segunda-feira, 4 de setembro de 2023

A perda de superdotados e Zé ABC,

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Tive a sorte de conviver com alguns superdotados. Dois deles se foram deixando um bom legado, mas poderiam ter deixado muito mais caso o Brasil desse a devida importância a estas personagens especiais que muitas vezes são mal compreendidos ou até mesmo repudiados pela nossa sociedade. Em um mundo altamente competitivo o desperdício das boas cabeças é um tiro no pé, o que dizer daqueles que têm um poder muito acima do normal de concentração, criação e produção? Todos os fora da curva que conheci e conheço não são exatamente pessoas de fácil convívio tanto por não terem facilidade para conversas triviais, como também porque parece não haver qualquer interesse por parte da população do país em sua inclusão social e produtiva, que no caso deles remete mais à ciência que propriamente resultados ditos vulgarmente como práticos. Mais que a perda de um amigo, a perda de um superdotado sem que seu pensamento e trabalho tenha sido documentado ou passado adiante é deprimente. Mesmo nas mais complexas divagações, que por vezes mais parecem loucuras, o conteúdo que superdotados oferece é e será sempre imprescindível para todos e tudo, e é o que faz a diferença entre países ricos e pobres. 



- Tem alguém aqui que seja espírita, que conheça algum espírita ou algum vidente que possa contar como foi a chegada do Zé Assumpção lá em cima (no céu ou inferno)? Ele brigou com quem? 
O riso na missa de 7º dia foi geral e irrestrito.

Desde que Zé morreu tentei escrever alguma coisa sobre ele e não consegui. Ontem, jantando com um amigo em comum e conversando sobre as histórias dele caiu a fixa que não é só pelo Zé em particular que sinto a partida, mas pelo que envolve o seletíssimo grupo de superdotados que quero escrever umas linhas aqui. Zé Assumpção seria o primeiro a concordar com meu pensamento.

Conviver com pessoas de inteligência acima a da média e superdotados é ao mesmo tempo um prazer e um ato de paciência. Mesmo os mais afáveis estão bem fora do convenciona e vira e mexe fazem coisas também fora da curva, algumas muito além da curva. Em muitos casos a inteligência social não funciona no modo mediano, o que com certa frequência cria problemas os mais diversos.  

Ontem estive com um jovem que está fazendo uma pesquisa sobre a vida de Fernando de Azevedo. É óbvio que ele se encaixa nos fora da curva, mas a hora que eu lhe disse que ele também era superdotado a cara fechou e tive que contornar. A partir daquele momento ele começou a contar sobre uma pesquisa que está fazendo sobre cientistas que passaram pela vida brasileira e que foram mal compreendidos ou tiveram seus trabalhos esquecidos. Superdotados ou extremamente focados? Boa pergunta que nossa conversa deixou no ar. Fora da curva com certeza. Fato é que mal compreendidos.
Não temos uma política nacional para os superdotados. Muito pelo contrário, parece que o foco está sobre os ineptos, os imbecis e outras formas de limitados. Vide a qualidade de nossa educação. Alguns destes são tão bizarros que se encaixam no termo "fora da curva", a outra curva, a curva de baixo, e fazem sucesso por serem exatamente facilmente compreendidos ou risíveis, tristemente risíveis. Rir para não chorar. 

Uma das principais escolas do Brasil tem até hoje classe especial para os fora da curva, os melhores alunos, as melhores notas. Conheço quem foi destas turmas e nem por isto se deram bem na vida. A bem da verdade a qualidade que tinham é de um aprendizado rápido e fácil, de resto são quase pessoas comuns, mas muito mal aproveitados. 

Depois da missa um amigo comum, meu e do Zé, disse que o que impressionava era a capacidade de trabalho dele. É verdade, Zé tinha uma capacidade de concentração impressionante que somada à obstinação gerou excelentes resultados nos trabalhos realizados. Já a vida pessoal foi um tanto tumultuada, para dizer o mínimo, mesmo assim deixou muito carinho, e um monte de histórias bizarras, daquelas que só rindo.  

Zé ficou por aqui, São Paulo, Brasil, mas muitos cientistas, pesquisadores, os fora da curva e superdotados, preciosos, vêm voando para outros países na busca de reconhecimento ou simplesmente para ter uma vida minimamente comum, sem se sentir um aborto da natureza, o que é muito comum por aqui. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário