sábado, 25 de agosto de 2018

Alargar a Ciclovia Faria Lima

Mais que uma boa notícia, o número de ciclistas que passam pelo contador na ciclovia Faria Lima aponta para a necessidade de alargamento desta ciclovia num futuro muito próximo. Antes das novas bicicletas do Itaú não me lembro do contador chegar perto dos 4.000 ciclistas\dia de semana, o que logo depois delas passava diariamente. Depois da entrada das Yellow o número está quase nos 6.500 ciclistas\dia, pelo sim pelo não, 2+2=4, sorrisos nos rostos, a ótima notícia: com a estratégia correta dobrou o número de ciclistas na Faria Lima. E olha só: felizmente já é possível ouvir reclamação sobre o congestionamento na ciclovia.
Espero que esteja acontecendo o mesmo no resto da cidade. Na Ponte Cidade Jardim ajudei dois homens e uma mulher pedalando juntos nas Yellow que pediam orientação para chegar na Ponte do Socorro pela ciclovia Pinheiros. Opa! Longe, heim! Encontrei bicicletinhas amarelas estacionadas no pézinho numas ruas bem inesperadas, bem fora do circuito normal do pedal.
Mas voltando a Faria Lima; ontem tive que ir correndo para um PA (um conhecido teve um princípio de infarto) e para ir mais rápido cruzei a Faria Lima pedalando no meio do trânsito. Fazia um bom tempo que não pedalava como num vídeo game e adorei. Costurar os carros da avenida entupida deixando até moto para trás foi divertido, mas fiquei impressionadíssimo como piorou o trânsito. Pobres motoristas e motociclistas, não existe espaço sequer para passar bicicleta.
Cruzei a av. Rebouças em paralelo com um garoto pedalando uma bicicleta vermelha de estrada na ciclovia e cheguei bem a frente dele na av. Cidade Jardim, o que não esperava que fosse acontecer. Óbvio que pedalar na ciclovia é muito mais tranquilo que no meio dos carros da Faria Lima, mas mesmo pedalando rápido o ciclista da bicicleta vermelha demorou mais do que eu para cruzar aquele trecho de avenida.
No final da noite, por causa dos estúpidos faróis piscantes no olho, prefiro cruzar a Faria Lima pedalando junto aos carros e ônibus, e mantendo a mesma velocidade que os ciclistas na ciclovia vou um pouco mais rápido. A razão é simples: a fluidez do trânsito da avenida está calculada para beneficiar os automóveis, o que ainda faz sentido, mas deveria ser iniciado imediatamente estudos futuros para resolver o colapso na fluidez que começa a se instalar até na ciclovia. Numa avenida que não tem mais espaço para nada e ninguém onde encontrar mais espaço para quem quer que seja e todos juntos? Acabar com o canteiro central. Nunca! Tirar o que resta de verde? Sou totalmente contra. Tirar espaço dos automóveis? Imaginem só a gritaria! Desviar o trânsito para paralelas? Impossível, não existem paralelas, não exite caminho alternativo, ou passa pela avenida ou passa pela avenida, a matemática aí é simples, inequívoca e direta.
São Paulo, como boa parte das cidades brasileiras, tem um desenho urbano medieval e quis ter um trânsito com padrão americano. Não deu e nunca dará certo. E agora acha que ter ciclovias como das educadíssimas e organizadérrimas cidades de primeiro mundo vai resolver todos problemas. Com este nível de selvageria que estamos tendo inclusive entre ciclistas?
Só iremos resolver nosso entrave a partir do momento que nos portemos como gente civilizada e estamos um ano luz disto.

Bolsonaro? Como?

