segunda-feira, 4 de março de 2013

8.666

Para quem não sabe, 8.666 é o número da Lei de Licitação em vigor no Brasil. Costumamos dizer que é a lei do infinito (8) apocalipse (666), uma brincadeira que está muito próxima da mais pura verdade.

A lei 8.666 foi criada na melhor das intensão e tem por princípio que as licitações devem ter como prioridade o menor preço. Qualidade fica em segundo lugar, mas com uma série de instrumentos de controle. Instrumentos de controle? No Brasil, principalmente no Brasil atual? Piada! Não funciona! O resultado é o que se vê por ai, em todas as partes: péssima qualidade, tudo desfazendo rapidamente, perdas imensas, impossibilidade de bom uso; problemas com transporte, saúde, educação, serviços públicos de toda ordem... Um lixo.
Mesmo quem sempre defendeu esta Lei de Licitação está mudando o discurso. A boa intensão não funciona, nunca funcionou, é um desastre. O Brasil empobreceu muito depois dela. Vale para tudo, da compra de papel a construção dos estádios da copa, da falta de papel higiênico nos aeroportos a ambulância do SAMU quebrada.

Um dos problemas para a lei 8.666 não dar certo é a baixíssima qualidade do trabalho prestado pela grande maioria dos brasileiros, tanto na habilidade específica, quanto no caráter. O prazer, correção e a honra do trabalho estão hoje passados.
Infelizmente tive que fazer uma obra de reforma de um banheiro. Quem já teve a experiência sabe do que estou falando. A obra que deveria estar pronta em 15 dias, ficou em quase 3 meses; o horário de trabalho deveria ser de 8 horas diárias, mas o pessoal, quando vinha, chegava lá pelas 10 h e ia embora lá pelas 15 h antes do trânsito. Obviamente paravam para almoço. paravam por falta de material (não pedido). Obviamente estouraram um cano, encheram de água; deixaram a obra inacabada, com problemas de acabamento, limpeza, mal funcionamento, esgoto entupido por uma palha de aço jogada na privada, os outros cômodos sujos, paredes com mãos, móveis manchados... Fizeram, refizeram para corrigir o erro... Desapareceram ferramentas minhas, algumas vistas nas mãos deles, apesar de meu pedido para não toca-las. Um quarto fechado a chave foi aberto e revirado, roupas desapareceram, um brinquedo raro foi quebrado... Custou umas 3 vezes o previsto, sendo que boa parte do custo foi para pagar erros básicos e estúpidos dos próprios trabalhadores... Não deveria reclamar por que não foge a regra do que contam amigos que trabalham na construção civil, ou mesmo do que vi na reforma das ruas de meu bairro.


Bernardo, ótimo ciclista, preocupado com a qualidade, faz mecânica e manutenção de suas bicicletas em casa por que praticamente não há mecânicos de qualidade no mercado. E a situação só piora. Não é só nas bicicletarias, mas na maioria dos setores, públicos e privados, a qualidade da mão de obra só piora. Mas porque acontece isto?
Olho para o que aconteceu em meu banheiro e para minha vivência com a Argentina, junto os dois e tenho uma teoria, senão uma certeza: o problema é o caráter coletivo no ar, desintegrado por este populismo barato e extremamente perigoso.

Continuo buscando resposta e olho mais longe, para o Brasil de “antes”. Sempre tivemos um problemão de educação formal, escola, mas também sempre tivemos uma mão de obra que se esforçava muito para trabalhar direito, para crescer, progredir. Progredir! E construímos um país. Não se pode negar que naqueles tempos, do antes, construímos um país, andamos para frente, que as coisas que foram feitas naquela época duravam. Havia muitos e graves problemas, mas aos poucos fomos para frente.
O desrespeito que o trabalhador (?) tem pelo trabalho é notável. Trabalho hoje é quanto e ponto. Perdeu-se a noção de trabalho ligado a honra, a uma obra, ao futuro coletivo. Eu sou pobre e tenho direito vem em primeiro e disparado no frente.

