Eu, Arturo Alcorta, não acredito nas instituições brasileiras. Não tenho porque acreditar. Como cidadão, vejo o produto final em geral de baixíssima qualidade. Pelo contato que tive e sigo tendo com vários setores e instituições, principalmente da coisa pública, acredito que a ineficiência não vem de incompetência generalizada, má fé e roubalheira, como acredita a maioria. Este é um problema muito menor do que se imagina. A coisa pública está cheia de gente séria, competente, esforçada e trabalhadora, mas que serve a uma máquina que funciona pessimamente mal. Somos uma sociedade tão rica e ao mesmo tempo tão precária, frágil, pobre é a palavra mais apropriada. Da mesma forma que quando o Brasil era uma colônia, nossas riquezas continuam sendo jogadas ao vento. É fácil culpar o outro, prática tão comum hoje em dia.
Dia 22 de Fevereiro deste 2011, à 01h da madrugada, morreu atropelado no quilômetro 13 da Rodovia Raposo Tavares o calouro da FEA USP Leonardo Araujo dos Santos. O que se sabe é que naquele seu primeiro dia de aula aconteceu o trote, que durou até lá pelas 22h. Do fim do trote até seu atropelamento na rodovia, 3 horas depois, há um vácuo. Quem conheceu a vida da família Araujo, este menino, mãe e irmão, sabe que Leonardo era um jovem fora da faixa de risco. É uma família de classe média sobrevivente. Os três são centrados, objetivos, tranqüilos, lutadores, positivos e construtivos. Gente do bem e da paz. Seguindo os passos do irmão mais velho Leonardo também entrou na USP. A forma como chegaram lá aumenta muito o valor da conquista. Muito.
http://tvig.ig.com.br/354755/aluno-da-usp-morre-atropelado-em-rodovia.htm
Pode até ter sido um simples atropelamento. Simples atropelamento! Que absurdo! Pode até ter sido, mas que não se deixe de investigar os fatos. Muito fácil para ser realidade. Meninos com o valor deste são raros aqui ou em qualquer parte do mundo e não podem ser desperdiçados. A perda deles é um tiro no pé do próprio futuro do país. O que se sabe até agora é que Leonardo passou pelo trote na av. Faria Lima e depois sumiu. Morava com a mãe em Vila Maria Alta. Não gostava de beber, não era chegado a grandes festas, gandaias, divertia-se dentro de seu habitual equilíbrio e calma. Como foi parar na Raposo Tavares, o que estava fazendo caminhando na pista, porque não viu e ouviu o carro vindo em um ponto que isto é relativamente fácil? Teve morte instantânea. Os fatos podem ser simplesmente estes, mas a morte de um jovem, principalmente valoroso não é.
Nesta mesma semana veio a tona os números sobre a violência no Brasil, que vem aumentando assustadoramente nestes últimos anos. O número de jovens mortos é absurdo. Mesmo em guerras, as mais sangrentas, jovens são preservados. Aqui no Brasil Leonardo e milhares de outros viraram estatística. E aceitamos. Os cidadãos deste país fogem do drama humano. A ignorância geral, sem exceção, faz com que o brasileiro não consiga vislumbrar sequer o custo destas perdas. Acredita-se que acovardar-se escondido em pseudo-castelos medievais nos salvará da realidade selvagem. Lá fora não importa que um valiosíssimo Tim Lopes seja trucidado e logo depois débeis mentais arrastam por 7 km de ruas e matam um menino de 6 anos, João Hélio. Só 50 pessoas foram ao manifesto. Estas cenas mudam de roteiro e se repetem de maneira vergonhosa, mas todos aceitam a vergonha como normal.
Responsabilizo a sociedade brasileira, que continuamente se prova frouxa, em todos os sentidos da palavra, pela inoperância das instituições. Confio que a história de Leonardo, muito estranha, seja esclarecida porque sei que há gente de valor nestas mesmas instituições. Gente que quer construir um país, um futuro, mesmo sendo chamados por grande parte da sociedade de incompetentes e corruptos. Peço a estes bravos servidores que busquem a verdade.
