"Tudo é passageiro.
Expansão urbana, transporte público e o extermínio dos bondes em São Paulo"
de Ayrton Camargo e Silva é leitura obrigatória para quem quer mesmo, de
verdade verdadeira, o bem desta cidade ou de qualquer outra cidade deste país.
Conta a história, deprimente, dos descaminhos e oportunidades perdidas que o
transporte público teve em São Paulo desde os idos de 1800 e bolinha quando
surgiram as primeiras linhas de bondes puxados a burro. Quando os burros de
quatro patas foram tirados de circulação entrou a tropa de burros de duas patas
com suas ideias, empacando aqui e ali, uns para tentar tirar proveito próprio
da situação, outros por que além de burros imbecis, e ai aquilo deu nisto, exatamente
nisto que está ai. É deprimente ver que depois de bem mais de um século de
desacertos continuemos nos enroscando nas mesmas ladainhas, vontades próprias, nos
mesmos desacertos, nas mesmas idiotices: tarifas irreais, interesses mui particulares,
descontinuidade, imprensa despreparada, tendenciosa e muitas vezes medíocre, população
ignorante, depredações, e absoluta falta de um planejamento de longo prazo realista,
sensato, que seja iniciado, seguido e terminado.
"Tudo é passageiro"
é leitura obrigatória principalmente para o ciclista que vê com bons olhos o
que está acontecendo com São Paulo neste exato momento.
Sou um apaixonado por bondes. Sonho um dia ver os
corredores de ônibus serem substituídos por corredores de bondes, em especial o
da av. Santo Amaro, avenida com a qual tive uma relação quase familiar e que
foi estraçalhada junto com a esculhambação do projeto original do seu corredor
de ônibus. Entra o Jânio Quadros e aborta o projeto original do pessoal do
Covas. Jânio por sua vez tenta enterrar a av. Juscelino Kubitschek, já uma via
expressa, formando um boulevard. Entra Luiza Erundina, que por sua vez acha o
projeto de Jânio um erro social e enterra tudo para anos mais tarde considerar
que fez uma burrice sem tamanho. E assim vamos. No meio desta ópera bufa
desafinada onde cada um canta o que bem entende foi-se a única ciclovia que São
Paulo tinha a época. Cá entre nós, não fez qualquer diferença por que a
ciclovia JK não ligava nada a lugar nenhum. O projeto original ligaria o Parque
Ibirapuera à Cidade Universitária, o que nunca saiu do papel por que os
técnicos ficaram loucos com o cruzamento da Ponte Cidade Jardim. Nossa! E ai
continuamos.
Antes do boulevard JK o
Prefeito Figueiredo Ferraz já tinha tentado fazer com que a av. Paulista
tivesse dois níveis, um subterrâneo e expresso, e outro no nível atual, com um
boulevard e trânsito local. É óbvio que não foi para frente por causa de alguns
interesses particulares e uma visão medíocre da população. Ironia do destino da
obra restou os dois quarteirões entre a av. Consolação e rua Haddock Lobo, onde
hoje se encontra a Praça do Ciclista. A Paulista seria melhor com o boulevard
de Figueiredo Ferraz ou como está hoje?
Eu vivi numa São Paulo que
vocês não conseguem fazer ideia do que foi. Maravilhosa, simples, mas
completamente heterogênea, riquíssima, chiquérrima, mágica, viva, muitas
cidades numa única, mágica pura, mas a maioria da população não teve inteligência
para olha-la e entende-la e preferiu sair fazendo tentativas. Deu no que deu.
São Paulo foi linchada por descaminhos e vontades particulares, a maioria
mesquinha, ridícula. "Tudo é passageiro" de Ayrton Camargo e
Silva é um olhar essencial sobre a questão dos transportes em São Paulo, leitura leve e obrigatória para quem
quer de fato lutar para que as coisas melhorem.
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