Veio pelo Whatsapp uma propaganda do Bolsonaro que mostra uma série de pessoas armadas reagindo e matando bandidos a tiros tendo como fundo uma marchinha suave ufanista que fala de um país em paz. Como? Mais loucura: recebi de um grupo de amigos e amigas Cristãos. Não são os únicos religiosos que acham que resolver na porrada e matando é a única saída para o Brasil. Uau! que fé é esta?
Duvido que este pessoal tão religioso que apoia incondicionalmente Bolsonaro, qualquer outro nome ou qualquer coisa que se proponha a esfolar, esquartejar, matar e queimar comunistas ou assemelhados faça tenham boa fé. Não sei para quem curvam os joelhos, juntam as mãos, fecham os olhos e rezam, mas sei que não entenderam o espírito da coisa. Textos sagrados, praticamente todos, independentes da religião, são códigos para a boa convivência e paz. Podem gerar várias interpretações, algumas mais duras, ortodoxas, mas nunca violência. Misturar fé com violência é necessitar desesperadamente uma fuga de si próprio.
Os mesmos que me mandaram o vídeo seguidamente mandam mensagens sobre Cristo. Será que Cristo apoiaria um Bolsonaro da vida? Faria campanha por ele? Instigaria a brutalidade, armaria os seguidores, desprezaria as mulheres...? Não me lembro de ter notícia sobre Cristo mandando apedrejar ou crucificar os opositores. Pelo que se sabe Cristo, como todos outros messias, era um homem inteligente, paciente, hábil político, e sobretudo pacifista. Ou entendi errado o "Amai o próximo..."
Mais louco no que estamos vivendo é mulher apoiar e divulgar causa desta extrema direita populista, por direita anacrônica, por populista burra, medíocre, perigosa. Igual para esquerda populista, por si só de extrema. Provavelmente nunca ouviram falar em Santa Inquisição. Santa Inquisição! com ideias tão atuais e parecidas às que o vídeo pró Bolsonaro propaga. Santa Inquisição que resultou em pelo menos um milhão queimadas em fogueiras, fora as incontáveis torturadas. "Caça às bruxas! Viva a caça às bruxas" cantam no mesmo tom estes novos inquisidores.

"Bandido bom é bandido morto", discurso tão comum, é de uma estupidez sem tamanho pela simples razão que bandido morto é queima de arquivo, perda de informação, perda de conhecimento sobre o modus operandi de nossos inimigos. Só sairemos desta guerra civil com inteligência, não com mais violência irracional, desmedida, medíocre, burra. Todos países do planeta que optaram pela violência institucional pioraram muito o que já estava ruim.

Já recomendei aqui e recomendo novamente que leiam o Que Las hay, las hay do psicologo, professor, historiador Néstor Ganduglia, livro de agradável leitura sobre quem foram de verdade as bruxas (mulheres comuns) e a perseguição ignóbia que sofreram durante séculos.  A igreja precisava de um mal para combater (Santo Agostinho) e criaram o demônio, logo depois desandaram a torturar e queimar mulheres. Um pequeno desvio numa boa causa?
 

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Yellow bike: sucesso, ciclistas novatos, depredação, roubo

As bicicletas comunitárias sem estação Yellow estão por todas partes aqui em São Paulo. O projeto está funcionando. O número de ciclistas no contador da av. Faria Lima, próximo ao largo da Batata, o único que conheço, aumentou mais ainda com elas. Já tinha dado um belo pulo com as novas bicicletas do Itaú. Ótima notícia.
Quem não está muito feliz com esta história são os pedestres. Não estar muito feliz é de uma delicadeza sem fim. Tem usuário de bicicletas comunitárias em tudo quanto é calçada, pior, muitos sem dar a mínima para os pedestres. E tem cada dia mais pedestre nas ciclovias, diga-se a verdade. 
Não sei porque, mas entre os usuários das Yellow tem um monte de novato, uns tantos aparentemente fazendo sua primeira experiência tentando pedalar uma bicicleta não no trânsito, na calçada. 
Ontem uma jovem mulher muito bem vestida que vinha de frente com uma Yellow do nada quase caiu. Não entendi nada. Pelo menos ela conseguiu não ir de nariz no cimento, parou de pernas abertas e uma das mãos no chão. Desajeitada tentou levantar a bicicleta que rodou sobre a roda dianteira e parou deitada no meio da ciclovia lotada quase derrubando o pelotão desvairado que vinha atrás. Felizmente tinha gramado dos dois lados e desviaram. Eu, de frente, praticamente parei, fui bem devagar para ver se precisaria de ajuda, mas ela, sem o menor pudor, ergueu a bicicleta 45º ainda ocupando metade da ciclovia, segurou-a com uma mão e com a outra disparou a digitar no celular fazendo cara de xingamento a todos que passavam curiosos e silenciosos por ela. 
Na calçada apertada da rua Butantã uma menina vestida num preto básico chique, salto 10 fino, meias escuras, desesperada não sabia para onde olhar, se procurava o pedal ou para o povo passando a pé. Simplesmente não conseguiu colocar a bicicleta para rodar. Empurrou até a ilha e voltou a suas tentativas apavorantes. A luta com a bicicleta foi dura, demorada, e uma hora lá foi ela cambaleando. Devia estar pensando "Estes pedestres não vão sair da frente?"
Depois de quase capotar de frente com sua dobrável a pequena senhorita que pedalava com um vigor incrível acalmou-se. Achei melhor acelerar e deixa-la para trás. Quando saí da ciclovia a esquerda, com tempo justo, mas com o trânsito que já chegava, percebi de canto de olho que a garota veio junto, numa manobra a beira da irresponsabilidade completa. Eu tinha espaço, ela ficou exposta aos carros e motos. Já na rua ela me passou sorrindo completamente inocente, desapercebida de sua própria besteira, e seguiu a minha frente pedalando muito forte num zig-zag que denunciava sua completa falta de noção do que estava fazendo na bicicleta. 
E os homens? Estes são piores. Tem que mostrar sua masculinidade ao pedal. Sai da frente! Sai do lado! Não fique atrás. Não esboçam qualquer vergonha, muito pelo contrário. 
Situações como estas está cheio. Espero que ganhem prática e segurança rapidamente e sem acidentes, o que acho difícil, mas este é nosso tempo.
Passamos por uma primeira etapa quando foram implantadas as "ciclovias" do Haddad e ninguém recebeu o menor treinamento ou folheto educativo. Foi um tempo de muitas barbeiragens, mas um pouco mais tranquilo que agora, talvez porque a bicicleta lhes pertencesse. Entramos numa segunda etapa, das bicicletas coletivas, onde a bicicleta é de todos, em se tratando de Brasil leia-se: de ninguém. Imagino que seja o tempo dos que tinham pânico de bicicleta e foram convencidos pelos fatos que a coisa não é tão perigosa como os cicloativistas pregaram aos 4 ventos. Do jeito que este pessoal pedala a bicicleta é sim perigosa, se não para o louco inconsciente que está sobre a bicicleta, mas com certeza para todos que estão próximos. Qualquer veículo mal conduzido é perigoso. Para este pessoal novo tomar jeito é uma questão de tempo - espero.

