sábado, 29 de abril de 2023

Educação

"É uma questão de educação..." é a fórmula mágica para todos os males da humanidade e do planeta. Não resta dúvida que resolve muito, mas nem tudo. A maioria dos educados trazem consigo os vícios do grupo social e ambiente no qual vivem. Se a regra geral for "faz e está feito", sem menção aos cuidados no fazer  e sem preocupação com a qualidade do produto final, como faz muito tem sido regra no Brasil, a educação não chegará a seu fim.

Educação, formação ou treinamento? 

Não, educação não é a solução de todos males. Porquê o resultado final vem de um conjunto de situações ambientais, sociais e individuais. Quando um destes fatores não funciona bem os outros estão fadados a não desenvolver seu pleno potencial.
Educação ou tradição ambiental? 
Educação ou tradição social?
Educação ou caráter pessoal? 
Educação e tradição juntos, creio exceto quando entra o caráter, que no caso individual é genético, portanto imutável. 
É possível disciplinar e limitar os problemas de mal caráter, mas o caráter individual é imutável. Os aditos às ideologias dizem o contrário, mas o resultado que imaginam conseguir vem pela força bruta, não pelas qualidades da educação. 
Para complicar, a tradição é formada pelo conjunto de caráter e a forma como estes interagem. E a formação do caráter por sua vez tem relação direta com o meio ambiente onde vivem. 

"Tem que fazer o ciclo completo (de educação), incluindo faculdade". Desculpem,  mas que puta asneira. Tem que oferecer educação da melhor qualidade possível, principalmente a básica, o b a ba. Não é o topo da pirâmide, mas a base. 

Tenho alguns amigos que são professores universitários. Todos, sem exceção, continuam dando aulas porque precisam ganhar o pão nosso de cada dia. Todos, sem exceção, não aguentam mais o despreparo, o desinteresse, a falta de noção da imensa maioria de seus alunos. A primeira reclamação neste sentido que ouvi foi de meu irmão, morto faz mais de uma década, professor de uma das mais concorridas faculdades de arquitetura do país. Murillo contou um dia ter perdido a paciência em classe com a completa apatia dos alunos. Ele parou a aula e passou a gritar "Sonhem! Sonhem! Sonhem!...". Não serviu para nada, não entenderam nada, não faziam ideia o porque da reação de seu professor, continuaram os mesmos.
Nestes últimos anos é trivial ouvir depoimentos de professores universitários sobre o baixíssimo nível de preparo dos alunos que entram na faculdade. Já ouvi sobre faculdades que optaram por dar reforço de matemática básica para os calouros, do contrário é impossível seguir em frente com a educação. 
Recentemente a imprensa denunciou que algumas matérias não podem ser levadas a frente porque alunos completamente despreparados não querem ou não permitem que se toque em certos assuntos. O terraplanismo neste ponto confunde-se com o politicamente correto ortodoxo. 

"Os alunos não levam mais caneta e papel para anotar a aula. Eles ficam com o celular na mão olhando para a tela e não importa o que você, professor, esteja falando, não prestam atenção. Não dão a mínima. Querem o diploma e só. Saem da faculdade sem saber nada, sem ter noção do que aprenderam ou o que poderiam ter aprendido" diz uma professora exausta de uma das mais conceituadas faculdades do país.
Está feito... (tenho o diploma)

quinta-feira, 27 de abril de 2023

Está feito...

Está tudo cheirosinho, dá para ver que teve o cuidado de lavar, deixar secar bem estendido no sol, e até dobrou, mas sem cuidado com alinhar as pontas, dar um bom acabamento ao trabalho realizado. Do jeito que ficou enfiou no armário, uma massaroca no meio de outras massarocas. Tive que tirar tudo estava socado dentro do armário e dobrar de novo, e enquanto o fazia fiquei pensando se ela repete o mesmo cuidado parcial no seu trabalho. Se sim, pena porque ocupa uma posição profissional invejável.

Claro que tem profissionais de alto gabarito que conseguem realizar seus trabalhos com alta qualidade, mas não tem a mesma habilidade com outras coisas da vida. É muito comum, se não a regra. Não sei ao certo se é resultado da mudança dos tempos onde no passado as tarefas eram divididas e quem colocava a mão na massa sabia o que estava fazendo e por isto tinha prazer de deixar tudo o melhor e mais arrumado possível. Hoje todo mundo faz tudo, ou é obrigado a fazer tudo, e neste novo viver entra a obrigação de fazer coisas que não agradam. Coloco aqui o minha culpa: minha cama é feita o mais esticada possível, mas não tenho o mesmo prazer de tirar poeira, que é uma desgraça. Talvez por ter a mesma preocupação com o armário é que esteja fazendo este comentário sobre o bem lavado, secado, mas dobrado de qualquer jeito em questão.

A questão de fato é que tenho a sensação que a geração dela e a mais nova conceitua o fazer em geral de uma forma completamente diferente da minha e de nossos antepassados. A geração de meus avós tinha muita preocupação com entregar o produto final com o máximo de qualidade que pudessem alcançar. Talvez fosse muito mais fácil porque as pessoas tinham muito mais tempo disponível e viviam com muitíssimo menos bens que se vive hoje, não sei quanto a menos, mas uma diferença enorme de itens. Basta assistir qualquer filme rodado dentro de uma casa ou até palácio antes dos anos 70 para ver que não era atulhado como são nossas casas, salas, quartos, armários ou até o chão. Lidamos diariamente com um absurdo de coisas, muitas delas absolutamente inúteis, dispensáveis. Cuidar de uma unidade que lhe importa e faz bem é uma coisa, cuidar de muitas unidades fruto de compulsão, que você acredita que sejam (todas) muito importantes, é outra. É uma questão de tempo e estado mental.

Como será a qualidade dela no trabalho? Como será o nível de aceitação de seu chefe? Com afeta o produto final que chega para o grande público? Qual os impactos sociais e ambientais?
 
