segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

36 ciclistas mortos em São Paulo


Repetindo o título: 36 ciclistas mortos em São Paulo, um crescimento de 64% em relação a 2018. Aí veio uma gritaria generalizada, "absurdo!". Os números de acidentes fatais no Município de São Paulo no geral, de todo trânsito, incluindo ciclistas, melhoraram quase nada ficando quase na mesma, de 888 para 874, o que também não é exatamente uma boa notícia. Como dizem os que gritam e os especialistas o ideal é zero mortos, objetivo que é meta em alguns países europeus.  Seria ótimo se conseguíssemos, mas aí sim nossa realidade é outra e estamos a um ano luz disto, principalmente porque se fala muita besteira e tem muita gente vesga ou dando palpite interessada só no seu próprio, nunca no coletivo.
Provavelmente este aumento de ciclistas mortos tem relação com as entregas por aplicativos, disto ninguém duvida, mas duvido que apareça em algum B.O. para confirmar. A maioria dos meninos e meninas que trabalham para aplicativos são de periferia, onde o trânsito é muito menos intenso e menos controlado que na área central; portanto, vem de um meio que vale tudo e pedalam com tal. Motoristas e motociclistas de áreas mais pobres e afastadas têm uma formação educacional e comportamental de condução de veículos bem mais precária que os de área central, isto aqui ou em qualquer parte do planeta. A diferença é que aqui no bang bang temos um problema sério de formação cidadã, que é essencial para a segurança no trânsito. O pensamento genérico é “eu tenho que ir para lá” e o resto é resto, os outros que saiam da frente. No meio dos bairros dormitórios e de periferia o controle e fiscalização de trânsito é praticamente zero, muita gente não habilitada circula motorizada, inclusive menores de idade, todos livres, leves e soltos... Via de regra o pessoal destas periferias vêm de cidades muito mais tranquilas, menos densas, que a megalópole que é São Paulo, o faz toda diferença na noção dos perigos do trânsito. Estes jovens vêm trabalhar no centro expandido, uma das áreas mais bem organizadas do Brasil, onde se cumpre a lei tanto quanto em outras grandes capitais do mundo, e saem pedalando leves, livres e soltos da mesma forma que fazem na sua periferia ou nas cidades de origem suas ou de suas famílias. É óbvio que motoristas e motociclistas não esperam que surja uma bicicleta descendo uma avenida a milhão na contramão, por exemplo. E por estarem pedalando uma bicicleta as leis dificultam ou praticamente impedem que as autoridades organizem, freiem, punam, eduquem. Estes ciclistas de aplicativos sabem disto, trabalham com isto na cabeça e estão única e exclusivamente preocupados em entregar o máximo de mercadorias para ganhar mais no fim do dia, o resto é resto. E, pelo outro lado, os aplicativos querem exatamente isto, que eles entreguem rápido, o resto é o resto. E os que usam aplicativo querem rapidez, o resto é o resto. Pausa para o selfie da plateia, o resto não importa.
A população da área central, rica, quando pede sua comidinha está fazendo e andando para a forma como estes jovens estão pedalando nas ruas ou calçadas; querem comer a comida quentinha e com gosto de saída do fogão, querem entregue o mais rápido possível. Como fica seu humor quando a pizza chega mole e o queijo endurecido? Este "já" coletivo foi e continua sendo regra com os motoboys: eu quero ontem. Se morrer morreu, eu quero é o meu - agora! Porque haveria de ser diferente com os ciclistas de aplicativos? Estas mortes sempre foram um efeito colateral, nada mais, e não se fala mais nisto, ou continuamos falando fala para atender o politicamente correto, e ponto final. Se a sociedade paulistana (e brasileira) estivesse mesmo interessada em diminuir as mortes no trânsito primeiro se olharia no espelho do banheiro.
Outro ponto para o aumento das mortes de ciclistas apontada pela pesquisa está nos fins de semana, este sim com números. Tem gente relacionando estas mortes com o fim da ciclo faixa de domingo. Concordo, de fato, mas com uma outra visão. Não acharia estranho que este aumento de mortes nos fins de semana fosse resultado exatamente de anos de Ciclo Faixa de Domingo. Existe a palavra deseducativa? (Google. Sim existe.) Pois bem, deseducativa, a Ciclo Faixa de Domingo foi profundamente deseducativa. Com a ciclofaixa conificada à esquerda em grandes avenidas para chamar atenção do público em geral, não só motoristas, o ciclista aprenderia, como aprendeu direitinho, que pedalar à esquerda das avenidas é o correto, o que muitos continuam fazendo quando a ciclo faixa de domingo não foi montada. Mais, a maioria dos ciclistas domingueiros continua pedalando pelos mesmos caminhos do automóvel, ou seja, em avenidas. O interno de bairro continua não existindo, ou seja, a cidade se resume aos caminhos das avenidas, o que é de uma pobreza e de um deseducativo sem tamanho. São Paulo é de uma riqueza impressionante, praticamente única no planeta, fruto de nossa diversidade sem igual – no interno dos bairros, não nas avenidas onde tudo fica igual, seja aqui ou em qualquer cidade do planeta.
Não sei onde li ou ouvi que uma das razões para este aumento de mortes pode estar no pedalar em ruas mais vazias. Precisaria cruzar com os índices de atropelamento de pedestres, de crianças para ter um mínimo de base para uma afirmação destas. Quem já pedalou no interno de bairro num domingo sabe que você consegue ouvir o carro vindo de longe e que se você não estiver viajando na maionese é muito mais tranquilo e seguro que em ruas movimentadas ou avenidas. Só sofre acidente em local tranquilo quem não tem a mínima noção do que é pedalar numa rua. Será que tem a ver com os ciclistas que acham seguro pedalar nas ciclovias? O que quer que seja é fato que estamos muito atrasados em relação a implantação de acalmamento de trânsito e redução de velocidade.
Ah! esqueci: tem a questão da qualidade, nível de segurança e manutenção das bicicletas, o que não se ouve uma palavra a respeito. Sobre erros de engenharia de trânsito não volto a falar porque já fiquei chato. Yo no creo em brujas, pero que las hay las hay.

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