Na noite anterior a minha partida de volta para o Brasil caiu a ficha que aquela não era só mais uma despedida dos Estados Unidos, mas o fim de uma era de minha vida. Não sei com que cara fiquei, luz apagada, mas simplesmente fiquei acordado até às 4:00h da manhã e só dormi umas duas horas, se tanto.
No dia do embarque, ainda com a cabeça dando voltas, olhei tudo em volta com melancolia e um profundo agradecimento por tudo que tive na vida até aqui. Não tinha mais dúvida, não tenho mais dúvida, minhas viagens para fora do Brasil acabaram. A festa acabou. Tenho, como já tinha consciência, que tenho que reorganizar toda minha vida para daqui para frente. Talvez voltar um passo atrás, usando minha velha vidinha caseira de trabalho como referência ou ponto de partida.
Fiquei com a TV ligada tentando dormir e não faço ideia o que me acendeu os pensamentos sobre o significado daquele momento. Apaguei a TV e a luz e aí o mundo girou mais forte.
No meio do turbilhão de idéias veio a certeza que de todas as viagens que fiz aprendi muito. Em todas elas saí para as ruas sempre com a segunda intenção de colher algo que fosse valioso para nós, paulistanos, e brasileiros. Depois de cada viagem sonhei, melhor, delirei que traria para casa, minha cidade, algo de novo e melhor para todos. E como numa onda de ressaca caiu a ficha que não consegui transmitir ou fazer valer quase nada de minhas experiências.
Lá fora saio para ver lojas, como todo ser humano destes anos de desbunde incontrolável, mas não sou um comprador, muito pelo contrário. Aqui não tenho o mesmo prazer.
Numa destas caminhadas por NY parei numa vitrine e fiquei embasbacado com a qualidade das costuras de um vestido. Entrei, fui bem recebido, minhas dúvidas respondidas.
Muitas e muitos entram e compram porque acham bonito, querem a marca a qualquer preço. A qualidade do trabalho? O que está por trás daquela obra prima? Não importa. Importa os comentários que virão com o vestido.
Eu me preocupo com a costura. Fico maravilhado com a altíssima qualidade. Obra prima de museu.
O turbilhão da noite de olhos arregalados me fez rever meu caminhar por calçadas perfeitas, com guias bem rebaixadas, ruas silenciosas, sem um papel jogado fora da lixeira. Doeu saber que não vou mais poder caminhar sem qualquer preocupação, nem digo medo.
Não faz muito tive que me controlar para não acabar num psiquiatra. Estava surtado, literalmente, por causa do lixo espalhado por nossas calçadas e ruas. Um dia Teresa me deu uma bronca das boas e passou a pedir com frequência para eu parar de pegar lixo do chão, jogar no lixo, e parar de reclamar dos outros. As pessoas já estavam me olhando com cara estranha.
Banco em praça pública doado por uma família. A pequena placa dá o nome. |
Tudo me veio a cabeça. Não tenho dúvida que muito da rica colheita de experiências que tive nestes anos de viagem foi rejeitada. NY sofreu uma transformação mágica, certeira, para melhor, muito melhor nesta última decada. Naquela cama, estatelado nos pensamentos furiosos, caiu a ficha que o prazer dos banhos de civilidade se acabaram. Vou dizer, foi bem pesado, dolorido.
Só tenho que agradecer a benção que me foi oferecida. Sinto que não tenha conseguido reparti-la.
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