A minha geração continuou com os mesmos princípios de fazer e acabar, um pouco mais relaxado, mas ainda tendo disciplina para o princípio, meio e fim. Havia muita cobrança em tudo, da caligrafia ao sair engomado, do escovar os dentes ao tomar o banho e ter atrás da orelha limpo. Engomado, para quem não sabe, é estar com as roupas limpas e passadas. Ontem lendo dei com "senti o cheiro do ferro quente de passar roupa..." algo que a maioria não faz ideia do que seja. Não que passar roupa seja ambientalmente correto, muito pelo contrário, mas foi socialmente correto, e este é o ponto aqui.

O que será a essência de fazer bem para estas novas gerações? Qual o conceito de acabamento, da qualidade do produto final? Guardo o direito, e tenho muitas razões para tanto, de achar que está um tanto esculhambado, um tanto do jeito que está está bom, um enfia aí e fecha. Virou uma festa.
Está feito...

terça-feira, 25 de abril de 2023

Lula e os parafuso mucho loco

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Lula, do PT, afirmou que na humanidade deve haver 15% de pessoas com algum problema de deficiência mental e pessoas que possuem problemas mentais tem “desequilíbrio de parafuso”. Ouvindo a fala me lembrei imediatamente da vez que fui levado ao Ministério das Cidades, Governo Lula, para dar uma palestra sobre segurança no trânsito para ciclistas. Entusiasmado com o avanço social, fui convidado a conhecer o SEMOB, Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana, exatamente quem deveria cuidar da inclusão destes 15%, na época mais, na vida urbana. Para meu profundo espanto e desgosto trabalhavam lá uma dúzia de pessoas para atender e dar futuro digno a uns 30 milhões de brasileiros, dentre eles os com "desequilíbrio de parafuso". As inúmeras besteiras que Lula tem dito, e não é de hoje, é que podem levar este país "a uma hora acontecer uma desgraça". Dos piores problemas mentais que afetam uma sociedade se deve incluir o "eu sou dono da verdade", esta sim uma sociopatia, e a construção de políticas sociais para burguês ver, ou seja, populistas, uma desgraça inerente há muito na falas e ações do PT. Mudanças sociais sim, urgem, continuar pensando e nos tratando como idiotas não, basta! 

A saber, naquele momento, por volta de 2006, Brasil contava com algo próximo 40 milhões de bicicletas e 30 milhões de usuários no dia a dia, a quase totalidade população de baixa renda (ABRACICLO). Em 1981 IBGE, última vez que foi pesquisada a situação da bicicleta, contou 33% de bicicletas como modo de transporte e bem de primeira necessidade para os mais necessitados. Foi uma luta fazer o PT entender o que era e para que servia uma bicicleta e quando conseguimos em nome da transformação social implantou-se um sistema cicloviário em São Paulo que atende preferencialmente aos "coxinhas", como os próprios petistas chamam ou pelo menos chamavam os ciclistas de classe média. Resolver os problemas de mobilidade dos trabalhadores de periferia, que não são poucos? Zero. falo besteira? Vide projeto GEF - Banco Mundial PMSP 2007 que morreu e foi enterrado, dentre outros. Aliás, a coisa da bicicleta só andou quando o PT (Martha Suplicy) saiu da Prefeitura. 

Aqui repito, todas ações sociais tem meu pleno apoio, mas que não sejam palavras, mas ações; e que não sejam feitas de qualquer forma, a qualquer custo, mas com com inteligência, equilíbrio, visando respeito a todas as partes. Por isto na eleição tiramos a tropa de malucos do poder.

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Participe, proponha Leis

Quer mudar este país, seu estado ou sua cidade, a vida das pessoas para o que você acha que será melhor? Coloque no papel suas ideias e leve para um ou mais políticos de confiança. Se o ou os políticos forem realmente sérios, e é óbvio ululante que há políticos sérios (somos todos humanos), sua proposta será estudada, pensada, revista, redigida na forma da lei e se couber será levada a frente num processo que pode parecer chato, demorado, burocrático, mas que faz parte do jogo civilizado.
Sim, apresentar propostas realistas, porque mesmo até quem tem prática de vez quando acha, sonha, delira que é viável propor mudanças que são impossíveis naquele momento histórico, ou por que só funcionará quando se mudar outras leis relacionadas, ou porque atendem a um desejo particular que só atende a uma pessoa ou a um grupo muito fechado de pessoas, o que, diga-se de passagem, é bem comum. Pensou no "eu quero..." costuma não funcionar. Pensou no "será melhor para todos..." costuma dar melhores resultados.
Quando pensar e escrever o projeto de lei não esqueça da parte mais importante: escrever a justificativa do que se está propondo.

Mesmo que seu anteprojeto de lei não dê em nada, pelo menos no que diz respeito à criação de uma Lei e sua aplicação, fará o pessoal que tem poder pensar, o que uma hora ou outra ará diferença, disto não tenho a mais remota sombra de dúvida, foi assim que evoluiu a humanidade, foi assim que melhoraram as coisas. Propostas de lei, que são uma forma civilizada de diálogo, abrem caminhos que podem ser demorados, mas de qualquer forma terão um fim positivo.

Ainda sobre desejos, sua vida, o que você acha correto para você e os teus, o que você queira para sua cidade, seu estado, seu país, NÃO SEJA BURRO: participe, se interesse, e principalmente VOTE.

Hoje há um pandemia mundial pelo não votar. As justificativas são as mais diversas, mas todas elas têm um forte cheiro de "não brinco mais", de infantilidade, imaturidade. 
É absolutamente certo, como provam dados vindos da França, dentre outros países, que uma das razões para a extrema direita e o terraplanismo estarem avançando é exatamente o "eu não voto porque meu voto não vai dar em nada", claramente um "não brinco mais, não gosto do jogo, eu nunca ganho..." 


