em pé tudo aquilo. Foi uma trabalheira sem tamanho. Parabéns, mas parabéns mesmo!" Se o alguém me perguntasse a seguir "E o que mais...?", responderia "Bom, quer ouvir, então lá vai..."

Ato final do Bicicultura: um passeio de bicicleta de 20 km pela cidade reunindo participantes do congresso, terminando numa confraternização num bar cervejaria. Passeio levado por um grupo de mulheres que pedalou no ritmo delas um tanto sem olhar para trás, sem se preocupar com participantes que não fazem parte da turma, alguns com pouca prática de pedal e outros turistas na cidade de Florianópolis. Pelo caminho, quatro rotatórias bloqueadas pelos guias para que os ciclistas ficassem girando duas ou mais voltas em cada uma destas rotatórias gritando palavras de ordem, e que se danem os motoristas. No meio do passeio, numa ciclo-faixa que pulava do asfalto para a calçada a queda, feia, de uma ciclista, Vera. O resto da história quem quiser que vá se informar.
Terminado o passeio foram para a confraternização num bar / cervejaria de cardápio não popular, por assim dizer, onde as puxadoras meio que 'ouviram' alguns protestos sobre a condução do passeio para então meio que 'pedir desculpas'. "Nós fazemos assim..." respondeu uma delas. Ótimo, então que seja. De minha parte, Arturo, sei como são alguns passeios, então não estranho.

Peço desculpas se erro na forma e tom que escrevo aqui, mas traduzo em minhas palavras debochadas o que me foi dito. Vera, a que tomou o tombo, está com várias lesões, mas está bem, tudo está dentro do terreno do bem dolorido até aqui; faltando a radiografia do braço.

No Bicicultura caiu a ficha que o que me incomoda em algumas mulheres do movimento feminista é que elas são muito, mas muito mesmo, parecidas com homens chatos, mal humorados, de estranha soberba, e não raro prepotentes, porque não dizer empoderados, com os quais tenho dificuldades de comunicação. Não, não foram assim comigo, até porque não interagi tempo suficiente, mas pelas brevíssimas respostas que tive algo me dizia que eu terminaria tenso se a conversa se alongasse. Não senti muito clima, então mantive certa distância.
A sensação que me deu, mais uma vez e como sempre, é que como todos movimentos sociais de frente, de ponta, os que se dizem ou não, mas se acham "revolucionários", há um sentido de nós estamos certos, ou, mais, nós é que temos razão e vocês são uns idiotas. Eu fico com a definição sobre ideologia do filósofo, ensaísta, jornalista romeno Andrei Plesu (com cedilha no "s") que está no seu livro "Da Alegria no Leste Europeu e na Europa Ocidental".

Teresa D'Aprile e Vera, do Saia na Noite, estiveram no Bicicultura e certos momentos, para um público específico delas, foi como não estivessem lá. Não foram elas que disseram isto, mas eu é quem afirmo porque vi. Teresa e Vera têm uma história de muito valor para contar, são revolucionárias de verdade de uma outra forma, abrangem um campo social muito maior do que se possa acreditar só olhando "a revolução". Ou será um "carro a menos e um homem a menos" e ainda não caiu minha ficha? A bagagem e a experiência delas é notável e deveria ser imperdível, mas pelo visto não interessa.

Termino meu comentário, até diria protesto, tirando a generalização, e pedindo que o pesado de minhas palavras, o acido de meus comentários, fiquem no terreno do bom humor e do politicamente incorreto, o que definitivamente vai ser bem difícil. Não iria escrever sobre o azedume que senti se não tivesse tido a nítida impressão que o mesmo respingou até sobre outras mulheres, não só as duas do Saia na Noite. Da mesma forma que não aceito o "a bicicleta, pela bicicleta, para a bicicleta", definitivamente não entendo uma parte do movimento feminista, feminismo que acho mais que pertinente, com um discurso soando "a mulher, pela mulher, para a mulher". Mais ainda quando dito com tons empoderados. Empoderado deve ser chiquérrimo, mas não sei porque me embrulha o estômago. Talvez Gabeira um dia consiga me explicar. Talvez meu problema seja a forma como tem sido usada, aliás o mesmo problema que começo a ter com a palavra democracia.
A minha discordância sobre o uso de social e afins, incluindo socialismo, já deixei mais que claro, de qualquer forma acredito que exista uma diferença abissal entre ideologia, populismo e esquerda, que não raro são mescladas e confundidas. Para mim esquerda não é venda de um produto, mas a entrega de resultados sociais.

