O dia de trabalho foi longo e cansativo. Chegou em casa, abriu o primeiro portão, parou o carro esperando para abrir o segundo, espreguiçou longamente. Abriu o segundo portão, desceu a rampa e freou. Um carro preto estava estacionado com a porta traseira aberta. "Saco!" pensou, puxou o freio de mão, abriu a porta, desceu do carro, deu dois passos para contornar a frente de seu carro e estranhou o formato do carro estacionado e largado no meio da garagem atrapalhando a passagem. Sentiu a porta do elevador abrir ao lado, virou-se para reclamar com quem quer que aparecesse o incômodo de não conseguir estacionar e poder subir para o merecido banho e descanso, e com a porta do elevador completamente aberta ficou frente a frente com o cadáver de um de seus vizinhos em pé. A princípio congelou com a cena e por breve momento eterno lá ficou apavorado. Voltou a si sem compreender bem e saiu a passos curtos, inseguros, apressados, para o interfone para pedir socorro, reclamar, exigir a retirada do carro estacionado, ou simplesmente gritar com alguém, quem quer que fosse. E nesta curta caminhada a procura do interfone deu com o caixão aberto pouco a frente do carro funerário. Mais assustado ainda com a situação deu meia volta e topou novamente com seu vizinho morto ainda em pé sendo carregado por dois homens que com cuidado finalmente tiravam o corpo do elevador. Sem saber para onde ir, olhos no chão, encostou no carro funerário apalpando com as mãos feito um cego e acabou batendo a cabeça na porta traseira aberta. Olhos para cima, mão na testa dolorida, breve olhar nos dedos para ver se sangrava. Vê a escada, atordoado não se lembra onde está o celular, passando a mão nos bolsos e subindo rápido tropeça. Ampara o corpo com a mão, levanta-se, abre a porta corta fogo, chega ao térreo, livre do cadáver, do defunto, do morto em pé. Puxa o celular do bolso e começa a fazer desesperadas ligações. Para a segurança do prédio, tenta controlar a fala; eles não podem fazer nada, cuidam só da segurança do edifício e por isto segue-se uma longa e inútil discussão. Segunda ligação para o síndico, toca, toca, toca, não responde, "Deixe seu recado após o sinal..." o deixa mais furioso. A tremedeira e o pavor são tamanhos que nem palavrões lhe escapam. Mais uma ligação, para o zelador, toca, toca, toca, e "deixe seu recado..." A fúria sobrepõe-se ao pavor. Na porta da escada aparece o motorista do carro funerário e pede que ele manobre o carro para poderem sair. Apavorado com a visão do homem manda sem meias palavras que ele mesmo manobre, as chaves estão no carro, e estacione onde quiser. Vai falando e reclamando enquanto caminha apressado para a rua. Dobrando a esquina vê o carro funerário sair da garagem e sumir. Liga aos prantos para amigos.
Dia seguinte as caixas postais de todos do edifício recebem uma mensagem reclamando que "ao chegar em casa encontrei um morto no elevador social... e mortos não podem descer pelo elevador social".
Uma das respostas dadas, com toda educação, diz que iriam colocar placas em todos elevadores avisando que Mortos favor usar o elevador de serviço e que, Em razão da lei vigente e devidamente sinalizada, reiteramos que defuntos só entrem no elevador depois de verificar se o mesmo encontra-se parado neste andar.
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