domingo, 16 de abril de 2023

A medicina da ética da salvação

Às 3:00 h da manhã fui avisado sobre a morte de um velho amigo, com quem convivi desde os 4 anos de idade. Estou, melhor, estamos todos aliviados. Cabeça dura e durão escondeu uma série de problemas que vinha tendo até ter passado longe do limite. Logo operado ficou claro para os médicos que ali estava um caso muito mais grave que os que eles até então consideravam como grave. Seguindo os ditames da medicina ele recebeu todos cuidados possíveis, várias operações nas quais lhe extirparam tudo o estivesse contaminado por uma septicemia, e não foi pouco. Poupo-os de detalhes. Isolado numa UTI especial recebeu sangue, hemodiálise, ficou ligado a mais cinco máquinas de remédios, dentre outras que não faço ideia para que servem. Os familiares foram avisados que caso sobrevivesse, praticamente um milagre e não força de expressão, meu amigo teria que sofrer várias cirurgias plásticas reconstrutivas e que depois destas provavelmente entraria num pesado tratamento de quimioterapia. 
A vida quis que eu passasse por sete anos convivendo com a morte de parentes e amigos, uma atrás do outra, por isso digo que lido relativamente bem com a questão. Vi muita situação pesada no pessoal e profissional. A verdade da brutalidade da morte veio em um fim de semana ouvindo histórias vividas por socorristas rodoviários e algumas vezes vendo fotos tiradas pela perícia em acidentes de trânsito. Na dor pessoal tive que acompanhar minha avó e minha mãe pedirem ao corpo médico que pelo amor de Deus não as ressuscitasse mais,  um familiar vegetando durante intermináveis sete anos para a família e amigos, saber como morreu atropelada a filha de uma amiga, dentre outros pesadelos, mas nada sequer parecido com o que vivemos todos nesta tentativa inútil de manter meu amigo vivo. O que aconteceu impressionou meu médico. Foi indescritível. Como previsto há duas semanas, hoje ele foi-se, felizmente. 
Escrevo este desabafo porque desde muito acredito que os limites da medicina perante a vida e a morte têm que ser revistos, o que vem acontecendo nos países mais adiantados. A ética médica atende a princípios que podem e devem ser colocados em discussão para o bem até da própria medicina. Vida e morte não podem ser mantidos sob uma conversa tão carola.
Aquele corpo que foi sendo lentamente esquartejado, desculpem os médicos meu sentimento, era de homem superdotado. Se estivesse ciente do que lhe estavam fazendo provavelmente teria pensado em dar uma última colaboração à ciência e ao futuro do planeta, mas não estava, e era líquido e certo que nunca mais estaria. A decisão sobre quanto prolongar o irremediável deveria ser dos familiares, mas nossa arcaica lei não os dá este direito.
Todos recursos e todas tentativas foram em nome da salvação, não sei se do paciente, naquele estado não mais que um corpo, ou a salvação dos médicos. Mesmo que para o deleite e a segurança legal dos médicos ele tivesse sobrevivido à barbárie, para familiares e amigos o futuro seria um suplício lento e massacrante sobre o qual parece não haver qualquer interesse da medicina. O problema a partir da salvação não é mais deles, médicos, simples assim. Coisas do negócio.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Qualidade? Vivo

Tenho um técnico da Vivo faz 7 horas tentando instalar um novo modem. Não conseguem sincronizar. Tive que mudar de plano porque meu telefone fixo ainda funcionava por fio metálico e sempre quebrava, melhor dizendo, estava quebrado, absolutamente mudo, fazia uns quatro meses. Depois de seguidos pedidos de manutenção, nenhum atendido, em nome de minha saúde mental decidi encerrar a vida do número que tinha desde 1987. Já podia prever que a troca de modem seria demorada porque toda maldita vez que o moldem teve que ser trocado foi o mesmo inferno. Ok, desta vez bem pior. Tenho todas as razões do mundo para acreditar nos funcionários, técnicos, atendentes e vendedores, como tenho todas as razões do mundo para acreditar na baixa qualidade geral da Vivo. Não conto a história dos problemas da minha linha fixa porque se os contasse seria um achincalhe total com a Vivo. 
Qualquer país desenvolvido sabe, sem menor sombra de dúvida, que o futuro depende completamente de um sistema de comunicação confiável, rápido e seguro. A brincadeira de mau gosto que estou vivendo agora com a Vivo prova mais uma vez que a coisa aqui neste Brasil vai muito mal. Não deve ser por menos que as operadoras de comunicação estão sempre dentro das campeãs de reclamações do público.

quarta-feira, 12 de abril de 2023

Violência nas escolas: fato previsível

Fórum do Leitor 
O Estado de São Paulo

Violência nas escolas: fato previsível

Alguém tem dúvida que "escola é local sagrado onde se constrói um futuro certo para todos e para tudo"? Neste Brasil que vivemos esta afirmação tão repetida sem dúvida tem pouco valor. Faz muito vem sendo relegado a um problema menor inúmeros atos de violência contra as escolas, principalmente as públicas, sem que a sociedade tenha uma reação imediata, inequívoca, forte e definitiva para freia-las. Depredação, roubos, tocar fogo, e porque não lembrar das abandonadas e precárias; desrespeito, desacato, ameaças e agressões contra diretores, professores e funcionários por parte de alunos e pais, o que é pior (Eu pago a escola!), desprestígio aos profissionais da educação, desinteresse pela diminuição do orçamento, são situações simplesmente comuns e absolutamente inaceitáveis para qualquer grupo social que tenha um remoto interesse real no futuro, para não dizer na civilidade. A escola está sendo vitima da violência endêmica deste país, gravíssimo problema de longa data de responsabilidade que não se pode imputar exclusivamente ao Poder Público; todos temos nossa parte aí, isto é líquido e certo. Violência se freia com pequenos atos de respeito ao próximo, como jogar lixo no lixo e não acreditar que só você tem direitos, por exemplo. Violência se freia com educação, cultura, civilidade. O que não vai resolver mais esta crise é histeria generalizada. "O filho é meu" é fato, mas a criança vive e viverá numa sociedade, portanto o filho, a criança, de certa forma é de todos, fruto de todos, fruto do ambiente, sem exceção. Passamos e faz muito o momento de entender, de fato respeitar e fazer cumprir o "Escola é local sagrado" e tem que ser cuidado como tal".  

