terça-feira, 16 de junho de 2015

A volta ao bang bang

Estou no aeroporto CDG, Charles de Gaulle, já dentro da área de embarque esperando minha hora de levantar voo para São Paulo. Não tenho a mínima vontade. A cada volta para o país do nunca antes é uma angústia danada. Meu último dia, minhas últimas horas, as últimas imagens que vão ficando para trás pela janela do ônibus que vai para o aeroporto, o check in e finalmente o entregar o passaporte para o carimbo final de despedida da civilização. Sim, civilização. Adeus Paris, adeus França, adeus Europa, adeus civilização. Não podemos afirmar que nós, brasileiros, somos civilizados. Basta o sobrevoo para a aterrissagem em nossas cidades para ficar claro que estamos em campo de guerra. Como mais chamar a baderna urbana de nossas cidades que se vê pela pequena janela do avião? E aquela paisagem que passa pela janela do carro ou ônibus que nos leva de nossos precários aeroportos para casa. Toda vez que faço esta viagem de reentrada as entranhas do Brasil lembro o choque que tive primeiro ao ver o aeroporto de Istambul e logo depois a muito bem cuidada via expressa que nos levou ao hotel vizinho à Mesquita Azul.
Ontem não tive coragem de sair do hotel e ver Paris a noite. Como se fosse uma mandinga para voltar para cá o mais rápido possível me recusei a andar alguns quarteirões e ficar babando com a vista da linda madame, a Tour Eiffel, com suas luzes brilhando para o infinito das estrelas. Hoje pela manha pedalei pelo Sena carregando a alma com aquela paisagem, exatamente como fazia na Sé de Olinda, na praia de Copacabana e a muito tempo atrás em alguns pontos especiais de São Paulo. A Praça do Por do Sol era um deles, mas faz tempo que não dá mais. Muita gente, muito barulho, muita maconha, bebida, praça mau cuidada, cheia de mato e lixo. Ainda sinto prazer em parar no meio da Ponte Bernard Goldfarb, mas ela é proibida e proibitiva para pedestres e o risco de ser atropelado é muito grande. Mas a vista do rio Pinheiros com o Pico do Jaraguá ao fundo é maravilhosa.
Este aeroporto, CDG, é maravilhoso. Chique, bem construído, aconchegante, funcional. Ele faz bem por que instiga a inteligência, o bem viver, o acreditar no futuro.
Paris estava lotada de gente como nunca havia visto antes. Nunca estive aqui nesta época, de início de temporada cheia. É muita gente para meu gosto. Felizmente consegui comer nos restaurantes que gosto, que normalmente são parisienses para parisienses. Costumo ficar numa área que
também é Paris de parisienses, com muito pouco turismo e turista. Para viver a mesmice entro em qualquer shopping center ou loja de grife, o que brasileiro e turistas de vários outros países atrasados adoram fazer. É verão, anoitece lentamente e muito tarde, depois das 23:00. Amanhece antes das 5:00. Dia longo. Sou um abençoado por que geralmente pego tempo bom, e não foi diferente desta vez. Dá para sentar numa mesa de rua e ficar conversando até o sono chegar. Dá para voltar para o hotel sem qualquer preocupação. Os franceses só pedem para tomar cuidado com batedores de carteira e eles só “trabalham” onde está cheio de turista. Ontem fui até a Basílica de Saint Denis, que fica fora do centro turístico de Paris, e lembra Brasil e sua mistureba de raças, cores, origens, falas, mas não senti qualquer temor de assalto ou latrocínio. O máximo que acontece são alguns falando no celular aos berros.

Amanha acordo no Brasil. De cara vou fazer minhas preces para que não aconteça nada entre o aeroporto e minha casa. A partir de amanha começo a contar com minha sorte para viver em paz. Começaram os assaltos na minha rua e por sorte não foi comigo. Estou cansado desta brincadeira de guerra civil, mas é nela que tenho que viver. Se pudesse sairia do Brasil e nunca mais voltaria. 

Uma das áreas de descanso com vista para o pátio dos aviões do aeroporto Charles de Gaulle

2 comentários:

  1. Prezado Arturo Alcorta.
    Ao ler este seu post, me identifiquei muito com você, pois sinto a mesma coisa que você sente, toda vez que retorno ao Brasil, depois de permanecer dias vivendo na Alemanha com um sentimento de segurança e testemunhando bons exemplos de cidadania. Há 6 anos que visito e convivo de 1 a 3 meses por ano com minha filha e netos aqui na Alemanha, onde estou hoje. Depois da primeira vez que aqui estive em 2010, pude constatar que vivemos em um país onde somos enganados desde criança, com a propaganda enganosa que diz: "vivemos em um país maravilhoso, no melhor país do mundo, etc, etc," Pura enganação. Como não tenho o dom da boa escrita igual a você, fico por aqui dizendo-lhe que concordo em muitos pontos com você sobre a vida lá no Brasil, sobre a mobilidade, a qualidade de vida em geral e da mobilidade e tudo mais. Lhe sigo a algum tempo e senti vontade de lhe dizer isto, após ler esse post. Saudações.

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    1. Paulo, meu caro. Para quem tem cabelos brancos, como nós, é muito difícil ver que aquilo deu nisto, muito difícil. Eu estou tentando procurar um caminho para ajudar, mas confesso que não sei mais como.

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