sábado, 31 de dezembro de 2011

Ladeiras do novo trajeto da São Silvestre

31 de Dezembro de 2011
O Estado de São Paulo
São Paulo Reclama


Mudaram o trajeto da São Silvestre, mas não explicaram por que ou quem desenhou o novo trajeto. Quem conheceu a descida da av. Consolação, do antigo trajeto, sabe que este era o ponto onde mais pessoas se machucavam. Acredito que não deva haver estatísticas, infelizmente. Estatísticas podem colocar em situação desagradável as posições de alguns manda-chuvas.
Quem corre a pé sabe que as descidas da rua Major Natanael, logo no início da prova e av. Brigadeiro Luiz Antônio no final são muito íngremes para a maioria dos corredores. Hoje está chovendo, o que só deve piorar a situação. Descidas forçam demais as articulações e musculatura de qualquer corredor e não raro geram lesões. Qualquer evento esportivo deste porte, com mais de 10 mil participantes, acaba sendo questão de saúde pública e cuidados devem ser tomados para o bem estar geral. Provavelmente cuidar do bem estar dos atletas seja um deles.
Não sei de quem foi a idéia de mudar o trajeto. A razão principal provavelmente é o tumulto que a chegada causa na av. Paulista em razão do preparo para a festa da virada no mesmo local. Ou terá sido mais uma vez uma questão de fluidez do trânsito? Ou as duas coisas juntas e algo mais? O fato é que estes grandes eventos são fácil e freqüentemente mudados, o que acaba com a tradição. A Prova 9 de Julho, importante evento ciclístico paulistano e brasileiro, está confinada às moscas no autódromo de Interlagos; a Maratona de São Paulo saiu do Centro e perdeu o grande público... A leitura que se faz é que a cidade de São Paulo continua não sendo um prazer da vida para os paulistanos; mas um direito para a vontade e manias de uns poucos. Usos, costumes e tradições pouco ou nada valem. “São Paulo não pode parar” (‘sic’  tão repetido).

sábado, 24 de dezembro de 2011

Feliz Natal, Cidade Natal

O preto velho cruza por trás do povo que assiste distinto o coro de músicas natalino que se concentra nos degraus da Catedral da Sé e pára na beira da rua. Tem os cabelos e barbas completamente brancos, desgrenhados pelo forte vento da chuva que vê vindo. Veste sobre seu velho e surrado terno um casaco de Papai Noel muito bem cuidado, vermelho intenso, gola branca impecável. Começa os primeiros pingos e a multidão foge para se proteger e se apinha do outro lado da rua debaixo de marquises, bares e cafés abertos. O preto velho permanece ali impassível, como se soubesse que aquela chuva não seria capaz de parar os acordes delicados do coral. Terminam uma música e o quase só se ouve o aplauso do solitário preto velho que sorri e aproveita o espaço dos que correram para se aproximar do coral e da escadaria. O maestro gira o pescoço, olha para os lados, vê nuvens passando rapidamente e o azul tomando o início de noite de verão. Olha para o coral feliz. Todos passaram pelo aperto dos maus tempos e lá permaneceram afinados. Olha para trás para agradecer o aplauso efusivo e dá com o Papai Noel preto de olhos e dentes intensos de alegria. Enquanto volta a cabeça para o coral percebe que os fugitivos estão aos poucos voltando. Umas últimas gotas caem sobre a partitura, sem mexer a cabeça ele lança um olhar para os céus e levanta os braços. “Dóóóó....”. Pára as mãos abertas para frente, aponta os tenores, move os lábios “um, dois, três” e a nova música vem num crescente de trás para frente, enche os pulmões e todos degraus sobrepõe vozes delicadas para formar o louvor.

As luzes da cidade começam acender. Pouco depois os holofotes amarelados da Catedral batem na fachada e contrastam com o cada minuto mais azul do céu com suas últimas nuvens apressadas. Entre a multidão e coral está o Papai Noel. Termina a música, mais aplausos, que aos poucos vão silenciando. O maestro virasse e agradece. Aponta o coral. E percebe um cantar suave, barítono cheio e preciso, mas baixo, bem baixinho, entusiasmo puro. “Estrela brasileira”, pesca o maestro, que percebe pelo sorriso envergonhado que a voz é do preto velho Papai Noel. Dá um sorriso de aprovação, volta-se para o coral e faz as últimas músicas da noite quase sem parada.

