quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

A obesa e a aviação comercial

Viajei de trem pelo centro norte dos USA onde o número de pessoas com obesidade e obesidade mórbida é alto. Dependendo do tamanho do cidadão o assento para acomodá-lo era obrigatoriamente duplo e por razões que não têm nada a ver com gordofobia, mas pelo fato, uma verdade da qual não existe escapatória: o respeito às leis de física. Simples de se entender, a impossibilidade de acomodá-los num único assento padrão que é projetado para o corpo de uma pessoa média.

As companhias de transporte têm por obrigação legal acomodar com conforto e dar segurança durante a viagem a todos os passageiros, dependendo das leis do país onde está incluindo as exceções à regra. Pelo sim ou pelo não o fazem pela simples razão que a concorrência é brutal e um desagrado pode se transformar num problemão comercial para a companhia.

Quem já viajou com um obeso sentado ao lado sabe que terá que conviver pelo menos com o braço dele invadindo seu espaço, quando não as pernas, dentre outros detalhes. Com um pouco de compreensão segue-se viagem, mas há limites. Fiz uma viagem torcido no assento por conta de um prepotente espaçoso e mal-educado o que me valeu dor na coluna e o gasto extra com massagista. A aeromoça fez o que pode e calei para não piorar mais a situação durante o voo.

A aviação comercial barateou tanto suas passagens que hoje tem que contar centímetro por centímetro e quilo por quilo o que será embarcado ou a conta do combustível não fecha. Não faz muito pensou-se em pesar os passageiros antes de embarcar. Chegaram a este ponto, mas não conseguiram.

O que houve com a passageira brasileira que não conseguiu embarcar de volta para o Brasil foi gordofobia? Boa pergunta. Curioso, mas é fato que ela foi para lá, embarcou, mas como?

Não faço ideia de como ajeitaram a garota obesa na viagem de ida para o Líbano, mas acredito que tenha havido uma cortesia. Não sou médico, não tenho o teor de gordura dela em mãos, mas visualmente parece que ela já se encaixa em obesidade mórbida, ou seja, ela é muito grande. Todos assentos num avião são padrão com algo entre 42 e 46 cm de largura e entre 67 e 73 cm para as pernas. Já viajei com assentos de medida mínima foi um inferno para meus 1,85m com 85kg. Dependendo do grau da obesidade mesmo os assentos da classe busines, que são um pouco mais largos, são apertados. Os assentos dos trens no meio dos Estados Unidos são largos, provavelmente como os padrão de uma classe busines de avião, e dependendo do obeso ele era obrigado a sentar em dois assentos; disto não tenho dúvida porque vi, me impressionou muito, marcou a imagem.

Qualquer coisa fora do padrão tem que ser comunicado pelo passageiro à companhia aérea antes até do check in, é a regra, mas onde se encontram estas regras?
Infelizmente até algumas das informações mais básicas das companhias aéreas podem não ser tão fáceis de se encontrar no site. Tive uma experiência bastante desagradável que me obrigou a abandonar uma bicicleta no aeroporto de Paris, que só foi esclarecida depois que 5 funcionários da empresa, Air France, pesquisaram para achar a informação perdida no site, que também não era assim tão explícita. Perdi minha causa para não alongar a loucura. Em suma: voe KLM. Em uma coisa os funcionários da Air France tinham completa razão: eu comprei a passagem e com isto aceitei as normas da companhia, ponto final. Se não li todos os termos antes de assinar ok problema meu. That's life!

É comum ver pessoas com necessidades especiais sendo embarcadas com cuidado e preferência. Nunca vi confusão com isto. Já vi confusão com brasileiro querendo embarcar muito mais mala que o permitido, até ouvi de uma o nosso famoso "você sabe com quem está falando"; mas funcionário da companhia aérea destratando passageiro nunca. Talvez mal-humorado, destratando nunca.

Outro ponto a se ponderar é que a distribuição dos passageiros dentro do avião deve atender aos quesitos de segurança da aeronave e dos próprios passageiros. A acomodação dos passageiros deve levar em consideração uma eventual evacuação do avião ou se arrisca aumentar o número de vítimas. É comum ter a perna de um passageiro ou passageira dormindo sentado na fila do corredor atrapalhando a passagem dos outros. Quando este é obeso, mesmo sendo leve, ele ou ela se acomoda melhor com parte da perna avançando no corredor, o que é aceitável e se faz vista grossa enquanto todos dormem. Cruzar o corredor a noite vira uma corrida de obstáculos.

Na aviação é obrigatório pensar em todos os detalhes, daí vem o altíssimo nível de segurança em voo. Não interessa o que o passageiro pensa ou é, interessa a segurança de todos. Como somos todos humanos, as companhias aéreas se esforçam para acomodar o melhor possível as diferenças, mas para tanto tem que estar cientes do que vão ter a bordo, ou seja, ser avisada com antecedência, obrigação do passageiro. 

Tem muito buraco nesta história.

Influenciadores colocaram muita gente que era excluída ou mesmo cancelada na ordem do dia, o que acho maravilhoso. Este processo de inclusão ainda é uma novidade e podem acontecer escorregões de ambas as partes, dos excluídos ou cancelados e de quem vai recebê-los, o que é normal. 
Calibrar as palavras, os pensamentos, as posições é algo que ainda não somos craques, aqui me refiro a todos sem exceção. As eleições passadas provaram por A+B que exageros, besteiras grosseiras, bobagens fazem muito mais sucesso que o que está certo ou deveria ser, e como dizia Andy Warol "No futuro (este presente) todos terão seus 15 minutos de fama". Na mosca, mas a que preço?

Não isento os erros das companhias. O ocorrido com Mara Gabrilli, que teve sua cadeira de rodas danificada num voo, aponta para que as companhias aéreas, aliás como tudo neste mundo, são bem-preparadas e treinadas só para o que se chama de público geral, não para as exceções. Segundo matéria do Fantástico sobre o caso desta brasileira que não embarcou, as leis que regem as companhias aéreas mudam de país para país, o que complica mais ainda. Não sei em que língua a brasileira e a atendente do check in se comunicaram, o que pode ter sido mais um agravante.

Houve gordofobia por parte da companhia aérea? Como se diz na minha família, eu não estava lá para ver e ouvir, mas pelo meu longo histórico de viagens guardo o direito de duvidar. A menina, em suas próprias palavras, disse algo como "eu paguei, eu tenho direito", frase tipicamente brasileira que diz muito. Lá fora frases como esta costumam ser muito mal-recebidas e gerar problemas.

Já briguei muito pelos meus direitos e aprendi a duras penas que se em vez de brigar você conversar o resultado sempre sai melhor. 

Bato aposta que o desespero ao vivo, minuto a minuto, da brasileira que não embarcou deve ter bombado nas redes. "Me ajudem!" repetia ela nas redes sociais. 


Pela imagem da brasileira acredito que pese bem mais que os 98kg da figura acima. 

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