Ontem, dia 25 de Janeiro de 2010, aniversário de 465 anos da cidade de São Paulo, aconteceu o segundo São Paulo World Bike Tour, desta vez com 6 mil bicicletas, mil a mais que na primeira versão. Por sorte o céu abriu e as chuvas que por 34 dias castigavam os paulistanos deram trégua para o sol sorrir para os inscritos. Foi uma manha festiva, organizada, tranqüila, uniformizada quase em mono cor, que rapidamente passou pela Marginal Pinheiros, pista expressa, fechada e antes do meio dia o sonho já havia terminado. A massa saiu da Ponte Estaiada, que ainda chama atenção, mas já não é novidade, e fez 9 km até chegar na Cidade Universitária da USP, mais exatamente no fechado velódromo, que agora me veio à cabeça que creio ouvi dizer pelos alto falantes que estiva aberto aos participantes. Será? Se foi assim fez-se milagre.
A maior diferença entre os dois eventos foi dado pelas bicicletas, desta vez fabricadas aqui no Brasil pela Caloi, que fez um belo trabalho. Em comparação com a do primeiro evento é um grato salto de melhoria de qualidade. No primeiro São Paulo Bike Tour o que havia de ciclista que não conseguia sair, que ficou parado no meio do caminho tentando atarraxar o pedal ou sendo empurrado com ou sem pedal na mão foi uma brincadeira. A baixa qualidade da bicicleta começava nos adesivos que não colaram direito no quadro e garfo, passava por uma suspensão que não servia para nada além de agregar peso, em câmbios desajustados, em pedais largados às pencas no asfalto e terminava no desapontamento de um percentual alto dos participantes. O pedal foi o ponto baixo de todo pedal, broxante por assim dizer, porque eram dobráveis, mas fora de centro e sem firmeza. A bicicleta foi mais um produto de marketing vagabundo que um veículo usável. Talvez tenha sido uma das razões porque se viu tão poucas, ou quase nenhuma, circulando nas ruas.
Qualquer projeto de estímulo ao uso da bicicleta começa pela qualidade da própria bicicleta. Venho batendo nisto há quase 30 anos. A intenção do World Bike Tour é justamente estimular o uso da bicicleta como modo de transporte. A bicicleta deste ano tem boa qualidade e dá a sensação que a Caloi quis dar troco ao desaforo das importadas do ano passado. Quem ganhou nesta briga são os inscritos. Nada como concorrência. A qualidade das bicicletas fez que o evento alcançasse o perfil para o qual foi criado: ciclistas recebendo suas bicicletas e saindo de lá pedalando tranquilamente. Indústria nacional quando quer faz. O único ponto negativo da bicicleta 2010 está nos pneus, muitos desalinhados, e nas câmaras, muitas esvaziando muito rápido, mesmo sem furo; problemas comuns nos modelos básicos vendidos no Brasil. Triste situação que não muda e que faz muita diferença na construção do processo de introdução da bicicleta como modo de transporte, de estruturação de um mercado descente e etc... e tal.
O que chamou atenção foi a falta de entusiasmo do pessoal pedalando. Não entendi porque tantas caras tão sérias. “Faltou uma música, faltou bagunça” disse Teresa D’Aprile. Os participantes estavam felizes como alemães, suíços ou japoneses, não como efusivos brasileiros que somos. Estranho. No meio da Marginal havia um silêncio de vozes estranho e um silêncio de motores e neuróticos maravilhoso.
Para quem quis participar e não conseguiu se inscrever o evento foi um acontecimento que poderia ser mais receptivo. Quem foi até a largada se sentiu um pouco perdido porque lá na cabeceira da Ponte Estaiada, entrada para a marginal e o passeio, teve todo tipo de informação, desde que não seria permitido qualquer penetra até que os “pipocas” sairiam atrás do passeio escoltados pela PM. Na Marginal Pinheiros passou uma quantidade razoável de ciclistas pedalando pela esquerda da via. Outros, incluindo pais com crianças em cadeirinhas, ficaram na calçada olhando as bicicletas e os uniformizados e esperando a largada na calçada para cruzar a marginal e invadir o passeio, o que logo acabou acontecendo. Eu fiquei no sonho que haveria mais penetra que inscritos, o que definitivamente não aconteceu. Segundo me disseram a Folha de São Paulo deu como local de largada o Centro de São Paulo. Mesmo entendo a necessidade dos patrocinadores do evento de ter a massa homogênea e uniformizada para fins de mídia, me pergunto se não seria mais simpático se houvesse uma orientação para nós, os “outros”, os penetras? Fico imaginando quem deve ter definido o funcionamento do evento e o porque o descarte dos “outros”. Duvido que para patrocinador não seja muito interessante ter uma massa de “invejosos” (?!?) seguindo atrás da procissão. Duvido! Ainda vai acontecer e espero que esta seja bem recebida.