segunda-feira, 10 de abril de 2023

Surfista agredida em Bali, brasileiras presas na Alemanha, e nossa justiça

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

O caso da surfista americana agredida por um brasileiro em Bali, das brasileiras presas na Alemanha há 20 dias, apontam mais uma vez, como sempre, para que nossa justiça, nosso sistema penal precisam ser aprimorados com urgência urgentíssima para que venhamos a ter um mínimo de segurança. Se neste momento só tivéssemos em pauta estes dois casos seria um milagre incompreensível no meio desta baderna diária, injustiças e violências que nunca acabam. Pois então, é trivial ouvir sobre homens violentos, que já perpetraram vários crimes, estarem livres, leves e soltos para continuar sua saga de barbaridades. O surfista agressor tinha contra si três mulheres espancadas aqui e, óbvio, repetiu a estupides lá fora, onde espero que seja preso, o que dificilmente acontecerá no Brasil, como não aconteceu no passado. Medida protetiva, para quem conhece, já viu ou ouviu histórias, só pode ser tomada como uma decisão da justiça, nada mais, ou seja, papel. Já o caso das duas brasileiras presas porque 'alguéns' já identificados e presos trocaram as etiquetas das malas em área dita de responsabilidade Federal aponta para a inépcia do Governo Federal Brasileiro em agir para liberta-las, o mesmo governo que diz aos quatro ventos que agirá com mão forte pelos direitos humanos dos desprotegidos e mulheres; o que até creio, mas tem que provar. As provas foram enviadas à Alemanha pela Polícia Federal, que óbvio não foram aceitas por ser uma questão que tem que ser representada pelo Governo Brasileiro. Se até a imprensa já divulgou imagens com os fatos probatórios que a droga não era delas, o que falta para liberta-las e traze-las de volta ao Brasil? Se Lula e sua tropa não gostaram de ficar presos porque as duas estarão gostando? Falta funcionar, simples assim. Não funciona, simples assim; a bem da verdade para tudo e todos. A quem interessa esta baderna? 


sexta-feira, 7 de abril de 2023

Planejamento, as cidades e o tempo perdido

Este bairro era até pouco industrial e de pequenas residências. Crescimento ordenado?

Ninguém neste Brasil tem a mais remota dúvida que o que nos falta é planejamento, como ninguém tem dúvida que temos um país largado, obras paradas, coisas mal feitas, precárias, que não atendem ao interesse real da população. Como é um escândalo a distorção social que temos, em todos sentidos.
Não é desenvolvimento a qualquer custo, definitivamente não é. Muito pelo contrário, no meio de um caos, de uma situação muito complexa como a que vivemos, é necessário um planejamento detalhado ou se cai nos planos milagrosos, a solução de todos os problemas, tão comuns em nossas pastagens.

Comecei a escrever este texto ainda em 2022. Publico agora porque o choque de realidade é muito grande quando se volta de uma organizada Europa, no caso Itália e França. A baderna urbana que estamos vivendo é literalmente impensável lá ou em qualquer país minimamente civilizado.
Já pensei e repensei o que escrever, meus pontos de vista, o que vi e aprendi nas viagens. Não consigo terminar o texto, e assim vai subir.

Texto de origem:

Brasil é cíclico em repetir suas tragédias - Felipe Moura Brasil.

O texto de João Lara Mesquita fala sobre a barbárie que vem a muito acontecendo nas cidades do litoral norte paulista onde a especulação imobiliária corre solta. O contundente artigo de João a meu ver é aplicável num contexto muito mais amplo deste Brasil desenfreado. O que vem acontecendo na cidade de São Paulo é de uma selvageria indescritível e não é de hoje, mas nunca foi tão agressiva como é agora.

.... Upa!!!, não, você jura? Só agora, em 2023? Parabéns ao Governo pela ação, mas espero que não seja mais uma populista, eleitoreira, para os mané vê

Primeira pergunta: Quem sabe o que é o Plano Diretor do Município?
Segunda pergunta: Para que serve? ou melhor, Para quem serve?
Terceira: No que os planos diretores passados mudaram sua vida e no que mudará este que aí vem?
A resposta para todas estas perguntas pode ser resumida em que a maioria dos cidadãos não faz ideia do que é o Plano Diretor e o que vai acontecer em consequência. Provavelmente também não sabe o que foram os Planos Diretores passados e no que nossas vidas mudaram para melhor ou pior por causa deles. Confesso que estou no meio desta maioria, mesmo me preocupando. Trato, ou tratava de saber por alto o que se pretendia.
Fato é que cansei de reagir, como está cansada a maioria. Minha pergunta hoje é como combater a barbárie.
Ontem numa conversa com amigos do mercado de capitais eu disse que o que está acontecendo aqui em São Paulo com esta explosão de novo imóveis não interessa sequer ao capital, ao dinheiro. Concordaram.

Já faz tempo que muitos estão assustados com o número de prédios que vem subindo às alturas na cidade. Vi um Youtube com críticas sobre novas construções na av. Rebouças, coisas que não tinha pensado. Para mim o primeiro problema é a brutal deformação da paisagem urbana, a perda de identidade. Não resta dúvida que é resultado do "a classe média vai ao paraíso".

Estenderam a data final para a entrega do novo Plano Diretor do Município de São Paulo. Soube que o Plano Diretor seria revisto, mas só agora, através de uma notícia acabei sabendo que está quase pronto e que foi dado mais tempo para palpites e acertos finais. Não entendi.
O futuro Plano Diretor, qualquer um que tenha sido aprovado, não pode reverter o que já foi feito e a barbárie que vem sendo feita sob a assinatura do direito adquirido.

No meio do bairro Cidade Jardim, do lado direito de quem sobe a avenida Oscar Americano, está um conjunto de edifícios de altíssimo padrão. Estão atrás do hospital. Pelo que me lembro o então Prefeito Jânio Quadros mudou o zoneamento da área, deu ok legal para a construção de todos edifícios, e meses depois voltou atrás na decisão, mas as construtoras já tinham direito adquirido e os prédios foram erguidos mesmo contra tudo e contra todos. É assim que funciona.
(Direito adquirido é o termo utilizado pela Constituição Federal para evidenciar a incorporação de uma expectativa de direito (a existência do potencial de conquista de uma vantagem legal) como direito efetivo em favor do titular, pelo preenchimento de determinadas circunstâncias exigidos na lei.)