Arturo Alcorta, Escola de Bicicleta, sobre a vida, rodando um pouco por tudo
segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
foto marcante
Há alguma forma que esta semana desapareça? Esta foto passa a ser, para mim, a marca desta semana triste.
Myrian, que ai pedala feliz, é a mãe de Leonardo Araujo dos Anjos, atropelado e morto nesta última terça-feira, dia 22 de Fevereiro de 2011, às 01h00m, na Rodovia Raposo Tavares. Tenho que tomar fôlego para conseguir digitar o texto sobre a história.
A Caloi Easy Rider, uma das bicicletas mais agradáveis de pedalar que indústria brasileira criou, foi criada pelo Fábio, conhecido como Japinha, uma figura adorável. Teresa D’Aprile acaba de me comunicar o falecimento dele.
Ironia da vida: sempre usei esta foto para falar de felicidade, das possibilidades que a bicicleta abre para qualquer um. Esta semana ela fala sobre outras coisas
Carinhos às famílias. Leonardo e Fábio são guardados no meu coração em um lugar especial, quase como filhos.
Myrian, que ai pedala feliz, é a mãe de Leonardo Araujo dos Anjos, atropelado e morto nesta última terça-feira, dia 22 de Fevereiro de 2011, às 01h00m, na Rodovia Raposo Tavares. Tenho que tomar fôlego para conseguir digitar o texto sobre a história.
A Caloi Easy Rider, uma das bicicletas mais agradáveis de pedalar que indústria brasileira criou, foi criada pelo Fábio, conhecido como Japinha, uma figura adorável. Teresa D’Aprile acaba de me comunicar o falecimento dele.
Ironia da vida: sempre usei esta foto para falar de felicidade, das possibilidades que a bicicleta abre para qualquer um. Esta semana ela fala sobre outras coisas
Carinhos às famílias. Leonardo e Fábio são guardados no meu coração em um lugar especial, quase como filhos.
segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011
A responsabilidade legal pelo ciclista
O Estado de São Paulo
São Paulo ReclamaLili caiu de sua bicicleta num buraco da rua da Consolação esquina com rua Estados Unidos. Estava praticamente parada, o que resulta nos piores tombos. Teve trincas em ossos do pulso e fratura no rádio, o que a levou a uma operação corretiva. Deve ficar parada por mais de um mês, o que lhe é uma grande complicação.
Histórias de acidentes com bicicleta, como o de Lili, são cada dia mais freqüentes; resultado do rápido crescimento do número de ciclistas circulando e dos perigos do uso da bicicleta, dirão. Será verdade? É tão simples assim? É a mesma coisa em todas as partes do mundo? E de quem é responsabilidade legal? Do próprio ciclista?
Em entrevista para TV, uma autoridade colocou que no Estado de São Paulo 22 milhões de veículos vão receber os benefícios legais do IPVA 2011 pago. Este número diz respeito só aos veículos motorizados. Se neste cálculo for computada a bicicleta temos mais pelo menos 8 milhões, portanto 30 milhões de beneficiados. Bicicleta é, segundo o Código de Trânsito Brasileiro, um veículo, portanto deve ser incluída como beneficiária dos impostos pagos. E na fala da autoridade. Mais ainda,também pelo mesmo CTB, pedestres tem prioridade sobre veículos, portanto também devem entrar nesta partilha. E ai vai... O que IPVA tem a ver com buraco? Provavelmente nada, mas a declaração leva à questão do dever e da responsabilidade legal do Poder Público. Hoje só é incluído quem interessa.