A definição de uma das mais ativas participantes do cicloativismo sobre o que aconteceu no Bicicultura foi precisa: "Isto aqui é uma igreja". Genial, brilhante!
Dito isto, em parágrafo de destaque, vou dizer que não valeu a pena? Muito pelo contrário, valeu e muito. No geral foi a mesma ladainha de sempre, mas tiveram ótimos momentos.

Para mim o ponto alto foi ter visto a prestação de contas da UCB, União dos Ciclistas do Brasil. Devia ter gritado "parabéns, parabéns mesmo!". Como acompanho a UCB desde o início, para mim foi uma gratíssima surpresa ver que a entidade tem um bom dinheiro em caixa, que recebe apoio até de banco, que faz contabilidade, auditoria, ou seja, que usam ferramentas monetárias capitalistas para chegar um fim de cunho social, porque não dizer, e de esquerda. Bravo! Bravo! Os puristas, a quem devo meu carinho e respeito, mas discordo, e seu purismo, que entendo, ficaram para trás, mas ainda estão junto na luta. Bravo! Eu queria ter dado um beijo em todas as que fizeram a apresentação financeira, mas pelo clima tenho certeza que me enquadrariam na Lei Maria da Penha, ou mandariam para o hospício. De qualquer forma, querendo ou não, fica meu beijo de agradecimento estalado e babado em todas. Bravo! Bravo! Quer saber, ali valeu minha ida ao congresso.

De minha parte gostaria que eu, Arturo Alcorta, não fosse citado, de preferência fosse esquecido por completo, como de certa forma está provado que quase estou. O Brasil não tem memória, caga e anda para sua história, porque seria diferente com o que aconteceu no passado da bicicleta.
Se faz muito não interessa o que penso e falo, se faz muito dizem que falo sem parar, que lá vem o Arturo, então peço desculpas por não ter me retirado definitivamente antes, mas tenham certeza que aqui me retirei. Mesmo que alguns tantos digam que meu trabalho serviu de referência, serviu é passado, foi-se. Minha voz, minha experiência, minhas contribuições e ou discordâncias, a bem da verdade de qualquer um, não interessam mais. Hoje é o tempo da bicicleta pela bicicleta, para a bicicleta, da ciclovia e ciclofaixa, do carro a menos. Não ouvi uma palavra sobre pedestres e pessoas com necessidades especiais, aliás ouvi, quando para pedir melhoras para ciclistas foi citado o número absurdamente alto de pedestres mortos em Florianópolis. Quem estava lá para ouvir um senhor vestido de preto, um Secretário ou o próprio Prefeito? Que me lembre chamaram o Prefeito. 
Pessoas com necessidades especiais e suas mobilidades? Pelo que entendi das falas, a cidade tem que se curvar à revolução da bicicleta. Che Guevara pedalava ou só usava moto, como aparece no filme?*

Para mim é uma surpresa, Che Guevara nunca disse “hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás”. De quem quer que seja, o "tem que endurecer, mas sem nunca perder a ternura" faz todo sentido, mas eu completaria com "sempre olhando os mais necessitados".

Sem mais, boa sorte a todos e todas.
Talvez vocês estejam certos e eu completamente errado, mas sigo porque acredito o que meus próprios erros me ensinaram: pensa em todos, pensa em tudo, não confronta, trate bem até seus inimigos porque mais vale um mau acordo que um confronto, e talvez ele tenha alguma boa razão. Olhar no espelho e me achar lindo e inteligente não fez parte de minha formação. 