Roubo e depredação:
Num domingo em Paris não consegui encontrar Velib para sair. Comecei a andar atrás das estações, a maioria vazia, até que encontrei uma das grandes, perto da La Grand Épicerie de Paris (o paraíso da gastronomia) com 25 bicicletas, todas depredadas, todas. Deprimente, mas mais ou menos comum. Acontece em todas partes. É muito comum ver bicicleta com roda amassada em todas as grandes cidades europeias. Bêbados ou imbecis pseudo anarquistas? Não sei, mas adoraria entender o que leva qualquer um a depredar algo que só faz bem a todo mundo.
Infelizmente tenho visto algumas Yellow com rodas tortas sem qualquer sinal de colisão ou qualquer outra marca de acidente. Acredito que tenha sido pé na roda mesmo. Deprimente. Mais triste ainda é que soube de boa fonte que já aconteceram roubos e que estão sendo vendidas em feiras de rolo.
Acabo de ter a confirmação das depredações, mais do que esperado; dos roubos; da feira do rolo; e felizmente a recuperação de praticamente todas. Triste.

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

custo corrupção 3 X 9 custo problema em obras públicas

"O principal problema do Brasil é a corrupção" afirma categoricamente todo o povão mais o "não povão". Não é. Corrupção é um dos problemas do Brasil, mas nem de longe o maior deles.  
O Brasil perde 3 vezes mais do PIB com diversos problemas em obras públicas que com corrupção, ouvi na rádio e é o que se pode ler em vários artigos e estudos publicados. Custo de erro no projeto, construção, atraso na entrega da obra, obra inacabada... Não entra aí custos e prejuízos outros após a entrega da obra. Ou seja, 3 X mais que corrupção só no custo direto de obras. Quais custos indiretos? Congestionamento, acidentes causados por falha de projeto, perdas decorrentes de ineficiência funcional, durabilidade, geração de entulho ou resíduos para consertar... Garantia? Que garantia? Quem consegue acionar garantia de obra pública no Brasil? Quem tem interesse em acionar a garantia? Governo? Não. População? Acha porcaria normal, não faz ideia do que seja qualidade, muito menos garantia. Acha que não tem anda a ver com aquilo, que é coisa de corrupto... Corrupção, o conceito mágico para justificar tudo - e enganar todos.

