Aqui vale uma valiosa explicação. Todos nós representamos constantemente vários papéis em nossas vidas. Para sobreviver temos que viver em grupo, em sociedade, portanto temos interações com outros seres, com outras vidas. Somos biologicamente masculinos ou femininos, mas em relação ao social, fomos bebês, crianças, adolescentes, adultos, e quando adultos, continuamos a ser filhos, mesmo sendo pais. Somos também amigos, companheiros, solteiros, casados, pais, tios, avós, idosos, conhecidos, amantes, trabalhadores, etc... Cada uma dessas funções tem vida própria, o que estabelece uma condição de relacionamento específico.
Uma criança necessariamente tem pais e sua relação com eles é de filho para pai e mãe, mesmo que esta não seja biológica, mas social. A relação ideal dos pais, portanto seres adultos, com esta criança deve ser de pai ou mãe para filho. Um pai pode eventualmente ser companheiro, pode e deve ser amigável, mas não deve assumir o papel de amigo ou concorrente do filho ou haverá uma distorção de papeis o que irá criar problemas de relacionamento. Assim como o papel de companheiro é diferente do de amigo, que é diferente de ser amigável. As razões que estabelecem estas configurações vão desde a maturidade biológica (leia-se idade), responsabilidades inerentes até a diferença de vivência que define forma de pensar e capacidade de ação. Pai é pai, filho é filho, amigo é amigo.
Uma mulher adulta e casada é sempre mulher, principalmente quando dá tempo e cuida de si mesma e de sua biologia específica; mas também pode ser companheira ou esposa; se tiver filhos será mãe, com as amigas é amiga, com os irmãos é irmã, com os pais segue sendo filha, com os avós sempre será neta, e no trabalho será sempre parte de uma equipe de trabalho, uma operária, gerente, diretora, etc... O mesmo vale para homens, adolescentes, crianças, e até mesmo para animais caseiros que normalmente são tratados erroneamente como humanos. Qualquer inversão ou mudança de atitudes nas relações provavelmente trará problemas para si ou para os outros, ou pior, para todos. O coitado do cachorro vestido de Fred Astaire passeando na rua que o diga.
Praticamente todos nós misturamos os papéis. Vivemos numa sociedade imatura, confusa, mistificada. Quem já não considerou o melhor amigo um irmão? Quem não teve uma companheira de trabalho que foi uma verdadeira mãe? Quem não esqueceu sua função e posição social, confundiu sentimentos, fatos e momentos? É absolutamente normal fazer confusões, mas inapropriado porque o resultado final, muitas vezes ou quase sempre, costuma não ser o melhor. Fazer o que? Somos todos humanos, o que quer que isto signifique finalmente.
Conseguir entender cada um dos papeis e as funções decorrentes deles, facilita demais a vida. Na verdade exercer o papel correto para o momento nos oferece uma base segura para evitar conflitos, portanto desgastes. Para o ciclista é importante, quase vital, pelo menos entender que a bicicleta é uma bicicleta, o que muita gente tem uma dificuldade imensa de sacar. Bicicleta é uma máquina, maravilhosa, mas é uma máquina, um veículo, divertido e que traz bem estar; mas um veículo, e que qualquer extrapolação pode fazer mal ao usuário. E como há ciclista que extrapola! Somos humanos!
Muitos pedalam como estivesse conduzindo um carro, com a cabeça de um motorista, o que talvez seja de fato o maior perigo. Basta olhar um e outro para ver que há diferenças. Daí sempre repetirmos na Escola de Bicicleta: ciclista é ciclista, motorista é motorista. A rua da bicicleta é uma, a do carro é outra, as duas podem ser a mesma, mas as dinâmicas envolvidas são completamente diferentes. Até ai vamos praticamente todos. O que é difícil é chegar a maturidade de conseguir interagir com o trânsito geral como ciclista, sem conflitos, sem faniquitos, sem ficar exposto desnecessariamente ao perigo, sem confundir tensão com perigo, sem julgar, sem reagir. Pedalar no meio do trânsito com naturalidade e segurança. A culpa, como mostra todas as pesquisas, normalmente é do próprio condutor, incluindo ai ciclista.
Quem sabe jogar o jogo, posicionar-se e agir corretamente, não culpa os outros. A vida não é um jogo só de poderes. Não me lembro quem disse isto, mas é brilhante: a vida gosta de quem gosta da vida. Viva. Viva!
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