quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Direito de pensar - presidiários

Charles Darwin e seu tratado em livro “A origem das espécies” nos remete àquela imagem clássica do chipanzé que transforma num macaco semi ereto, que tem a frente um homem peludo, que finalmente se transforma no homem ideal de nossos dias, completamente ereto, sem barriga, jovem e forte. Associamos automaticamente a evolução de nossa espécie como sendo corpórea, como fosse de uma casca. Quando eu era criança, faz muito tempo, lá pelos anos 50 e 60, sob a influência da santa Igreja (santa com minúscula mesmo), a moralidade impunha tamanhos limites ao pensar que até mesmo Darwin ainda era questionado. Ok, não mudou muito, porque em várias partes dos Estados Unidos há grupos religiosos que questionam esta definição científica. Para eles somos produtos de Deus e ponto. Adão e Eva e estas coisas. O homem foi criado a semelhança de Deus e não houve evolução. Adão teria sido Tom Cruise ou Tom Hanks? Talvez Tom Jones? Tem algum “Tom” loiro que possa ser incluído? Fica a escolha da seita religiosa.

Meu pai tem uma definição interessante para o celebro. Diz ele que o celebro é como um músculo, que quanto mais treinado, mais em forma fica. Eu entendo a explicação dele como fosse um conjunto de grupos musculares. Da mesma forma que o corpo humano se reestruturou para os novos usos que a ele foram impostos, nosso cérebro também o fez e segue fazendo a cada segundo. Quem anda muito a pé descalço tem os pés completamente diferente de quem usa sapatos, que também é diferente de quem usa tênis ou botas. As pinturas de Portinare, principalmente a série plantadores de café, mostram pés imensos, grossos, espalmados, que sempre achei que fosse uma figura de linguagem do pintor, mas é uma expressão quase exata da realidade. Pés, como qualquer outra parte do corpo, incluindo cérebro e sistema nervoso, mudam conforme a necessidade. Mas normalmente vemos a casca, não o sistema completo, as relações, o micro e macro juntos. Darwin!

Infelizmente e vergonhosamente considero que li muito pouco na vida. Não tenho condição de fazer, através da literatura, uma análise sobre a evolução do funcionamento dos neurônios, não só no sentido do pensamento em si, da Inteligência emocional e racional, mas também e principalmente em relação à evolução da inteligência neurológica. Como jogaria Pelé e Garrincha como toda esta medicina esportiva que um Ronaldo teve a disposição. Qual a diferença neurológica entre os corpos da década de 50, 60 e os de hoje? Exemplo fácil: porque minha geração não consegue digitar ou jogar games como esta molecada? Ver um Leandro “teclando” mensagens ao celular para mim é fascinante e frustrante. Nossa diferença é só treinamento ou houve uma evolução neurológica da espécie nestes 30 anos? Eu não tenho a nítida sensação que o histórico psico-neurológico-social pode ser percebido de grupo social para grupo social.

Brasil foi e segue sendo o país das capitanias hereditárias. “Sabe com quem está falando?” E Turquia foi e de alguma forma segue tendo influências do Sultanato. “Fé em Deus e pé na tábua”, diz o título do livro de Roberto DaMatta. Como ele mesmo disse em entrevista “trânsito é o melhor reflexo de uma sociedade”. Motoristas sempre deixam claro seu histórico psico-social, portanto também neuro-social. É como o dedo mínimo estendido na hora de tomar café. Ou o gestual delicado das japonesas, a sensualidade caminhante das africanas, o reger a orquestra da conversa italiana, e assim vai. Como será estruturada estas diferenças esquelética / muscular / neurológica? Como entra Darwin ai? Aqui em Istanbul é assustador ver como os motoristas deixam o carro ir para cima do pedestre. Paulistano não sabe reduzir a velocidade porque não sabe frear. O motorista de Istanbul dá a sensação que sabe o que está fazendo, mas me pergunto se eles têm os reflexos condicionados para tempo tão baixo de reação? Eles deixam o pedestre passar, mas abrem caminho com o carro como fossem pedestres vestidos de automóvel. Na periferia de São Paulo fica claro que o problema é falta de treinamento ou de passado automobilístico. Aqui em Istanbul..., não sei. Pensando bem, aqui em Istanbul o trânsito é uma baderna generalizada. Nós, paulistanos, ou brasileiros no geral, somos muito mais civilizados. Eu gostaria de fazer uma conexão entre o que eles são como motoristas hoje e sua história de civilização. Interessante é que depois de 5 dias não ouvi sequer uma sirene de ambulância passar.

Zumbi, meu pequeno poodle preto, está aos poucos ficando sego. Preciso buscar informações sobre treinamento porque ele está cada dia mais inseguro e angustiado. Quero entender como funciona o processo da cegueira para desarmar os condicionamentos estabelecidos pela visão, onipotentes e onipresentes, que continuam servindo de parâmetro para a sua nova vida de sego. Talvez o primeiro passo seja fazer a experiência de ir pessoalmente para as ruas com olhos completamente vendados. Somos todos prisioneiros de nossos próprios olhos, principalmente nesta sociedade agressivamente visual de hoje. Somos prisioneiros de vícios neurológicos estabelecidos por várias gerações de nossa própria família e sociedade, e atualmente pela sociedade industrial. Inegável que há uma doutrinação neurológica, presente no dia a dia. De outra forma não haveria padronização, que é a base da produção em massa. Acredito que deva nos limitas a evolução. Canhotos conseguem sentir esta situação diariamente, mas também se adaptam porque há pouquíssimos produtos com soluções próprias para eles. Já tentou abrir uma lata de ervilhas com a mão esquerda? Tente, é bem interessante. Sobre nosso caráter neurológico ninguém fala; a não ser que haja algum comprometimento mais sério e limitante.

Uma amiga sofreu um derrame e teve que reaprender a andar. Num determinado tombo, esparramada no chão, virou para o médico e fisioterapeuta e disse: “Não quero aprender a andar. Quero aprender a me levantar de meus tombos”. Funcionou. Pessoas e grupos sociais normalmente só se pré-dispõe a uma grande mudança a partir de algum evento traumático, quando e onde todo parâmetro habitual simplesmente cai em nos mais diversos e realistas questionamentos.

Como ensinar sociedades a reorganizar seus processos, culturais, de pensamento, e psicomotores? Como fazer isto sem destruir nossa principal riqueza, que é o passado, a memória? Mais uma vez a resposta gira em torno da educação, do semear cultura, da abertura. Como pegar uma sociedade tão civilizada como estes turcos e fazê-los também ser civilizados enquanto dirigem? Só com educação emocional e racional? O que nos falta para conseguirmos sair deste atoleiro?

Nenhum comentário:

Postar um comentário