quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Os 35 ônibus é o que importa?

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

O editorial O Rio de joelhos do Estado de São Paulo cita a queima de 35 ônibus, mas não diz uma palavra que atearam fogo nestes com os passageiros ainda dentro. O que realmente importa, os 35 ônibus queimados ou a população vítima da barbárie. Cita que os trabalhadores cariocas ficaram a pé e que o trânsito virou um caos, colocando a questão econômica em primeiro plano? As imagens destes mesmos trabalhadores descendo desesperados pela porta traseira dos ônibus estão ai para quem quiser ver e põe todo acontecido em um patamar muito além dos 35 ônibus, de trabalhadores sem transporte, do trânsito parado por horas. Cida, minha querida diarista, não pode vir com o celular porque os assaltos no ponto de ônibus ou dentro do ônibus são cada dia mais frequentes. Ela é classe C, mora quase na periferia, os bandidos vem da mesma área que ela a muito querem que se dane, não importa se é pobre, assaltam igual, e com muita violência. A baderna neste país é tão absurda que mesmo a bandidagem, que lá num passado distante tinha um código de conduta, hoje não tem mais qualquer limite. Danem-se todos. O que aconteceu no Rio me fez imediatamente lembrar aquele carnaval carioca, acho que em 1993, no qual Leonel Brisola, governador, fez um acordo com os bandidos para não ocorrerem assaltos até a quarta-feira de cinzas ao meio dia. Eu estava lá, no Jardim de Alá, e vi bater 12:00 h, em ação perfeitamente coordenada a turba se levantar e imediatamente iniciar o arrastão, impressionante, treinamento como a do exército da Coreia do Norte. Hoje não tem mais acordo, que se dane tudo, perdeu!, até porque se existe governo e poder público, se existe..., não faz sequer cocegas. E o editorial Estadão aponta para o que importa é a perda dos 35 ônibus, os trabalhadores que não chegam ao trabalho e o colapso no trânsito. Por tudo que está acontecendo, o povo que aprenda que a nova Santa Inquisição está aí, e se tocarem fogo no ônibus, salve-se quem puder. 

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Entre a cruz e a espada do bullying

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

A sociedade brasileira entrou num processo para corrigir erros sociais atávicos e históricos. Não pode fazer bullying, todo mundo diz. Por outro lado, o bullying corre solto e é praticamente impossível frear. Há um limbo apavorante entre as duas realidades. Quem sofrer que se vire no país das maravilhas pretendidas. O Brasil politicamente incorreto da Escolinha do Professor Raimundo, por exemplo, expôs nossos desvios e nos levou a discussão mais dentro dos termos de nossa cultura sobre os problemas, chegando a resultados de forma mais leve e apropriada do que acontece agora. "Vai ser assim" em nome dos bons costumes e do politicamente correto talvez não seja tão sensato assim. Encurrala muita gente, gerando ódios incontroláveis. Empurrar o outro para entre a cruz e espada não costuma dar certo, a história está farta de provas.

O que se pretende está correto. A maneira como está sendo feito...

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Buraco na Bela Cintra; e fala de Ricardo Nunes sobre o Plano Diretor

SP Reclama
O Estado de São Paulo

A razão alegada para a demora no término das obras de recuperação das galerias de águas pluviais na rua Bela Cintra com rua Estados Unidos tem tudo para ser pertinente: descobriram interferências no subsolo que não deveriam estar lá. São Paulo não tem mapa de subsolo que seja confiável. A Prefeitura do Município de São Paulo não tem um mapa integrado de tudo que está no subsolo e não cumpre o dever constitucional de fiscalizar, controlar e organizá-lo em nome e pelo bem público. A baderna vai continuar enquanto não se cruzar os mapas das concessionárias e o mapa preciso e definitivo estiver em mãos do poder público, como deve ser. A cidade vai continuar parando e tendo seguidos prejuízos enquanto tudo for na base do mais ou menos aqui. Sobre as galerias pluviais, no caso dos Jardins elas datam da década de 30, ou têm 90 anos, foram projetadas para uma carga completamente diferente da que se tem hoje, seja de águas, seja de pressão de solo provocada pela passagem de veículos muito mais numerosos e pesados. Tive a oportunidade de entrar numa destas galerias pluviais e fiquei admirado como foram bem construídas, mas isto não basta.




Em entrevista na Rádio Eldorado FM, o Prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, falou, dentre outros assuntos, em defesa do zoneamento e seus edifícios altos, de certa forma querendo contrapor o crescente movimento que pretende dar um basta ao que vem acontecendo, preservando nossa memória. Ricardo Nunes repetiu a alegação mais usada, o futuro do transporte público, citou um défice de 400 mil moradias e que esta explosão imobiliária faz sentido em razão da questão ambiental, o que, segundo ele, deterá o avanço da cidade sobre áreas verdes, e que os estudos feitos por funcionários públicos validam o que está ocorrendo. Desde 1898 as grandes cidades se reúnem periodicamente para trocar experiências e não resta a mais remota dúvida da importância da preservação da memória como fator de estabilidade e paz social. Se há um défice habitacional este é para que população, em que áreas da cidade, para que nível social e poder aquisitivo? Números de cidades que sofreram rápida transformação urbana como a que está ocorrendo aqui em São Paulo apontam de maneira inequívoca a ruptura do tecido social existente, diminuição da diversidade, aumento da diferença socioeconômica em toda cidade, não só no bairro. O que vem acontecendo em NY é notório e com números para quem quiser ver. Alegar que este "desenvolvimento" deterá o avanço da cidade sobre as áreas verdes não condiz, primeiro pelas razões dadas acima. É nas periferias onde ocorrem os mais frequentes problemas ambientais e estes têm muito a ver com grilagem e "donos do pedaço", em alguns casos com os que mandam e desmandam, conhecidos nomes com processos movidos pelo própria Prefeitura e por outras instâncias. Vastas áreas da cidade estão transformadas em enclaves onde a mesma Prefeitura pouco atuou, por sua responsabilidade ou por impeditivos, mesmo quando ocorrem sérios crimes ambientais. Os exemplos são inúmeros e as histórias são notórias. A construção desordenada de edifícios em si é um problema ambiental sério que vem sendo estudado e os dados estão aí para quem se interessar. Mudança no regime de ventos, sombras, umidade, temperatura, danos a biomas, não esquecendo o aumento de casos relacionados à saúde pública, dentre outros. Apoiar esta concentração de moradias em nome do futuro do transporte serve para incautos pois se há algo que está no campo da incerteza é o que acontecerá com as mobilidades nas cidades, em especial por aqui. De qualquer forma esta loucura especulativa que aí está aposta que as moradias que serão entregues em um ou dois anos terão moradores que esperarão pacientemente cinco, dez, vinte anos para ter um transporte público descente a porta. É, tem tudo para dar certo.

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Um carro a menos. Sim, mas...

Ontem saí pedalando de casa na hora do rush e para seguir em frente tive que fazer caminhos loucos, alguns trechos não pude fugir de pedalar na calçada, o que não me agrada em nada. O congestionamento era tanto que simplesmente não dava para passar entre os carros parados com a bicicleta. O pior é que a cada dia esta loucura fica mais comum. A bem da verdade, esta loucura dos congestionamentos nas cidades e estradas extrapolou qualquer limite.
A geração mais nova não faz ideia do que foi divertido dirigir, de quanto o carro ajudou a vida de todo mundo. Este tempo acabou e não volta mais, ponto final. O olhar para o automóvel saiu do emocional e entrou no campo do racional, quase bom senso. Paixão, amor, prazer acabaram num congestionamento.


