Baranga e mal educada, mas deve ter algum dinheiro ou não estaria hospedada neste hotel. Comportamento de baranga, grossa, pobre, para ficar na ordem alfabética. Sua filha, pobre adolescente, chegou primeiro, silenciosa, inexistente, encapuzada e rosto baixo brilhando pela tela do celular. Saiu do elevador virou a esquerda e tentou entrar onde está sendo servido o café da manhã empurrando para o lado o bloqueio. O atendente percebeu e educadamente a orientou a dar a volta. E ela apareceu do outro lado, na entrada, encapuzada, rosto e olhos baixos brilhando pela tela do celular. O atendente deu bom dia, não respondido, perguntou o quarto, respondido com um grunhido forçado através do capuz e existente pelo brilho do celular. Pós adolescente, deu meia volta e foi sentar retorcida para o brilho saído de seus dedos numa poltrona no meio do lobby. Não demorou voltou como um fantasma sentou-se numa mesa ao lado e então chegou a mãe, rosto grande, redondo, olhos estreitos, beiçola, como personagem de desenho animado que só urra para os outros. O atendente se aproximou, pediu o quarto da senhora que ali chegara e teve que subentender uma resposta já que a grande mulher continuou em vão seu monólogo com a pós adolescente encapuzada cabeça baixa rosto brilhando. Não obteve grunhido ou menção de olhar. Os outros não existem, coisas de uma geração. Os outros não existem, coisas de uma certa população.
A mãe foi ao buffet, recebeu um sorridente bom dia e foi servida, como manda a pandemia. Foi servida, nada de por favor, obrigado, ou qualquer sinal de delicadeza. Sirvam-me. Sentou-se frente a frente com a filha, entulhada de pratos, xícaras, copos, e falas não respondidas, mesa pequena, meio prato apoiado prestes a emporcalhar o chão, gula grotesca. Veio o atendente e desentulhou o que pode, sem um olhar, sorriso, muito obrigado. Ele não existe. Sirva-me. "Vai pegar o café, minha filha" ouviu se no salão. Eu estava em pé esperando meu expresso e veio a filha encapuzada, cabeça baixa; e que eu saia da frente, que dê um passo para trás, e dei, fazer o que? Voltei para minha mesa, voltou a menina cheia de pratos, e atrás dela o simpático atendente com os ovos mexidos. Sem espaço na mesa, sem olhares para ele, sem agradecimento, sem mover uma palha, mãe e filha. O funcionário para elas estava ali para servir, ponto final.
Saíram do mesmo estrato social dos funcionários, mas agora tem algum dinheiro. O outro não existe, não interessa, tem que servir. É símbolo de um passado que incomoda; que não exista.
Eu e todos que estamos aqui no hotel somos chamados pelo nome, num atendimento impecável.
Adolescentes de hoje são assim: o outro não existe. Sei porque tenho netos. Netas em particular.
Adultos não; mas é cada dia mais comum vivenciar situações como esta aqui no Brasil. O outro não existe. Novo rico, se é que é o caso, é propenso ao grosseiro. Foi pobre, virou mal educada, portanto e sem dúvida baranga.
O boysta
Na entrada para o bicicletário do shopping, que fica no subsolo, ficam dois funcionários tirando a temperatura dos motoristas, motociclistas e ciclistas que entram. Na minha frente desce a rampa um carro pequeno tunado com som alto, para no bloqueio e eu espero. Vejo o segurança que gesticula e até eu consigo entender que é para virar a direita, direita, descer a segunda rampa e novamente direita, caminho para o segundo subsolo. E gesticula de novo dando a mesma explicação. O motorista sai e para meu espanto segue em frente, cruza o primeiro corredor de vagas e lá na frente para perdido. Desço rindo até o funcionário com o termômetro e os três ficam olhando o perdido pedindo novas explicações. "Como ele foi em frente? Até eu que não ouvi a explicação pelos gestos entendi". O segurança que deu a explicação se aproxima e bem contrariado diz "Ele está com o som alto, pediu orientação, não abaixou o som e sequer ficou olhando para mim. Pediu de novo, expliquei de novo e não olhou, nem deve ter ouvido. E ainda reclamou que eu tenha tomado a temperatura. É assim. Nós que ficamos aqui passamos por estas. O pessoal não respeita, fica bravo, acha que somos os responsáveis, e ainda pedem orientação e não ouvem. É assim."
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