 
Dois detalhes na foto acima, o remendo na calçada com cavalete e o asfalto refeito. Mais um detalhe: esta rua foi completamente reconstruída e inaugurada faz uns 6 anos. Arrancaram toda calçada, todo asfalto, toda brita, todos canos, tudo, e reconstruíram a rua do zero. A rua Eugênio de Medeiros de Medeiros, junto com boa parte do baixo Pinheiros, foi trazida para o século XXI brasileiro. Eu disse "brasileiro". Enterraram todos os cabos, refizeram todos os dutos e canos, calçadas bonitinhas... Fosse em qualquer país civilizado a rua Eugênio de Medeiros teria este perfil técnico desde o século XIX, ou seja, uns 150 anos antes. Com uma diferença: fosse em país civilizado teria projeto adequado, execução cuidadosa, deixaria mapas \ plantas precisas, teria garantia de obra longa (25 anos na Itália) que nunca seria acionada porque o processo todo teria sido trabalhado com total qualidade.
30 de setembro de 2012, a reconstrução já em estado adiantado  
Voltando a primeira foto e explicando os detalhes. O asfalto teve que ser quebrado em um longo trecho porque uma casa estava com problemas no esgoto, segundo contaram não corretamente ligado ao sistema de coleta (entenda como quiser). Na reconstrução esqueceram algo. O remendo na calçada (com cavalete) teve que ser feito ontem porque só agora, seis anos depois, vão finalmente retirar os postes e enterrar a energia e outros cabos, mas agora os operários não conseguem encontrar várias ligações das casas para o cabo de energia enterrado.
Esta obra pública, a extensa Operação Urbana Pinheiros, com uns 6 anos apresentando seguidos problemas não é novidade. Toda a vez que alguma prestadora de serviço tem que instalar ou mexer nos cabos enterrados acontece alguma coisa errada. Quando a prestadora de serviço é nova no pedaço eles tem que procurar onde estão passando os tubos enterrados. Os mapas existentes do subsolo são imprecisos, indisponíveis ou não existem? Não raro tem que quebrar a calçada. Isto em uma obra realizada faz 6 anos. Fora a calçada que já está se desfazendo em vários pontos. Isto para não falar sobre o concreto das ruas que já quebrou em vários lugares, principalmente nas tampas de bueiro. Fora o..., e o..., e... Uma intervenção imensa numa área extensa de grande circulação poucos anos depois numa condição triste. Deprimente!
Estou cansado de gritar no vazio. Garantia? Como se aciona a garantia de uma obra pública? Como se sensibiliza a administração sobre os problemas? 

Abaixo fotos de uma obra em Milano, Itália, durante as obras em 2015 e logo entregue ao público. Já escrevi sobre esta e outras obras em cidades civilizadas. Na segunda foto é possível notar a esquerda um desnível de 3 mm na tampa de ventilação, que foi corrigido, como se vê na terceira foto. E 25 anos de garantia. 

Corrupção é um dos nossos problemas, nem de longe o maior. Pensar desta forma pode nos fazer votar sem colocar na balança eficiência e qualidade, o real desastre deste Brasil horroroso que vivemos. 

obra em via de Milano, Itália, março de 2015

calçada em construção, Milano, Itália, março 2015

via pronta e entregue ao público em 2018. Garantia da obra: 25 anos
Um bom paralelo:
Bicicleta popular brasileira, as bem baratas, custam pouco e duram menos ainda. O segredo da história está em que o povão paga pouco, compra porcaria e tem que trocar várias peças logo em seguida, o que garante a sobrevivência de boa parte das bicicletarias e do setor. 
Primeiro, é uma sacanagem sem tamanho, ato de profunda má fé do mercado para girar mercadoria. 
Segundo, e ai sim um escândalo: não tenho números recentes, mas faz uns anos uma das concessionárias de rodovia de São Paulo afirmava que pelo menos 35% dos ciclistas mortos em acidentes a causa foi falha mecânica da bicicleta; ou seja, baixa qualidade.

recordações com Paul MacCartney Carpool Karaoke

Quando Paul MacCartney veio pela primeira vez a São Paulo conversei com Renata, "Vamos levar o Paul para pedalar?" Não conseguimos, mas ele pedalou por aqui. Que oportunidade perdida! E aí aparece este vídeo do Carpool trazendo um monte de recordações...