Um carro a menos, mote do movimento ciclo ativista faz todo sentido. Um carro a menos sim, muito diferente da luta feroz pela proibição indiscriminada do automóvel, como querem os mais radicais. Sinto muito meus caros, não vai acontecer, ponto final. E não vai acontecer até porque mesmo os mais radicais que conheço ou tenho notícias quando precisam entram dentro de um carro e seguem felizes da vida no conforto do que consideram uma "máquina maldita" responsável por todos os males da humanidade, segundo os mesmos.

Tive a oportunidade de visitar uma das cidades holandesas que está construída para "zero automóveis", onde, dizem, só circulam pedestres e bicicletas. Primeiro, sim, tem automóvel, depois é uma minúscula vila onde só o centrinho tem restrições severas para a circulação de automóveis, em especial os particulares. Pedalou uns quarteirões do centro as restrições diminuem, e vi até um Morgan, um maravilhoso carro esportivo inglês estacionado na frente de uma casa ajardinada. Vimos também a saída de uma escola primária sem nenhuma mãe pegando os filhos de SUV, e com a maioria das crianças voltando tranquilas e seguras para casa pedalando suas bicicletas. É o ideal.
Em 2007 a Broadway, em NY, teve transformados 20 quarteirões sul, a partir do Central Park, em área preferencial para pedestres e ciclistas, reduzindo e restringindo a circulação de caminhões, taxis e principalmente automóveis particulares, num projeto conhecido como "ruas sustentáveis de NY". Não só deu certo, como o conceito de reurbanização segue em frente a todo vapor, com números surpreendentes não só para pedestres e ciclistas, mas para a vida de motoristas e de toda a população em geral, incluindo no que tange a economia. Deu e continua dando certo porque "um carro a menos" foi bem pensado e evitou-se radicalizações. NY não fez nada além de seguir uma tendência mundial usando a experiência que tem dado certo em inúmeras grandes cidades, capitais e metrópoles - quando bem feito. Buenos Aires teve que desfazer as besteiras e refazer tudo para começar a funcionar.

Uma cidade com menos carros é melhor? Sim, talvez. provavelmente, depende. Um monte de fatores definem a necessidade ou não do carro, automóvel: distâncias, topografia, clima, população, carga a ser transportada..., e o mais importante: para que se usa e serve o modal no sistema integrado de transporte. 
A maioria da população mundial hoje vive em cidades cujo desenvolvimento urbano dos últimos 60 anos foi praticamente todo pensado tendo o uso do automóvel como ponto central. Por razões econômicas e demográficas é impossível implodir tudo o que está ai para construir uma nova realidade completamente diferente. E está provado que há um tempo de adaptação. Ninguém quer largar o que está bom. Melhor sentado num congestionamento numa lata de sardinhas do que em pé num ônibus ou amassado num metrô.      

A "máquina maldita", automóvel, com as bicicletas no rack para um dia de mountain bike ou de road bike é uma delícia, muitos, mas muitos mesmo, não vão negar. Automóvel, o "maldito", na volta para casa com ar condicionado refrescando as pernocas exaustas é uma benção.

"Não odiamos o automóvel. Amamos a bicicleta" foi o tema proposto, talvez porque as redes sociais tenham reduzido tudo a extremos, a um amar ou odiar. O maravilhoso documentário disponível na internet sobre a vida e a brilhante carreira de Mark Cavendish, um dos maiores ciclistas da história, deveria ser matéria obrigatória na formação de qualquer ciclista, ou motorista, ou cidadão. Nunca é sobre bem ou mal, mas sobre ter um casamento honesto com o viver, com a vida e com todos.



Não odiamos o automóvel; amamos a bicicleta

Até que morte os separe... na vida a dois de vez em quando este juramento acaba se tornando realidade; de vez em quando. Mas... como se costuma dizer, ou casa ou compra uma bicicleta, e vem a piada pronta, mais fácil e seguro comprar uma bicicleta. Aliás, é muito mais provável que você vá terminar uma vida longa, feliz, livre e sadia com ela, a bicicleta, óbvio. Eu disse terminar a vida com ela e não por causa dela, a bicicleta; vale aqui o mesmo que num casamento véu e grinalda.

Na vida real, incluindo a dos casamentos, é muito mais normal passar toda vida num automóvel..., num posto de gasolina..., num congestionamento..., e mesmo quando uma maravilhosa vida de casado os separe, o casal, nem o rabecão, o último automóvel de todo ser humano, escapará do congestionamento.

A verdade é que por mais desejado que seja, por mais difícil que tenha sido pagar, por mais amado enquanto o tanque de gasolina está cheio, a estrada vazia e sem pedágio, é muito raro o casamento com um automóvel acompanhar seu dono até que a vida os separe. Normalmente ele, automóvel, se vai antes. Automóveis, como tudo nesta vida, têm obsolescência programada. Cuidar de um carro por toda a vida, até ele se transformar em chapa preta, ou de colecionador, demanda muitos gastos, muitas horas de dedicadas, muita briga no outro casamento, o de véu e grinalda. 
A bem da verdade se não cuidar qualquer relacionamento também acaba, e rapidinho. Por exemplo, não raro a esposa força a troca do automóvel, e não ouse fazer piada sobre isto ou apanha. Conheço várias histórias de "ou eu ou teu automóvel", com fins diversos.

Desconheço quem realmente odeie o automóvel. Tem muita gente que fala que odeia da boca para fora. Na hora "h" abre a porta e senta feliz e confortável para seguir viagem. Ufa! Não é um amor, até tem quem realmente ame, via de regra são amantes, o dono e o automóvel, aqueles ou aquelas que podendo fecham a porta, ligam o ar-condicionado e estão felizes e afivelados a eles, automóveis, até que a viagem acabe. Parecido com a cerveja gelada entregue no sofá frente a TV. Óbvio que chegando, de automóvel, no bar vai xingar a lata de sardinhas, assim como reclamará da pergunta da esposa em pé ao lado do sofá exatamente na hora do gol. Mas casamento com eles, automóveis, até que a morte os separe, ter um para chamar de seu, só seu!, ter cuidar, lavar, abastecer, polir, fazer balanceamento, trocar filtros, gastar com ele..., upa! gastar, gastar, gastar..., nestes momentos vem o "eu odeio o automóvel". Mais ou menos parecido com o "meu bem, vai rápido, preciso usar o banheiro".

Agora veio esta nova geração que tem outros olhos para todo tipo de casamento, principalmente com o automóvel, cada vez mais utilitário, cada vez menos eu odeio ou amo, mais eu fico, uso e usurpo enquanto preciso. Pode-se dizer "by by american way of life" até mesmo lá, país do automóvel Estados Unidos, onde "o nada vai nos separar", a total dependência do bibi-fonfon, está cada dia sendo mais questionada. 

A relação umbilical de nossa sociedade com o automóvel não é só uma questão de amor e ódio, mas também de pura praticidade. Automóvel funciona. Não funciona, troca, vende ou descarta, mas com um por perto a disposição. Queira ou não queira, automóvel é necessário. Pelo menos não fala. Somos assim, mesmo que neguemos ajoelhados em juras perante o altar, o de véu e grinalda, casamento é bom enquanto dura, ou o saco não estoura. 

