segunda-feira, 8 de abril de 2019

Zona, zoneamento, IPTU, mobilidade

Zoneamento; se me falassem esta palavra quando era um pré-adolescente provavelmente acharia que era alguma sacanagem ligado a zona, também conhecido entre os puritanos como o bairro das mulheres de vida fácil, seja o que for o que eles consideram vida fácil. Em outras palavras, zona, bordel das putas.
Zoneamento; se me dizem esta palavra hoje vou ligar a zona, bagunça, sacanagem, e creio que não estarei completamente errado. O zoneamento de São Paulo, que deveria ser coisa para lá de séria, é uma zona, todo mundo faz o que quer, e quem discorda recomendo que vá andar um pouco por aí com a lei na mão.

Desde que me conheço por gente sei que os Jardins estão tombados como uso restrito residencial. É mesmo? A av. Europa de fato é residência de carros. Tem um monte de carrão lindo residindo nas lojas. Estranho, mas parecem que estão naquele bairro das putas de Amsterdam; todos dormem sem fechar as cortinas. Não é uma zona? Ou vai ver que mudaram a lei e nem sei. Muda segundo as conveniências ou para acomodar o que não está de acordo. Muda na cidade toda. Foi assim e tristemente assim será.

E aí entra o IPTU, intimamente ligado ao zoneamento, não a realidade da cidade, a sua vida e de seus cidadãos. Zona total.

Outro dia estou subindo a Pedroso Alvarenga e dou com uma nova praça. Não está lá para ficar, é só uma rapidinha, daquelas que você se mete nela, ganha aguinha, sorvete, senta-se nas grandes e confortáveis poltronas, algumas debaixo de guarda-sol, e é convidado por uma das lindas meninas a conhecer o projeto do grandioso Edifício Fasano. Resultado da mudança de Zoneamento, vai subir 40 andares e os privilegiados que pagarem uns tantos milhões, cinco pelo que ouvi, vão ganhar o direito olhar os outros por cima, bem por cima, fazendo sombra a insignificância aos antigos prédios em volta. Também pelo que entendi, a luxúria dos carros como os da av. Europa terá muitas garagens, algumas nos primeiros andares acima do térreo, estacionados atrás de altas e seguras paredes. Paredes na cara vizinhos e passantes. Maravilha da arquitetura moderna. O projeto é fruto do novo zoneamento de São Paulo que permite edifícios deste porte em nome do adensamento populacional e da mobilidade. O corredor de ônibus fica logo ali, a menos de 150 metros, na av. Nove de Julho, passando para servir dignamente moradores dos apartamentos de luxo. Bom, pelo menos o projeto da garagem, cercado de paredes, vai evitar que os carros fiquem empoeirados. Muito inteligente!

Ao lado do edifício Fasano será construído um hotel, provavelmente também Fasano, mais baixo, mas combinando as arquiteturas das garagens. Não sei porque me lembra as construções fortificadas medievais, mas isto não importa. De qualquer forma quem está dentro, está dentro, num luxuoso mundo, quem está fora classe média é, se é que é, este é o sinal que se dá.

Óbvio que a simpática praça e espaço livre para convivência desaparecerão. Mas não se preocupem, o Itaim Bibi vai virar uma zona chique. A Pedroso Alvarenga e a João Cachoeira, hoje já completamente abarrotadas de carros de classe média ficarão mais bonitas cheias de lindos carrões. Isto para chegar até o edifício ou hotel. É óbvio que, pensando no novo zoneamento, seja lá o que isto signifique, os carros ficarão estacionados e moradores e hóspedes do hotel usarão as linhas de ônibus da Nove de Julho, portanto a Bandeira Paulista continuará tão congestionada como está hoje, nem mais, nem menos.

Como ficará o IPTU com a mudança de status do Itaim Bibi? É óbvio que o valor dos imóveis vizinhos do Fasano vai ter uma variação de valor, e então, como fica?

Sentados na agradabilíssima praça provisória um casal falou sobre mobilidade, criar ciclovias em todos cantos... Ciclovias no Itaim Bibi? Hummmm.... Com ou sem patinetes elétricos? Tem hospital nas proximidades?

Não é corredor de ônibus, não é ciclovia, não é metro, é a cidade, é um ser vivo com suas peculiaridades e particularidades. Cidade! Cidadãos! Adensa o que já está entupido; genial!

Jaime Lerner acabou virando umas das referências internacionais sobre organização de cidade pelas diretrizes que deu para Curitiba, uma delas adensar a população nas margens dos corredores de transporte de massa. Deu certo, mas em outra época, nos idos do telefone de baquelite. Em 1983 o então Prefeito Mario Covas começou a implantar os corredores de ônibus seguindo o padrão de Curitiba, mas com a eleição de Jânio Quadros, a partir de 1987 o projeto original foi deixado de lado e os corredores de ônibus viraram uma zona, junto com eles foi-se a reorganização dos bairros em volta. Com a esculhambação importantes avenidas como a Santo Amaro e a Celso Garcia tiveram sua morte decretada, o que aconteceu lenta e dolorosamente.

Zoneamento? Tivemos vários aqui em São Paulo, lindos no papel, só não se pode dizer que não serviram a interesses bem particulares. Jorge Wilheim, um dos que tentou colocar ordem na putaria, disse algo como "quem constrói nossa cidade são as construtoras", e estava absolutamente correto.

Mobilidade e transporte estão intimamente ligados ao zoneamento. Tem que tratar tudo junto porque são indissociáveis. Fez zona num, vira zona noutro; exatamente como acontece hoje. O problema tem sido que a dinâmica da vida na cidade tem engolido os lindos zoneamentos que foram colocados no papel. Como toda zona tem um preço, dá-lhe IPTU. Pau neles! Zona total!

https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2019/02/08/iptu-sao-paulo-aumento-como-reclamar.htm 

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