Inté, caros amigos. Boa sorte






*Respondo eu: Che estudou no mesmo colégio que meu pai, Colégio Marista Champagnat, era três anos mais velho, e naquela época, por volta de 1944, ninguém usava bicicleta, principalmente numa Argentina tão rica como era*. Era carro mesmo, algumas pouquíssimas motos. Via de regra era carro bom para circular numa Buenos Aires riquíssima, Belle Époque tardia e total. O resto, até que a história seja revista, é história.

*... Argentina tão rica como era... até entrar num ciclo vicioso de um populismo assistencialista que há 50 desintegra o país e empobrece brutalmente os mais necessitados.
Responsabilidade social é uma coisa, aquilo, o que houve, é outra coisa, completamente diferente. 
É deprimente, mas agora votaram pelo fim dos donos da pobreza entregando o poder a um mucho loco, para dizer o mínimo minimorum. Deprimente, mas previsível. A toda ação existe uma reação. Aquilo deu nisto. 

Serve de exemplo.

sábado, 18 de novembro de 2023

O valor das coisas

No meio de um trânsito infernal o que me salvou foi o som do carro com Larry Adler com sua mágica gaita acompanhando várias versões de clássicos da música americana. Maravilhoso. Odeio trânsito e minha relação com estar dentro de um carro é cada dia mais precária. Largo o carro na garagem e volto para minha casa pedalando numa das tardes mais quentes da história paulistana. Em ruas onde um dia sonhei que passariam os ciclistas o entupimento está tão grande que tive que seguir pela calçada.

Chego em casa exausto do calor e deito por uns minutos no chão, o local mais fresco de toda a casa. O silêncio não tem preço. Fico com olhos fechados por um bom tempo, mas não cochilo, os pensamentos não param, muito menos as obrigações. 

Sinto saudades de minha cidade, esta mesma que vivo hoje e que no maldito que acabo de passar não reconheço mais. É o preço do progresso? Será progresso? 
Quero sair de casa para caminhar e fazer umas compras para a geladeira, mas o mar não está para peixe, os ladrões estão em tempo de pescaria, os vizinhos contam um assalto atrás do outro. Não acredito, mas por via das dúvidas é bom ficar em casa.

Quero tirar os 550 milhões na Mega Sena. Quem disser que não quer não está falando a verdade, ou não sabe sobre o que se trata. Vou mudar minha forma de vida? Não. Então para que tanto cacau? 

Quero comprar um destes morros carecas cheios de cupins que cansei de ver quando viajava para Cambuquira e reflorestá-lo. A ideia não é idiota, o único problema é que não estarei vivo para ver o resultado. O resto dos desejos sobre o que fazer com os trocados se eu ganhar a Mega Sena são mais banais, mas definitivamente não incluem comprar um carrão. Nada contra carros, muito pelo contrário, mas no meio deste engarrafamento ele não servirá para nada. Prefiro a liberdade, que não tem preço. 


sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Bicicultura Florianópolis

Uma das participantes disse que aquilo, aquele congresso, parecia uma igreja. As palestras repetiam exatamente o mesmo discurso de sempre, como uma ladainha.

A primeira vez que vi a paisagem do litoral catarinense, quando terminando a serra que desce de Curitiba, onde se abre o verde imponente da Mata Atlântica que certa o vale por onde corre a rodovia, foi e continua, quase 60 anos depois, uma emoção forte, um respirar profundo de felicidade. Pelo menos este trecho da BR101 continua lá praticamente igual, um alegria que dura pouco.