Não está aqui uma lamentação de um paulistano velho e saudosista, mas de um cidadão com experiência de vida e leitura suficiente para saber que há limites para a velocidade que se imprime em qualquer mudança de vida ou social, na urbana nem dizer. Mudanças radicais só tem bons resultados quando devidamente preparadas, o que não é o caso.

Até onde sei a justificativa para a barbárie é concentrar pessoas próximo do sistema de transporte de massa, como foi feito em Curitiba a partir da década de 70 com Jaime Lerner. A princípio parece sensato, mas tem um pequeno detalhe: Lerner redefiniu Curitiba na década de 70, dando um crescimento ordenado para seu futuro. Tentar fazer o mesmo aqui em São Paulo num momento da história no qual ninguém sabe ao certo onde vamos parar, como vai ficar a questão das mobilidades, apostando só na derrocada do uso irracional do automóvel, pode fazer sentido, mas tem muito para dar errado, e está. O mínimo que já está acontecendo é a deformação da paisagem urbana e de sua personalidade. O que não vai acontecer, disto tenho certeza, é um dia irem atrás de quem ganhou rios de dinheiro com esta brincadeira.

Brasil é cíclico em repetir suas tragédias - Felipe Moura Brasil.

Paris tem 25% de suas propriedades desocupadas. As causas são várias, mas muita especulação imobiliária e muito RB&B, aluguel para turistas. 
Não faço ideia de qual é o índice de propriedades desocupadas em São Paulo, mas já foram divulgados os números de inadimplência e definitivamente são preocupantes.

Milão na pandemia parou e pensou o que será o futuro. 

Principalmente com a pandemia as cidades entraram num processo pós crise econômica e social que não deve terminar tão cedo. Mesmo em cidades que vinham caminhando para uma melhora de qualidade de vida já ocorriam uma série de problemas não tão aparentes, principalmente com as populações de baixa renda. A fórmula de progresso baseada em recuperação de áreas degradadas acabou valorizando estas mesmas áreas e excluindo ou empurrando para fora as famílias e comunidades de menor renda. Parece um contrassenso, mas infelizmente não é, acaba preponderando a lei do mais forte, da economia de mercado, e não se vê no horizonte outra perspectiva.

The environmental outcomes offer a sliver of “good news from this terrible situation” and may guide thinking “about what could be the future of the globe and our cities,” Pelizzaro said.

“We need to rethink our way of moving; we need to rethink the economy,” he commented. “And there is a huge opportunity to create a huge programme of investment in renewable energy and energy efficiency,” which could help with recovery and meeting environmental goals.

“We don’t have to look only at technology or health. We [must look at] emotional and psychological action at the same level of importance,” he commented.

Ruas sustentáveis de NY - Sérgio Abranches - vídeo de 2007


quinta-feira, 6 de abril de 2023

Breves histórias sobre papel higiênico

Aconteceu, acontece com todo mundo, abro a porta do armarinho do banheiro e não tem papel higiênico, acabou. E por que não escrever breves histórias sobre papel higiênico?

Entro no apartamento de dois quartos, dois banheiros, um praticamente escondido no quarto do casal, procuro por alguém, ninguém. Paz, santa paz! Vou fazer pipi, lavo as mãos, vou tomar um copo de água, uma voz baixa se faz sentir lá no fundo. Olho pela janela, vejo os meninos da igreja jogando vôlei lá em baixo, fazendo uma discreta algazarra. Coloco a cabeça para dentro e volto a ouvir um som surdo vindo sei lá de onde. Ponho a cabeça de volta para fora, vejo as crianças brincando e não entendo de onde vem o som. Saio da cozinha, caminho pelo apartamento, passo na porta do quarto do adolescente,  procuro, ninguém, vou a sala, ninguém. O som persiste. Paro no meio do apartamento pronto para ir até as janelas da sala no outro lado do apartamento e procurar de onde vem, quando ouço em alto e bom som "ô surdo! Traz papel higiênico!". Volto para o meio do apartamento, lembro do banheiro escondido, vejo uma cabeça a meia porta. Corro em socorro, entrego a mercadoria, não recebo um muito obrigado, e a porta de correr se fecha numa forte batida. São as delícias de se ter netos. 

O apartamento alugado em Paris era horroroso, inabitável. A sensação foi imediata ao abrir a porta. Sento na cama, melhor, no miserável sofá-cama aberto e já com o lençol esticado, e fico olhando em volta até esquecido que antes de entrar estava desesperado para ir no banheiro. A porta do pequeno banheiro está aberta, a luz apagada, mas é um banheiro, e lá vou eu. Ligo a luz e descubro que a única coisa que se salva no apartamento é o pequeno banheiro. Sento no trono deprimido. Aqui eu não fico. Na corriqueira posição "o pensador" de Rodin decido que vou procurar imediatamente um hotel para ficar. Olho o papel higiênico cor de rosa, "Que horror! Cor-de-rosa? Só faltava esta. Fazer o que? É o que temos". Nem chuveirinho tinha a porcaria. Que medão das lembranças dos papeis cor-de-rosa do Brasil. Mas, para minha gratíssima surpresa o papel higiênico é muito bom, mesmo sendo cor-de-rosa.   
Não foi complicado explicar para o proprietário e a locadora porque não fiquei no horroroso apartamento. Estava pago para uma semana e fiquei se tanto uma hora. Quero meu dinheiro de volta. Depois de conversas um tanto truncadas, recebi metade do que paguei. Aí pude fazer comentários no site.
O que você mais gostou: O papel higiênico, feio, cor de rosa, mas muito eficiente.

Londres: o clima estava frio e muito seco, para caminhar ótimo, o melhor possível, para o intestino nem um pouco. Ir para a rua, caminhar e pelo menos de hora em hora parar para um café expresso e um líquido, água ou suco. Comer o mais saudável possível, saladas, grãos, yogurts, frutas, mesmo assim o intestino fica seco, um horror para aquelas horas de "o pensador" de Rodin. Hoje sei o que é um parto, mas este não é o ponto. Depois da experiência tenebrosa mais água, mais yogurt, mais pimenta, enfim mais qualquer coisa para evitar... que seja. E finalmente de volta ao normal; as funções intestinais, bem entendido. Foi então e só então que descobri as delícias do papel higiênico da Rainha da Inglaterra, sim porque aquele papel higiênico tinha que ser o usado pela Rainha da Inglaterra. Deus salve o papel higiênico da Rainha da Inglaterra! No dia seguinte joguei um bom dinheiro na loteria inglesa. Se um dia entrarem na minha casa e o papel higiênico for inglês, aquele daquele hotel, estejam certos que tirei na loteria. Será o único sinal que darei sobre minha mudança de vida. Que delícia! Deus salve a Rainha!