Se tiver que fazer uma relação entre os Beatles e a bicicleta volto aos meus 14 anos passando férias no Guarujá na pequena e charmosa casa dos Falzoni com Renata, Roberto e Ricardo, de vez em quando outros primos, Calico e Roberto em especial. Naquele 1969 Abbey Road tocou na pequena vitrola mono as férias todas, não sei como Yeda, santa mãe, aguentou. Parava quando íamos à praia ou quando saíamos a pé ou em bicicleta. Tínhamos a disposição três bicicletas Caloi Fiorentina, duas aro 26 e uma 24, se não me falha a memória.
Aquela foi uma semana feia, com dias de chuva contínua, céu cinza, enfurnados em casa, lendo e ouvindo música, pela manhã indo à praia para ficar desapontados com o mar furioso em ressaca. Choveu forte toda a manhã e o sol voltou com tudo ardente num céu azul límpido que abriu rápido no meio da tarde. Felizes desligamos a vitrola, guardamos o disco na capa, pegamos as bicicletas no fundo do terreno, eu e Renata. O sol de tão forte já fazia com que um leve vapor começasse a subir do asfalto molhado. Dobramos a esquina, entramos na avenida e subimos na calçada da praia pedalando forte rumo ao centro para tomar um sorvete na Caramba. A calçada levantada pelas raízes das árvores, figueiras-de-jardim, foram rampas para pulos de felicidade com as bicicletas. Pulei a primeira, pulei a segunda, meu pé escorregou do pedal, cai no selim que cedeu e dei forte com o saco no tubo superior. Tentei controlar a direção (e a dor) mas a roda passou sobre uma folha podre e molhada, escorregou, e direcionou a bicicleta para o meio do tronco da árvore seguinte. Pés escorregando no cimento molhado e cheio de folhas podres e parei no meu saco contra tronco e guidão. Caí em dor, retorcido, coloquei a mão nas bolas meio tonto e gemendo. Olho para cima, para os céus, e aparece Renata chorando de rir, tanto que também desandei a gargalhar entre os urros de dor. E foi assim que perdi a capacidade de ter filhos, felicidade para minhas namoradas que nunca engravidaram.
Yeda, santa Yeda, e foi assim que no dia seguinte Yeda devolveu o santinho para minha mãe na balsa Santos - Guarujá. O short não conseguia esconder o saco preto do tamanho de uma bola de futebol de salão, doloroso e vergonhosamente pendurado sob o fino tecido. O andar lento com pernas abertas só piorava minha vergonha. Até os peixes do canal olhavam. Confesso que até hoje não consigo entender como consegui entrar nos carros. O fim daquelas férias me lembro bem; em Santos e com outros primos indo ao quarto para rir. Nem a vitrola tinha.

Esta entrevista com Paul MacCartney para o Carpool Karaoke toca na alma, não só pelas histórias dos Beatles, mas pelas recordações que traz. Lembro de minha irmã ainda menina ouvindo o disco "A hard day's ninght" no último volume junto com Celinha e Regina num final de tarde de um céu azul mágico e uma temperatura agradabilíssima, provavelmente primavera. A vitrola ficava perto da porta de entrada da casa, que estava escancarada, e fiquei sentado nos degraus do pequeno terraço ouvindo as músicas com as três cantando e esboçando dança. 
Paul fala na entrevista sobre detalhes de várias canções.  Let it be, ligado a um sonho de MacCartney com a mãe, me remete a minha adolescência e uma Buenos Aires que andei, andei, andei por todas as partes simplesmente olhando a cidade e a vida dos porteños. Quando voltava para o apartamento de meu avô Arturo Raul ouvia o então recém lançado álbum branco dos Beatles de meu tio Zé Maria. Podia acompanhar as músicas com um livro ilustrado com as letras, mágico livro que nunca mais vi igual. A sonoridade das composições do álbum branco era nova, num tom especial, desafiadoras. Incrível, mas não me dei conta de Helter Skelter, provavelmente a música mais forte do álbum duplo. Talvez não esteja errado em dizer que foi um prenúncio do barulho punk que surgiria anos depois. Minha bisavó Mamita Elena dizia que ouvir aquelas músicas, mesmo a suave Black bird, durante as refeições fazia mal a saúde e mandava desligar a vitrola. Era uma Argentina fortemente ligada à Igreja e avessa a mudanças.
Ver Paul dobrar a esquina no Carpool Karaoke e falar sobre a Penny Lane me jogou direto aos domingos chuvosos que ficávamos todos, eu e os Falzoni, na sala de TV de Yeda ouvindo Sargent Pepers e Magic Mistery Tour, então desconhecido no Brasil. I'm the Walrus foi o trampolim musical para minha adolescência. Ainda hoje a ouço com raro prazer e emoção. Foi naquelas tardes frias e chuvosas que descobri a obra alucinadamente maravilhosa de Dali, o que dava mais força ao Walrus e Strawberry Fields Forever. Sempre aparecia a portuguesinha com uma grande tigela de pipoca quente e cheirosa. Tardes inesquecíveis. 
Tive a felicidade de poder ouvir não só Beatles, mas a maioria dos discos em aparelhos de som de ótima qualidade. Som de qualidade é outra história, outro universo, outra emoção, outra educação para o espírito. Eu próprio tive um Heico, um amplificador valvulado americano de baixa potência, mas grande precisão, que me foi dado por meu pai junto com caixas acústicas em madeira compensada que respondiam com perfeição aos graves, médios e agudos. E os discos eram LP, bolachas, tocados em uma ótima agulha. Cada detalhe saía das caixas e era apreciado com respeito. Quase enlouqueci meu irmão, vizinho de quarto; e todo edifício (a quem peço desculpas cada vez que passo na porta). 