Se BR 101 sul representa o que somos e para onde estamos indo.... 
A partir de Joinville, rumo sul, virou uma avenida, um daqueles avenidões comerciais horrorosos, apavorentes, que enfeiam qualquer cidade do planeta, cheios de propagandas de todas formas, dimensões e cores, galpões imensos com seus estacionamentos cheios de carros e caminhões, e totens altos iluminados. O que apavora é a rapidez como tudo está surgindo, mudando, se desenvolvendo. Para os desavisados, um bom sinal, pelo menos a economia anda, e como! Será? Foi-se o verde, foi-se a natureza que enchia os olhos de alegria, foi-se o gosto de colonização europeia,  italo-germanica, dentre outros, com sua forte e respeitada história. Virou algo tão comum, um nada onde vale o dinheiro, ponto. 
A paisagem catarinense era maravilhosa. Não se trata de ambientalista melancólico, mas de crescimento a qualquer custo que mais cedo ou mais tarde vai cobrar seu custo, alto por sinal. Era.

Sigo em frente e Balneário Camboriú passa ao lado, à esquerda. Muito mais forte e marcante que a imagem do mágico verde da Serra, no sentido oposto. Quem te viu, quem te vê,  Camboriú. Conheci uma cidade litorânea, desconheço a Manhattan que surgiu ali e que o povo feliz vê ainda explodir como algo natural. Os nova-iorquinos nunca sonharam, nem nos mais desvairados delírios selvagem-capitalistas, em construir algo semelhante. O próximo passo para o orgulho camburiense é o edifício de 150 andares que vem aí, o mais alto da América do Sul, ou será das Américas?

Fotografado na volta para São Paulo 

A imagem de Camboriú é mais que impressionante, beira o brutal, para letrados é brutal. Se a classe média vai ao paraíso e este é o paraíso... 

E, depois de uma pequena subida na estrada / avenida se dá com a imagem da ilha de Florianópolis e o mar, uma benção. A estrada vai sendo percorrida, mar a esquerda, a imensa ilha ao longe. Tudo cresceu, cresceu muito, muito mesmo, muito rápido, muito rápido, e não para. 
Entro em Florianópolis, a cidade continental que parece não terminar e finalmente dou na ponte com a vista da ilha ponteada de luzinhas. Cresceu muito, todos sabemos, é público e notório, mesmo assim impressiona como mudou. Não reconheço boa parte do vejo. 

Acabou-se a Santa Catarina de meus sonhos, até os mais recentes. Virou estrada e avenidas, galpões, edifícios. 

UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. Ou o que resta dela. Não a conhecia, nem preciso para entender a decadência. Triste, muito triste. Entro a pé,  caminho por edifícios largados até chegar ao local onde será o Bicicultura, um grande centro de convenções bom, velho e um tanto descuidado. O teatro é grande, aconchegante, mas necessita cuidados.
Encontro amigos que não via faz muito. Vale a viagem. Os abraço forte e com carinho. Giselle, minha querida Giselle, mulher de muito valor, passa caminhando, corro até ela e ficamos num longo e terno abraço. Ela está bem, é o que basta. 
 
O Bicicultura saiu, está acontecendo, é o que importa. Passados 16 anos e várias edições continua a mesma coisa. Isto me aflige e muito. 
Gasto meu tempo procurando velhos amigos, mesmo os mais novos já estão de cabelos brancos. O tempo passa. Pergunto da vida de um deles que tenho, ou teria, como filho. Ótima pessoa, ótimo garoto, hoje homem feito, mas vivendo igual. Me preocupa.

Vim eu com sonhos de ver algo novo. Nada mudou. Não consigo ficar nas palestras. Me remetem a um passado que deveria ter ficado para trás, até porque o sonho então era muito bom e exatatamente por isto deveria ter caminhado em frente. Foi, a que passos? De certa forma segue igual. 

O hotel onde estou é um oásis verde com cheiro de civilização, próximo a UFSC, que em breve acabará. Vão passar uma rua no meio. O resto prefiro nem pensar.