O povo já se espalhou feliz pela paz do silêncio da praça. O preto velho continua lá. O coral festeja nas escadarias junto com o maestro. O preto velho quieto e sorridente segue olhando. “Deve estar bêbado. Deixa para lá”; mas maestro e duas cantoras descem as escadas. O preto velho esconde os dentes, mas mantém o sorriso e brilho dos olhos. “O senhor gostou?” E a resposta veio muito positiva dos olhos tímidos. A roupa de Papai Noel impressiona pela beleza. E o preto velho pela magreza sob o terno surrado, mas bem cuidado. “O senhor canta bem. Ouvido de maestro pega tudo. Já contou?” “Só para meus filhos. E hoje para os netos. Mas me desculpem, mas tenho que ir andando para chegar em casa.” E sem saber porque o maestro pergunta “Onde o senhor mora?” O preto velho, um tanto envergonhado, continua sorrido, olha o infinito, e depois de um breve silêncio responde: “Umas 3 horas caminhando”.

Um pouco a frente o coral cerca o preto velho Papai Noel. “Vamos todos de bonde. Vamos acompanhar o senhor. Pode ser?”. “Meu filho; moro num canto muito simples, vocês não vão querer ver...”. E quando se dá conta já está a caminho de casa, Papai Noel ao lado do motorneiro, coral balançando ao gosto dos trilhos, pontuado pelo sino das paradas. Numa delas pediram e ganharam o goro vermelho que faltava ao velho.

Dizem que ali nasceu uma nova cidade. Aquele coro voltou um pouco tarde para suas casas, mas foram recebidos sem ressalvas. Havia sido uma noite mágica e ninguém sabe até hoje quem era aquele senhor, para onde o acompanharam, onde exatamente ele morava. Mas todos do coral lembram que entraram pela viela naquele lugar muito simples, pobre mesmo, cantando. Atrás deles entrou um bumbo, e aos poucos a marcação era de samba. Na casa do preto velho ele pediu silêncio e cantou para os netos “Noite Feliz”, e acabada esta mandou que todos voltassem para suas casas. “Tem gente esperando vocês. Não cheguem tarde. Vão embora. Obrigado”.

A boa notícia correu; primeiro boca a boca, depois pela rádio, jornal e TV. O maestro repetia que entrar naquele local cantando foi o momento mais feliz de todo coral, e que as pessoas precisariam experimentar, não importa o lugar. E um dos repórteres pergunta se valeu a pena. “Vão! É um milagre. Há uma cidade lá fora que não conhecemos. Natal não é um presente. Natal, de ‘nascimento’, é uma dádiva. A cidade não é um presente, é dádiva. Vão em coro, vão juntos; mas vão! Peguem o bonde”. “E o Papai Noel preto velho?” - pergunta outro repórter? “Ele deve estar cuidado da família e da comunidade. Este é o espírito”.

Feliz Natal

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Natal

1962

“A meia não entra, a meia não entra!”, reclama o menino de 6 anos angustiado, sentado na borda da cama, sem perceber que na pressa está colocando a meia de cima para baixo. Está praticamente pronto, banho tomado, roupas limpas, passadas e cheirosas, cabelo engomado penteado cuidadosamente para trás, um sapato preto lustroso no pé, outro no chão, e a meia que não quer entrar na mão. A família passa pela porta e olha fazendo caretas. “Não existe meia que não entra no pé. Olha com calma a meia”, diz a mãe; e o menino remexe na meia irritado e volta a reclamar que “a meia não entra”. A irmã mais velha entra no quarto com a toalha enrolada na cabeça, tira a meia da mão do irmão, olha bem e grita “Mãe, quem costurou o furo da meia? Costurou o buraco e fechou a meia. Ele não vai vestir nunca esta meia”. “Pega outra meia cor azul no armário e ajuda seu irmão a vestir”, responde lá do quarto a mãe. E completa “Deixa a meia fechada em cima da mesa que esta eu quero ver”. A irmã pega a meia no armário e o irmão diz que ele mesmo veste. Ela sorri, entrega as meias, faz um carinho, “Veste logo”, e volta para o banheiro desenrolando a toalha da cabeça. Ele termina de se aprontar e sai correndo escada abaixo.

Todos prontos. “Cadê este menino?” E de dentro da casa ele começa ouvir os chamados da família, primeiro calmos, depois aos gritos. “Estou aqui, estou aqui”, responde ele sem sair da sua pequena bicicleta. O pai vai até o corredor da garagem e vê o filho girando para cima, para baixo, não fala nada e volta para dentro da casa. Em seguida surge a mãe, linda, bem vestida, pronta para a festa, e no passo do salto alto com vontade de rir chama a atenção do menino “Você já está todo suado”, passa a mão com suavidade na camisa do filho, “Nós vamos para o Natal. Você não poderia ter ficado quieto por uns minutos? Não poderia ter ficado quieto na televisão? Sempre a bicicleta, sempre a bicicleta... Vamos, deixa ela lá dentro e vamos que já estamos atrasados”.