Acredito que tenha sido o primeiro brasileiro a ouvir Taxman, do Revolver. O disco acabara de sair em Londres e Rodrigo, primo de meu pai, trouxe os primeiros imediatamente depois do lançamento para serem tocados numa rede de rádios espalhada pelo Brasil. Meu pai foi pega-lo no aeroporto e passou a mão num deles para minha irmã Dinorah,  Beatle maniaca. Chegou bem cedo em casa naquela manhã de névoa cerrada, abriu o móvel, colocou o disco num volume bem alto e me disse "Quero ver em quanto tempo sua irmã acorda". No meio da música estava ela e Celinha descem correndo escada e aos berros "O que é isto?" pulavam no meio da sala. 

Quando Paul MacCartney veio pela primeira vez a São Paulo conversei com Renata, "Vamos levar o Paul para pedalar?" Não conseguimos, mas ele pedalou por aqui. Que oportunidade perdida! E aí aparece este vídeo do Carpool trazendo um monte de recordações...

Se tiver que fazer uma relação entre os Beatles e a bicicleta volto aos meus 14 anos passando férias no Guarujá na pequena e charmosa casa dos Falzoni com Renata, Roberto e Ricardo, de vez em quando outros primos, Calico e Roberto em especial. Naquele 1969 Abbey Road tocou na pequena vitrola mono as férias todas, não sei como Yeda, santa mãe, aguentou. Parava quando íamos à praia ou quando saíamos a pé ou em bicicleta. Tínhamos a disposição três bicicletas Caloi Fiorentina, duas aro 26 e uma 24, se não me falha a memória.
Aquela foi uma semana feia, com dias de chuva contínua, céu cinza, enfurnados em casa, lendo e ouvindo música, pela manhã indo à praia para ficar desapontados com o mar furioso em ressaca. Choveu forte toda a manhã e o sol voltou com tudo ardente num céu azul límpido que abriu rápido no meio da tarde. Felizes desligamos a vitrola, guardamos o disco na capa, pegamos as bicicletas no fundo do terreno, eu e Renata. O sol de tão forte já fazia com que um leve vapor começasse a subir do asfalto molhado. Dobramos a esquina, entramos na avenida e subimos na calçada da praia pedalando forte rumo ao centro para tomar um sorvete na Caramba. A calçada levantada pelas raízes das árvores, figueiras-de-jardim, foram rampas para pulos de felicidade com as bicicletas. Pulei a primeira, pulei a segunda, meu pé escorregou do pedal, cai no selim que cedeu e dei forte com o saco no tubo superior. Tentei controlar a direção (e a dor) mas a roda passou sobre uma folha podre e molhada, escorregou, e direcionou a bicicleta para o meio do tronco da árvore seguinte. Pés escorregando no cimento molhado e cheio de folhas podres e parei no meu saco contra tronco e guidão. Caí em dor, retorcido, coloquei a mão nas bolas meio tonto e gemendo. Olho para cima, para os céus, e aparece Renata chorando de rir, tanto que também desandei a gargalhar entre os urros de dor. E foi assim que perdi a capacidade de ter filhos, felicidade para minhas namoradas que nunca engravidaram.
Yeda, santa Yeda, e foi assim que no dia seguinte Yeda devolveu o santinho para minha mãe na balsa Santos - Guarujá. O short não conseguia esconder o saco preto do tamanho de uma bola de futebol de salão, doloroso e vergonhosamente pendurado sob o fino tecido. O andar lento com pernas abertas só piorava minha vergonha. Até os peixes do canal olhavam. Confesso que até hoje não consigo entender como consegui entrar nos carros. O fim daquelas férias me lembro bem; em Santos e com outros primos indo ao quarto para rir. Nem a vitrola tinha.