Já a relação com as bicicletas, esta é outra história. Se decidimos não trocar alianças com véu e grinalda no altar perante o padre, padrinhos e todos convidados, com certeza alguma vez na vida vamos ter que trocar um pneu furado da bicicleta, que no final das contas tem a mesma forma e simbologia de uma aliança.


segunda-feira, 16 de outubro de 2023

As pessoas enlouqueceram?

O texto de Antônio Prata, Bebês terrorista X colonialistas, publicado na Folha de São Paulo neste dia 14 de outubro de 2023, me embrulhou o estômago - literalmente! O publico aqui, o assertivo texto que pega na veia sobre uma realidade que está aí para quem quiser ver, e pelo andar da carruagem cada dia menos e menos gente tem interesse e consegue ver e entender o que realmente está acontecendo. Deprimente, literalmente deprimente.

Antonio Prata diz que escreveu e apagou vários textos, o que acontece com frequência comigo, e provavelmente com outros. Não dá para escrever na lata sob o risco de simplesmente cair no vazio, de você não passar a notícia ou o recado pretendido, ou de gerar uma reação de fúria. As pessoas querem ler o querem ler, saiu disto nas primeiras palavras pulam fora. O pensar diferente não interessa, o que não é novidade, mas agora foi para extremos. Uma mínima diferença para o que a pessoa pensa passou a ser inaceitável, intolerável.  

Aprendi com um bem sucedido tio que trabalha na imprensa a evitar "exageros", a escrever o mais neutro possível, de preferência sem adjetivos, tendo muito cuidado com a forma para conseguir uma boa comunicação. Dependendo da situação é muito difícil chegar ao equilíbrio e situações extremas são cada dia mais comuns e aceitáveis pela população a espera de milagres, de soluções mágicas, da cura de suas próprias angustias e desesperos a qualquer custo. Que me lembre, quem era incapaz de entender o outro e só buscava saídas para suas próprias dores entrava no rol dos sociopatas. Chegamos ao "sociopatas unidos jamais serão vencidos"? Em nome e com um empurrão da ideologia ou religião escolhida, sim, digo eu. 

A reação extremada que estamos vendo frente aos deprimentes acontecidos em Israel e na Faixa de Gaza não é nenhuma novidade. A novidade talvez seja o alto índice de aceitação da barbárie.

Perdi o fio da meada. Não consegui começar a escrever logo depois de ler Antonio Prado porque tive muita vontade de chorar e infelizmente não consegui. Passado um tempo fui lembrando do que tenho lido, de mais um ótimo artigo do Yuval Harari, da Argentina, de vivências minhas passadas que remetem ao texto Bebês terroristas x colonialistas que me faz escrever este. Está tudo interligado, não percebem? Argentina foi divida ao meio pelos populistas Peron e Evita, desintegrou, segue desintegrando e não há notícias que pare de desintegrar. Para mim só realmente ficou clara a causa depois de ler a análise de Harari sobre onde e porque Israel chegou onde chegou: divisão interna provocada por populistas. Já disse mil vezes e não canso de repetir que conheci a Argentina dos 4% de população na linha de pobreza, país maravilhoso, antes da reeleição de Peron em 1974; e conheço a Argentina dos 40% da população pobre de hoje onde ou se é peronista ou se é contra os peronistas, mas sem o apoio destes não se faz nada. A divisão, o extremismo, o nós e eles, o populismo estúpido, levou o 5° país mais rico do planeta, a maior reserva de ouro no pós WWII, o celeiro do mundo, a miséria. Populismo de merda! O Brasil vem sendo dividido ao meio bem antes de Bolsonaro e os bolsominions. Em 1975, ou por aí, fui excluído de participar de uma das reuniões que resultaram na criação do PT sob a alegação que usava mocasins, critério ideológico importantíssimo. Durante décadas por usar bicicleta fui considerado bicha e comunista. Não faz muito passei a ser fascista. E aí vamos. O que acontece comigo acontece amiúde com tantos outros. Pensou fora da boiada, pensou errado, não é assim?

Não sou gente, sou uma peteca ao sabor de discursos ideológicos e religiosos, nada mais. Todos nós somos petecas.

Os inúmeros artigos e análises que estão sendo publicadas sobre a guerra Israel - Hamas servem e muito como alerta sobre o que vivemos por aqui. Estabelecer um paralelo com o que temos no Brasil é facílimo de estabelecer, basta abrir os olhos. 


sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Fim de romaria, de volta à casa

É muito louco, entrei em casa voltando da romaria e desmontei, acabou a pilha, fim. Impressionante como a cabeça da gente trabalha. 

A romaria foi uma romaria? Não, foi um pedalar no meio dos romeiros. Até gostaria de ter assistido uma missa em Aparecida, o que sempre faço quando chego lá, mas quando cheguei estava acabando a última da manhã e depois só bem mais tarde. Ficar em Aparecida e esperar a próxima? Desculpem, mas eu não consigo, a cidade é muito feia, pobre (de espírito), cheia de lojinhas e barraquinhas vendendo bugigangas religiosas e outras porcarias; uma tristeza. O café expresso que era bom e simpático com suas mesas na rua, fechou. Procurar uma nova parada? No caso de Aparecida não sou eu que sou chato, a cidade é que feia, desestimulante, pobre no pior sentido. Sentei num banco ainda dentro do santuário, comi um sanduiche que tinha levado na mochila por precaução e rodoviária. Passagem comprada, fui tomar um sorvete num dos bares e o proprietário, um senhor, não conseguiu fazer R$ 50,00 - R$ 17,00 de cabeça, aliás por muito pouco não conseguiu fazer na calculadora, fora a cara de mau humor com que tratou todos clientes que entraram. Ele e a mulher, uma senhora de sobrancelhas pintadas de preto carvão que apontou para um cartaz colado na parede e disse seca "não está vendo o preço?". Pior, muito pior, o pessoal senta lá e acha normal. Desculpe Aparecida, mas tchau, e já vou tarde.

A Basílica, que é muito bacana por dentro, está sendo decorada por fora. Pena, eu gostava da simplicidade despojada dela, muito mais ligada ao espírito cristão. Estão empetecando as fachadas com mosaicos, uma decoração muito carregada que mais lembra grafite de baixa qualidade ou mesmo pichação. Triste, muito triste, aponta para um baixo que comanda aquela paróquia ou basílica, sei lá, não entendo da hierarquia da igreja. 

Quem vem no sentido São Paulo - Rio, depois que passa a reta da Roseira, talvez veja que uma grande escultura da Santa foi colocada em cima do morro. Para dizer a verdade a imagem quase me passou batida, acredito que só vi porque foi noticiado aos sete ventos. Mais, sem graça. Cristo Redentor que o diga. Não sei se está terminada ou vão colocar mosaicos azul marinho no seu manto, o que ajudaria e muito sua visualização pelos viajantes da Dutra. Do jeito que está é meio invisível, sendo justo, é menos visível que a importância que a Santa tem para o povo brasileiro. Por sinal, ela é vazada ou eu enxerguei mal?

Era dia 10 de outubro e Aparecida ainda estava vazia, o ônibus chegou rápido. Sentei junto com um senhor que voltava do trabalho. Conversa vai, conversa vem, ele contou que foi matrizeiro (faz matrizes para estamparia) e que fecharam o setor dele, por isto saiu. Gostava do trabalho, deu para perceber o orgulho. Boa conversa, bom conversar sobre qualidade com quem entende, e a estrada passou rápido. 

