quinta-feira, 20 de março de 2014

Madri - normal

Pelo meio da praça cheia de crianças, bebes, cachorros, soltos, pais despreocupados, velhos e velhas conversando, alguns sentados outros em pé, alunos de escola ainda vestindo uniformes brincando, cruzam correndo e olhando para trás dois adolescentes rindo. Atrás deles vem um jovem casal, também adolescentes, passo apressado e firme e reclamando. “Vamos falar com a polícia” diz a menina. Ao encontro dos adolescentes que terminaram de cruzar a praça e estão caminhando na rua em frente segue mais um adolescente magro e alto falando, rindo e um tanto preocupado com alguma situação deixada para trás. Ele para, vira e aponta, rindo, para os próprios olhos desafiando alguém que está de olho. Ninguém na praça está preocupado, percebe ou se dá conta da situação. Parecem jovens brincando, como é normal. Os dois adolescentes que passaram correndo voltam ao centro da praça e juntam-se ao que ri e desafia. Conversam um pouco, rindo, e caminham de volta para a rua.
Os três jovens sentados no mesmo banco onde estou param de conversar e passam olhar para a outra rua com uma leve preocupação, o que me faz olhar na mesma direção. Vejo a porta direita de um carro de polícia abrindo e um policial saindo atrás dos três adolescentes. Todos disparam pela rua e lá na frente dobram a esquina. O carro de polícia sai também atrás, sem fazer alarde.
Tudo acontece sem que a vida da praça mude. Não há um sinal sequer de anormalidade. Crianças, bebes e cachorros continuam livres e soltos, os pais despreocupados, velhos e velhas seguem suas conversas, nas bordas da praça muita gente está sentada nas mesas de rua das cervejarias. O pequenino segue girando pela praça com sua bicicleta sem pedais seguido por sua mãe que empurra o carrinho de bebe com sua irmãzinha que dorme. Uma bola cruza o ar e cai mais uma vez dentro do chafariz...
Aqui o normal é normal.
A dois quarteirões dali, a rua principal do bairro, uma avenida estreitada e muito bem reurbanizada, vive a mesma situação de absoluta tranquilidade, com a população desfrutando da vida coletiva na cidade. Os velhos amigos, bem velhos, estão sentados num longo banco que fica entre dois parquinhos de brinquedos para crianças pequenas. Noutro banco em paralelo com a rua está um grupo de cinco adolescentes. Um pouco a frente é um estacionamento de motos e scooters. O trânsito da rua é intenso, assim como o trânsito de pedestres que passam, fazem compras ou buscam um lugar para tomar um café ou uma cerveja sentados nas mesas da calçada. É uma massa de cidadãos felizes aproveitando a vida.
Esta é a Madri dos madrilenos. Sai da Madri para os turistas, que não é só para turistas, mas para todos; e todos a desfrutam por igual. Passei por um longo calçadão comercial. Mistura-se ai de tudo, de distintas senhoras aposentadas a inconfundíveis jovens putas, de blue collars a mendigos, de crianças soltas a ciclistas costurando com certo perigo a multidão. Onde quer que seja, por praticamente toda Madri, multidão. Tranquilos, felizes, vivendo. É normal.

É literalmente deprimente a baixa qualidade de vida que estamos tendo no Brasil. Nossas cidades não merecem ser assim chamadas. São praças de guerra, mesmo nos lugares mais tranquilos, menos violentos. Menos violentos – ridículo, ridículo, ridículo! Anormalidade não é normal.

Nestes anos de economia estabilizada brasileiros viajaram muito para fora. Saem do Brasil e fazem um turismo essencialmente de compras. Paupérrimo, imbecil, mesquinho, inútil, imprestável. A maioria não aprendeu absolutamente nada sobre civilidade. Zero. 

Um comentário:

  1. A D O R EI TEU TEXTO! O final dele entao......infelizmente na maioria das vezes eh a pura verdade. de vez em quando acredito q eh possivel ainda a evolucao de nos seres humanos. Pronto , falei. Ha! beijus e meu café no pedal einh??? Miriam tua amiga anonima; beijus

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