O Rio Grande do Sul vai ter que ser construído, algumas cidades vão ter que partir do zero. Qual é a experiência que temos aqui e que há fora do Brasil que devem ser olhadas com muita atenção? No que ela pode ou deve servir e ajudar?
O problema já começou. Tem prefeito que foi a público definindo que certas áreas devastadas não podem ser reconstruídas e quepara evitar que isto aconteça não mais voltarão a ter água, esgoto, luz e comunicação, mesmo assim tem morador que jura que do que resta de suas casas não sai e de lá não se muda. É mais que compreensível, mas ao mesmo tempo este posicionamento, "o que é meu ninguém tira e ainda faço o que quiser", é justamente o que faz com que nossas cidades sejam o que são. Começando por aí a comparação com cidades mundo afora é muito desalentadora.
Nos Estados Unidos é frequente uma cidade ser varrida por um furacão ou tornado. Acaba de acontecer em Houston, onde os danos não foram muitos, mas sensíveis. E vai começar a temporada de destruição, de tudo voar pelos ares. Eles tem prática. Eles tem um planejamento para atendimento emergencial e reconstrução pós furacão ou tornado que é seguido passo a passo sem desvios. Dependendo das condições o poder público tem mão forte para evitar futuros problemas, ou seja, o cidadão é mudado de endereço e ponto final.
Quando eu estava em Bowlling Green, Kentucky, dispararam as sirenes da cidade, o celular disparou a fazer barulhos e encheu a tela com aviso de tornado, que de fato veio um pouco mais tarde, felizmente 20 milhas ao norte da cidade. Eles sabem bem o que é destruição. Nós também. Eles sabem também como reconstruir. Aí tenho minhas dúvidas que nós, brasileiros, saibamos.
Estou em Newnan, Georgia. Faz dois anos a cidade foi cortada por um tornado uns dez quarteirões do centrinho. A destruição foi total. Da velha escola só sobrou a fachada que é em tijolos, o resto voou pelos ares. A nova escola, agora bem mais robusta, já está pronta, assim como a maioria das casas.
Talvez eles tenham uma lei que obrigue a reconstrução num terminado tempo, ou o poder público intervem. Em NY um imóvel comercial não pode ficar mais de seis meses desalugado ou o proprietário é penalizado. Razão: não prejudicar os imóveis que estão em volta e a população que por lá vive.
Acabei tendo uma longa conversa com um dos bombeiros de Newnan. Contei sobre o Rio Grande do Sul e ele pediu para ver vídeos. Enquanto via, perguntou se tinha dinheiro para reconstrução. Boa pergunta! Dinheiro, este é um problemão, mas no Brasil não é o maior. Nosso maior problema é fazermos mal feito, desperdício, todos nós sabemos de cór e salteado.
Não é só uma questão de dinheiro, mas muito mais de postura em relação ao coletivo. Aí todo brasileiro sabe que a coisa pega. Ninguém fala, mas todo mundo sabe que nosso lema está mais pelos lados do "salve-se quem puder".
Na longa viagem de navio para NY conversei muito sobre o drama do Rio Grande do Sul com um senhor nascido em Beirute, Libano, de família armênia, que é arquiteto e vive em Boston, mas viveu e trabalhou em Paris e na Arábia Saudita, portanto com vasta bagagem. Perguntei se ele já tinha visto, lido ou conhecia algum documento ou manual americano ou europeu sobre efeitos, procedimentos e recuperação de cidades pós enchentes. A resposta me deixou mais aguniado que já estou:
"Furacões causam sérios danos superficiais. Enchentes destroem tudo, são muito mais complexas, porque destroem tudo na superficie e debaixo do solo. Água causa os piores danos possíveis e é difícil recuperar".
Perdi um carro numa enchente. Ele só pegou água até um pouco acima do meio do pneu. Na época ainda dava para mandar desmontar o carro e limpar tudo. Ele voltou a funcionar, mas uns meses depois os efeitos da água apareceram para valer e perdi o carro. Imagine numa casa, num bairro, numa cidade.
Uns dias depois, Lito Sousa, especialista em aviação, deu uma entrevista sobre o Aeroporto Salgado Filho, o de Porto Alegre, que literalmente submergiu. Segundo ele, ninguém faz ideia do nível de danos causados pela enchente, mas conhecendo aeroportos ele não tem dúvidas que são muito grandes. E completou, pela forma como foi solto o comunicado oficial dos responsáveis pelo Aeroporto Salgado Filho, Lito disse que talvez não dê para recuperá-lo.
Aeroporto não é uma cidade, mas serve como referência porque tem uma estrutura similar ao que uma cidade deveria ter. A maior diferença para nossas cidades é que os aeroportos funcionam com um alto padrão de qualidade, com informações precisas sobre tudo. em Mesmo nossas cidades mais bem organizadas as informações são falhas ou ainda inexistentes. Mapas? Duvido, ou são falhos, desatualizados.
O lado bom da enchente que é se tivermos juízo vamos construir cidades bem planejadas. Gaucho costuma ser mais organizado que a média brasileira.
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