Peço à dona, por favor, coloca o carro um pouco mais para trás para a gente, os hóspedes, não tomarmos chuva.  O carro continua exatamente no mesmo lugar, sequinho. Nós, os hóspedes, temos que dar uma corridinha no meio do aguaceiro que não para de cair. Igual aos edifícios de Camboriú.

domingo, 12 de novembro de 2023

Falta de informação completa

Fórum do Leitor
SP Reclama
O Estado de São Paulo

Fui fotografar as obras da retificação da Marginal Pinheiros na altura da Curva da Traição. Quando voltei para casa abri o Google Earth para fazer uma comparação entre as fotos e o que existia antes no local e dei com o escrito "empreendimento JHSF" no  meio deste terreno, aliás, onde já fizeram uma bela terraplanagem. Quase caí da cadeira, nunca tinha ouvido uma palavra, lido uma linha ou visto uma imagem que ali, naquele terreno que parecia e era um resto de mata, tão simbólico para quem vive perto ou vai de passagem, fosse surgir um empreendimento imobiliário. Não estava dando para entender o porque da retificação da via expressa, não fazia sentido, agora faz, total, em todos sentidos, por todas razões. Alguns quarteirões da avenida Nove de Julho, na altura do Jardim Europa, estão sendo demolidos e com eles edifícios de arquitetos importantes em nossa história. Há um movimento para tentar salvar com o tombamento o edifício projetado por Rino Levi que está na esquina da rua Japão, mas que só soube pelo jornaleiro vizinho. Outros desapareceram irremediavelmente no silêncio das notícias, todas e qualquer uma. Em entrevista ao JN um diretor da ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica - acabou confessando que só temos 10 fiscais desta agência reguladora trabalhando em todo Brasil, o que coloca a calamidade ocorrida em São Paulo em outro patamar de realidade e problema. "Joga pedra na Geni / Ela é feita para apanhar / Ela é boa de cuspir / Maldita Geni" diz a brilhante letra de Chico Buarque. Meu pai e vários amigas tiveram problemas de falta de energia elétrica, que é responsabilidade da Enel, que não é a Geni de Chico, como estamos fazendo.  E assim vamos. A verdade é que nós, população, estamos entregues a falta de notícias numa cidade que não pode parar. Vamos parar onde?

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Mudar?

Ontem almocei com um amigo e quase caí da cadeira quando ele reconheceu seus próprios erros. Cabeça brilhante, ideias estruturadas, mesmo que fora da curva para os simples mortais, coisas que fazem todo sentido. Os almoços sempre foram sentar e ouvir, e de preferência comer bem devagar porque o parto de tanto ouvir demorava. Ontem ele disse com todas as letras que reconhecia não só minha voz, mas também minhas posições discordantes

Numa sociedade profundamente individualista, como a que estamos vivendo, reconhecer seus próprios erros não é para qualquer um. Numa de suas falas sem papas na língua, Pondé, filósofo, fuzilou: não vamos mudar. Temo fudido! E acredito que mesmo sendo anunciado aos quatro ventos que temos que mudar com urgência, não vamos mudar mesmo. Concordo em grau, gênero e número com ele, caro Pondé.
Não vamos mudar do dia para a noite, como urge. Ou vamos mudar para não mudar nada. Nossos erros atávicos fazem parte essencial do sistema de auto-proteção de nossa individualidade, indispensável para sobreviver socialmente. 

Meu caro amigo, aquele do almoço, pensa diferente, e tenho a dizer, pensa correto, por isto assusta os amigos, que sabem que tem que levá-lo a sério, muito a sério, mas não o fazem porque teriam que abdicar de uma montanha de coisas, ideias, princípios. Provavelmente também seriam tidos como exóticos, para dizer o mínimo, talvez o mais assustador. Viver fora da boiada? Nem pensar em pensar diferente. Tá louco?

Para conseguir mudar de fato seria necessário educar estabelecendo dúvidas na cabeça do povo. Iria desmontar um monte de interesses muito bem estabelecidos e perenes. Não vai acontecer.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

E se vier outra ventania?

Fórum do Leitor
SP Reclama
O Estado de São Paulo

E se vier outra ventania?

