Bateram os três cafés
com leite e as médias com manteiga no balcão. A conversa era esparsa e trivial;
frio, névoa, acordamos cedo, o bêbado voltando para casa...,como se fosse
importante desviar da conversa o longo dia de pedal que teríamos pela frente. Cristina
deu as costas e foi ao banheiro e Zé olhou um pouco mais sério, mas com seu
sorriso incessante, e só ai perguntou “falta muito?”. Brinquei com ele, dos
três o que menos prática tinha com bicicleta, se a Cristina estava indo muito
rápido. Ele de uma risada alta e silenciou. Sacanagem minha.
O primeiro trecho da
viajem sempre é o mais duro. O corpo ainda não está no espírito da longa
pedalada. As pernas demoram a soltar para conseguir despistar a pesada ansiedade.
Um pouco mais para frente, já em forma, o selim se faz presente. Esquecemos
dele quando o rebolado cansar. E mais uma dezena que quilómetros a viagem
realmente começa a mostrar seus plenos prazeres. O voo da bicicleta pelo asfalto
liso vai engolindo a paisagem cada momento mais leve e bucólica, a diminuição
do barulho dos carros, caminhões e ônibus que passam, e a leveza de espírito finalmente
toma conta do ciclista. Pelo menos dos experientes. É um pouco sofrido para os
novatos, mas o prazer da descoberta apaga o resto.
Cristina pedala com a
leveza de uma menina, que então é. Alta, magra, bela e imponente, perfeitamente
encaixada na bicicleta, com uma cadência de pedal quase perfeita, posso vê-la à
frente com sua cintura fina e cabelos lisos e longos ao vento. É a pincelada
final daquela paisagem. Lá no começo da estrada fiz o erro de colocar meu ritmo
para todos e cansei o Zé desnecessariamente. estamos no ritmo de Cristina, bem
mais tranquilo, mas Zé vem atrás, perto, e só sorri quando vê que estou olhando
para trás com certa preocupação.
“Esta bicicleta é
mais pesada que a sua”, diz Zé para mim. “São idênticas”. “Então são estas
subidas”, replica ele rindo. Um pouco mais a frente cruzamos com uma família
inteira numa bicicleta vindo de frente. O pai pedala com uma filha de uns seis
anos entre as pernas, a mãe está sentada no bagageiro com uma criança de colo
nos braços. Estamos todos sozinhos na estrada e é possível ouvir o rodar dos
pneus grossos da bicicleta da família terminando a descida e iniciando a
subida. Eu chamo a atenção de Zé e Cristina para a cena. Zé está emparelhado
comigo. Olha o pai iniciando a longa subida sem sequer mexer o tronco. Pedala o
peso da bicicleta e de toda família com as pernas sem reclamar. Torcemos o
pescoço para acompanhar a longa subida que é feita no mesmo ritmo e sem parar. Agora
estamos nós subindo. Zé olha para mim e como sempre sorri, praticamente ri. “Este
cara está de brincadeira comigo. Foi você que mandou ele passar por nós. Não
reclamo de mais nada”. Caímos na gargalhada e seguimos em frente. Cristina
segue na frente quase impassível. Nosso caminho ainda é longo.
Olá Arturo, tudo bem?
ResponderExcluirComecei a acompanhar seu blog, que é muito interessante, pois sou estudante de Ciências Sociais na UFRGS e estou fazendo meu TCC sobre o uso de bicicletas em Porto Alegre, que felizmente a cada dia aumenta mais, bem como tudo o que envolve seu uso, implantação de novas ciclovias, estações de aluguel de bicicletas, aumento na participação das pessoas nos passeios ciclísticos e movimentos cicloativistas, utilização da bicicleta como meio de locomoção ao trabalho.. abraços
Danielle, boa tarde. Precisando de algo me escreve, mas no arturoalcorta@uol.com.br
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