O que não deu para entender foi porque um pouco antes da Ponte Cidade Universitária até o retorno foi colocada uma barreira que restringia pela metade o espaço da marginal para os ciclistas. Aliás, ninguém entendeu, sequer o pessoal da própria Prefeitura. Ou não quiseram ou puderam responder. Quem imaginou esta divisão esqueceu mais uma vez de perguntar como se brinca de pedalar e em pouco tempo o espaço vazio foi completamente invadido. Ai começou a aparecer ciclista vindo de tudo quanto é lado, inclusive na contra-mão.
O passeio passou por baixo da Ponte Cidade Universitária, fez o retorno lá na frente e voltou na contra-mão da massa pela pista local para pegar a alça da ponte e cruzar o rio. Quem vinha atrás e longe do bloco abre alas geral do passeio não entendeu bem o que deveria fazer, onde deveria retornar, o que levou a que muitos pulassem o guard-rail para chegar na ponte. Foi o único ponto confuso do curto trajeto.
Depois de terminado o circuito os participantes foram dispensados para voltar para suas casas. Estavam todos felizes, mas havia no ar alguma coisa do tipo: receberam a bicicleta, pedalaram 10 km para chegar até aqui, já estão grandinhos, viraram ciclistas, a partir daqui vocês que se virem. A CET manteve a Ponte Cidade Universitária aberta para quem quisesse voltar, mas sem sinalização. O pessoal caia na Praça Panamericana completamente desorientado de como dali voltar para a Ponte Estaiada. Está ai dado um espaço em 2011 para a “bicicletada” prestar um bom serviço e ajudar os iguais. Vamos sinalizar a volta e formar grupos para serem acompanhados por “anjos”.
Creio que eu tenha participado de boa parte dos grandes passeios promovidos pela Prefeitura de São Paulo. Do primeiro Passeio da Primavera criado por Caio Pompeu, sei lá em que ano, creio que ainda na década de 70, até a sua divisão em vários passeios porque se tornou muito grande. Saía e chegava no Obelisco e em sua última edição ali os 17km de grades avenidas de três largas pistas transbordaram de ciclistas e quando os primeiros começaram a chegar os últimos sequer tinham tido espaço para largar. Até hoje ninguém se entende sobre quantos participaram daquele passeio, mas continua sendo o maior da história de São Paulo e assim permanecerá imbatível por muito tempo. No ano seguinte foi dividido em duas largadas dadas em pontos diferentes da cidade.
O que não gosto destes eventos é sua matemática: o sujeito nunca pedalou antes, pega uma bicicleta, sorri, adora, pedala o suficiente para a bunda desacostumada doer bastante, no dia mal consegue sentar, e por um bom tempo não querer ver a bicicleta, quando olha para ela sente insegurança de pedalar sozinho nas ruas, acaba sendo esquecida na garagem e só sairá às ruas no evento do ano que vem. Hoje talvez não seja bem assim, mas não está longe disto. Eventos deste tipo é como berçários para o ciclista: se não tiver alguém para superproteger ele não se arrisca.
Outro ponto é que tudo o que está sendo feito com a bicicleta em São Paulo é segregado e o povão adora. São Paulo World Bike Tour com trânsito fechado por umas horas. O mesmo na Ciclo Faixa de Domingo. A Ciclovia Marginal Pinheiros estará entre o rio e linha férrea e terá entrada meio que controlada. A Ciclovia Radial Leste é encostada num muro, não tem cruzamentos e é acessível em poucos locais. Tudo é segregado. Jardim Helena, que é uma área cercada pelo Rio Tiete de um lado, pela linha da CPTM do outro, será feito porque o número de ciclistas/dia é altíssimo, mas também é uma gleba urbana isolada, uma ilha. O que dói é que a população aceita marketing e propaganda pura como solução para a questão da bicicleta. Infelizmente o sonho ainda é a ciclovia. Estamos longe de ter pressão popular real no sentido da construção de uma cidade melhor. O que está sendo feito é o que é possível com a situação que temos hoje, mas não deixa de ser só purpurina.
São Paulo fez 456 anos. Para a bicicleta ainda estamos praticamente no ano zero. Nem sequer conseguimos o que foi dito que se faria para os 450 anos da cidade. Aliás, cá entre nós, o São Paulo 450 anos foi o primeiro golpe do PAC que o Brasil sofreu.
opa, que bom te ver na blogosfera arthuro. Bom texto, realmente têm gente precisando acordar e perceber a ânsia das pessoas de viverem numa cidade melhor.
ResponderExcluirabs.
MKT!!!! SEM DÚVIDA!
ResponderExcluirtambém estive no bike tour na segunda!
fui de pipoca , pois 37 minutos depois de abrir as segunda remeça de 500 credenciais já não havia mais possibilidade de cadastro nem para sorteio!
vi gente atravessando a marginal a 50 metros da largada com a bike já a tira colo, vi portadores de necessidades especiais sendo rebocados por causa de uma manivela que não funciona e ví também a cara de desespero de uma multidão no final do passeio sem saber oq fazer com a bicicleta. isso sem contar a fila na estação de trem para voltar para casa.
só lamento a DESorganisação do evento, à prefeitura, e os orgãos (IN)copetentes que não previram nenhuma alternativa para o retorno seguro dos participantes.