Como cidadão afirmo com todas as letras que não me interessa saber quem responsabilizou quem. Não vai servir para absolutamente nada no caso bem provável de termos uma nova tempestade com ventos fortes. Eu quero saber é: O que acontece caso tenhamos um outro evento do porte de sexta-feira nos próximos dias ou mês? Qual é o estoque de fios, cabos, conexões, postes e outros da Enel depois deste desastre? Como estão as indústrias que produzem os insumos? Qual foi o índice de eficiência geral dos trabalhos realizados? Quanto tempo por situação? Qual a eficiência das equipes da Prefeitura? Faltou serra, caminhão, guincho, para a remoção?

Quantas equipes foram envolvidas, quantos por situação? Tinha material de reposição e ferramentas para todos? Aumentou muito o número de funcionários da Enel nas ruas. Qual o treinamento deles? Enel tem normalmente quantos funcionários disponíveis para situação de emergência? Foram utilizados funcionários aposentados ou equipes terceirizadas? Qual a garantia legal / jurídica destes?

Qual o parâmetro de eficiência? Comparação com Miami ou outras cidades da Flórida ou Texas, por exemplo. O que eles tem que não temos? O que precisamos para nossa condição? 
Como é a engenharia financeira da Enel para situações como esta? Ela fica de pé ou quebra caso aconteçam vários eventos destes? Quem segura a peteca? Há um fundo de emergência do Governo do Estado disponível para socorrer a Enel? De quanto, para quanto tempo? 

O que tem que ser religado antes? Qual são as prioridades técnicas num evento destes? Qual é o nível de segurança das centrais elétricas, dos transformadores e outros? Não estou dizendo que se dê informações que afetem a segurança geral, mas que nos eduque e treine para sabermos agir numa emergência deste porte.
 
O que precisamos agora é de informações, de dados, de previsibilidade. Precisamos de mapas que possamos nos localizar e entender o que está acontecendo e poderá acontecer. Precisamos e temos o direito de nos prevenir ou de agir com alguma eficiência depois do evento. O ônus não pode nem deve ficar completamente sobre nossas costas.
Precisamos ter e ver um plano emergencial. Temos o direito constitucional a informação.

Não adianta ficar no ele falou isto, o outro falou aquilo... Como dizem os argentinos, o diz que diz agora vale tanto quanto um peido.
A aviação, que tem um dos sistemas de segurança mais precisos da humanidade, ensina que não adianta culpar, tem que entender o evento em todos seus detalhes, os que estão na cara e os que não se pode ver a princípio, mas tiveram importância no resultado final.
Se queremos um país, se queremos uma cidade, se queremos um futuro, é bom entender o que realmente acontece. É óbvio que não interessa a muitos que os brasileiros venham entender o que é qualidade, mas a estes digo que continuar na mesma ladainha será um tiro no pé de suas próprias intensões, sejam boas ou más. A ignorância do outro é o suicídio de si próprio. 

Numa situação de crise profunda, a maior asneira que se pode fazer é buscar responsáveis ou culpados. O momento é de termos respostas, caminhos. Infelizmente não as temos. Somos uma população completamente a deriva.

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Fim da curva da traição. Prolongação da marginal até Jurubatuba