De quem é a responsabilidade legal pelo tombo do ciclista? Do ciclista, dirão. O ciclista sempre é o responsável pelos próprios atos, dirão. Se não houver uma ciclovia, ciclofaixa ou sinalização específica ele circula sobre a própria responsabilidade, dirão. Definitivamente não é verdade. Não é o que diz a lei. No caso de Lili a responsabilidade é da Prefeitura, que deve manter o pavimento das ruas em perfeitas condições ou sinalizar os eventuais problemas. Mais ainda: havendo ou não qualquer sinalização a responsabilidade pela circulação segura do ciclista (e pedestres) nas ruas é da Prefeitura e do órgão responsável, no caso a CET SP. Está no CTB, é lei, cumpra-se. O que acontece hoje é que as autoridades se valem da grave distorção onde a ausência do poder público é facilmente aceita socialmente. É o jeitinho brasileiro - “Se eu não fiz não sou responsável”. O cidadão assumiu seus riscos...
Está na hora da sociedade entender que boa parte dos acidentes envolvendo ciclistas (o foco do momento) e pedestres são causados por falhas, erros ou ausência do Poder Público. É fácil tipificar na lei de quem é a responsabilidade. A lei é um instrumento claro e bem usada ajuda a melhorar a vida de todos. Ciclistas, como qualquer cidadão, têm direitos e deveres. Assumir responsabilidades não devidas ou deixar como está é assinar a continuidade da incompetência e baixa qualidade na qual vivemos. A cidade de São Paulo é uma das mais ricas do mundo, mas sua qualidade urbana e segurança estão muito aquém do aceitável para sua posição. Os números de mortes no trânsito mostram que há algo muito errado, mas muito errado mesmo. A imagem da bicicleta insegura é muito interessante para um grupo de pessoas que são intimamente ligadas à fluidez do trânsito motorizado. “Bicicleta atrapalha!” é o estertor dos que não acreditam em novos tempos, na construção de uma nova cidade, para todos, voltada para a vida e não só o carro. A negação da realidade, o empurrar responsabilidades, tão comum às autoridades, está criando mais uma categoria de motoboys, agora os ciclistas. Se já não bastasse o horror diário que temos. Mas... quem se importa?
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
Para não se arrepender
Se arrependimento matasse...
Arrependimento é algo dispensável, que a vida vai ensinando os caminhos para evitar, ou pelo menos para minimizar nossas posições mais fortes, as que com o tempo se mostram ineficazes ou pouco produtivas.
Não foi a bicicleta quem me ensinou que algumas ações, julgamentos, juízos e preconceitos pouco valem quando a verdade é colocada em pratos limpos. Mas considero que muito de minha segurança no transito depende de não fazer coisas insensatas das quais possa me arrepender mais tarde. Entenda os outros e será seguro. Jogue a culpa no que está em volta e aumentará seus riscos. E mesmo que o outro erre, analise com inteligência. Potenciar o erro do outro enfraquece as próprias virtudes. Virtudes nos traz bom senso e bom senso o bom futuro.
Conto quatro breves e incompletas histórias, duas da vida pessoal e duas de minha relação com a bicicleta e a vontade de mudar o mundo.
História 1: Foi um longo namoro. Dez anos de paquera, namoro, e pouquíssimo tempo de noivado, um relacionamento de forte paixão, relativamente tranqüilo, de bom companheirismo, mas imaturo. Acertados os detalhes logo estávamos casados e seguindo viagem para Recife, onde fomos morar. Exatamente 3 meses e 20 dias eu estava dirigindo o carro de volta para São Paulo; só. Fui entender o que passara quando a psicóloga disse sem meias palavras: “Sua mulher tem um distúrbio neuro-depressivo (hoje conhecido por “bipolaridade”). Você não poderia entender o que estava acontecendo”.