Há muitos caros estacionados perto da casa velha. “Me ajuda a levar os presentes, por favor”, pede a mãe para todos filhos. A porta da frente está aberta e já da escada se vê muita gente passando entre as salas. Do porão dois primos sobem correndo, quase derrubando os presentes. No topo da escada a família faz uma parada. São bem recebidos e começa o “Feliz Natal” acompanhado de sorrisos que será repetido algumas centenas de vezes, tantas quantas os parentes que cruzarem a frente. É muita gente junta. Há algumas meninas mais velhas sentadas conversando na escada que leva aos quartos. Elas acenam e continuam conversando, ou provavelmente fazendo fofocas. O menino se desprende da mão da mãe e some no meio da multidão. Corre para ver a árvore de Natal e o pequeno Papai Noel que se mexe sozinho. Encontra os primeiros primos de sua idade. Conversam um pouco e logo saem correndo por entre as pernas dos adultos. O menino passa pela sala de jantar, pára para admirar a cuidadosamente a mesa preparada para a ceia. Dourados, brilho, uma toalha de renda, detalhes em cor vinho, velas, um grande arranjo central com frutas e nozes. Há três anjos pendurados e um grande lustre de cristal cheio de lâmpadas acesas. Cadeiras vazias. E no menino toma uma palmada carinhosa, “Vai brincar que aqui não é lugar de criança”, diz alguma tia que o menino já viu, mas não sabe bem quem é. E ele dispara. “Pela cozinha não!!”, grita a tia brava e inutilmente.

Lá fora estão muitos primos, distribuídos pelo jardim, agrupados por tamanho, e um velocípede que passa conduzido por garoto feliz e arrogante pelo seu novíssimo presente. Velocípede vermelho. O garoto passa sorrindo olhando nos olhos. ‘O velocípede é meu’. Os mais velhos acham a situação engraçada e fazem chacota do garoto. Ele não está nem ai e segue em frente costurando entre os primos.



1982

Um pouco antes do banho o mocassim foi engraxado com cuidado. Está brilhante. As roupas estão cuidadosamente estendidas na cama. São vestidas com bastante calma. Depois do mocassim vem o toque final: prender a perna da calça para ela não sujar na corrente. Ele sai do quarto, vai até a sala, dá um beijo na testa da mãe. “Você está muito chique. Abaixa um pouco para eu arrumar o nó de sua gravata”. E enquanto acerta gravata e colarinho desce os olhos e pergunta com falso tom de espanto: “Você vai de bicicleta?”. Olha nos olhos do filho com autoridade de mãe e dispara “Vai devagar para não chegar suado e vê se não suja roupa. Que hora você está de volta?”. “Fica tranqüila, eu volto cedo. Só vou dar uma passada para desejar Feliz Natal e rapidinho volto. Se eu for com o carro não vai ter lugar para estacionar. Vai ser um saco”. E quando a porta já está quase fechada ouve-se “Vai com cuidado. Volta rápido”. “Beijo”.



2002

O tempo que a chegada do ciclista na festa de Natal era quase aguardada como a chegada de um aventureiro ficou para trás. Já eram dois a ir para o jantar pedalando. Ele entra e já não perguntam mais “Você veio de bicicleta?” Mas ninguém esquece a primeira vez que o primo ciclista chegou na portaria do edifício e o porteiro desandou a repetir “Com a bicicleta o senhor não entra, com a bicicleta o senhor não entra...” Teve que descer o tio para convencer o porteiro. Nos Natais seguintes o ciclista foi recebido pelo mesmo porteiro com quase inaudível e acabrunhado “Boa noite, Feliz Natal para o senhor também”. De rabo de olho o nortista deixava sua contrariedade com aquela situação. A história virou piada obrigatória do Natal.



2011

Chegou o tempo das luzes da cidade, das ruas decoradas, do clima de festa. As ruas estão completamente lotadas, entulhadas de carros com suas janelas pretas e fechadas. Há uma reclamação geral que não dá mais para sair de carro. Muitos vão a pé ver o Natal criado para ser visto. Se as lojas ainda não estão cheias, os supermercados e as casas de comidas estão. Não dá para entrar. Não há mais espaço para tanta gente. Faz um bom tempo que a bicicleta tem dificuldade de encontrar espaços para passar entre os carros e até mesmo nas calçadas. Já não é mais só um fenômeno de Natal. O velho ciclista encontra um velho e querido primo na bicicletaria comprando uma bicicleta para a mulher. Linda bicicleta.