Infelizmente poucos que creem na construção de um Brasil justo falam sobre a importância da qualidade, que só é construída sobre os pilares da boa educação e principalmente de bons valores sociais. Infelizmente socialistas e comunistas de plantão ou ocasião, como os de hoje, se esquecem que o justo objetivo só é alcançável dentro da coletividade e honestidade. Coletividade significa todos, sem distinção. O que temos hoje são aproveitadores que estimulam o consumismo e individualismo exacerbado em troca de votos para a permanência no poder. Nesta condição é impossível fazer valer algumas leis bem intencionadas. Lembre-se disto quando passar por aquele defeito na ciclovia recém construída.

Vale a pena ver a fala do Alexandre Garcia no Bom Dia Brasil de 04 de Maço de 2013: http://globotv.globo.com/rede-globo/bom-dia-brasil/v/alexandre-garcia-questiona-a-ma-qualidade-das-estradas-brasileiras/2438901/

E o texto de Renato Janine Ribeiro, “Ciclistas apoiam a democracia?”, publicado no Valor Econômico também de 04 de Março de 2013: http://www.valor.com.br/politica/3029706/ciclistas-apoiam-democracia#ixzz2MZu3JCWa

2 comentários:

  1. Arturo, belo post. Essa república das banânias estão falidas tanto moralmente como funcionalmente. Hoje morreu mais um, o Hugo Chavez, que ótimo para a humanidade. Faltam o Maduro e outros ditadores terem o mesmo fim. O pior é que o Lula se tivesse poder suficiente faria o mesmo.
    É tudo muito triste, mas graças a Deus não dependemos diretamente dessa gentalha. Vamos vivendo como dá. Abração

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  2. Arturo,

    Ótimo post. Concordo com o Luiz, sobre a grande ilusão que está sendo promovido neste país. Há dez anos atrás ainda se falava em qualidade, por causa da globalização, Brasil em busca de mercados, etc. Hoje, o importante é ter carteira assinada, e se trucida os empresários, com essa legislação trabalhista absurda. Há dez anos atrás se falava em reforma trabalhista, hoje no entanto, pôs-se mordaça nisto.
    Em casa aqui aconteceu a mesma coisa, sumiram algumas das minhas ferramentas, fizeram trabalho razoável, mas que preciso fazer alguns ajustes. O que entendo da situação é que a construção civil está absorvendo muita mão-de-obra, e o que está no mercado para nos atender, ou é pessoal que tem algum problema, ou tem falta de sorte. Como disse, carteira assinada é importante hoje em dia, empreitada individual, como são os que pagamos por empreitada, passam por problemas, e, na cabeça deles a situação é temporária, até arranjar algo mais estável, como construção civil.
    Bem, em relação a qualidade, temos que também mostrar qualidade na hora de negociar o trabalho e no pagamento. Se fazemos também nas coxas, o desempenho deles também sofre. Conheci um gestor de projetos que desenhou todas as tarefas e atrelados a entrega, com verificação da qualidade, faz-se o pagamento.
    Teve sucesso, mas claro, com muita reclamação do empreendedor. :-).
    Este tópico me lembra do seu artigo, "Pelo menos fez algo." (http://www.viaciclo.org.br/portal/artigos/99-artigos/370-fez-algo), em relação a serviço público. O problema é como controlar a execução da obra, ou os serviços. Na verdade, a grande parte da população, e nós mesmos, não fazemos este acompanhamento. Nós nos omitimos desta tarefa, recusamos em participar de obras públicas. Depois que fica pronto e fica uma porcaria, ficamos apontando o dedo e dizendo "Eu não te disse ? Político são corruptos."
    Bem, concluindo, nós também temos culpa na história ( calhou o significado e a grafia :-)), porque somos omissos, não colaboramos e participamos, o que nos torna um tanto hipócritas. Tem os ferramentas para denunciar, como SAC, 156, CET, 1188, ouvidoria, etc ... Digamos que alguns destes canais são um S***, mas tem muitos destes serviços destes canais que funciona. Então temos que usar estes canais para de certa forma atuar, acompanhar e participar da vida pública. Os franceses tem razão em falar que nós não somos um país sério, porque se fóssemos, tivessemos esta qualidade, estariamos sendo admirados, não ridicularizado. Vindo de um país que fez uma revolução que lutaram para dar certo, é de certa forma um atestado da nossa qualidade como nação.
    Então Arturo, há caminho sim, mas se não formos no caminho certo, cada um, e uma grande parte da população esclarecida, não haverá como endireitar este país.

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