Solidão e solitude.
Está chegando aquele momento do ano no qual as pessoas em festa se dividem entrem "eu sou o último biscoito do pacote" e as que gostariam que a reunião fosse de família, coletiva. É também o momento que a divisão entre servidos e serviçais se escancara. É quando filhos turistas (bem brasileiros, que foram ou não foram à Disney) imaginam ou tem certeza que seus avos, pais, mães, tios e tias, têm cara ou são a definitiva encarnação do Pateta ou Clarabela. Também podem acreditar que a estes mesmos, avos, pais, mães, tios e tias, fazem parte do banco imobiliário, aquele jogo de tabuleiro, mas aqui como banco, literalmente, e imobiliária, literalmente, ou seja, que tem obrigação de fornecer o melhor da casa e comida, e ai se não oferecerem!
Enfim, chegaram o Natal, a festa imposta para aqueles que tem a síndrome do selfie com certeza que é o último biscoito do pacote (abundado no sofá). Os servicais que sirvam, incluindo a avó.
Poderia, ou deveria, continuar a descrever tipos que estarão presentes nas comemorações deste e de todos Natais. Este chega a galopes. O ano se foi, acabou 2024, ninguém sabe, ninguém viu.
Não, não são só os meus que quero aqui descrever. Em todo o planeta Cristão estarão presentes familiares e amigos que tem ojeriza a qualquer esforço que não seja ficar sentado, quanto mais dizer a pratos e copos sujos, a chegar perto da cozinha, esticar a mão para o próximo. Também estarão presentes aqueles mais novos, a geração eu, que educadamente em sua infância ou adolescência se recusam a ceder uma cadeira para os mais velhos. Sim, não, ahmmm? respostas ou não respostas de uma inteligência suprema, mais, sem tirar o olho da telinha.
Ah! Sim! Ou não! Sei lá. Pelo menos em casa parece que conseguimos controlar os malucos que adoram política. Se começam, logo se coloca um freio.
A ceia de Natal de um amigo terminou com o peru voando pela sala como bala de bazuca contra seu inimigo. Como ele contou as gargalhadas, e já estava preste a ter um ataque cardíaco com a história, acabei não sabendo se o tiro foi disparado por um fascista ou comunista. A comemoração só não acabou porque a mira estava errada, o atacado conseguiu desviar a cabeça e o peru encaixou-se no meio da árvore de Natal iluminada. Um tio bem humorado e completamente bebado foi lá, arrancou a coxa gorda e engordurada e saiu comendo lambusado pela sala. Peru resgatado, colocado de novo sobre a rica mesa, e fatiado para a felicidade de todos... e para calar a boca dos dois imbecis que envergonhados pararam de urrar.
Enfim, lá vem o Natal. FELIZ NATAL
Cansei de ver a matriarca da família sendo usada como eletrodoméstico. A gota d'água foi um almoço de boas vindas no qual uma das convivas que além de ter problemas para levantar a bunda da cadeira, foi atrás da serviçal matriarca reclamar que não estava sendo bem servida. Gota d'água porra nenhuma! Foi um balde de gelo, pedra de gelo, iceberg na cabeça. Na hora deixei passar, mas uns dias depois, mais calmo, mandei mensagem bem pensada, medindo bem as palavras, lembrando a todos que, mais do que matriarca, era ela quem havia sustentado e continuava sustentado toda tropa, além disto já se encontrava na melhor idade. "Melhor idade é sacanagem, é a pqp!" responderia ela, ofensa para quem ainda não pode deixar de trabalhar. Ok, lembrei a todos os abundados do dito almoço que a eletrodoméstico em questão já se encontra vizinha dos 80, e que levassem em consideração este pequeno detalhe. "Não seria justo que a esta altura da vida, depois de tudo que fez por vocês, em vez de servir fosse servida?" Acreditem se quiser, tomei uma cortada em minha mensagem. Aí explodi, o que foi considerado um exagero minha parte.
Com tristeza e ao mesmo tempo aliviado, avisei que deste Natal estou fora, ou, como disse, "o mordomo, empregado doméstico, ou ainda e também o eletrodoméstico, pede demissão irrevogável".
Antes só que...
A verdade é que não consigo mais estar presente para ver abusos de filhos e netos turistas. "É adolescência", ouço como resposta, e não aceito, não consigo aceitar. Aí digo eu: "adolescência a PQP!". Sou bem viajado e afirmo com todas as letras que nossos pimpelhos são muito mal educados. Aliás, não preciso eu dizer isto, basta ler artigos e mais artigos, e mais artigos de epecialistas que dizem e confirmam a mesma coisa. Temos uma geração "o outro que se foda" e achamos normal, até mesmo no Natal.
Filho turista foi uma expressão que ouvi numa entrevista e que define aquele filho que usa a casa dos pais como se fosse um hotel. Está lá para ser servido e ponto final, e ai se tudo não estiver do jeito que ele gosta. É o que mais tem nesta nossa classe média vai ao paraíso.
Estou muito mais leve. Uma das situações que fiquei livre, e não tem nada a ver com a tropa do dito almoço, nem com Natal, foi deixar ouvir o senhorio enfiar o dedo na campainha eletrônica que disparava um dim dom altíssimo chamando a senhora que passou a vida lá servindo exemplarmente. Não era um sininho ou algo que chamasse com respeito, mas um dim dom altíssimo, desagradável até para os convivas que estavam lá visitando do senhorio. O senhorio se foi, felizmente. A campainha continua lá. O que vocês sugerem que eu faça com ela? Minha ideia é quebrá-la a porretadas. O que vocês acham?
Tudo começa dentro de casa. Em nossa cultura o Natal é (ou deveria ser) a reunião de família onde todos se abraçam (ou deveriam se abraçar) em nome de um começo ou recomeço de esperança, paz e amor.
Feliz Natal a todos.
Precisando, me chamem que vou ajudar.
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