História 2: Os noticiários davam que a fazenda do então Presidente Fernando Henrique Cardoso havia sido reintegrada pela Polícia Federal depois de sei lá quantos dias de invasão e alguns tantos danos à propriedade. No meio das imagens da TV a de uns Sem Terra imobilizados com a cara no chão de terra. A questão foi tema da conversa do jantar da casa de minha avó. Eu disse que colocar os Sem Terra naquela posição era um grande erro porque, principalmente na fazenda do Presidente da República, a desocupação deveria ser feita no mais restrito da lei. “Acontecer deslizes legais em outro lugar ainda vai, mas na fazenda do Presidente da República é burrice porque sabota a autoridade máxima do país. É um grande estrago para todos”. Meu tio falou de bate pronto: “Você apóia este pessoal, você gosta de invasor!” Entramos em um embate tenso, pessoal, portanto inútil. Em um determinado momento que soltei “Você é fascista!”. “Você conhece meu trabalho. Acha que sou fascista?”
História 3: Estava com o pulso engessado e não poderia correr a etapa do Campeonato Brasileiro de Mountain Bike em São José dos Campos, mas como “jornalista” tive que ir lá ver os treinos e ouvir a fúria dos competidores porque o circuito havia sido alisado por máquinas e parecia um estradão de terra. A razão, diziam todos, era que a Caloi, responsável e patrocinadora do evento, queria a todo custo que Mazzaron, da própria Caloi, ciclista de estrada dos melhores que o Brasil já teve e iniciante no mountain bike, mas ainda sem prática com a buraqueira, tivesse sua vida facilitada. No dia da prova fiz inscrição para minha categoria (máster) sem o gesso. Na hora da largada fui levado para pista cuidadosamente cercado pelos outros competidores para que a organização não visse não só o gesso, mas minha bicicleta, uma Caloi 10 das antigas, que quebraria num circuito de mountain bike de verdade. Larguei, corri, fui avisado aos gritos por amigos que a organização não iria me desclassificar, mas queria me matar. O circuito estava tão liso que terminei a prova com pulso e bicicleta inteiros. A provocação surtiu efeito. Dali para frente provas de mountain bike passariam a ser provas de mountain bike. E eu fiquei com grandes inimigos.
História 4: Gunter Bantel era então responsável pelo Projeto Ciclista do Município de São Paulo. O Projeto Ciclista propunha uma série de ciclovias espalhadas pela cidade, umas 100 se não me falha a memória, todas desconectadas. Eu tinha idéias bem diferentes de como trabalhar a questão da bicicleta e como introduzir um sistema cicloviário. Era (e continuo sendo) contra a “ciclovia salvação da humanidade”, o que considero um desperdício de dinheiro. Bantel era conhecido por seu gênio forte, por ganhar espaços no grito, pela intransigência com certos pontos, pela obstinação. Pelo sim ou pelo não, boa parte do que há até hoje em São Paulo para bicicletas tem de alguma forma sua mão. Durante a criação do mapa Ciclo Rede Rio Pinheiros, da GTZ com a SVMA SP, houveram algumas tensões no processo, algumas estranhas. Um pouco depois de terminado o mapa Ricardo Otake tornou-se Secretário de Verde e Meio Ambiente, me chamou para conversar e perguntou o que eu acreditava que deveria ser feito para seguir com o Projeto Ciclista. O fim da era Bantel foi ali decretado.Arrependimento é algo dispensável, que a vida vai ensinando os caminhos para evitar, ou pelo menos para minimizar nossas posições mais fortes, as que com o tempo se mostram ineficazes ou pouco produtivas.
Não foi a bicicleta quem me ensinou que algumas ações, julgamentos, juízos e preconceitos pouco valem quando a verdade é colocada em pratos limpos. Mas considero que muito de minha segurança no transito depende de não fazer coisas insensatas das quais possa me arrepender mais tarde. Entenda os outros e será seguro. Jogue a culpa no que está em volta e aumentará seus riscos. E mesmo que o outro erre, analise com inteligência. Potenciar o erro do outro enfraquece as próprias virtudes. Virtudes nos traz bom senso e bom senso o bom futuro.
Conto quatro breves e incompletas histórias, duas da vida pessoal e duas de minha relação com a bicicleta e a vontade de mudar o mundo.
