sábado, 9 de maio de 2015

Doença do lixo

Almoço todos dias num restaurante por quilo vizinho a minha casa. É bem possível que alguns frequentadores acreditem que sou um dos proprietários do restaurante por que sempre estou retirando das mesas os pratos sujos deixados para trás. Eu não consigo almoçar no meio de restos, vai além de minhas forças. Também não consigo aceitar que se deixe para o próximo uma mesa suja. Mas a pior situação, a que mais me enoja, são as pessoas que sentam à mesa, empurram para o lado a sujeira deixado por outros e almoçam no meio de restos. Literalmente coisa de porco de lixão de periferia.
Não tenho a mais remota vergonha de limpar as mesas ao meu redor antes de sentar e comer em paz. Como não tenho a mais remota vergonha de pegar lixo jogado nas ruas e colocar nas lixeiras. Tenho como meta no mínimo catar e jogar no lixo alguma coisa a cada vez que vou para a rua. Infelizmente tenho que me refrear ou vou ficar doente. A verdade é que já estou. Vejo isto nos olhos dos outros. É simples: numa sociedade que aceita com tanta facilidade a imundice ter preocupação com um grau mínimo de limpeza é doentio. Estou doente e, pior ainda, me orgulho de sê-lo.  
É incrível como brasileiro não consegue aprender absolutamente nada em suas viagens para o primeiro mundo. Este é meu ponto de vista e novamente devo estar errado. Brasileiro aprende muito: descobre onde estão os melhores outlets e volta cheio de compras para esfregar as compras de marcas com preços baratos na cara dos amigos, vizinhos, família e inimigos, não necessariamente nesta ordem. Melhora a aceitação social, é o que importa. Se passarem por trezentas cidades em dez dias melhor ainda, por que conheceram o mundo. Mais status.
O que importa é o que é meu. Mesmo na mais degradada das favelas o interior dos barracos, por mais pobre que seja, é primorosamente bem cuidado. Brasileiro sabe o que é limpeza e ordem, tem profundo orgulho de seu progresso. Falei de favela, mas mesmo nos melhores bairros do país a rua, o espaço público, vira terra de ninguém. Os empregados devem varrer e manter impecável a frente da casa; já o terreno baldio do outro lado da rua que fique com mato e cheio de entulho.
Muitos de meus amigos, gente instruída e do bem, uma das elites brasileiras, aceitam e até defendem o lixo de sistema cicloviário que se está implantando aqui em São Paulo. A quantidade de incoerências, desacertos, defeitos e problemas é tão grande que só e pode chamar de lixo. Muitos deles já são bem viajados, mas pelo jeito fazem uma grande diferença entre lá e cá, aceitando que cá vale qualquer coisa, afinal somos ricos, tem dinheiro sobrando, se tiver que refazer no futuro que se refaça. Até o professor doutor Paulo Saldiva, uma das melhores cabeças pensantes deste país, disse algo como ‘que se tudo tem problema por que as ciclovias não podem ter problemas?’.
Eu estou doente, por isto estou distante do pessoal. Vai que eu contamine alguém!

Um comentário:

  1. Bom dia Sr. Arturo...

    Aqui no Grande ABC próximo de casa uns 1000 metros tem um restaurante de bairro que possui uma placa bem clara na entrada: "- Não desperdice! Pratos com desperdício na devolução terão taxa adicional..."

    Eu não sei se isso é legal, mas funciona! Pois ao fim da alimentação, as pessoas coletam seu prato e entregam no local correto da devolução sem desperdício (não dá pra adivinhar se é por educação ou por medo de pagar a tal "taxa adicional" na saída)... mas parece bem razoável, assim por ser um restaurante familiar pequeno de bairro com mulher, esposo e filha trabalhando, percebe-se que há movimento intenso e as 10 mesas/40 cadeiras estão sempre limpas... só compartilhei o fato, pois reclamar de tudo e todos é comum no Brasil... mas sugerir soluções práticas é raro!

    cicloabraços do admirador de seus textos - joaozinho

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