sexta-feira, 15 de março de 2019

O que quer que eu faça?

Chegando em casa por volta de 23:30h senti um cheiro muito forte de queimado já na rua. Rodeei o edifício e o cheiro estava bem forte nos fundos. Olhei para cima para ver se saía fumaça ou havia algum outro sinal de fogo, algum ruído estranho, aquele crepitar de fogo ou alguém com voz alterada, mas nada, tudo calmo. Chamei o segurança, que estava distante e não tinha percebido nada, quando se aproximou ficou assustado e decidiu dar a volta por trás dos outros edifícios para ver se via algo. Voltou dizendo que o cheiro era forte lá, mas não havia sinal de fogo ou fumaça. Vai ver que já tinham apagado, mas aí ele saberia. Lá pelo começo dos anos 70 pegou fogo na lixeira do edifício que morávamos e a experiência foi marcante. Vi o incêndio do edifício da CESP na Paulista, minha avó morava a não mais de 150 metros de lá, e sei bem como é. É muito rápido e trágico. Minha avó era a Chefe de Cerimonial do Governo Abreu Sodré quando o Edifício Andraus pegou fogo matando 16 e deixando 330 feridos. Ela teve que acompanhar muito de perto e o pouco conseguia falar sobre a tragédia era muito doído. Não tenho dúvida, com fogo literalmente não se brinca.
Fiquei na rua por um bom tempo para ver se acontecia algo que chamasse a atenção. O cheiro seguia forte, mas não aumentava, um bom sinal. Não era cheiro de panela queimando no fogo, nem de curto circuito, nem de papel queimado, era o cheiro de fogo de incêndio, quem já vivenciou sabe que é cheiro muito particular. Nesta hora a maioria dos moradores do prédio, trabalhadores, aposentados e idosos, estão dormindo. Um único apartamento tinha suas luzes acesas. Fui lá e bati com delicadeza na porta. Tudo que não queria era fazer alarde porque a situação parecia controlada. Tocar uma campainha aquela altura da noite acordaria todo o pequeno edifício, sei como é. Bati na porta de novo com um pouco mais de força e um senhor de uns 50 anos abriu. Nunca o havia visto antes, nem sabia que morava lá. Com a porta entreaberta pude ver sua mulher em pé mais ao fundo. Perguntei com cautela "Vocês estão sentindo um cheiro de queimado?". Ele respondeu seco "Não", e ela disse "Meu filho percebeu o cheiro forte de queimado", e ele completou com irritação "O que quer que eu faça?" e fechou a porta.

O que quer que eu faça?

Se o edifício e o apartamento tivesse torrado "O que quer que eu faça?" se transformaria imediatamente num apontar o dedo no buscar o primeiro culpado que se encontrasse. Vai fazer o que? É sempre assim, é Brasil.

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