História 1: Foi um longo namoro. Dez anos de paquera, namoro, e pouquíssimo tempo de noivado, um relacionamento de forte paixão, relativamente tranqüilo, de bom companheirismo, mas imaturo. Acertados os detalhes logo estávamos casados e seguindo viagem para Recife, onde fomos morar. Exatamente 3 meses e 20 dias eu estava dirigindo o carro de volta para São Paulo; só. Fui entender o que passara quando a psicóloga disse sem meias palavras: “Sua mulher tem um distúrbio neuro-depressivo (hoje conhecido por “bipolaridade”). Você não poderia entender o que estava acontecendo”.
História 2: Os noticiários davam que a fazenda do então Presidente Fernando Henrique Cardoso havia sido reintegrada pela Polícia Federal depois de sei lá quantos dias de invasão e alguns tantos danos à propriedade. No meio das imagens da TV a de uns Sem Terra imobilizados com a cara no chão de terra. A questão foi tema da conversa do jantar da casa de minha avó. Eu disse que colocar os Sem Terra naquela posição era um grande erro porque, principalmente na fazenda do Presidente da República, a desocupação deveria ser feita no mais restrito da lei. “Acontecer deslizes legais em outro lugar ainda vai, mas na fazenda do Presidente da República é burrice porque sabota a autoridade máxima do país. É um grande estrago para todos”. Meu tio falou de bate pronto: “Você apóia este pessoal, você gosta de invasor!” Entramos em um embate tenso, pessoal, portanto inútil. Em um determinado momento que soltei “Você é fascista!”. “Você conhece meu trabalho. Acha que sou fascista?”
História 3: Estava com o pulso engessado e não poderia correr a etapa do Campeonato Brasileiro de Mountain Bike em São José dos Campos, mas como “jornalista” tive que ir lá ver os treinos e ouvir a fúria dos competidores porque o circuito havia sido alisado por máquinas e parecia um estradão de terra. A razão, diziam todos, era que a Caloi, responsável e patrocinadora do evento, queria a todo custo que Mazzaron, da própria Caloi, ciclista de estrada dos melhores que o Brasil já teve e iniciante no mountain bike, mas ainda sem prática com a buraqueira, tivesse sua vida facilitada. No dia da prova fiz inscrição para minha categoria (máster) sem o gesso. Na hora da largada fui levado para pista cuidadosamente cercado pelos outros competidores para que a organização não visse não só o gesso, mas minha bicicleta, uma Caloi 10 das antigas, que quebraria num circuito de mountain bike de verdade. Larguei, corri, fui avisado aos gritos por amigos que a organização não iria me desclassificar, mas queria me matar. O circuito estava tão liso que terminei a prova com pulso e bicicleta inteiros. A provocação surtiu efeito. Dali para frente provas de mountain bike passariam a ser provas de mountain bike. E eu fiquei com grandes inimigos.
Se pudesse voltar atrás...
Minha separação de Tina é uma das cicatrizes mais doloridas que trago na vida. Infelizmente consigo reviver cada segundo do momento que avisei que estava terminado e que eu ia embora. Está feito, não tem reversão. Finito! Infelizmente. Infelizmente. Infelizmente. Sinto por todos, não só por nós dois.
Ainda vou trabalhar meu tio, que tem como defeito usar sua brilhante inteligência e charme para sempre sair por cima das situações, até as mais banais. É um cara bom, ótimo família, um ego forte que sabendo levar diverte e faz bem. A posição política que tem é direito dele. Perder o relacionamento foi imaturidade minha.
Mazzaron era a de um tanto de ciclista vitorioso um pouco introvertido ou centrado no objetivo. Nestes anos fez um mais que bom trabalho em pró do ciclismo de competição. Amadureceu a abriu-se. Aquela história de São José dos Campos, que nunca nos demos o direito de conversar com calma, teve vários desdobramentos, mas ficou no passado. Coisas desagradáveis que acontecem na vida de qualquer um. Ele era “o” ciclista da Caloi e recebia ordens. Mazzaron pedalava, não fazia circuitos. Juan Timon, de quem já escrevi um texto, meu grande inimigo / amigo, em qualquer ordem, provavelmente foi o responsável pela alisada no circuito. Hoje Mazzaron rema para o mesmo lado de todos. É peça crucial na engrenagem. Uma posição radical sobre aquela história de todos nós não teria dado chance de Mazzaron mostrar seu amadurecimento e os resultados que hoje ele nos oferece.