SP Reclama
O Estado de São Paulo


Fim da curva da traição.
Faz mais de um século (1898 - NY) que as grandes cidades mundiais se reúnem regularmente para trocar experiências sobre o que pode ser feito para melhorar a qualidade de vida de suas populações. São Paulo insiste em seguir seu próprio caminho com endosso implícito da maioria dos paulistanos, não importa o custo, não importa os passivos que são deixados para trás. São Paulo não pode parar, foi tomado ao pé da letra no desenfreado abrir novas ruas e avenidas para melhorar o fluxo dos automóveis. Deu certo? O trânsito vem melhorando? Dentro destas experiências sobre desenvolvimento urbano, que são amplamente debatidas, publicados e praticadas por cidades do mundo com sucesso, fica muito difícil entender as possíveis razões para a retificação da Curva da Traição na Marginal Pinheiros que está em andamento. Passo com frequência pelo local e nunca vi algo que justifique ou faça pensar os benefícios da obra e da derrubada de árvores. É perigosa, afirmam. Perigosa para quem? Para quem vem a milhão acima do limite de velocidade?
Em vez das pistas contornarem uma pequena mata remanescente que em parte já foi derrubada, os 800 metros da marginal expressa correrá numa reta. Quem trabalhou com trânsito sabe que uma reta não necessariamente diminui os acidentes. Pode ocorrer o contrário. Óbvio que devem ter justificativas oficiais mais que cabíveis, sabe-se lá para que ouvidos. Não cai a ficha que mesmo que a obra tenha custado dois palitos, o que é duvidoso, custou dois palitos que a cidade de São Paulo não tem, mesmo que os receba de "grátis". Não existe almoço grátis, não acredita nesta verdade quem não quer. 
Olha o que eu descobri. Leia no meio desta imagem do terreno na Curva da Traição que ficará entre a retificação da marginal e a pista local.


Prolongação da Marginal Pinheiros até Jurubatuba.
Caso a cidade de São Paulo tivesse um planejamento pertinente ao momento que o planeta vive seria possível questionar o futuro prolongamento da mesma Marginal Pinheiros entre a Ponte Transamérica até Jurubatuba, mas é praticamente impossível entrar no tema. Está provado com documentação farta: quanto mais vias, mais trânsito, mais congestionamentos, mais outros problemas, dentre eles desequilíbrio social e violência. Este prolongamento fará aumentar a pressão sobre vitais áreas de proteção ambiental porque estimulará a especulação imobiliária, mandando para mais longe ainda a população de baixa renda. Será um problema a mais para as já poluídas águas das represas Guarapiranga e Billings. Não adianta comentar e muito menos questionar, mas na minha loucura ouso fazê-lo. Todas estas novidades paulistanas, estas modernidades se transformam num deslumbre em velocidade desenfreada que enche os olhos de todos, com amplo endosso e apoio popular, sem pestanejar. Soluções milagrosas, populistas, costumam se transformar em erros crassos, mas são aplaudidos em pé. Exemplos é que não faltam. É uma questão de cultura: São Paulo não pode parar! A saber, como sutil detalhe: construíram a ponte Jurubatuba sem que boa parte dos altos funcionários da CET SP soubessem da obra. Não faço ideia se a ponte Jurubatuba e a avenida Jair Ribeiro da Silva ligada a ela foram projetadas para receber a carga de trânsito do trecho que se pretende prolongar. Se não foi, preparem-se, o caos vai ser grande. 

Até quando nossas cidades vão aguentar o passivo que não para de crescer? No delírio populista que nos encanta a todos perdemos a noção do que nos agrada e o que renderá frutos futuros. Não há almoço grátis, isto é líquido e certo. O buraco que estamos metidos é muito, mas muito mais em baixo. São Paulo é um transatlântico a deriva com um grande furo no casco que traz a reboque o Brasil. Quem fala contra o que está ai é considerado um imbecil, e exausto me incluo dentre estes.

domingo, 5 de novembro de 2023

O que aprenderemos desta ventania?

SP Reclama
Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

O plano de emergência se resume a retirar as árvores tombadas e religar a energia elétrica? E o que mais? Aprenderemos algo desta ventania? Aprendemos algo da última? Ou vamos continuar a só retirar árvores e religar a rede elétrica, e cada um que se vire com seu drama pessoal? Que é coletivo de milhões. A verdade é que se o plano de emergência se resume ao que vimos nestes três dias de apagão então não temos praticamente nada que nos salve ou pelo menos ajude. Pior, e não reagimos, aceitamos a limitação.

A ventania da sexta-feira passada deixou pelo menos 2.5 milhões de residências sem energia. Passadas quase 48 horas temos umas 1.5 milhões ainda com problemas e a promessa é que até terça-feira, ou seja, até 96 horas depois, tudo volte ao normal. Na ventania anterior que derrubou centenas de árvores não se resolveu tudo até a data final estabelecida. Estas ventanias estão cada dia mais frequentes e pelo que dizem os especialistas tendem a piorar.   
Boa parte da população afetada pelo corte de energia é idosa ou tem necessidades especiais e mora em edifícios, o que dificulta muito qualquer atendimento emergencial. Fora os prejuízos para negócios, empresas e serviços. Eu tenho dificuldade em responsabilizar unicamente Enel, Prefeitura, fiação aérea e as árvores por estes constantes problemas. É inegável a falta de interesse e respeito dos paulistanos por sua cidade, o que pode ser apontado como causa de boa parte destes problemas. Nem o lixo vai para o lixo. Ouve-se e vê-se muitas reclamações e reivindicações pertinentes, mas que relatam problemas imediatos e particulares sem olhar o todo, sem procurar se aprofundar nas causas e possíveis soluções. A baderna pendurada em nossos postes deveria ser inaceitável, até as prestadoras de serviço não aguentam mais. Muito se fala em aterramento da fiação ou em deixar nossas ruas sem árvores. Moro no baixo Pinheiros entre o Largo da Batata e a Estação Terminal Pinheiros, onde a Operação Faria Lima enterrou toda a fiação. Afirmo com todas as letras: também dá problemas e não são raros. Aqui também é frequente tempestades desligarem a telefonia e internet. Segundo reportagem do próprio Estadão, cabeamento subterrâneo custa 20 vezes mais que cabeamento aéreo, isto se não encontrarem pelo caminho o que os mapas não mostram, como aconteceu nas obras da SABESP da rua Bela Cintra e Mercado Municipal, dentre inúmeras outras. Enfim, temos, nós, paulistanos, que viver com que está aí pela simples razão que a cidade, a nossa cidade, São Paulo, não tem dinheiro, capacidade e muito menos organização para fazer de maneira correta o aterramento dos cabos. Que seja aérea, mas que funcione, o que é possível como provam inúmeras cidades pelo mundo. O nosso problema, brasileiros, paulistas e paulistanos, é não termos consciência do que é qualidade, do que é fazer bem feito, de entender o que está acontecendo e como melhorar sem apontar culpados. Os postes que temos estão absurdamente sobrecarregados. É comum encontrar funcionários das prestadoras de serviço de telefonia e internet encontrando fiação aérea que não se sabe a quem pertence e se está conectada. Muitos não têm sequer autorização para estar naqueles postes. Alguém fala uma palavra? Alguém se interessa? Fui Bike Repórter da Rádio Eldorado FM entre 1999 e 2001, comecei a fazer comentários sobre postes e fui ameaçado para valer. Meu irmão, Murillo de Azevedo Marx, lá pelo final dos anos 70, então Diretor do Patrimônio Histórico do Município de São Paulo, tentou mexer com a questão e foi ameaçado de morte, como relatou para família num jantar. Poste e fiação aérea não é para iniciantes. O povo se cala, só fazendo a maior gritaria quando lhes falta luz em casa. E como os postes não vão sair de onde estão a ideia genial é que se derrube as árvores. Muitas caem porque são plantadas em cova rasa ou em local inapropriado. Não quero entrar aqui na questão dos ventos que são acelerados pela turbulência criada por edifícios altos. Estou falando besteira? Procurem e acharão com facilidade simulações matemáticas de ventos em cidades. Ou um documentário sobre a turbulência causada por um edifício construído sem estudo de aerodinâmica urbana que derruba e arrasta pessoas na rua. As razões para a falta de energia ou internet independem de ventanias, como creio que a maioria já tenha percebido, mas quem se interessa? É bom se interessar porque numa economia altamente digitalizada pelo menos o 3G tem que funcionar direito, o que nem isto vem acontecendo. Tenham certeza, vai doer no bolso.