Não me lembro onde, nem quero me lembrar. O preço estava ótimo, imperdível, e fui parar num hotel dito e escrito de luxo. Entrada clássica, recepção bacana de onde se via uma sala de estar muito bem arrumada com um bar ao fundo, o barman preparando um drink para um dos silenciosos hóspedes que lia jornal estendido na confortável poltrona. O recepcionista nos atende com raro esmero, faz os tramites, nos entrega as chaves desejando boa estada e ao mesmo tempo chamando o bellboy para carregar as malas e nos levar até o quarto. Elevador moderno, corredor acarpetado sem cheiro de mofo com belas gravuras nas paredes e alguns aparadores com flores naturais. Opa! Isto aqui vai ser muito bom. O quarto ótimo, janela com um boa vista, cama macia, presentinho sobre o travesseiro. Upa! isto é que é vida, banheiro grande com banheira e tudo mais. Deito um pouco no delicioso lençol, olho em volta feliz, pouco depois vem o ziriguidum da barriga e lá vou eu "pensar". No trono, naquele hotel onde de fato o vaso deve ser chamado de trono, feliz da vida... até o fura bolo.

Fui pego por uma gripe com muita coriza e diarreia, conto de terror para quem está no meio de uma viagem de férias. Para minha felicidade o banheiro do hotel tinha um rolo de papel higiênico na parede e mais dois outros extras prontos para serem usados. Foram todos no primeiro dia, todos no segundo, e quando fui sair para a rua no terceiro dia, já com a situação sobre controle, passo pela recepção e com muito jeitinho da gerente do hotel veio a pergunta onde estava indo tanto papel higiênico. Pedi desculpas, dei as razões, disse que estava melhor e me despedi agradecendo muito a atenção. Virei para a porta, dei um passo e soltei silencioso, mas muito cheiroso peido. Pergunto: com que cara se volta para hotel?

Chuveirinho, chuveirinho, santo chuveirinho.  

quarta-feira, 5 de abril de 2023

Abismo cultural

Não entendeu a foto acima? Olhe de novo. Não entendeu de novo?

Foi olhando vitrines e entrando em boutiques de roupas femininas que me dei conta, mais uma vez, do tamanho do abismo cultural que vivemos. É preciso educação, cultura, treino e capacidade para ver a diferença, está aí a sutileza. 

Soeur, esta foi a boutique que me fez voltar a pensar. Não é alta moda, não é roupa show, é roupa para o dia a dia, simples, mas muito chique. Nunca acompanhei moda, muito pelo contrário, nem sou paparazzi de vitrine, simplesmente descobri que algumas lojas, ou boutiques, tinham verdadeiras obras de arte, e, de novo, aqui não falo sobre alta moda, grandes nomes, preços malucos, mas sobre a sutileza da criação de alto nível, de qualidade, que vale a pena parar e ver com cuidado.   

Uma das ditas obrigatoriedades culturais de Paris é bater pernas para ver a moda, e se tiver dinheiro comprar. Comprar?


Galerie Lafayette, tradicional loja de departamentos, uma das referências de Paris e da França, um dos pontos de visita obrigatória para turistas, vive lotada. Todas as grandes marcas estão lá de roupas, bolsas, sapatos, perfumes, cosméticos... Chineses e árabes fazem fila para comprar o lançamento de uma bolsa de $ 8.200,00 Euros, simples assim. Cultura? Nada sutil.


A diferença é visível entre uma senhora discreta e sutilmente bem vestida, chique, e uma que não passa de um cabide de marcas caras ditas chiques ou cópias destas. Vendo duas pessoas com roupas semelhantes com certa atenção é possível perceber a diferença de qualidade entre as duas, uma sutileza que faz toda a diferença, pelo menos para quem se interessa. 
É com tudo, não só com roupas, sapatos, bolsas. O abismo cultural é patente, basta olhar.


Viajei muito com foco na comida, na degustação. Não fui atrás de restaurantes Michelin, que devem ser ótimos. Por exemplo, minha lista do que comer em Paris veio do respeitado chef e dono de restaurante Charlô, nenhum deles Michelin, todos restaurantes locais, dos parisienses, a maioria lugares simples. A lista me chegou as mãos por uma amiga e não foi seguida a risca, até porque descobrimos alguns que conseguem ser melhores. A diferença da escolha está na preocupação com a gastronomia, com o saborear, não com o deslumbre, o ir para contar história quando voltar. De longe a melhor refeição que fiz na vida foi em Alaçati, Turquia, num pequeno restaurante de 5 mulheres e umas poucas mesas. Cozinha de outro planeta, perfeita, delicada, sutil, memorável, incomparável. 
Minhas melhores experiências nesta viagem foram pequenos restaurantes de bairro, não tanto pela comida, mas pela frequência. Um deles, em Lyon, será pela vida memorável. Começavam a servir comida as 19:30h, até lá o pequeno restaurante, ou café, estava lotado de famílias vizinhas ao local. Bateu 19:30h todos foram se retirando, uns com seus filhos pequenos, outros com amigos, para a chegada dos que iriam comer, uma cena deliciosa que fez da degustação outra coisa. A bem da verdade o jantar foi bem gostosinho, com gosto da boa comida caseira.


Não é porque se está em Paris ou Lyon, dita a capital gastronômica da França que se vai comer melhor do que aqui, Brasil. Não é porque se está na Itália que tudo será delicioso. Não é porque está nos Estados Unidos que o hambúrguer será perfeito. O bouffe da padaria em frente ao Pão de Açúcar da Ministro Rocha Azevedo é maravilhoso, muito melhor que a maioria dos restaurantes de lá, muito melhor alguns restaurantes lotados que estão em volta. A questão é uns são considerados chiques e outros estão na França. 


