terça-feira, 2 de agosto de 2022

As mobilidades ativas em cidades acidentadas

Você conhece Belo Horizonte, a famosa BH ou Bélzonte? Deveria. Minha primeira estadia, não faz muito, não marcou, me hospedei e andei pelo centro, fui a um congresso na UFMG, tive que circular por vias expressas, vi pouca coisa, no geral não gostei. Não incluo aí a mulherada que no geral é linda de lascar, meu primo Caio estava absolutamente correto, mas esta é uma outra história, falo aqui sobre cidade e mobilidade.
E lá em baixo, bem em baixo, Belo Horizonte, a famosa BH

Desta vez fui para um rápido fim de semana e a festa de aniversário da avó de Fernanda, mineira de BH que mora em São Paulo. Com ela fiz um "sightseeing" guiado para conhecer os melhores bairros e vistas da cidade. Já na chegada de São Paulo e sem mais delongas fomos para uma Pampulha lotada num fim de uma tarde quente de sábado. Fernanda entrou a mil em BH para ver o por do sol avermelhado na lagoa, comum na cidade e sem dúvida lindo. Passamos pela Igreja de São Francisco projetada por Oscar Niemeyer que é muito menor que minha imaginação visualizava. O estádio do Mineirão por sua vez é muito maior. Estava tendo um show de rock e na exata hora que passamos tocava Paralamas do Sucesso que se ouvia longe. 
O entorno da Lagoa da Pampulha é ou foi bairro riquíssimo com residências grandes, suntuosas, umas poucas descomunais. Demos uma boa volta na Pampulha, sobe e desce, e seguimos ainda sem parar depois da estrada rumo ao Centro e sua belíssima Praça da Liberdade rodeada de palmeiras imperiais. Muita gente ciruclando para a Festa dos Franceses do outro lado da rua. Começamos a ir para casa passando por bares e restaurantes cheios, gente descontraída ponteando muita vida aqui e ali. Sobe e desce, sobe e desce, sobe e desce.
A rampa no fundo da praça é lugar comum em BH. Leia-se "parede"

Domingo giramos em carro por outros bairros, boa parte deles no alto da cidade, bairros de classes média, média alta e alta. BH é bem mais rica que eu poderia esperar. Sobe e desce... Muito agradável em vários pontos dispersos, com gente vivendo bem, tudo limpo, ajardinado, ruas arborizadas, bem sombreadas, várias praças bem cuidadas, tranquilidade, mas que topografia difícil! Sobe e desce, sobe e desce, desce e sobe, em alguns pontos parece que só sobe. Na Serra do Curral, ponto mais alto da cidade, reserva verde, inúmeras construções residenciais caríssimas penduradas na montanha, até edifícios, absurdo, algo que nunca deveria ter acontecido. O contraste com o Rio de Janeiro é imediato; em BH rico mora no morro.

Por onde fui levado em BH só carros e motos. Era domingo, vi vários ciclistas pedalando para cima e para baixo literalmente. Puta treino! Ali coloquei em dúvida o velho prazer de pedalar, a não ser que fosse para treinar forte para o Desafio do Rio do Rastro. Tem subida tipo parede para tudo que é canto, daquelas que até o carro geme e se parar a moto cai e rola para baixo. Exagero? Uai, vai lá e veja com seus próprios olhos, mas cuidado para não ficar com dor no pescoço.  Dá para fazer a pé? Dependendo de onde como treino de subida para o Himalaia deve ser uma maravilha.

Não parei de pensar que BH é a prova máxima que definitivamente o automóvel não vai desaparecer, algo que já tinha certeza, mas que agora tenho certeza ao quadrado, ao cubo... 

Apesar de ter ficado muito bem impressionado com esta BH que conheci agora, não seria minha opção de cidade. Sou ciclista e pedestre, gosto de subidas, mas tudo tem limite, principalmente para um velhinho como eu. Lá sem carro ou moto não dá; ademais, perdi completamente a relação com o ficar dentro do carro no meio do trânsito. A principal estrutura de serviços e comércio é em muitos pontos da cidade pouco acessível a pé ou de bicicleta e, de novo, sem um carro a disposição é muito complicado viver. 
Não é raro em bairros com topografia acidentada ter opções de caminhos para facilitar a vida do ciclista. Pelo pouco que vi não dá para contornar um morro ou escolher a melhor subida, é pau direto, os morros são muito íngrimes. Tá bom, a pé e em curta distância dá, mas nada além disto. Em BH o que sustenta o dia a dia, serviços e comércio, está centrado em vias de trânsito rápido que são sinuosas e em sobe e desce; mais uma razão complicadora para o uso da bicicleta com segurança, aliás o mesmo para pedestres. Cruzar estas vias não é muito agradável.
  
O trânsito por lá vai rápido. Conversei com um jornalista sobre a questão de redução de velocidade e senti que há desconhecimento e descrença por parte da população que a medida possa dar certo. Trânsito rápido, curvas, sobe e desce diminuem o tempo de reação dos motoristas e aumentam muito os perigos para pedestres e ciclistas. Implantar ciclovias? Naquela topografia? A saída é diminuir a velocidade, acalmar o trânsito, mas como controlar o embalo nas descidas?

Se em São Paulo, que é muito menos acidentada que BH, ainda se usa o discurso que a topografia não ajuda o ciclista, imagina como o povo de lá vê a bicicleta. Estruturar os bairros que vi para terem comércio e serviços em distância acessível para o pedestre ajudaria e muito, mas ai entramos numa briga de cachorro grande.

Conheci um pequeno pedaço de BH. Pelo pouco que sei sobre a cidade a topografia de inúmeros bairros é mais amigável. Eu começaria por aí e por micro ações onde for possível. Sem nenhuma dúvida reduzindo a velocidade do trânsito. 
Há uma diferença brutal entre ser uma cidade do automóvel e ser uma cidade pouco amigável à vida. Cidades mais calmas acabam se ajeitando por sí só.   

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