Bantel é uma das principais peças da história da bicicleta no Brasil. O gênio de rottweiller que tinha na época, mais umas coisas de pura cabeça dura alemã, me fez tomar uma posição que hoje tenho minhas sérias dúvidas que tenha sido a melhor. O fato é que Batel provavelmente fosse indispensável para a época, mesmo que eu continue considerando que se poderia ter sido feito muito mais, muito mais facilmente, por muito menos de outra forma. O fato é que ele fez, com acertos e erros, mas fez. Flexibilidade teria engraxado a situação.
Poderia ficar aqui contando historinhas de vida como estas. Infelizmente as tenho aos montes. Em algumas o arrependimento mata, aos poucos, lentamente; noutras deixa a dúvida cruel. A única certeza é que o que se pode tirar do fazer concessão é sempre melhor que deixar nossa intransigência fechar portas. Porta fechada esconde caminhos.
Virei macaco velho. Muitos anos de estrada. Vi o ciclismo e a bicicleta serem violentados por situações sem nexo, por fofocas, intrigas, incompreensões, bitolamento, falta de inteligência, educação, amadorismo, bobeira, e tantas outras faltas de maturidade. Ou até por razões justas que acabam levando a caminhos estreitos. Ouvi montes de histórias ruins. Não faz muito tempo havia o negócio da bicicleta era um oligopólio que mandava e desmandava na base da força bruta. Houve muita sacanagem, muita intimidação e até coisas piores. Não deu certo, nem poderia dar. Julgamento rápido, condenação certa e fuzilamento é ineficaz, burrice mesmo.
Hoje todos estamos mais maduros. O Brasil está mais maduro, toda a sociedade está mais treinada para vida em grupo, para alcançar objetivos mais sólidos e duradouros. Começamos a entender que ou vamos todos em frente ou ninguém chega a lugar nenhum. Sociedade: organização coletiva. Com a coisa da bicicleta não é diferente.
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Pelas tumbas do Faraó!
- Valéria, você que mexe com internet faz tanto tempo podia imaginar que aquilo ia dar nisto, que a informação em vez de ser um controlador de poder iria um dia ser o detonador de revoltas como esta do Oriente Médio, principalmente Egito?
- Ninguém podia dizer.
As notícias correm numa velocidade brutal. O pau que está rolando neste segundo nas ruas do Cairo pode ser visto instantaneamente na telinha de um bom computador. Acabaram de me telefonar com voz embargada porque um camburão veio correndo contra a massa protestante e simplesmente passou por cima de uns tantos, enquanto outros voavam atirados para cima e os lados como fosse desenho animado. Só que “for real”. Era criança, 9 anos, estava na rua quando as rádios começaram a gritar que havia estourado a revolução (de 1964). Corri aos prantos para casa. Não sei como uma criança reagiria hoje, mas provavelmente mais tranqüila porque está acostumada a realidade nua e crua instantânea. Quando não aos “games” ou mesmo desenhos animados matinais onde tudo explode, tudo vai pelos ares, todos morrem com a maior naturalidade. Uma hora destas inventam uma forma de transmitir cheiros e a realidade será mais real ainda. Uma grande diferença para os desenhos de Pica-Pau e Pato Donald de minha época. No caso do Pato Donald era necessário montar a máquina projetora de filmes, tirar o filme da lata, montar o filme na projetora, encaixar bem os dentes do filme, esperar a lâmpada esquentar, acionar e ver o filme. Opa; esqueceram de ligar a caixa acústica.
Hoje é “enter”, ponto! Pato Donald vai para o alvo do tiro. Pannnn... pannnn.... pannn. Acertou! e o ser vivo que vinha voando em sua direção vira instantaneamente um frango assado com direito a pontuação. Game over.