- Você saiu em algum passeio para ver as luzes?

- Saímos alguns dias atrás. Antecipamos por causa do trânsito. Provavelmente vamos sair de novo, mas bem mais tarde, lá por volta das onze, quando o trânsito melhora.

- Você viu o pessoal que saiu com Papai Noel bem gordo na frente e uma bicicleta carregando uma árvore de Natal grande decorada e iluminada? Estes leds fazem milagres. Tava muito divertido.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Ir para escola pedalando



“Não dê esmolas. Dê futuro”. Sempre gostei deste slogan criado em 2005. Não dê esmolas, dê futuro - nada mais sensato. O que é este Brasil que está sendo construído agora? O que é nossa vida diária? O que somos? Somos fruto do que?
Ordem e progresso demandam ações que nem sempre são fáceis, principalmente quando a sociedade historicamente, como a nossa, tem mais olhos para seus direitos individuais do que deveres. Direitos, que por egoísmo, comodidade, ansiedade e até e principalmente ignorância, facilmente viram espécie de esmolas entregues como legítimas em ladainhas atraentes. Infelizmente passamos a aceitar com incrível normalidade o  “Deus lhe pague!” e pouco pensamos e respondemos “Ajuda-te e ajudar-te-ei”. Esmola é um vício, uma bebedeira que te deixa alegre hoje, mas vem com uma trágica ressaca social amanha.
Esmolas transformadoras de nossas cidades.
O que está acontecendo agora com nossas cidades? Cidades são seres vivos, sempre se transformam, ou se deformam. O que aconteceu no passado que levou nossas cidades a esta baixa qualidade de vida de todos, dos pobres aos ricos? Creio que o egoísmo de cada um e de todos, respaldado nos desejos de grupos específicos, e no silêncio conivente de todos, absolutamente todos, sem exceção. “A cavalo dado não se olha os dentes”. “Cuidado com teu telhado de vidro”.
Somos uma fábrica de presuntos. Mortos, se quiser. Ou, como faço questão de afirmar “casualidades de guerra”. Só pára uma guerra quem tem atitude. Só muda uma sociedade quem tem atitude. O resto é subjulgado pelos acontecimentos.
Segregar salva? Vidro preto, muro alto... Segregar é esmola ou futuro? Cidade é coletivo ou individual. Cidade é atitude ou aceitação incondicional? Cidadania é subjulgar-se?
 
Ter coragem

Hay que tener cojones! Isto aqui é uma guerra!
A Secretária Municipal de Educação de São Paulo está trabalhando para por em prática um projeto audacioso, fantástico e ao mesmo tempo politicamente arriscadíssimo: entregar aos alunos das escolas bicicletas para eles irem e voltarem da escola. O Governo Federal tem um projeto destes, mas em cidade pequena a história é outra. Aqui estamos falando sobre crianças no trânsito de São Paulo, o monstro mitológico. É preciso coragem! Parabéns.
A coisa que mais comum é ouvir que São Paulo não está preparada para a bicicleta. (E precisa?) Eu não perdi a conta quantas vezes ouvi mães e pais ciclistas afirmando que seus filhos jamais pedalarão nas ruas desta cidade infernal. A questão é que um monstro como São Paulo é muito diversificado e a realidade muda de bairro para bairro, de área para área, de rua para rua. Diz que é impossível quem faz questão de ficar dentro de seu castelo medieval, e a estes aviso que a Idade Média acabou já faz um tempinho. Na periferia a bicicleta é realidade. O jogo lá é outro. O pessoal não fica esperando, porque se ficar o bicho pega.

Dar bicicletas para adolescentes e crianças tem um grau de risco alto. Não dá para errar com as escolhas das escolas, professores, pais, bairro, trânsito... A segurança do ciclista depende de detalhes, disto não tenho dúvida. Com criança é inaceitável o “Com o tempo a gente vai arrumando”. Eles são o futuro hoje, agora, já, imediatamente. “Com o tempo a gente vai arrumando” construiu o Brasil atual. Está legal? Foi bom para você?
Se for feito o que tem que ser feito este projeto tem um potencial de transformação da sociedade e da cidade muito grande, imenso, quase imensurável. Bem feito vai desmontar muitas panacéias que estão ai. A sociedade tem apoiar o projeto, ajudar a burilar o processo e principalmente assumir os riscos. O pessoal que está envolvido no projeto tem passado e experiência para fazer bem feito. Cabe a nós sociedade assumir o risco.