Esta entrevista com Paul MacCartney para o Carpool Karaoke toca na alma, não só pelas histórias dos Beatles, mas pelas recordações que traz. Lembro de minha irmã ainda menina ouvindo o disco "A hard day's ninght" no último volume junto com Celinha e Regina num final de tarde de um céu azul mágico e uma temperatura agradabilíssima, provavelmente primavera. A vitrola ficava perto da porta de entrada da casa, que estava escancarada, e fiquei sentado nos degraus do pequeno terraço ouvindo as músicas com as três cantando e esboçando dança. 
Paul fala na entrevista sobre detalhes de várias canções.  Let it be, ligado a um sonho de MacCartney com a mãe, me remete a minha adolescência e uma Buenos Aires que andei, andei, andei por todas as partes simplesmente olhando a cidade e a vida dos porteños. Quando voltava para o apartamento de meu avô Arturo Raul ouvia o então recém lançado álbum branco dos Beatles de meu tio Zé Maria. Podia acompanhar as músicas com um livro ilustrado com as letras, mágico livro que nunca mais vi igual. A sonoridade das composições do álbum branco era nova, num tom especial, desafiadoras. Incrível, mas não me dei conta de Helter Skelter, provavelmente a música mais forte do álbum duplo. Talvez não esteja errado em dizer que foi um prenúncio do barulho punk que surgiria anos depois. Minha bisavó Mamita Elena dizia que ouvir aquelas músicas, mesmo a suave Black bird, durante as refeições fazia mal a saúde e mandava desligar a vitrola. Era uma Argentina fortemente ligada à Igreja e avessa a mudanças.
Ver Paul dobrar a esquina no Carpool Karaoke e falar sobre a Penny Lane me jogou direto aos domingos chuvosos que ficávamos todos, eu e os Falzoni, na sala de TV de Yeda ouvindo Sargent Pepers e Magic Mistery Tour, então desconhecido no Brasil. I'm the Walrus foi o trampolim musical para minha adolescência. Ainda hoje a ouço com raro prazer e emoção. Foi naquelas tardes frias e chuvosas que descobri a obra alucinadamente maravilhosa de Dali, o que dava mais força ao Walrus e Strawberry Fields Forever. Sempre aparecia a portuguesinha com uma grande tigela de pipoca quente e cheirosa. Tardes inesquecíveis. 
Tive a felicidade de poder ouvir não só Beatles, mas a maioria dos discos em aparelhos de som de ótima qualidade. Som de qualidade é outra história, outro universo, outra emoção, outra educação para o espírito. Eu próprio tive um Heico, um amplificador valvulado americano de baixa potência, mas grande precisão, que me foi dado por meu pai junto com caixas acústicas em madeira compensada que respondiam com perfeição aos graves, médios e agudos. E os discos eram LP, bolachas, tocados em uma ótima agulha. Cada detalhe saía das caixas e era apreciado com respeito. Quase enlouqueci meu irmão, vizinho de quarto; e todo edifício (a quem peço desculpas cada vez que passo na porta). 
Acredito que tenha sido o primeiro brasileiro a ouvir Taxman, do Revolver. O disco acabara de sair em Londres e Rodrigo, primo de meu pai, trouxe os primeiros imediatamente depois do lançamento para serem tocados numa rede de rádios espalhada pelo Brasil. Meu pai foi pega-lo no aeroporto e passou a mão num deles para minha irmã Dinorah,  Beatle maniaca. Chegou bem cedo em casa naquela manhã de névoa cerrada, abriu o móvel, colocou o disco num volume bem alto e me disse "Quero ver em quanto tempo sua irmã acorda". No meio da música estava ela e Celinha descem correndo escada e aos berros "O que é isto?" pulavam no meio da sala. 

segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Mais uma perda com a saída de Marta Suplicy