De volta a São José para mais um dia, não, dois dias. Férias! No dia seguinte saí para pedalar de leve e relaxar as pernas. Enquanto fugia do calor ficava sentado na poltrona ao lado da janela digitando no celular os textos que soltei.

Eu fico no Ibis Colina que está situado entre dois bairros agradáveis e de bons restaurantes, a única coisa é que para lá ou para cá tem uma bela subida. Também dá acesso fácil, pela ciclovia paralela ao rio, à UrbaNova, onde os ciclistas têm uns bons km sinalizados em avenidas como área de treinamento. É um pedal muito agradável, em especial nesta época que se vai ao som muito intenso das cigarras. 

Fiquei dois dias em São José na ida e mais dois na volta, os da ida um pouco pelo erro da meteorologia que afirmava que ia cair o mundo o dia todo. Não choveu uma gota e fez um calor dos diabos. Que seja, a vista que ainda se tem do quarto do hotel é maravilhosa. Ainda; estão construindo dois edifícios de luxo que vão fechar a vista inspiradora para a serra lá no fundo. Triste, vai acabar mais uma coisa que me faz feliz, ver o horizonte, verde, de preferência lá longe, bem distante. 

Zé, que morava lá, me levou ao Saint Joe Burger, ótimo, parada obrigatória que cumpri ao chegar pedalando de São Paulo, até mesmo antes de ir para o hotel. Vizinho tem uma boa sorveteria, e contornando o edifício tem o Arabíssimo, muito bom, e um pok que Zé gostava, e ele tinha boa boca. O italiano nunca experimentei. Ao lado tem um posto de gasolina com a Padaria Papaya ao fundo. A pizza é boa e as esfirras feitas na hora, só a noite, são memoráveis. Peça o combo, que vem com 6 esfirras, não vai se arrepender. Por perto tem outros restaurantes que nunca entrei, mas ainda vou experimentar. Este pedaço de cidade já vale a visita de São José, e vale muito. Aliás, o bairro todo é muito simpático, tem uma grande praça no meio que é viva, cheia de crianças brincando, pessoas correndo, idosos sentados e caminhando, cachorros, verde, árvores... Os edifícios guardam um bom distanciamento entre eles, o que ajuda muito ser agradável. 
Não sou de shopping, mas pelo calor absurdo acabei lá comendo num japonês por quilo na praça de alimentação, e foi muito honesto, bom. Acho que chama Orient Express. E sentar no meio do zoológico do povo da cidade é conhecer outra realidade.

Fim de festa. Peguei o ônibus de volta para São Paulo sem qualquer problema. Sentei junto com um garoto que está fazendo doutorado no ITA, o que não é para qualquer um, e a viagem correu rápida em uma conversa farta e interessante. No retão final para a marginal deu para ver a imensa nuvem pesada que despencou no exato momento que chegamos na rodoviária. Metro então. Que nada, metro fechado, falha técnica. A noite descobri que a falha técnica tem nome: greve. Puta sacanagem parar o metro exatamente num feriado. 

Nos dias de romaria não choveu como previsto, a meteorologia do celular não acertou uma. Poderia ter ido para Aparecida depois de descansar um dia, mas acabei ficando um dia a mais em São José porque o brinquedo avisava que iria despencar o mundo, chuva intensa todo dia. O sol foi uma beleza, o calor insuportável. 

Muitos romeiros escolhem São José dos Campos como base para suas romarias. Eles caminham e no final do dia são pegos por um carro ou van e levados para dormir lá. Pela primeira vez, quando cheguei em São José tive que procurar hotel. Estavam ou lotados ou quase. Dei sorte e consegui onde passar a primeira noite, mas não vale o risco, reserve com antecedência.  

Breves conversas, reveladoras

"... construíram o chão com um pequeno degrau e quando instalaram a porta ela não abria... " sobre uma área nova construída em um dos mais importantes centros de pesquisa do país.

"... as ferramentas de precisão estavam sumindo das bancadas e os funcionários de trabalhavam com elas foram sendo demitidos e o preço da ferramenta descontado do pagamento. Um dia abriram o armário do encarregado do setor e descobriram as ferramentas lá... ". O ônibus chegou a seu destino, meu interlocutor desceu e acabei não sabendo o que aconteceu com os demitidos, se foram readmitidos, se foram ressarcidos. Não duvidaria que o encarregado tenha sido demitido sem que se apresentasse queixa crime.

"... deixa para lá."

"... mudou o diretor e ele mandou pegar todo estoque (de peças) e cortar tudo (picar para ser vendido como sucata). Toda vez que pediam peça de reposição tínhamos que trabalhar direto até conseguir fabricar novas (idênticas as sucateados), mesmo que isto significasse passar noites sem dormir... "

"... vão construir uma escola de altíssima tecnologia lá (longe, bem longe), está definido. Para que? Todo setor industrial que precisa desta mão de obra está aqui, não há sequer uma indústria que gere emprego para os formados lá. Os laboratórios de pesquisa que temos aqui estão claramente desatualizados, trabalhamos com aparelhos obsoletos. Não seria mais sensato investir em equipamentos novos aqui?"

"... um dia ele veio aqui (o diretor industrial foi ao chão de fábrica) e eu disse para ele que tinha que mudar a forma de fabricar (um sistema de rolamento) para evitar todos defeitos (que as peças estão apresentando). Ele sorriu, deu um tapinha no meu ombro, agradeceu e disse que ia resolver. A fábrica está falindo, vamos todos ser demitidos, a peça continua igual, eles não fizeram nada."

"... (risos) vocês vão mesmo fabricar em azul calcinha? Não vai vender." De fato não vendeu. 

"... é corte de custo. Esta máquina é muito ruim. É fabricada aqui no Brasil (montada na Zona Franca de Manaus), não vale nada. A antiga era suíça, nunca quebrou. Já foi conversado com a direção, mas eles acham que está bom assim, então... Quem paga o pato somos nós, funcionários, que recebemos reclamações constantes de vocês, clientes." 

"... o que estou estudando aqui praticamente não tem trabalho no mercado nacional. Estou pensando em ir para fora, onde posso continuar meu trabalho de pesquisa e sobreviver. Aqui ganho mais trabalhando com internet que na minha área."

"... se não fabricarem com baixa qualidade como é que vão vender novos (para substituir)?"

"... não sei como conseguiram, mas a frente, a entrada do teatro, está onde deveria estar os fundos, e os fundos está onde deveria ser a entrada e saída. Acabaram a obra e deixaram ela lá, largada. Não serve para nada e não sabem como vão resolver."

"... tenho muito medo que isto aqui vire uma Venezuela."

"... não funciona. Depende da internet que sempre varia. Não funciona. Prefiro o antigo."

"... o pessoal não assina (abaixo assinado para trocar o transformador da rua do condomínio). Depois eles vêm aqui gritar com a gente que queimou tudo (aparelhos eletrônicos) como se nós fossemos os responsáveis" 

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Apareceu Aparecida, a Basílica


A foto não dimensiona o que aconteceu. Ampliando? Nem assim.

Nunca vi tanto peregrino junto. Este segundo trecho foi impressionante. Saí de São José dos Campos às 8h00 e de lá até Pindamonhangaba foi um prazer ver toda aquela massa de romeiros, quase uma fila única sem espaços vazios. Pelo que me lembro, desta vez teve mais romeiros que no festejo de 300 anos da descoberta da Santa numa pescaria no rio Paraíba do Sul.


