quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

pedalando nos bons tempos

Eu tenho que fazer um agradecimento pela benção de ter pedalado nos anos 70, 80 e 90. Estes dias de festas de Natal e Ano Novo, com uma São Paulo praticamente vazia, principalmente nos Jardins, tem me feito lembrar de como era bons aqueles tempos, principalmente em cima de uma bicicleta. Tenho perguntado para amigos como era, se era tão tranquilo assim, e todos respondem que sim, era uma paz. Havia espaço de sobra para o ciclista, praticamente não havia interferência da poluição sonora dos carros e no interno dos bairros ouvia-se a aproximação das esquinas com a interferência do canto dos pássaros, latidos, miados, vozes de crianças brincando, de um radinho de pilha ligado, e a partir da tardinha as televisões próximas às janelas abertas nas noites mais abafadas. Portas abertas, gente nas ruas conversando. De vez em quando passava um carro e o pessoal o acompanhava com os olhos sem parar de falar. Nas avenidas era um pouco mais agitado, algo parecido com o que temos em ruas ditas calmas. É lógico que havia hora do rush, mas nada que chegue perto da insanidade que temos hoje.
Os anos foram passando e o trânsito engrossando. A década de 80 foi quase uma repetição da anterior. A partir do mountain bike, anos 90, novos ciclistas foram aos poucos saindo às ruas, mas ainda era raro vê-los circulando durante o dia. Ao contrário, a noite era uma festa, as ruas eram tomadas por grupos de ciclistas sorridentes e falantes que redescobriam uma São Paulo realmente nunca vista antes. Quem pedalava com frequência conhecia praticamente todas as bicicletas e seus donos. Era estimulante ver uma bicicleta nova no pedaço, ótimo emparelhar e conversar com seu ciclista virgem. Alguns novatos se assustavam com a efusiva receptividade e alguns se retraiam ante o excesso de volúpia dos velhos ciclistas pelo pedalar e a bicicleta.
Segurança no trânsito? Quanta besteira! Quem sabia pedalar tinha tranquilidade. Havia espaço e tempo para todos. Reclamava quem tinha medo da própria sombra ou era prego (que não sabe pedalar). Na década de 70 e 80 bicicleta por estas bandas estava para os motoristas mais para uma visão de um disco voador que eles preferiam manter distância. Era pura curiosidade.
Nos anos 90 o trânsito começou a ficar cada dia mais pesado, denso, mesmo assim era muito fácil pedalar, quase uma brincadeira. Bastava saber pedalar e se comportar como cidadão civilizado. Fácil.
Quem pedalou nestes velhos tempos viu uma cidade de São Paulo única, de extrema riqueza. Eu vi, enxerguei, entendi. Além da bicicleta tive como referência outra benção: meu irmão Murillo Marx, professor de história do urbanismo e arquitetura e então Diretor do Patrimônio Histórico do Município de São Paulo. Ele contava a história, eu fui para todos os cantos, os conheci com carinho o que pude, que não foi pouco. Zona Leste, Norte, Sul. Oeste e Centro é o meu pedaço, mas confesso que muito descobri por aqui. Só falta Iguatemi e Itaim Paulista e mais um pedacinho aqui e ali. Tudo pedalando tranquilo, sem trânsito, sem correria, sem preocupação, sem medos... Bons tempos.  

Obrigado pela benção. 

2 comentários:

  1. Li , gostei e recomendo. Arturo, voce escreve de um jeito gostoso,quase ou porque nao dizer poetico. Escreva sempre! Bjs Miriam Que voce tenha um 2014 com tudo de bom que voce quizer.

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