Nunca gostei da Marta Suplicy em si, mas não só reconheço o seu precioso valor na luta vitoriosa por causas nobres que vinham secularmente sendo consideradas menores ou ridículas, como fico triste em saber que ela está definitivamente fora da política, mesmo não concordando com alguns pontos de vista dela. 
Meu problema com Marta vai além da forma política que ela adotou. Para mim uma coisa é vaidade e a busca pela beleza; outra é exagero, chegar a situações que fogem à normalidade e podem prejudicar a saúde para atender parâmetros sociais, para mim uma forte expressão de fraqueza na justa ambição feminina. Ai a mulher Marta, cheia de plásticas e outros, me incomoda.
Marta e Eduardo moravam próximos de minha casa. Encontrei inúmeras vezes Eduardo na rua, sempre acessível, sorridente e mentirosamente político nas respostas e ações em relação ao que eu lhe falava sobre a situação dos ciclistas. Resposta zero, desinteresse absoluto, sorrisos inúteis mil! Detalhe: na época bicicleta, década de 80, bicicleta era o veículo mais usado no Brasil (IBGE 1981), era sim coisa de pobre, de operário de fábrica, com bicicletários monstros espalhados pelo ABC, berço do PT, e em todos cantos onde houvesse uma fábrica ou obra. O Bicicleta era sim prioridade social (IBGE), artigo de primeira necessidade para os miseráveis do interior deste país. Marta era uma loira que passava na rua de nariz em pé, na época bonita aliás, e só. A minha impressão cada vez pior de Eduardo colou em Marta. 
Marta fez o útil programa na TV voltado às mulheres. Logo após saiu candidata, se elegeu, e veio a público com o discurso de PT populista, já um tanto nós e os outros. Mesmo nas vezes que Marta teve razão a forma do discurso azedou muito a compreensão de sua boa causa, não só para mim. Um dia saiu com o famoso "Relaxa e goza"; depois a história do namorado golpista argentino e suas palmeiras imperiais..., e a venda da casa deles, Marta e Eduardo, com contrapartida da troca do terreno onde estão uma escola, posto de saúde, teatro, AACD, tudo muito mal explicado... Marta, vaidosa e cheia de si, não foi reeleita para a Prefeitura de São Paulo muito por causa da imagem que deixou. Depois foi eleita Senadora. Inteligência e energia ela tem de sobra para fazer bom trabalho, mas a vaidade atrapalha.
Não perdoo a grosseria com que fomos tratados, eu, Renata Falzoni, Sérgio Luís Bianco (petista de carteirinha) e mais alguém que estava conosco, creio que Teresa, quando entregamos reivindicações para os ciclistas que por pouco não foram jogadas no chão por Marta. O encontro desastroso aconteceu num evento na Praça Patriarca, onde Marta vomitou toda sua prepotência em breves palavras e gestos ásperos, inclusive pelo ostensivo do segurança ameaçador ombro a ombro com ela. Saímos de lá com uma Renata dizendo "Queria estar com a filmadora ligada".
É inegável a importância de Marta em causas cruciais para a construção de uma sociedade justa. Não ter simpatia pela causa da bicicleta é um posicionamento completamente aceitável. Ser grosseria, pesada, prepotente, não. Lembro a ela que a bicicleta foi de grande importância para a causa feminista em seus primeiros passos no final do século XIX, assim como para a causa operária e o nascimento da esquerda. “Ao socialismo se vai de bicicleta”. Marta não tem obrigação de saber, mas dado a sua brilhante inteligência e viés de esquerda, sendo ela atrelada a um partido operário, era de se esperar que pelo menos entendesse.
Infelizmente o Brasil, no meio desta baderna, deste caos, desta guerra civil não declarada, tem perdido inteligências imperdíveis. Marta é uma destas. E assim a cada dia imbecis ganham mais espaço. Só posso dizer uma coisa: estamos fu!
Marta, obrigado.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Jotta Santana

Ontem fui avisado sobre a morte do Jotta Santana, uma das figuras mais simpáticas com quem trabalhei e que me ajudou muito nos tempos da Bicisport. Tenho que agradecer toda a equipe de redação da Bicisport, Panara, Marc, e muito em particular o Jotta, que foi de uma paciência e cortesia impar. A bem da verdade agradecer a todos de lá que me abriram as portas para o que vim a fazer depois. 
Abraço e boa viagem meu caríssimo Santana, como sempre chamei esta figura maravilhosa.

Infelizmente se perdeu numa enchente todo material fotográfico da Bicisport, que tinha fotografias do.... do... (vergonhosamente não me lembro do nome do excelente fotógrafo da época) e provavelmente também de Jotta Santana. 
Encontrava eventualmente Jotta pelas ruas que sempre estava sorrindo e leve. Neste exato momento está sendo cremado em Vila Alpina numa cerimônia discreta, como foi sua vontade.