Minha reação mudou muito e rapidamente. Quando Blumenau veio abaixo eu fiquei desesperado, praticamente surtei. Agora neste horror que aconteceu na Região Serrana, fiquei chocado, mas parece que me acostumei. Provavelmente não. A Internet trouxe notícias sobre desvios que foram feitos nas doações para Blumenau e isto tirou meu pique. Mas não foi só. Um amigo de Blumenau saiu de bicicleta e distribuiu fotos que qualquer mídia teria censurado, coisas brutais. Aquele nível de imagem obviamente foi também censurado agora. Há limites. Ou não deve haver?
Valéria acabou entrando no tema do momento: qual o limite a Internet deve ter? Nenhum. É a definição de liberdade em si. Censura, no pior sentido, neste caso é idiota porque ninguém segura a rede. O governo Egípcio bem que tentou, mas em vão. Cortaram a Internet do grande público. Cortaram a telefonia. Tentaram silenciar as mídias. Impossível. Internet via rádio amador. Via rádio amador?
- Hoje se transmite por Internet pela eletricidade. Por rádio amador é fácil; explica Valéria.
Os noticiários deram que operadoras da Europa deixaram livre seus sistemas para o Egito. Se não fosse assim seria de outra forma. A molecada acha um jeito, acha um caminho. Não tem mais freios. Ironia do destino é vitória completa do liberalismo. Tremam os que sentem arrepios deste desatino do capitalismo selvagem, mas é verdade, nada mais liberal que a Internet.
Olhando as imagens do desastre da Região Serrana do Rio de Janeiro fiquei me perguntando no que um ciclista como eu poderia ajudar. Provavelmente pouco porque nem as motos especiais estavam conseguindo passar. Já na época de Blumenau fiquei com a idéia de como organizar os ciclistas para uma situação de emergência. Na minha santa estupidez dos 55 anos de vida não consigo imaginar; ou consigo imaginar, mas não conseguiria executar. Provavelmente se colocasse na mão de moleque ele resolveria e rapidamente organizaria o pessoal via Internet. Ai teria que entrar a voz da experiência de algum macaco velho em desastres para a coisa toda dar resultado. Os dois mundos se completam, se necessitam.
O que não consigo mesmo achar resposta é porque quando a coisa é mais objetiva, como responder “O que vocês querem da (entidade) União dos Ciclistas do Brasil” vem só uma meia dúzia de respostas? Isto para falar no nosso mundinho. Mas porque não se consegue frear fatos cotidianos que nos massacram, como a violência brutal deste Brasil dito pacífico. Não vale a resposta que o brasileiro não dá bola para estas coisas, porque os pictogramas das bicicletinhas pintadas como protesto nas ruas foram entendidos pelos motoristas, um dos grupos sociais mais agressivos deste país, e estes passaram a tomar mais cuidado com os ciclistas que ali circulavam.
Porque tão fácil e ao mesmo tempo tão impossível?
O interessante de todo este momento histórico é que os islamitas, que boa parte do ocidente euro-centrado desdenha por toscos, limitados, primitivos, e outros adjetivos mais, é que estão mostrando o caminho da revolução binária. Alá ou Allah.
- Ninguém podia dizer.
As notícias correm numa velocidade brutal. O pau que está rolando neste segundo nas ruas do Cairo pode ser visto instantaneamente na telinha de um bom computador. Acabaram de me telefonar com voz embargada porque um camburão veio correndo contra a massa protestante e simplesmente passou por cima de uns tantos, enquanto outros voavam atirados para cima e os lados como fosse desenho animado. Só que “for real”. Era criança, 9 anos, estava na rua quando as rádios começaram a gritar que havia estourado a revolução (de 1964). Corri aos prantos para casa. Não sei como uma criança reagiria hoje, mas provavelmente mais tranqüila porque está acostumada a realidade nua e crua instantânea. Quando não aos “games” ou mesmo desenhos animados matinais onde tudo explode, tudo vai pelos ares, todos morrem com a maior naturalidade. Uma hora destas inventam uma forma de transmitir cheiros e a realidade será mais real ainda. Uma grande diferença para os desenhos de Pica-Pau e Pato Donald de minha época. No caso do Pato Donald era necessário montar a máquina projetora de filmes, tirar o filme da lata, montar o filme na projetora, encaixar bem os dentes do filme, esperar a lâmpada esquentar, acionar e ver o filme. Opa; esqueceram de ligar a caixa acústica.
