Café expresso com broinha de
milho, receita moderna da política do café com leite. As broas mineiras são mais
airosas e saborosas que esta aqui industrializada, mas o café mineiro, aguado, continua
sendo um horror. Faz mais de 30 anos, não existia café expresso, pelo menos
aqui no Brasil, e o café de coador, bem passado e forte, era bem saboreado. Tínhamos
tempo e calma suficiente para parar na mesa de casa ou na padaria para ver o
vapor subindo, sentir o aroma, olhar a broa crescendo no forno e conversar,
conversar e pensar...
Um dia entramos, eu e tio Renato
(Brandão), uma figura especial à beira do limite da normalidade, na padaria da
rua principal de Cambuquira, Circuito das Águas e Sul de Minas, e demos no
canto a direita com uma mesa cheia de fazendeiros conversando. Ao ver tio
Renato chegar um deles foi logo chamando e perguntado: “Ô Renato, meu caro, o
que você acha? Mantemos os cafezais ou mandamos tudo para o chão? Plantamos café
novo outra coisa?”. Na época as fazendas de café da região produziam um café de
baixa qualidade e cada dia menos rentável. Tio Renato era conhecido e tido com
algum respeito na região por que havia começado uma granja modelo de porcos com
procedimentos de qualidade desconhecidos então, o que assustava a mineirada cabocla
tranquila ainda perdida no passado. A resposta, detalhista, típica de quem sabe
que é socialmente chato, mas respeitado por ter boa informação, terminou com um
“....Por tudo isto, derruba tudo e planta café da mais alta qualidade”. A expressão de todos, mesmo os que até então
não tinham levantado o rosto da mesa e xicara de café ralo e frio, foi forte,
decisiva. Sei que tio Renato não foi a palavra final, mas também sei que dali,
daquela mesa com os principais fazendeiros de café da região, incluindo da
cidade vizinha Três Corações, teve origem o ótimo pó de café que acabou de
fazer o delicioso expresso que acabo de tomar.
Na época ainda circulavam os últimos
velhos, lentos, poluentes, barulhentos e muito fortes FNM (Fábrica Nacional de
Motores), os primeiros caminhões nacionais, conhecidos como “fenemê”. O Brasil
era outro, muito menor, infinitamente mais tranquilo, mais lento. Mesmo assim a
Rodovia Regis Bittencourt já era um perigo e um problema, principalmente nas
serras. Já se falava na sua duplicação, na necessidade de redução dos acidentes,
na maior rapidez da viagem, na importância vital desta ligação rodoviária entre
a Região Sul e a Sudeste, as propulsoras da economia nacional.
Nestes 40 anos a estrada foi
recebendo alguns melhoramentos, mas a Serra do Cafezal continuou igual com
todos seus problemas, desastres, estrangulamento de trânsito, lentidão... Principalmente
por causa deste trecho a Regis é conhecida com “Estrada da Morte”. Foram
inúmeras as razões para que o problema não tenha sido resolvido, principalmente
a questão ambiental, mas o Brasil cresceu muito e junto com ele a importância estratégica
da Regis. Só agora está sendo feito a duplicação da pista na Serra do Cafezal.
Quando ficar pronta vai ser um imenso progresso, mas provavelmente a obra já vá
ser entregue aquém da demanda... Mas não este não é o ponto.
Qualquer que tenha sido a razão, a
Serra do Cafezal é prova inequívoca que vivemos num país que não tem futuro. Estes
estúpidos 19 km devem ter representado uma perda para o país, portanto todos
nós, quase imensurável em todos aspectos, do econômico ao ambiental, da erradicação
da pobreza ao passo seguro para o futuro. A Serra do Cafezal é prova de nossa
falta de inteligência e capacidade de realizar. Em 30 anos teria sido possível
abrir tuneis a mão, com inchadas, pás e burros de carga. Ou, se houvesse menos indolência
e desinteresse, teríamos pensado e realizado alguma solução. Nada,
absolutamente nada, além de atraso e mortes, uma atrás da outra, sempre.
Ontem demorei 9 horas de Curitiba
a São Paulo, sendo 3 horas para cruzar a Serra do Cafezal. Ou seja, numa mula
teria sido mais rápido, menos custoso, mais eficiente. Dentro do confortável ônibus,
vendo um filme colocado para acalmar ânimos, me senti mais uma vez envergonhado
com meus silêncios. Como poderia ter lutado para que esta estupidez já tivesse
sido resolvida?
Olá Arturo!
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Abs