Por outro lado, foi bem complicado estar no meio deles pedalando, algo que não  pretendo repetir. Medo de atropelar, mais que o medo de ser atropelado. Os caminhões passam raspando quando o ciclista ultrapassa alguns romeiros que teimam em caminhar conversando com seu parceiro e muito próximo da pista. Está foi minha última. Ciclista não deveria estar ali, mas não há forma de impedi-los.
Fiquei com raiva de quatro idiotas que pedalavam bicicleta de estrada, vinham forte, rápido, ultrapassavam os romeiros de qualquer forma, me ultrapassaram sem avisar enquanto estava ultrapassando romeiros, invadiam seguido a pista da Dutra sem olhar para trás. Se já não tinha gostado do comportamento deles durante a romaria, impliquei de vez quando os encontrei na rodoviária e simplesmente não retornaram o comprimento. 

Para mim e todos ciclistas, que nesta romaria eram bem menos que nas outras romarias que fiz, ficou muito mais fácil e agradável pedalar depois do trevo de Pindamonhangaba, onde a massa de caminhantes foi desviada para a outra pista, sentido Rio - São Paulo, e provavelmente para uma estradinha que corre paralelo à Dutra, pela qual já pedalei e adorei. O acostamento ficou vazio, não tive que ficar olhando o tempo todo para os romeiros a frente. 


Pude apreciar a paisagem do Vale do Paraíba, que é linda, nem ser obrigado a ultrapassá-los pedalando quase dentro da pista. 

São 86 km que fiz em 4h20 só parando para pipi no matinho, com boa parte do tempo nublado. A saída de São José dos Campos é complicada e demorada porque não dá para ir pela Dutra neste trecho, é inteligente contornar por trás da cidade, seguindo até depois do que resta da fábrica da GM para cruzar a Dutra e seguir pedalando.
Quando cheguei em Roseira, a uns 14 km da Basílica, o céu abriu e ficamos debaixo de um racha coco duro de aguentar.
Tivemos cruzar o primeiro viaduto que dá entrada para Aparecida por causa de um acidente e minha chegada acabou sendo pelos fundos da Basílica. Simplesmente não acreditei que estivesse praticamente vazia naquela hora, meio dia e meia.


Confesso que tenho vontade de seguir pedalando para o Rio de Janeiro, o que talvez um dia aconteça. Pedalar no meio desta massa de romeiros não mais, principalmente por respeito a eles. Até gostaria de fazer a romaria a pé, mas sei que não aguento, mesmo que seja em muitas etapas. Meu quadril está ruim e, como alertou meu médico, é bom não forçar. Agora, que é uma experiência única e emocionante, isto é. Vale a pena.


Meu agradecimento as equipes de limpeza da Dutra que fazem um senhor bom trabalho.
E agradeço a Polícia Rodoviária que neste dias de romaria tem um trabalhão que cumprem com muita paciência.

segunda-feira, 9 de outubro de 2023

Romaria: faça seu desejo

Ontem choveu e não pude voltar à romaria. Não deu para sequer para sair às ruas e passear por São José dos Campos. Fiquei dentro do quarto do hotel numa penitência que não estava no programa. Olhando a bela vista pela janela confessei a mim mesmo meus próprios pecados. Nada de novo, só que desta vez fui sincero. Upa! Terei sido?

Os ponteiros do relógio correm, envelhecemos, o tempo passa, e tudo que que parece óbvio deveria permanecer igual. Definitivamente não é assim. Tudo muda. Estar aqui quase não faz sentido. Fez das vezes passadas.

A fé, em outras palavras o "vai dar certo", é tão cega quanto aquelas dezenas de anos que trabalhamos com gosto e sem parar pelos mais diversos motivos, principalmente a esperança é a última que morre. Não, não largue o trabalho, não chute tudo para cima, não creia que a piração é o caminho para a liberdade. Não é isto, não é. É um pouquinho mais complicado, sutileza que precisa de uma romaria de quietude e nada pensar para abrir olhos e mente. Enquanto isso, dígito para desabafar, pensar e me auto confessar. E tento ficar em silêncio comigo mesmo, este sim seria um milagre.

Confessar, ajoelhar e rezar. Amém!

Cordeiro de Deus, vós que tirais os pecados do mundo daí-nos a paz.
Enquanto o cordeiro não vem nem liga para mim, ligo a TV. Fuga. Por um tempo não penso em nada. Falso alívio. Mentira.
Intervalo do seriado, olho pela janela. Não chove mais. Mais uma vez esta é a última noite de uma minha romaria e fuga. Mais uma vez quero que esta noite não acabe, mas também que o dia seguinte chegue logo e eu siga na romaria. 

O povo segue caminhando no acostamento da rodovia em romaria por uma fé, mas qual é? A dor faz parte. A dor faz parte? Faz parte.
Em Aparecida segue uma missa atrás da outra, assim como na rodoviária parte um ônibus após o outro. Faz sentido? Faz sentido. A fé que vem, vai, volta para casa, e na segunda-feira tudo voltará ao de sempre.
Eu não mais. Eu nunca mais. Amanhã, já na bela Basílica, vou saber como ficarei. A certeza de chegar lá é que nos move. O que me move é olhar e ver os caminhos, o da paisagem e dos meus interiores. Nos dois me dói não ver, perceber, aprender e aproveitar tudo. Cada vez que passo pela Dutra em Romaria descubro uma novidade, da mesma forma quando me olho no espelho.

Descalço desci até o térreo, saí e fui até a rua. O céu está limpo. Dá vontade de fugir pela noite, mas não se pode ter tudo de uma vez só. Aliás, não se pode ter tudo. Descobri tarde que ter é o que crucifica. Quero ser.

Deitado na cama termino esta confissão. Não vou precisar rezar nada porque nem Deus entendeu. Não me importa, eu entendi, acho eu. Pelo menos estou mais leve. Devo dormir tranquilo. Até amanhã. 

Hamas tem que apoio?

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo 

Dá para fazer um paralelo entre o apoio que o Hamas tem na Faixa de Gaza e o que traficantes e milicianos tem dentro de suas comunidades? O medo. A imposição de um apoio irrestrito pelo medo, pelo terror. A técnica terrorista agora aplicada pelo Hamas contra Israel remonta a mesma estratégia aplicada nos anos 70 e 80, para não voltar mais no tempo. Muito sangue para pouquíssimo resultado prático. Quem ganhou? Ninguém. Porque não fazer um paralelo com o que fazem traficantes, milicianos, alguns religiosos e políticos? Medo, distorção da verdade. Já deveríamos ter superado a era de instabilizar outros pelo medo, mas ela segue aí firme e forte. Os resultados alcançados sempre são facilmente questionáveis, mas as consequências negativas inúmeras. É impressionante que não se tenha aprendido nada de ações estúpidas passadas. Definitivamente qualquer saída para um futuro desejável não passa pela violência pura. Todos nós, sem exceção, queremos sair dos impasses que vivemos; alguém tem dúvida? Mas são poucos os que agem pelo razoável e factível, até porque o povo, a massa, tem medo / pavor das consequências de ficar de fora da manada estourada em que estão inseridos. Gostaria de saber quantos palestinos de fato apoiam o Hamas e quantos para sobreviver repetem o que é mandado. A briga interna em Israel conhecemos, é aberta, complicada, gera pesadas discordâncias, isto é uma coisa. Outra, injustificável, é promover um banho de sangue para justificar suas próprias fraquezas e erros passados e presentes. Os médicos pediatras no Rio que o digam e sirvam como exemplo. Uma coisa não tem nada a ver com a outra? Será? Será mesmo?

domingo, 8 de outubro de 2023

Mudança de nomes, mudança da história, mas nada realmente muda.

