sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Viva! Correr a pé

E se eu voltasse no tempo, o que faria? Não tenho a mais sombra de dúvida: correria a pé. Se tivesse que optar entre a bicicleta e correr a pé? Correr a pé. Futebol? Natação? Bem, de tudo um pouco, mas correr a pé, correr muito a pé, correr em todo lugar, para todo lado, de preferência nas matas, praias, pastagens, pedras, morros...

Minha grande paixão é correr a pé, o único momento que sinto meu corpo completamente livre, integrado à natureza, natural. Nada da chatice que fazem da corrida sempre no mesmo circuito, com os mesmos treinos...; mas simplesmente a liberdade de correr. Não sei bem como comecei, mas depois que aprendi a correr descobri uma sensação de capacidade corpórea e liberdade sem precedentes. Você não precisa de absolutamente nada, basta sair correndo...

Creio que o Chico Macchione tem a ver com o interesse. Começamos juntos no mountain bike e Chico corria a pé, o que fazia grande diferença no preparo físico. Numa São Silvestre fui acompanha-lo pedalando e fiquei um tanto impressionado com a subida da (av.) Brigadeiro (Luís Antônio) que ele fez. Ali entendi a nossa diferença nas subidas das provas de MTB. Um dia o Felix, um dos primeiros (e injustiçado) organizadores de provas de MTB, contou que corria ultra-maratonas. Ouvi de queixo caído que ele tinha vindo de Campinas para São Paulo de ônibus e que ia voltar correndo a pé. “Como?”

Assinei a Bicycling por décadas. Acho que foi numa propaganda dela que vi a Runner’s World, da mesma editora, Rodale Press, e decidi assinar por curiosidade. Faço aqui um elogio e agradecimento à qualidade editorial da Rodale Press, sempre cuidadosa com o leitor, o que me influenciou demais para o bem. A Runner’s mostrava o passo a passo sensato e comecei a gostar para valer da brincadeira.

Joguei futebol durante décadas praticamente todo fim de semana. Por praticar o esporte de maneira errada tive inúmeras lesões, algumas graves, principalmente no joelho esquerdo. Médicos e ortopedistas repetiram que eu não conseguiria correr mais. Com as dicas da Runner’s fiz duas meias maratonas e três São Silvestres, e na última fiz uma molecagem que me custou mais uma longa parada, que pensei ser a derradeira. Acabou. Acabou? Nada disto; mais uma vez estou de volta.

 Os diagnósticos sobre as dores no joelho esquerdo realizados por especialistas foram todos errados. Ai apareceu o Alberto Minami, ‘mestre’ em massoterapia e acupuntura, que com as mãos e em silêncio provou que estavam errados. Um bom tempo depois fui para no Bruno Bettarello, preparador físico, que começou seu trabalho fazendo testes de equilíbrio, força e agilidade em todo corpo, o que mostrou que a dor no joelho era resultado problemas com as cadeias musculares dos pés, bacia e coluna. E agora Rogério Neves, fisioterapeuta, está completando o trabalho. Estou de volta.

Nosso corpo é um sistema complexo e integrado. A medicina chinesa e a cultura indiana sabem bem disto há milênios. A medicina ocidental, com menos de dois séculos de boa história e grande arrogância, busca a correção rápida dos problemas localizados, pouco ou não levando em consideração que o joelho está entre o pé e a bacia, e que estes fazem parte do todo do corpo, num sistema ósseo, articular, muscular e neurológico completamente interligado. Saúde ocidental é cartesiana. Ótima para extremos.  

Faz uns dias consegui correr sem qualquer dor, uma experiência inacreditável. Minhas corridas ainda são relativamente curtas, mas o que importa, eu corro! Voltei a sonhar em fazer a São Silvestre. Ou talvez mais uma meia maratona. Quem sabe? Estou escrevendo este texto por que no final do dia escapei do trabalho e fui correr na mata do Parque Alfredo Volpi, um pequeno paraíso. Fiquei assustado com trânsito pesado na ida e muito deprimido com o que vi na volta, uma hora depois. Pensei em escrever sobre o colapso de São Paulo, mas para que? Por causa das corridas a pé minhas pernas giraram os pedais de volta para casa com uma consistência maravilhosa. Minhas pernas estão vivas, se precisar delas é só usar, respondem imediatamente. E passando por todos encalacrados senti mais uma vez a liberdade de ter o corpo em ordem, a alma limpa, o rosto leve, sorrindo de bobeira. Tesão!

Mais um pouco vou para cama. Vou ler um pouco e quando desligar a luz cada passada no meio da mata irá embalar o sonho. Vida! Viva a vida!

3 comentários:

  1. tenho um amigo que diz:
    "depois que eu corro, tomo uma cerveja no Bar X, volto caminhando pra casa, janto e vou dormir igual um bebê". rs

    ResponderExcluir
  2. Corrida não é o meu forte, mas se pudesse voltar no tempo, faria Le Parkour com certeza! Hoje, incentivo os meus filhos, espero que eles nunca percam a ansiedade que o nosso corpo tem em subir, escalar, pular, girar... Em algum momento eu perdi. Torço para que eles não e utilizem com criatividade os percursos cheios de desafios que esta cidade oferece sem saber...rs.

    ResponderExcluir
  3. Corrida

    Corremos juntos
    eu e meu companheiro.
    Meu não por posse;
    mas por instante fugaz
    de perfeita compreensão.
    Sinto seu calor
    a um metro de distância.
    Absorvo sua energia
    e corro mais.
    Meu companheiro.
    Meu companheiro e eu.

    Lola Mora

    ResponderExcluir