A era do só o muitíssimo (o completo exagero) é legal, entramos nela? Tudo indica que sim. Nunca o muito foi tão muito, necessariamente muitíssimo em tantas áreas de nossas vidas. Comunicação em massa, mais que isto, a manipulação em massa está em nossas mãos, a carregamos no bolso e estamos atentos a ela o dia todo. Mais, aceitamos como natural e bom, melhor, ótimo.
A diferença para o passado é óbvia: a era digital está aí até para os que não querem vê-la, e ponto final.
Pós escrito: o conceito de infância surge no início do século XIX com a revolução industrial. Antes disto não se fazia distinção entre adultos e crianças. E o conceito de adolescência se firma pós Segunda Guerra Mundial, antes também eram crianças e adultos. Ou seja, usando um termo bem popular: não tinha mi-mi-mi.
Paz e amor, nossa fronteira final? Faz tempo que se acredita que sim, é o nosso fim, e aí faz tempo, muito tempo, procura desesperada desde o surgimento das religiões monoteístas, ou bem antes. Cristianismo a refinou: pratique muito amor e tenha paz no céu, com direito a recepção por São Pedro. E por aí vão esta e as outras.
O Festival de Woodstock foi o ápice do paz e amor, do Flower Power, do faça amor, não faça guerra... Quatro dias de música, sexo e drogas, e paz e amor. Saiu do controle com 500 mil pessoas invadindo a fazenda e lá ficando por quatro dias, debaixo de sol, chuva, lama, precariedade de alimentação, bebidas, higiene, transformando tudo em volta num caos, mas de alguma forma controlado pelos próprios meio milhão de jovens. Quase inacreditável, mas foram só duas mortes, uma por overdose e outro atropelado por trator que ali trabalhava para dar um mínimo de condição de vida para aquela massa de paz e amor.
Os cinco discos gravados e lançados no mercado, mais fotos, filmes e o filme Woodstock mostram o que foi, pelo menos o lado que era interessante mostrar para um público que se sabia restrito, selecionado, e com potencial político e comercial. Paz e amor serve além de suas belas palavras. Woodstock foi para uma geração "muitíssimo legal".
Aqui, no Brasil, antes disto, a partir da metade dos anos 60, começaram os festivais nacionais de música transmitidos direto pela TV (em branco e preto). Quantos músicos maravilhosos saíram dali. Paz e amor? Não só, ou um outro tipo. É proibido proibir, ou era, ou queriam que fosse, como cantava a música. Vivíamos o começo de uma ditadura militar que ficou braba e o discurso paz e amor pegava menos neste país tropical, ou fazia menos sentido que num Estados Unidos desbundado na riqueza, a todo vapor, mas metidos em uma guerra violenta, Vietnan, sem sentido diziam, a segunda deles pós WWll. Paz e amor era protesto, ou pretexto, como queiram.
A partir da revolução industrial o "muito é legal" não só para os negócios e capital disparou. Imagina só o que sentia a primeira geração que passou a ter utesilhos domésticos a disposição em casa. Quanto mais, melhor, era novidade e ganhou outra escala: acessível. Rádio e depois TV deram um belo empurrão ao mais é melhor.
Também a partir da revolução industrial surge uma nova era, a era do só o comunismo é muitíssimo legal, que pelo sim ou pelo não tem a ver com o paz e amor do Festival de Woodstock caótico e absolutamente igualitário, pelo menos por quatro dias.
Paz e amor? Paz e amor!
(Esta porra de corretor automático, que agradeço a Deus por existir e evitar que eu escreva erro atrás de erro de português, corrigiu o paz e amor por Paz é amor, o que dá o que pensar. Mensagem subliminar de Deus ou sacanagem digital do programador que é messiânico? NDA.)
Exageros? Sempre existiram, nenhuma novidade, alguns comportamentais, outros sociais, faz parte de nossa história. A 'era do só o muitíssimo é legal' sempre existiu, mas em nichos, de formas diversas e escalas restritas em setores de cada sociedade, mas não na escala e nível de disseminação que temos hoje.
Foram muitas eras do "só o muitíssimo é legal". Por exemplo, um dos fatores para a vitória dos aliados na WWll foi a suavidade dançante das big bands americanas.
Sempre se quis encaixar e viver, regra básica de sobrevivência social. Hoje "muitíssimo" é uma força impositiva gerada pela realidade digital que atinge inevitavelmente a todos, queira ou não queira.
Fato é que paz e amor, da forma como pensamos hoje, eu diria, foi o início da "era do só o muitíssimo é legal" uma novidade recente entre e dentro da humanidade.
Como curiosidade, dois Beatles, Paul e George, viajaram para San Francisco para ver e vivenciar o paz e amor do Flower Power. Dois dias depois retornaram a Londres. Acharam um porre idiota.
De qualquer forma o paz e amor muito turbinado e fortemente distorcido pela pela cada vez mais agressiva propaganda comercial, nos trouxe a esta maravilhosa "era do só o muitíssimo é legal", ou, no dito popular, "quanto mais melhor", ou ainda "quanto mais vende, mais lucra". Neste contexto, com a concorrência que se tem hoje, vale qualquer coisa para sobreviver, inclusive o "só o (meu) muitíssimo é legal". E o pessoal embarca e compra, esta é a questão.
A memória do meu celular acabou. Limpeza feita. Agora funciona muito melhor. A mesmíssima receita de uma pesquisa científica sobre recuperação da nossa memória, a que temos dentro da caixola, que acabou de ser publicada. Menos informação é mais saudável para o funcionamento geral do corpo, mente e alma. Absolutamente ninguém duvida, pelo menos os que não são das gerações X Y Z e os etc + algo.
Diz a pesquisa, momentos de observação aleatórios e inconsequentes trazem benefícios para memória e outras funções do cérebro, por conseguinte para a vida. Só funciona com as sensações abertas, focadas no apreciar o momento. Simplesmente dar-se ao direito de perceber e sentir.
Em outras palavras: era e continua sendo muito legal integrar-se à vida. Não é sadio e produtivo entrar de cabeça no só 'o muitíssimo (qualquer coisa, de preferência idiota) é legal' que se vive hoje. (Nossa pausa. Sorria! Selfie!)
Meu agradecimento aos pensadores, historiadores e sociólogos que em diversos artigos tem analisado e colocado em contexto o que vivemos hoje. Estamos um pouco muito mais acelerados do que é sadio. Pelo que me lembro a ideia deste texto, delírio talvez, veio de artigo do Karnal sobre exageros.
Termino citando Goebels, que usou e abusou do "só o muitíssimo é legal" para fundamentar a tentativa de impor uma era que teve consequências definitivamente nadíssima legal para centenas de milhões. Aliás, Stalin, Mao e outros do genero, também impuseram o muitíssimo legal a moda deles que também fazem parte de um passado pouco memorável. A ideia de todos eles, ditadores, salvadores da humanidade, populistas, religiosos, tudo junto e separado, pode até ter sido boa, mas.... aí entrou o muitíssimo, a doutrinação do "só o meu muitíssimo é legal". Danou-se!
Será o IA a nova "era do só o muitíssimo é legal"?. Medão! Eu prefiro ser uma metamorfose ambulante