Sábado passado foi o encontro com meus
colegas de escola, os de primário e ginásio. Fomos convidados por um deles para
um almoço com prato principal leitão ao rolete. Confesso que quando estava
entrando na fazenda onde aconteceu o encontro olhei em volta e pensei "Ué?
não entendi que seria num hotel de luxo", tal a grandeza e beleza do
lugar. E não era. A recepção que nos foi oferecida é difícil de descrever de
tão tão.
O encontro anual com os velhos ex
colegas de escola fica cada vez mais agradável, não só porque os dois últimos
tiveram recepções maravilhosamente indescritíveis, mas porque todos nós estamos
deixando para trás nossas besteiras para dar lugar ao aproveitar os amigos que
ali estão próximos, no pouco tempo que temos todos juntos, tirando
amigavelmente uns dos outros preciosas sabedorias de vida. O agradecimento
feito pela dona da casa na hora da foto coletiva foi o mais acertado possível:
todos ali são abençoados. E somos, como somos.
A beira da piscina de horizonte perdido,
quando uma das bordas faz a linha do horizonte, e olhando o entorno do casarão
construído no topo de morro, começamos, eu e mais uns quatro, comentar sobre a
beleza e a riqueza do lugar. Havia nas palavras maturidade, zero inveja, só
muito desfrute. A sala onde estavam os aperitivos e o bar tem metragem
seguramente maior que de toda minha casa, com seus aconchegantes 45 metros
quadrados de telhado. Quando voltei para casa, abri a porta, liguei a luz
repetiu-se a mesma deliciosa sensação de estar aconchegado e bem comigo mesmo.
Por questão de trabalho necessitaria mais espaço, mas o que tenho é uma benção
sem tamanho. Não tenho a mais remota dúvida que sou disparado o mais pobre de
todos aqueles com quem partilhei aquela tarde maravilhosa, mesmo assim nem um
pingo de insegurança. Entre eles tem de tudo, de funcionário público,
assalariado, autônomo, pequeno empresário e uns ricos, poucos para valer que
são iguais a nós mortais.
Uma vez por semana almoço com Tobias,
um amigo que fez escolhas de vida inusuais para esta sociedade que vivemos, boa
parte delas corretíssimas perante a situação social e ambiental que o planeta
se encontra. Com a mão na água tíbia da piscina e olhando o pôr do sol por trás
das montanhas lá longe fiquei lembrando das longas conversas que eu Tobias
sempre temos. Demorou, mas passeio por mundos ditos opostos com facilidade, sei
que somos todos humanos, nada mais, nada menos, simplesmente. Me sinto leve e
feliz por ter conseguido chegar onde cheguei. Paz, segurança, insegurança, incertezas,
paz.
Restam dores, ressentimentos? Ainda
restam. O mais difícil de lidar vem de um erro de avaliação feito no passado
sobre onde a bicicleta nos levaria. Esqueci de colocar na equação que somos
brasileiros e que a bicicleta se transformaria no reflexo do que somos,
brasileiros. Cada um vê o reflexo como quer ou consegue, mas um reflexo é
literalmente o reflexo da realidade como realmente é, e eu não gosto do que
vejo por aí.
Humor sempre foi o caminho. "Ou
você ri da vida, ou a vida ri de você" repetia minha mãe. Comecei a
limpar esta sensação pesada quando ouvi de ex ciclistas profissionais que eles
têm medo de pedalar nas ciclovias e preferem estar no meio dos carros. Ouvir
isto deles foi um alívio; não sou o único. Creio que já escrevi isto, mas fazer
o que? Velho fica repetindo seus resmungos.
Bicicleta é de uma riqueza sem
tamanho, hoje ninguém duvida. Mesmo que tivesse dinheiro aquele maravilhoso
casarão não seria minha opção, meus sonhos são outros. Mas é do dono e ficamos
felizes. Pedalar traz paz. Todos têm suas riquezas e nós, amadurecidos, as
compartilhamos sem provocações ou hostilidades. Passou o tempo onde parecia
fazer sentido colocar um sol pisca-pisca ofuscante no olho do outro para ser
notado ou sentir-se falsamente seguro. Bobagens sem nexo. A vida ensina.