França vive cultura, vive da cultura, vive pela cultura, vive na cultura. Estabiliza sua economia no turismo cultural. Cultura é ao mesmo tempo busines e um imperativo para o avanço seguro de todos e aí a diferença entre estas duas ditas culturas é abissal. Uma está nos levando para o abismo e a outra é a única saída para tentar evitar a catástrofe que nos avizinha. 
Não vou falar sobre o Museu Nacional do Rio de Janeiro ter torrado, dentre outras barbáries que pouco afetaram nossas vidas brasileiras, nem sobre o estado de nosso patrimônio histórico. 

Paris, a cidade luz, o centro da cultura francesa e um dos centros históricos da cultura mundial, recebe uma barbaridade de turistas que passam os olhos nas infinitas belezas que esta maravilhosa cidade tem de sobra. A maioria vai aos pontos turísticos que são muitos; os pequenos detalhes passam desapercebidos, mas estão lá por todas partes e de todas as formas. O olhar médio de um visitante de museu é de 8 segundos por obra de arte, sim, 8 segundos, afirma uma pesquisa realizada em importantes museus. Não duvido, me coloco aí. Isto é e não é cultura ao mesmo tempo. Claro que ao visitar um museu olhando de passagem tudo se leva algo para casa e para a vida, se leva alguma cultura ou uma poeira da cultura. Perde-se a sutileza. É quase impossível ver de perto a Monalisa de Leonardo da Vinci porque há uma montanha de turistas na frente, alguns só preocupados em fazer selfie. É cultura e não é ao mesmo tempo, mas para algo serve, nem que seja para autoafirmação do visitante. Poucos sabem que Leonardo da Vinci fez mais outras versões da mesma obra, mas que importa, o negócio é ver pessoalmente a Monalisa famosa no Museu do Louvre, uma espécie de condecoração para a vida, um diferencial entre os simples mortais.

Na TV passou um longo documentário sobre a criação do Museu D'Orsay, da revolucionária estação ferroviária construída em dois anos para a Feira Mundial de Paris de 1900, sua decadência, a decisão de aproveita-la e não demoli-la, o genial projeto e a detalhada reconstrução que resultou no maravilhoso museu que lá existe. O documentário de uma hora de duração é recheado de fotos, filmes, documentos, depoimentos e análises, numa riqueza concentrada que torna impossível desligar a TV, pelo menos para quem se interessa. Esta aí a sutileza. 
A TV francesa tem uns cinco canais que vão desde um besteirol mais elaborado, com viés educativo, até a divulgação de cultura refinada. Na BBC da Inglaterra a mesma coisa, "n" canais, não sei qual delas mais refinada, deve haver uma competição. RAI italiana, também, no geral um pouco mais popularesca, mas com pelo menos um canal com ótimos programas sobre a vida e a história do país. Provavelmente a mesma política cultural deva se repetir em outros países, na Alemanha com certeza. Lá, TV também é cultura é para valer, tem verba, incentivo, verba para produção; tem público, este é o ponto, tem público.

A França foi o centro da cultura e da modernidade na virada do século XIX para o XX. Um outro documentário na TV, Paris: Les années folles, conta a história da vida social em Paris nestes anos da Belle Époque, mais uma hora prazerosa em frente a TV, sem censura, mostrando o que foi, e toca gandaia aí, uma festa sem limites que faz o que acontece hoje ser coisa de criancinha. 

São inúmeros os documentários, longos, detalhistas, consistentes, sobre todos temas possíveis. A história contada como nunca antes. 


A Biblioteca François Mitterand, um conjunto de quatro edifícios monumentais, um em cada canto de espaço de 80.000 m² de cultura, deveria ser uma visita obrigatória em Paris. A bem da verdade são poucos os que voltam de suas viagens contando que foi a uma biblioteca. Uns raros entraram numa livraria.


Na entrega das bagagens do aeroporto uma senhora vestida com um conjunto de um dos mais caros estilistas franceses espera suas malas portando várias sacolas de lojas de grife. A cena é muito ostensiva. Escondida atrás de um óculos grande e todo brilhoso, também de alta grife, um rosto repuxado com lábios preenchidos, o famoso 'pico de pato'. Restou duvidas aos que não tiravam os olhos dela, que é exatamente o que ela queria, se tudo aquilo era original ou camelô. 

segunda-feira, 3 de abril de 2023

As transformações de uma cidade

Uma cidade, quatro momentos históricos, quatro soluções de uso urbano diferentes e bem definidas.


Lyon é tida como uma pequena Paris. Merece. Paris é incomparável, isto é certo. Lyon é muito menor, muito bem ajeitada, muito menos intensa. Dentro da cidade são quatro pontos a serem visitados; o pequeno centro histórico que deu origem a cidade séculos atrás, o centro velho, e duas áreas comerciais, uma construída há 14 anos e outra recente. Poucas cidades foram tão elucidativas sobre o que pode ser o uso público do espaço urbano quanto Lyon. Para mim acabou sendo uma aula.

O centros históricos de todo mundo viraram pega-turista. Mesmo com as ruas vazias de uma segunda-feira de manhã tive em Lyon uma pitada da desagradável sensação que vivi na rua que leva da estação de trem à Praça São Marco em Veneza. Estes centros históricos "é tudo igual", passagem da boiada turística cheia de lojinhas de bugigangas e lembranças, lojas de marcas, restaurantes típicos do local (típicos do local?) e tudo mais mais que um turista possa querer... comprar. A história está lá para uns poucos degustar, mas raros o fazem.

Já a Basílica de Notre-Dame de Fourvière, que se acessa via funicular e está em cima do centro histórico e olhando por ele. É de cair queixo. Muito mais recente que o centro histórico, datada de 1872, inteira decorada como mosaicos pré-rafaelitas, coisa que nunca tinha visto, é uma preciosidade, um dos pontos altos de Lyon, nos dois sentidos.
Do pátio lateral é possível ver quase toda cidade, que é plana, construções uniformes, mas no meio, para lá do centro velho, tem três arranha-céus meio mais alguns edifícios altos sem sentido. Pelo menos estão concentrados num ponto único da cidade.