Hoje é “enter”, ponto! Pato Donald vai para o alvo do tiro. Pannnn... pannnn.... pannn. Acertou! e o ser vivo que vinha voando em sua direção vira instantaneamente um frango assado com direito a pontuação. Game over.
Minha reação mudou muito e rapidamente. Quando Blumenau veio abaixo eu fiquei desesperado, praticamente surtei. Agora neste horror que aconteceu na Região Serrana, fiquei chocado, mas parece que me acostumei. Provavelmente não. A Internet trouxe notícias sobre desvios que foram feitos nas doações para Blumenau e isto tirou meu pique. Mas não foi só. Um amigo de Blumenau saiu de bicicleta e distribuiu fotos que qualquer mídia teria censurado, coisas brutais. Aquele nível de imagem obviamente foi também censurado agora. Há limites. Ou não deve haver?
Valéria acabou entrando no tema do momento: qual o limite a Internet deve ter? Nenhum. É a definição de liberdade em si. Censura, no pior sentido, neste caso é idiota porque ninguém segura a rede. O governo Egípcio bem que tentou, mas em vão. Cortaram a Internet do grande público. Cortaram a telefonia. Tentaram silenciar as mídias. Impossível. Internet via rádio amador. Via rádio amador?
- Hoje se transmite por Internet pela eletricidade. Por rádio amador é fácil; explica Valéria.
Os noticiários deram que operadoras da Europa deixaram livre seus sistemas para o Egito. Se não fosse assim seria de outra forma. A molecada acha um jeito, acha um caminho. Não tem mais freios. Ironia do destino é vitória completa do liberalismo. Tremam os que sentem arrepios deste desatino do capitalismo selvagem, mas é verdade, nada mais liberal que a Internet.
Olhando as imagens do desastre da Região Serrana do Rio de Janeiro fiquei me perguntando no que um ciclista como eu poderia ajudar. Provavelmente pouco porque nem as motos especiais estavam conseguindo passar. Já na época de Blumenau fiquei com a idéia de como organizar os ciclistas para uma situação de emergência. Na minha santa estupidez dos 55 anos de vida não consigo imaginar; ou consigo imaginar, mas não conseguiria executar. Provavelmente se colocasse na mão de moleque ele resolveria e rapidamente organizaria o pessoal via Internet. Ai teria que entrar a voz da experiência de algum macaco velho em desastres para a coisa toda dar resultado. Os dois mundos se completam, se necessitam.
O que não consigo mesmo achar resposta é porque quando a coisa é mais objetiva, como responder “O que vocês querem da (entidade) União dos Ciclistas do Brasil” vem só uma meia dúzia de respostas? Isto para falar no nosso mundinho. Mas porque não se consegue frear fatos cotidianos que nos massacram, como a violência brutal deste Brasil dito pacífico. Não vale a resposta que o brasileiro não dá bola para estas coisas, porque os pictogramas das bicicletinhas pintadas como protesto nas ruas foram entendidos pelos motoristas, um dos grupos sociais mais agressivos deste país, e estes passaram a tomar mais cuidado com os ciclistas que ali circulavam.
Porque tão fácil e ao mesmo tempo tão impossível?
O interessante de todo este momento histórico é que os islamitas, que boa parte do ocidente euro-centrado desdenha por toscos, limitados, primitivos, e outros adjetivos mais, é que estão mostrando o caminho da revolução binária. Alá ou Allah.
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