domingo, 9 de agosto de 2015

Jandir Falzoni e a referência dos pais



O custo da batida do saco contra o quadro da bicicleta seguida da batida do mesmo saco na árvore foi muito além da vergonha de ser devolvido ipsis litteris de saco cheio por Yeda, minha amada mãe substituta, para minha mãe de fato, a santa Lollia. O saco preto do tamanho de uma bola de futebol de salão entre minhas pernas, resultado do acidente de bicicleta descrito neste mesmo blog, felizmente não afetou minhas festas, mas os filhos que sempre quis nunca vieram por mais que eu tenha me divertido. É, nunca tive a chance de entrar em casa, sentar no sofá com cara lavada e dizer “Mãe, não sei como aconteceu, mas ela (namorada) está grávida”. Enfim, não sou pai, pelo menos biológico.
A vida é cheia de ironias e sei lá por que cargas d’água escrevi sobre meu saco cheio justamente agora. Nós temos pais biológicos e outros que não o são (biológicos), mas nem por isto deixam de ser realmente pais. Jandir Falzoni, pai de Henrique, Renata, Roberto e Ricardo, talvez tenha sido o pai mais marcante que eu tenha tido. No mesmo dia que publiquei sobre a dolorosa comédia recebi no fim da noite a notícia que Jandir tinha partido. Não tenho nenhum problema em misturar a partida dele com minha história por que uma das muitas qualidades de Jandir foi exatamente o uso sábio de um inteligente e polido senso de humor. Tenho uma vaga lembrança dele dando bronca em nós, Renata, eu, Roberto e Ricardo, e mesmo nestas broncas havia um tom de “Olha aqui, ou eu faço isto ou sua mãe (a adorável Yeda) me mata, ou nos mata a todos, como queiram; portanto comportem-se”. (Yeda, extremamente inteligente, nunca precisou chegar a tanto para conseguir o que queria.)
Jandir foi minha referência de comportamento leve que um homem deve ter com as mais diversas coisas da vida. Mino Falzoni, primo de Jandir, de quem já falei aqui e outra de minhas melhores referências de vida, um dia teve seu carro roubado de dentro da garagem que ficava exatamente debaixo da janela onde ele dormia. Os ladrões abriram o portão, forçaram o quebra-vento, empurraram o carro para a rua, e ninguém ouviu, nem ele que dormia quase em cima do capo do carro. Quando contou o fato, bravo, muito bravo, eu, criança, estourei na gargalhada como se estivesse ouvindo a história de Jandir. Mino ficou mais bravo ainda e por muito pouco não tomo um safanão. O detalhe é que Jandir teve seu carro roubado algumas vezes e contava o fato de maneira natural, quase que tentando divertir os outros.  Foram dois pais fantásticos, Mino e Jandir. 
Jandir era leve, charmoso, inteligente, ótimo pai, calmo, paciente, coerente. Sua chegada era sempre esperada, principalmente pelos filhos, e confesso que eu partilhava da mesma emoção. Yeda sempre foi de uma sabedoria sem tamanho e provavelmente tenha ajudado a construir a imagem que tenho de Jandir. O fato é que entre os Falzoni sempre me senti mais um filho, gozando de completa segurança e tranquilidade, maravilhosa sensação de paz.
Ser pai é acima de qualquer coisa dar e deixar referências. Peço desculpas a mim mesmo por não ter procurado conversar mais com Jandir e Mino. A Jandir ainda consegui aparecer e dar alguns abraços pelo dia dos pais. Fui um pentelho para Mino, mesmo o adorando, e se ele pudesse provavelmente teria pulado no meu pescoço – e com razão.
Por timidez ou vergonha, não sei bem, tirei pouquíssimo proveito destas oportunidades que a vida me deu. Só posso dizer uma coisa: Idiota!
A bicicleta me tirou a possibilidade de ter filhos biológicos. Tratei de tê-los de outra forma e acho que os tenho por ai. Com sentimento de pai busquei usar o melhor das referências que tive na vida: Jandir, Mino, Murillo meu irmão, alguma coisa de meu pai, de meu avô. É dia dos pais e me atenho aos homens. Mas Jandir foi quem me orientou na busca de um ser leve, charmoso, positivo, que sigo até hoje, mas que meu carácter maltrata. Obrigado Jandir.

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