Lyon - centro velho
O centro da cidade velho foi construído em grande parte por volta da virada do século XIX e início do XX, La Belle Époque, é organizada, ruas retas, largas, edifícios grandes, uniformes, que respeitam regras de construção, praças espaçosas, também com intensa vida de turismo, mas definitivamente não só, misturada com muita vida local, vida intensa, a que não depende única e exclusivamente do turismo. Tem um comércio variado e rico, muito além da bobagem dita rica que temos no Brasil, sinal claro que corre muito dinheiro. Tem uma rua mais estreita que as outras, provavelmente de época mais antiga, um tanto turística e cheia de restaurantes.
Esta Lyon da Belle Époque está contida entre dois rios, o que por si já diferencia a forma de viver aí.

Finalmente os dois centros comerciais que aparecem no mapa para turistas, mas não me chamaram atenção de princípio. Pela paixão de andar de bonde acabei caindo acidentalmente nestas duas áreas comerciais. Acabou sendo uma baita experiência, deu o que pensar. 

No bonde sem destino, como sempre faço, depois de cruzar o rio e umas quatro paradas, uma delas estranha, desagradável, dei de cara com um bairro moderno, genial. O que primeiro chamou atenção foi uma mega construção cheia de curvas, elementos retos e vazados a margem de rio. Desci do bonde rapidamente e dei com um imenso espaço de reformulação do espaço urbano com um grande shopping center, o que parecia ser um lago e edifícios modernos em contraponto ao shopping.

Subi a escada rolante e dei com um espaço aberto, ventilado, acolhedor, com vários pontos de vivência com vista para a água, o ancoradouro e os novíssimos edifícios. Muito agradável. Estava no que seria a praça de alimentação. Desci e quanto mais baixo o piso mais cara de um shopping center normal. Solução para lá de interessante. 


Talvez tenham os projetistas tenham pensado que seria uma solução urbana, mas um arranha-céu é arranha-céu e um shopping center é um shopping center, com todos seus vícios.


Na outra ponta da cidade estão os três edifícios altos e injustificáveis na paisagem. Lá vou eu, bonde de novo, parada aos pés de um destes edifícios com a entrada de uma fachada toda recortada, até interessante. O bonde segue por baixo desta fachada numa arquitetura mal resolvida. Cruzando a rua e olhando em volta os detalhe dos recortes são sensação agradável apagada e resta uma certa opressão pelo local cercado, uma espécie de beco sem saída, com um edifício alto e feio.
Entro, paro para um café e descubro que estes edifícios tem uns 14 anos e que a novíssima área reurbanizada de Lyon é recente. A diferença de inteligência aplicada é gritante. Isto aqui é financeiro, ponto final. O espaço aberto do outro lado da cidade também pode ser, mas leva em consideração que o espaço pode oferecer algo mais para a qualidade de vida dos que lá estão.

O shopping center é um shopping center e tenho dito. Westfield La Part-Dieu Shopping Center. A cobertura até tem um espaço para vivência e crianças brincarem, ponto final, é um shopping center, mesmo bem cheio de público, de compradores, é vulgar, não simpático, pouco amigável, mas pelo jeito o pessoal adora. Triste.
A nota negativa até para um shopping foi a distribuição dos banheiros, poucos, um por andar e não em todos, além do fato que se tem que pagar em duas máquinas 0,70 Euro para entrar. Detalhe: depois de muito procurar um banheiro encontrei com as máquinas quebradas, o resto não conto. Desconfio... que os banheiros foram projetados para evitar os indesejáveis ao comércio local. 
Ufa! saí do shopping! de volta a rua.
 

Não muito longe dali o segundo edifício alto com um pequeno shopping gastronômico, o Urbi Lyon Bocuse. A solução urbana é muito mais bem resolvida e agradável, com uma larga larga praça com vista para o moderno auditório de Lyon, uma bela concha de concreto do outro lado da avenida. Aliás, esta avenida tem o charmoso e agradável toque de uma das principais avenidas de Madri: larga, minimalista, com calçada em concreto liso, uma ciclovia e ajardinamento. Muito agradável, muito agradável. Só agora percebi que a boa solução para o espaço público me fez passar batido pelo edifício alto, ou seja, meu olho ficou no plano, na vida que estava na rua e praça. 
Dali segue por vários quarteirões uma rua em diagonal que foi fechada para o trânsito e está sendo trabalhada para ser só de pedestres, ligando duas grandes praças, a da foto, moderna, com uma de longa existência. Os quatro amigos cadeirantes e todos idosos que vi circulando por ela definem bem o bom uso do espaço público.


Paris vista da Basílica de Sacré-Coeur de Montmartre é toda plana, teclados na mesma altura, e só tem dois pontos de referência, o isolado edifício monolítico preto da Torre de Montparnasse e mais longe o imenso e disforme conjunto de edifícios La Défense. A Torre Montparnasse é muito estranha no meio da paisagem plana do entorno, mas acho interessante como um ponto de referência e o contraponto que faz com a Tour Eiffel. Para quem conhece Paris, olhando a distância com a Torre de Montparnasse é possível entender a cidade luz. 
A visão do La Défense é grosseira de longe com um dos edifícios, o maior, todo retorcido. De perto não é tão feio e felizmente as estranhas construções estão constritas a uma área bem limitada. Como ponto de referência serve menos que a Montparnasse porque está distante do centro histórico e cultural de Paris.  
A questão é que em todas as grandes cidades europeias e americanas, que são o sonho de consumo de muita gente, e bota gente nisto, o uso do espaço urbano é ordenado, tem uma lógica, não cai na selvageria imobiliária que temos aqui em São Paulo. A razão para isto é simples: que cidade se quer. Ordem chama ordem e baderna chama baderna; eles fizeram uma escolha, nós também.

Um detalhe que me marcou, preservaram a fábrica da Citroën, que está no meio da cidade, só mudando sua função. As fotos que tirei não refletem a beleza e a escala do edifício. Adorei. 



Mais fotos de Lyon:

O bairro novo e seu shopping aberto









Os arranha-céus e seu shopping


 




A rua transversal e sua nova praça