SP Reclama
O Estado de São Paulo

O famoso e tão mal falado Minhocão, o Elevado Costa e Silva, foi obra de Paulo Salin Maluf, famoso por suas barbaridades e pouco respeito ao dinheiro público, um dos piores exemplos da história deste país segundo a Interpol. Na administração PT \ Fernando Haddad seu nome foi mudado para Elevado João Goulart pela Câmara dos Vereadores. Por mais erros que João Goulart tenha feito em sua vida não merecia tal fardo. 
Cancelar qualquer nome da história é um desserviço a sociedade. Não interessa se é boa ou ruim, é história e deve ser respeitada. 
Outra mudança de nome na era Haddad se deu na tradicional Av. Robert Kennedy em Interlagos que agora chama-se Av. Atlântica, apagando um dos nomes mais relevantes da história. Por mim continuaria como era, até para fazer a correlação acusatória com a invasão da Baia dos Porcos, mui provável razão para cancelamento de Kennedy por aqui.
As muitas invasões em áreas de manancial e o esgoto despejado na Represa de Guarapiranga têm outras razões, justificáveis segundos os mesmos purificadores de nomes e da história, mas isto é um detalhe.
A respeitadíssima pediatra Ana Goretti Kalume Maranhão teve sua nomeação vetada para o Departamento de Imunizações do Ministério da Saúde porque postou no passado apoio à Lava Jato.  Ideologia de conveniência.
Agora quem é o dono da bola vai decidir o futuro Ministro do Supremo. O que foi dito no passado, durante a campanha, ficou pelo dito. Mulher? Negra? Pelo que foi dito, duvido.

Não interessa o país, não interessa o que realmente é importante para todos, inclusive e principalmente os mais necessitados, interessa a venda da verdade que está no poder ou a que quer chegar ao poder. Neste sentido mudar nomes ou vetar nomes é de suma importância.

Olhar míope, conversa tacanha. Medo?

Ontem um dos meus netos, de 10 anos, andou pela primeira vez na vida num ônibus aqui, em São Paulo e Brasil. 
Já tinha entrado num na Alemanha, mas aqui não. O entusiasmo com a novidade foi notável. Descobri que nunca aqui, terra tupiniquim, entrou num metrô. Monotrilho nem pensar, o que é isto? Alguma novidade nesta "ignorância" do bom guri? O guri é ótimo, calmo, interessado, ligado em tudo, não tem celular até hoje e entende porque não o tem. 

Lá é seguro, aqui não? Lá é pontual, aqui... Lá é... , aqui.... Nem pensar em ele ir só... São várias as alegações para evitar que os filhinhos usem o transporte coletivo. A única inegável é roubo ou assalto, violência.

Nenhuma novidade que um garoto brasileiro, paulista e paulistano, da classe social e idade dele, ou até mais velho, nunca tenha entrado num transporte coletivo em sua vida.

O espetáculo terminou, a massa saindo do teatro começou a pegar qualquer taxi e entrar em qualquer carro que aparecesse na frente. Medão, eu não! Quem garante alguma coisa? O povo quer se mandar de lá, terras desconhecidas, próxima ao planeta Cracolândia, a da porta do teatro para a rua, vamos dar o fora, sair correndo.

Saímos do teatro, eu, avó e guri, olhei para o outro lado da avenida, subia um ônibus, consegui ler para onde ia, demos um corridinha e mandei que entrassem no ônibus que fechou as portas e partiu. Estávamos livres daquela loucura. Liguei para os pais do guri, avisei que estávamos num ônibus sem saber o que achariam, se eu iria tomar uma bronca. Avisei sobre a mudança de planos, que seria numa parada na av. Santo Amaro à pizzaria, meio do caminho para eles e para nós, vida mais fácil para todos. Não tomei bronca para minha surpresa, muito pelo contrário. Estranho. 

Em terra de medos, eu em particular, tenho medo de entrar em taxi que fica a espera na porta de teatros ou aeroportos. No ônibus, olhando para trás, fiquei imaginando que aquele povo amontoado na calçada da porta do teatro que pegava taxi provavelmente tem mais medo de entrar num ônibus com a sagrada família. Por uma lado posso entender, o cheiro do mendigo sentado mais atrás se espalhava, mas faz parte da vida. Não sei se perfume comprado em free shop por madame é pior. Pelo menos ali não estou trancado num carro dirigido por alguém que segue os caminhos marcados no celular dele e que não sei onde estou indo.

Há algumas diferenças entre o ônibus e o taxi. Se eu gritar num taxi com janelas e portas trancadas ninguém vai me ouvir. Taxis são transporte individual e muito mais caros que ônibus, na matemática financeira de nossa realidade social isto é igual a mais seguro? Provável. E tem todo imaginário que o status carrega, o que nestas pastage não é nada desprezível. Paranoia!? 

Com o neto sob minha responsabilidade deveria eu ter telefonado para os pais e aguardado a chegada deles dentro do teatro? Tomar a decisão de ir de ônibus faz sentido para mim, mas para para quem mais de nossa classe social abastada? 

Somos educados e vivemos num discreto aparthaid. Mentira! Verdade! 
Muros, seguranças, blindados, informação seletiva...
O desconhecimento gera medo, o medo por sua vez gera distanciamento, desconexão, fantasias, falsas verdades, verdades míopes. O que fazer? Pais que só andam de carro próprio, janelas fechadas, para eles o que será um ônibus? 

Eu só saí dos Jardins sozinho para conhecer o que havia noutro mundo, para lá dos limites familiares, o temido desconhecido, quando tinha uns 18 anos, dentro de um carro, dirigindo, portas fechadas, passando ruas e avenidas, as principais, olhando para frente para evitar acidentes de trânsito. Pelo menos na época não existia ar condicionado nem vidro fumado. E, principalmente, o Brasil sequer imaginava no pior dos pesadelos que nossa violência chegaria onde chegou.

"Você foi onde?" No meu entorno, entre os meus, discutia-se sobre o que fazer com aquelas vidas distantes afirmando certezas, mas sem nunca sequer ter passado perto. Alguns trabalhavam pelas redondezas, mas chegavam e saíam de carro, entra, portão fecha, saí, portão abre e fecha. O bar do outro lado da rua que serve p.f. comercial? "Onde?" 

E todos estamos sendo obrigados a ser politicamente corretos. É mesmo!? Não podemos mais delirar sobre o que não fazemos ideia do que é. Discussão absolutamente míope, conversa tacanha, pé batido com força no piso de pedra dura sobre o que pouco ou não se conhece: mas seja politicamente correto!

