"Não entendo porque ele (ou ela) é assim?"
As causas são inúmeras, por diversas razões ambientais, sociais e clínicas. Na maioria dos casos não interessa para a maioria ir fundo, saber por que ele ou ela é assim, mas optar como vai lidar da forma mais simples com o resultado final, com o que está a frente, ou, com quem se diz que a pessoa é. Mas quem de fato é a pessoa?
Eu fiz erros pela vida que me arrependo muito. E fizeram erros comigo. A vida é assim, mas poderia ser menos errática.
Pego meu caso como exemplo. Quem me conhece sabe que eu tenho uma boa dose de imprevisibilidade (tem gente que vai rir sobre esta minha afirmação. "Dose de imprevisibilidade?"). Mas por que a imprevisibilidade?
No pré primário tive minha primeira suspensão. Quando terminei o ginásio (acho que hoje é o 8º ano) já contava com 21 suspensões e três expulsões. Aí fui parar num colégio que aceitava alunos problemáticos e dele passei para um colégio de educação experimental. Nestes colégios e na faculdade não tive problema com a disciplina. Mas por que?
Meus problemas disciplinares foram consequência da minha hipo-hiper glicêmia, TDAH e mais outras cositas mas. Detalhe: nenhuma delas era ou conhecida ou bem definida no campo clínico em meu tempo de estudante. Nos colégios onde a disciplina era mais relaxada e menos fincada em besteiras, eu fui bem. Hoje não se tem mais dúvida que o comportamento tem muito a ver com meio ambiente.
Desconhecimento, hábitos sociais, falta de flexibilidade.
- Hiper-hipo glicêmico? Isto não existe! Aqui começa uma outra confusão.
Já ouvi esta afirmação de médicos, num farto plural. E também ouvi de várias enfermeiras de PA, pronto atendimento, emergência, que não só existe, como muitos médicos nunca viram um paciente em crise ou sequer ouviram falar de hipo-hiper glicemia. Para muitos o caso não existe, simples assim.
O que é hipo-hiper glicêmia? Uma curva glicêmica em zig-zag que faz o sujeito viver aos trancos, além das mudanças muito rápidas de humor, em outras palavras, os estouros. Até hoje. Nicas a ver com bipolaridade.
Aliás, como detalhe, mudaram as definições e a nomenclatura não só da diabetes, como até de partes humanas, mudou, então não sei mais quem ou o que sou. Roubaram minhas tíbias, agora tenho perônios. E aí vai.
Hoje há uma discussão sobre como lidar com pessoas fora do comum, incluindo autistas. A bem da verdade, a sociedade saiu de um não fazer ideia do que se tratava, para uma discussão maluca sobre o que fazer com eles.
A medicina saiu das garras da santíssima igreja e dos bons costumes sociais para cair no labirinto do politicamente correto e juridicamente seguro. Não resta dúvida que avançamos muito, mas... ainda tem muita confusão.
Lá pelos anos 60, quando tive minha primeira crise glicêmica grave, me passearam pela epilepsia, esquizofrenia, e sei lá mais o que. E, o pior, muito pior, fui filho de desquitada e neto de importante educador que pregava respeito aos alunos.
Felizmente minha infancia foi nos anos 50 e 60. Pense bem, se eu tivesse vivido na época da Santa Inquisição provavelmente teria terminado torturado para confessar o diabo e queimado vivo para pagar meus pecados. Não que depois da minha primeira crise não tivesse quem quisesse fazer um exorcismo básico em mim.
De lá para cá as mudanças foram imensas. Ficando nos diabéticos, ninguem da geração de meus avós e para trás sabia ao certo o que tinham, aliás, se eram diabéticos. Não havia conhecimento, nem tecnologia para tanto.
Quando se trata de doenças mentais ou neurológicas, falta muito para se chegar a uma cura, mas já não se trata mais destes casos com o grau de obscurantismo do passado. Via de regra já se sabe sobre o que se trata, e em vários casos há tratamento indicado, mas a maioria dos pacientes continua sofrendo tanto pela falta de tratamento quanto muito mais pela discriminação social.
Não me lembro se na minha época ainda falavam sobre lobotomia, mas lembro que aprendi o que era, portanto deveria ser praticada. Lobotomia? Sim, uma discreta técnica cirúrgica para casos graves de alteração de comportamento, onde se abria um buraco na cabeça, a seco, sem anestesia, e se retirava parte do cérebro para acalmar o bicho, digo, paciente. Tive sorte, desta escapei. Bom, se me tivessem lobotizado teriam encontrado muita merda.
Era estranho? Faz umas coisas esquezitas? "Nossa! É um perigo para a sociedade! Manda para o hospício!". O que? está pensando que é brincadeira minha? Não é. Um primo meu passou por esta, fora conhecidos, vários. Tá achando que pirei? Uai, hoje não se cancela? Só parece menos traumático, mas os dramáticos resultados estão aí para quem quiser ver. De qualquer forma é bem mais barato. Você sabe quanto custa internar alguém? Se não sabe, não procure, é um tremendo busines, vai que você só por perguntar acabe lá e de lá não sai mais.
Medicina é uma ciência em aberto. Tem muita coisa que é conhecida, sabe-se como tratar com um bom grau de segurança, mas todas os novos conhecimentos e as novas tecnologias deixam em aberto novas possibilidades de cura. Espero que cheguem rápido.
Já os maus da sociedade, o que dizer?
Tanto a medicina, quanto a sociedade, tem, ou temem, limites estabelecidos pela lei. Óbvio que em vários sentidos a santa inquizição ainda está nos assombrando. Médicos não arriscam, a sociedade segue seu rumo na manada, uma hora desembestada atrás das bestas do apocalípse, outra desembestada atrás das palavras que parecem bondosas, os milagres que estão em todas partes. Os diferentes que saiam da frente. "O que é estranho da medo e deve ser evitado", dizem. A vida é assim.
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