Cidade de São Paulo incentiva o uso da bicicleta para ir à escola - http://vadebike.org/2011/12/cidade-de-sao-paulo-incentiva-o-uso-da-bicicleta-para-ir-a-escola/
 

O artigo do Gilberto Dimenstein sobre a proposta original do “Não dê esmola, dê futuro”, que creio que tenha acabado. Pelo menos não repercutiu na sociedade o que deveria. Deprimente. Vai ver que estou errado, e que o paizão veio mesmo para salvar. Enfim, eu não acredito. Responsabilidade se assume, não se passa para os outros. Quem não assume, subjulga-se.  http://www1.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/colunas/gd110405.htm .

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Opção pelo negativo

Tive contato com uma quantidade bem grande textos todos relativos a vários aspectos da questão “bicicleta”. A maioria destes, a quase totalidade, precisamente um pouco mais de 90%, com um discurso negativo, tipo “a bicicleta é muito legal, mas também é muito perigosa e o trânsito não respeita...” Já cansou ouvir este disco. Aliás, não dá mais. É impressionante como a maioria dos amantes da bicicleta tem um discurso que vende as piores situações que o ciclista pode experimentar.

Eu não tenho dúvida que o número de usuários da bicicleta está crescendo ‘apesar o que dizem os ciclistas e o setor da bicicleta’. Já disse que o melhor vendedor de motos no Brasil é o setor nacional da bicicleta. E um dos maiores empecilhos para o desenvolvimento da bicicleta como modo de transporte é o discurso dos ciclistas, principalmente de grande parte dos engajados.

Até quem não gosta de bicicleta reconhece as qualidades da bicicleta. Não dá para negar. infelizmente a bicicleta está perdendo oportunidade histórica político por causa deste constante discurso negativo. E pobre! A força de transformação da bicicleta é reconhecida, incrível; as boas lembranças que traz são marcantes para a sociedade, ninguém nega. Liberdade, bem estar, felicidade, meio ambiente..., blá, blá, blá, blá... E mais muito blá, blá, blá, blá, blá... para o discurso negativo. Que coisa mais monótona e chata! Este país precisando desesperadamente de uma transformação urbana. A bicicleta tem muito a oferecer e os amantes dela ficam matando a galinha dos ovos de ouro. Bem Brasil.
detalhe ciclovia Faria Lima, Largo da Batata, São Paulo
Nós, brasileiros, temos “um certo” apego pelo negativo. Parece que não podemos fazer o correto, o simples, o direto, o que dá resultados esperados e perenes, ou parece que negamos nossa identidade. Há uma aceitação do negativo, do “dá-se um jeito”, depois a gente acerta, faz de qualquer jeito...  Por que será? Colonização portuguesa? Influência da igreja Católica? Muito simplista, bobo, infantil. Será resultado ou princípio? Quem vem antes, o ovo ou a galinha? Não temos a capacidade de superar a inteligência galinácea? Ou estaremos fadados a procurar o ovo de cu lombo? Será que fazer correto cansa?

Um amigo fez um comentário assustador. Segundo ele o país tem uma geração de jovens vindos de uma elite e os pais destes não tem limites para empurrá-los para as melhores posições possíveis. O resultado é uma geração que ao primeiro problema começam a chorar “papai, papai...”. Sou professor e só não voltei a dar aulas porque colegas de profissão e donos de escolas pediram que não o fizesse. Afirmam que educação hoje se resume na história, real e muito freqüente, do pai ou mãe que é chamado à escola porque o filho está de mal a pior, entra na diretoria e grita “estou pagando e meu filho não vai ser tratado assim”. Não sei por que, mas estas duas histórias acima me lembram uma criança vestindo capacete.

Futuro se constrói com acertos, na busca constante da qualidade. Quanto mais acertos, menor é o custo, menores são as implicações, menores são os danos colaterais. Desmandos ou deixar a qualidade em segundo plano para chegar de qualquer forma ao objetivo normalmente não dá certo. Minha mãe sempre repetia: “O tempo diz tudo a todos”.

Não me lembro exatamente como é o bordão do Instituto Ethos na rádio, mas aqui está a definição tirada do site: “A ética é a base da responsabilidade social, expressa nos princípios e valores adotados pela organização. Não há responsabilidade social sem ética nos negócios. Não adianta uma empresa pagar mal seus funcionários, corromper a área de compras de seus clientes, pagar propinas a fiscais do governo e, ao mesmo tempo, desenvolver programas voltados a entidades sociais da comunidade. Essa postura não condiz com uma empresa que quer trilhar um caminho de responsabilidade social. É importante haver coerência entre ação e discurso.