Os pais do guri têm outra cabeça. Sentamos na pizzaria e eles imediatamente pediram para o guri contar a aventura no ônibus articulado. Ufa! Ele adorou. 

sábado, 7 de outubro de 2023

Romaria 2023


O fascínio é pela festa popular em si. Sair para pedalar na Romaria para Aparecida para mim é mais participar da festa do que um ato de fé. Eles lá em cima me entendem. Há uma grande diferença entre acreditar e ser religioso. Eu acredito, ou pelo menos acredito que acredito. Não sou religioso. A diferença é que religiosos tem uma íntima ligação com que dizem em alguma igreja ou templo. Eu preferi ler os manuais de proprietário, leia-se bíblia. Leitura interessante, basta ter conhecimento prévio sobre como ler.
Morei em Olinda, onde as procissões são coisa séria, evento social só menos preparado e comentado que o Carnaval. Eu creio que as procissões são o carnaval dos tímidos. Tímidos? Depende. Fato é que a missa na São Bento, cantada em gregoriano e incensada era uma maravilha. As procissões, interessantes. 
Não sei exatamente o que sinto vendo todo aquele povo caminhando rumo a Aparecida, mas é uma sensação muito boa. Há uma comunhão, e não tome a palavra pelo sentido religioso. Os inúmeros postos de auxílio aos romeiros, com água gelada, café, bananas e laranjas, alguns docinhos e lanches são ofertados com simpatia e boa vontade. Diria união. Unidos venceremos.

De minha parte tem um que de superação. Completar os exatos 100 km entre minha casa e o hotel em São José dos Campos é um feito, pelo menos para minha condição física. Esta é a quarta ou quinta vez que repito o mesmo trajeto, sempre adorando. Queria ter saído a noite para ver como são as ruas e estrada até o apagar das luzes, iluminação pública. Coisas de família me fizeram ficar e ter uma ótima noite de sono e só sai às 8h00. Exausto pelo calor cheguei ás 14h30. Foi a mais dura de todas, longe.

Bicicleta e pedalar tem exatamente a mesma situação que citei aqui, ser religioso ou acreditar. Minha fé é a qualidade e o prazer, é nisto que acredito. Faz muito tempo, em uma corrida eu coloquei meu coração em 100%, uma estupidez sem tamanho, e fico feliz que quando voltei a mim mesmo disse com plena consciência "imbecil, você não é profissional". Não devo nada a ninguém a não ser a mim mesmo; que delícia de crença. Não pertenço a nenhum credo, bicicleta e pedalar não é minha religião. Mas tenho outra crença, inquebrável, unidos venceremos. De certa forma acontece na romaria.

Amadureci, mas ainda faço burradas. Pouco antes das 11h00 parei e almocei um sanduíche. Já tinha feito 45 km e bem. Daí para frente virou quase um pesadelo. Maldito sanduíche, mais justo, maldita burrice. Sem o que aprendi em anos de pedal não teria chegado em São José dos Campos. A técnica de girar os pedais usando o peso das pernas valeu, e como!

Estou tendo câimbras fortes, mas estou feliz. Descanso por um ou dois dias e sigo em frente. Gostaria de conseguir fazer numa tacada só, mas não dá. Gostaria de fazer em dois dias, mas não acho recomendável. Quero pedalar, ver a bagunça, romaria, e mais importante, ficar inteiro.

No meio do caminho parei num posto e restaurante que estava recebendo uns 20 ônibus de excursão cheios de jovens indo para uma festa rave. O zoológico era completo, algumas meninas bem hard core. O idiota aqui não entendeu nada e perguntou a um casal de romeiros se aquele povo estava indo para Aparecida. Eles riram.

O contraste entre as duas tribos foi genial 

Casal de mudança empurrando um carrinho de supermercado pela Dutra com todas suas propriedades. Histórias de um Brasil


quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Sugestões para segurança no trânsito

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Sugestões enviadas para OAB sobre
Segurança no trânsito
Novembro de 2019


Está copiado Walter Feldmann que tem sido ajuda preciosa na melhoria da qualidade de vida dos ciclistas, e porque não dizer na mobilidade ativa.
Muito já foi feito, mas falta fazer muito mais. Não dá para um dos países mais ricos continuar com os absurdos que temos no trânsito, porque não dizer nas mortes violentas e sem sentido. Trânsito, como diz Roberto Da Matta, sociólogo, é reflexo (perfeito, diria eu) da sociedade. Inúmeros estudiosos mundo afora afirmam que a mudança do comportamento no trânsito se reflete numa mudança comportamental da sociedade. João Batista Assumpção notou que o sistema mais simples de organização social é justamente o trânsito: a luz ficou vermelha, parou; a luz ficou verde, segue; ou seja, é facílimo de compreensão por todo e qualquer um, portanto ótima ferramenta educacional.
Plano de Segurança Pública para o Brasil? Ou se faz um plano cercando realisticamente nossas distorções ou vai continuar na mesma, como já afirmam especialistas. Como coloco no primeiro ponto das minhas sugestões: temos que parar com brincadeira.


Educação e diminuição de acidentes

• parar com brincadeira, com faz de conta. Ser realista. Entender o que está acontecendo e estabelecer agenda. Fazer de conta que em certas áreas a população usuária de moto usará capacete através de educação ou da presença de policiamento, praticamente inexistente, ou descobrir qual são as causas dos acidentes e diminuir os erros? Em país que tem lei que cola e lei que não cola não será melhor comer o mingau pelas bordas?

• educação para crianças – não tratar como pequenos adultos. Pedagogia própria

• B.O. uniformizado e fornecendo informações locais específicas

• acompanhar resultados e fazer mudanças caso necessário. Ter dados confiáveis.

• revisão de padrões técnicos de engenharia viária

• Polícia Técnica e Legistas treinados e com condição de trabalho. Dados!


Bicicletas e ciclistas

• mudança padrão dos semáforos para ciclistas e outras mobilidades ativas:

    ◦ posição nos cruzamentos – evitar confusão com semáforo para autos

    ◦ altura no poste – tanto para diferenciar quanto pelo ângulo de visão do ciclista

    ◦ estudar mudança de forma dos semáforos ou côr verde para azul. Diferenciar

• introduzir no CTB diferente forma, altura e cor para sinalização aérea para ciclistas – padrão europeu (usar exemplo de diferença de tamanho de placas de velocidade)

• criar ciclo linha e outras sinalizações de solo específicas para ciclistas existentes na Europa

• uso de pintura de solo só nos cruzamentos ou como fundo para pictograma – racionalizar uso de tinta vermelha

• começar estudos sobre uso de cores para sinalização de solo – ver situação pedestres e cadeirantes. Ver experiências internacionais

• rever padrão de qualidade de todos refletores obrigatórios para bicicletas e seus sistemas de fixação na bicicleta. Repensar forma de fixar refletores frontal, traseiro e de rodas, estabelecer norma.

• obrigar fabricantes e bicicletarias a entregar a bicicleta com refletores de qualidade, o que foi abandonado

• fazer campanhas sobre a importância dos refletores – vide exemplo da Rodovia Ayrton Senna

• normalizar padrão de pisca piscas e luzes para bicicletas: a baderna que está aí não funciona. Alemanha proibiu luzes pisca-pisca

• urgente: ver a situação dos ciclistas esportistas e cicloturistas em estradas – crescimento muito rápido

• urgente ver a situação de estradas conurbadas

• intermodal

• controle de qualidade das bicicletas – verificar o índice de acidentes por falha mecânica da bicicleta (10 anos atrás girava em torno de 35%, dado concessionárias de estradas)


bicicletas e outros elétricos

• olhar a questão da circulação de bicicletas elétricas em ciclovias e outros

• normalizar patinetes e outros motorizados elétricos: potencia, aceleração, frenagem, tamanho rodas, caster, torção chassis, evitar shimming, posição condutor...

