Oliveira continuou
servindo minha família por muitos anos. Progrediu, comprou uma VW Variant vermelha
nova. Certa vez conversamos sobre a época que ele pedalava para entregar os
pães, que agora iam e quantidade muito maior e mais organizada no porta-malas
da sempre bem cuidada perua. Foi nesta época que eu havia tirado a carta e a
bicicleta ficou completamente fora de minha vida. Normalmente encontrava o seu
Oliveira quando chegava da namorada. Desligava o carro, ia até o porta-malas
dele, pegava um pãozinho e ou deixava o dinheiro ali mesmo ou pagava depois. Subia,
entrava em casa, dava uma rápida cochilada, tomava um banho e saia para a
faculdade com minha Variant Azul calcinha, que judiei a não poder mais. No
princípio era fácil estacionar, algumas vezes até dentro do terreno da
faculdade. Com o tempo fui estacionando mais longe, mais longe, mais longe, não
tão longe e difícil como estacionamos hoje, mas o suficiente para começa a me deixar
irritado. E ai meu irmão comprou uma bicicleta para ele, uma Caloi SS 1977.
Quando seu Oliveira me
viu com a bicicleta pediu para relembrar os velhos tempos. Não pedalava fazia
anos. Entreguei a bicicleta vendo o sorriso nostálgico de seu Oliveira. Ela a segurou
com o braço estendido, rosto baixo e em silencio. Passou a perna por trás, ficou
um bom tempo em pé com o olhar baixo e perdido. Sentou-se no selim, olhou para
baixo verificando cada detalhe da bicicleta de tubos finos e cor prata, colocou
o pé no pedal, empurrou com o outro pé a bicicleta para frente e retomou seus
muitos anos de ciclista padeiro furando a fria neblina nas madrugas paulistanas.
“Era muito frio”, disse enquanto se distanciava. Ficou um bom tempo girando no
estacionamento, mostrando intimidade com os pedais, passando raspando entre os
carros, pelo corredor do elevador, subindo a rampa para rua e voltando, como
uma criança. A partir deste dia nos fizemos mais amigos do que já éramos. Ele
passou a contar, sempre com forte sotaque, a sua vida de português imigrante, o
trabalho dos pães, a bicicleta, sobre a mínima e delicada furgoneta Ford
Prefect que sucedeu a bicicleta e que eu não me lembrava mais; casamento,
família, o profundo amor pela mulher e filhos... e falta que sentia da
bicicleta, de pedalar...
que lindo.
ResponderExcluirObrigado
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