Celso Ming escreveu o brilhante texto "O que é ser esquerda hoje?" publicado no caderno Economia do O Estado de São Paulo deste domingo Dia dos Pais, 14 de agosto de 2022. Com subtítulo "Tão difícil como entender para onde vão as esquerdas convencionais é tentar entender o que é ser de esquerda atualmente", o texto me levou (novamente) a pensar na questão da bicicleta e os posicionamentos que foram tomados no passado para estímulo de seu uso.
Resumo da ópera: perceberam que os livros das verdades absolutas são um tanto disfuncionais para a verdade de nosso tempo. Upa!
Fato é que o discurso de esquerda se suavizou, por assim dizer. Faz décadas que não ouço discursos ou falas sobre tomar o poder na porrada e implantar um comunismo de "todo igual mundo vestindo uniformes", queimando livros e perseguindo intelectuais e professores. (Prática bilateral) Ok, mais que nunca estamos num "nós e eles", com perseguição ao contrário, pelo menos sem queimar livros, não que eu tenha visto ou sabido, dá muito na vista. Provavelmente tem "livro do diabo" e deve ter dos dois lados; coitado do diabo!
A bicicleta e as mobilidades ativas precisam e muito do movimento cicloativista, mas que saiba ver e ouvir. Não é fácil, eu bem sei.
Numa conversa ouvi que lideranças do movimento de ciclistas pensam em pedir que os atletas ciclistas que usam a ciclovia Capivara (a ciclovia do rio Pinheiros entre Ponte Estaiada e Jaguaré) só possam treinar dentro de horário definido e restrito porque são muito agressivos e oferecem perigo a todos outros ciclistas que lá estão. Ouvindo me estalou "O que é ser cicloativista hoje?", ou pelo menos o que deveria ser. Boa pergunta, até fácil de responder. Não é tão difícil entender onde está a questão da bicicleta, difícil para alguns parece ser entender onde e porque temos os problemas que se apresentam atualmente.
Educação, simples assim. Qualquer pessoa minimamente esclarecida entende a vital importância da educação, e aqui não falo da polida educação (?) de elite, mas de quem pensa; e completo: é um insulto especular que só a minoria dos brasileiros pensa. Cuma?
Ditaduras só funcionam sob o domínio do medo ou sob uma educação deformada que só fala o que interessa ao poder dos ditadores.
Interessante, mas o sistema cicloviário foi implantado com urras! e festas. Mesmo sem uma vírgula de educação ou treinamento para os então futuros ciclistas ciclovias e ciclofaixas tiveram total apoio dos cicloativistas. E que não se fale mal do que foi feito, aí caímos numa discussão sobre o nós e eles.
Os inúmeros, melhor, os infinitos problemas de falta de civilidade ao pedalar são reflexo da sociedade que temos, leia-se falta de educação, portanto civilidade. A tensão entre ciclistas não vem de agora, mas de muito, muito tempo, desde o estouro da "moda" do pedal. Os incidentes e acidentes se sucedem desde que as ciclofaixas viraram coqueluche, mas no passado (porque não no presente) era politicamente incorreto falar sobre o assunto, não atendia aos ditames do movimento.
Ontem pedalei atrás de um ciclista que usava a camiseta do Pelotão da Morte, o mesmo grupo de ciclistas que levou a Cidade Universitária da USP ao fechamento para ciclista e outros esportistas. Na época o movimento cicloativista fez uma tremenda barulheira contra o fechamento acusando a direção da USP de sei lá o que, ou seja, apontando o dedo para "eles". Não tiveram preocupação, nem se preocuparam, muito menos aceitaram informações sobre o porquê da medida radical da USP. Não interessava. Contados nos dedos foram os que tiveram a dignidade de dizer onde estava o problema de fato.
Óbvio que a situação mudou, que muitos, muitos... do movimento da bicicleta mudaram, passaram a entender o que acontece tendo uma visão mais ampla e realista do contexto. E é aí que entra o brilhante texto do Celso Ming "O que é ser esquerda hoje?". E aqui repito pela enésima vez: não é sobre a bicicleta, pela bicicleta, para a bicicleta, mas sobre a cidade, sobre a vida de seus cidadãos. Não parece óbvio?
Fechar-se em princípios pétreos é uma demonstração de limitação que vai muito além da burrice, mas sem dúvida atualmente é um mal pandêmico. O Brasil corre o risco de ser desintegrado como foi e continua sendo a Argentina com seu peronismo. A saber, na Argentina ou se tem apoio do peronismo ou simplesmente você não existe. Recomendo a leitura de um artigo de duas páginas sobre a situação da Argentina no mesmo Estadão de domingo onde foi publicado o texto de Celso Ming.
A bicicleta e as mobilidades ativas precisam e muito do movimento cicloativista, mas um movimento que ouça e olhe para fora de sí. A bem da verdade a cidade e o planeta não podem prescindir desta pressão. Sei que não é fácil, e como sei!
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