• normalizar bicicletarias especializadas em elétricas e descartes de baterias e outros

• quanto será o gasto de energia? Como carregar? É importantíssimo para o Estado ter noção do que vai acontecer

• celulares: há estudos sobre futuros problemas com aplicativos? E se der pau, como fica a mobilidade?

• planejamento estratégico para falha do sistema

• planejar educação de usuários urgente

• a lei tem que olhar as necessidades das seguradoras – inclusive seguro obrigatório

• controle de fluxo pelo sinal dos celulares – já existe


Espaço público

• CTB: mobilidades em espaço público e espaço privado de uso público, e não mais transporte em vias. Pensar na cidade como um órgão vivo, não como espaço onde ocorre transporte com o mesmo prisma de 20, 30 anos atrás - https://cidadeemmovimento.org/hiperlugares-moveis-e-o-novo-programa-do-ivm-internacional/

• começar a pensar no que já acontece na Europa onde as cidades não tem mais ruas, placas, sinalização... Ver história Exibition Road, Londres

• acelerar os processos de introdução de acalmamento de trânsito. Estabelecer em lei.

• estimular vagas vivas

• estacionamento de bicicletas e outros em espaço público e privado

• uso de bicicletas estacionadas como barreira para evitar cruzamento de pedestres

• quem tem responsabilidade civil e criminal por uma bicicleta ou patinete parados, jogados em local impróprio? dificultar a circulação de outros e causar acidentes

• pensar a agenda da bicicleta como mobilidade em espaço público, como cidade, não como ciclovia ou ciclofaixa

• como tratar ruas de lazer ou interditadas para eventos? Rever procedimentos, sinalização, informação ao trânsito…

• munir departamentos de transito com ferramentas de sinalização de mudança de trânsito ou acidentes

• olhar leis referentes a reorganização do uso de espaços públicas em vias e calçadas: vaga viva, mudança de uso…

• facilitar e estimular melhoras e aumento de calçadas

• medir fluxo de pedestres em pontos críticos – falta calçada e semaforização com tempos impróprios (além dos 45 segundos até Londrino cruza sem esperar)

• revisão da lei de circulação de ambulâncias, polícia, e outros veículos especiais. Hoje o pessoal tem medo de abrir passagem por causa de multa – CET SP

• ver leis sobre recolhimento de veículos abandonados – incluir bicicletas e outras mobilidades ativas

• revisão de técnicas construtivas – treinamento geral

• ter mapas


documentação e estatísticas

• unificar B.O. em todo Brasil

• congresso brasileiro para explicar e treinar todos

• regionalizar, mudar cultura por etapas

• criar central de coleta de dados

• B.O. detalhado para pedestres, ciclistas, patinetes, cadeirantes e outros – entender a causa dos acidentes – não dá para continuar simplesmente no “atropelado”, o que aliás pode ser um erro jurídico


sinalização

· persianas para semáforos – Londres,

· aproveitar e copiar as soluções funcionais criadas pelo mundo


terça-feira, 3 de outubro de 2023

Greve no metrô. E medo de ir para o trabalho pedalando

O texto a seguir foi publicado faz dez anos no site Motonline. Em boa parte ainda é atual. Boa parte das pessoas tem medo de ir ao trabalho pedalando. Outro dia ouvi, mais uma vez, que o medo se devia porque voltava para casa a noite. Não consegui responder que a noite, sabendo o que está fazendo, é muito mais seguro que automóvel. Pedalando a noite de volta para casa presenciei um sequestro, o que não foi nada legal. Por sorte da sequestrada consegui chegar rápido na delegacia e avisar. Os sequestradores devem ter me visto e largaram a sequestrada um pouco mais a frente. Enfim, por vários razões automóvel é menos seguro a noite que bicicleta.
Fato é que nesta década que passou o número de ciclistas circulando pela cidade aumentou, principalmente depois da entrada das bicicletas elétricas, ou seja, do que se conclui que não era só medo que freava o uso da bicicleta, mas o suar, a comodidade, a lei do mínimo esforço...

E hoje a cidade está um caos por conta da greve dos metroviários. Estou em casa arrumando a minha bagunça e dou de cara com este velho texto, que cabe aqui e o publico novamente. 
Lá vai. Boa viagem de 2012 a 2023.




O vizinho vai todo dia de ônibus para o trabalho, que é bem próximo. Não sei quanto demora, mas só até o ponto de ônibus, mais a espera, descer do ônibus e caminhar até o escritório deve dar o tempo que ele levaria pedalando. Não inclui no cálculo o tempo de viagem do ônibus no trânsito, que hoje em dia já não se pode mais precisar. Eu venho tentando convencê-lo, sem sucesso, a fazer a experiência de ir de bicicleta. A desculpa, educada, é a mesma da maioria: é perigoso. Ele tem uma linda filha pequena, o que valeira como desconto pelo receio, mas, racionalmente, não é.

Mesmo com o crescimento do uso da bicicleta tudo o que não temos é uma discussão racional sobre a questão da segurança de pedalar no trânsito, principalmente entre a classe média que trabalha em escritório. Infelizmente nós vivemos um tempo no qual dar ouvidos aos medos parece ser o mais sensato. A verdade parece não interessar.

O que é seguro ou inseguro? Com certeza não é o que se diz em conversa de botequim. Numa sociedade viciada em violência sentar-se para conversar sobre amenidades, de preferências as boas, agradáveis, racionais, realmente sensatas, costuma cansar a plateia. Talvez a melhor definição do que nos tornamos seria a primeira página do Notícias Populares, extinto jornal sensacionalista que sempre estampava na primeira página o pior ou mais bizarro. Tipo a fotografia do bebê diabo, corpos mutilados, facas ensanguentadas etc. Isto muito antes do Massacre da serra elétrica. Hollywood não sabe o que perdeu. Todo mundo adorava - e a sociedade incorporou.

Medo talvez seja o melhor negócio dos dias atuais. O mercado internacional pode estar um desastre, mas a indústria do medo continua muito bem; obrigado. Acabou a Guerra Fria, alguém tem de sustentar a indústria bélica. “Apavora os trouxas”. Sei lá como foi; talvez tenha sido por aí, mas de qualquer forma vender medo é muito lucrativo. Muito!

Mikael Colville-Andersen, em uma palestra em Copenhagen, disse que um dos grandes interessados na obrigatoriedade de ciclistas usarem capacete é a indústria automobilística. Talvez tenha a ver com o fato que em absolutamente todo local onde o capacete é obrigatório o número de bicicletas circulando diminuiu e o número de ciclistas acidentados aumentou. E que capacete está intimamente ligado a queda, acidente. Simples coincidência. Provavelmente mais uma teoria de conspiração. Existem pesquisas científicas que provam que o uso de capacete em carros de passeio seria realmente útil para diminuir as vítimas. Por que não?

Não importa que a distância seja a ideal, menos que 4 km; que paralelo a av. Nove de Julho tenha um monte de caminhos alternativos arborizados e seguros; que o caminho no sentido do trabalho seja uma leve descida, portanto vai suar pouco; que sua vizinha de porta sempre foi para o escritório bem vestida e pedalando e trabalhe na mesma área que ele; que eu me disponha a emprestar uma bicicleta e vá acompanha-lo para dar dicas; que indo de bicicleta ele chegue mais rápido e vá ter mais tempo para ficar com a sua filhinha, que ele tanto ama. Não importa nenhum argumento racional. Não dá para ir pedalando. Bicicleta é perigosa e ponto.