terça-feira, 20 de julho de 2021

Urbanismo e arquitetura de rico pobre ou de pobre rico?

O que fazer com a arquitetura e urbanismo das favelas? Pensamento de elite que gostaria de ver tudo bonitinho? Não! Tudo a ver com saúde preventiva.

arquitetura / construção
  • ventilação / mofo / circulação de ar > tuberculose - problema crônico no Rio de Janeiro e provavelmente em outras favelas
  • iluminação interna / sol
  • sensação térmica
  • isolamento acústico
  • hidráulica, elétrica, comunicação
  • circulação interna, espaços coletivos e individuais
  • outros
urbanismo
  • entulho / lixo / problema de coleta / ratos / baratas / escorpiões...
  • estabilidade do solo / impedimento de mobilidades
  • saúde preventiva / esgoto / águas poluídas
  • mobilidades / circulação de mercadorias / resgate
  • falta de áreas de lazer / esportes / convívio
  • transmissão hidráulica, elétrica, comunicação
  • escolas, educação, treinamento, cultura
  • distribuição de bens e serviços
  • ligações com a cidade
  • etc...
Vamos lá, vão dizer "não é favela, é comunidade"... Os problemas são idênticos. A mudança da palavra não mudou nada.

"Se tirar na Mega Sena quero comprar uma casa grande num condomínio fechado com seguranças", foi dito na fila da lotérica por uma senhora bem mais jovem que sua aparência sofrida pelo trabalho pesado da faxina numa casa de família. Aponta para um sonho popular: o de mudar para a vida numa outra favela: a dos ricos.
  • Favela, ou comunidade, como queira, é uma área delimitada onde o "rico não deve entrar". Não raro é vigiada (armada) pelos locais e entra quem tem autorização.
  • Condomínio é uma área fechada, murada, vigiada (armada) onde entra só quem é autorizado, no caso de pessoas com menos poder aquisitivo que só os que devem ir lá para prestar serviços.
  • em ambos os casos faz sucesso churrasco e cerveja, e outros motivos que deem status. Ser chique é o que vale, o resto pouco importa. São todos frutos da mesma terra
Favelas surgem e crescem em áreas que não são de ninguém (?) ou são fruto de alguma disputa judicial que nunca acaba, típico de Brasil. Favelado geralmente não título de posse, o que por um lado impossibilita (?) a ação do poder público e por outro impossibilita a ação do poder público (!). Não escrevi errado, a frase está repetida porque assim é, exatamente sempre a mesma situação, mas com variações de interesses por trás que podem ser dificultosos ou benéficos para a população favelada e ou muito mais para uma minoria que mora em outras paragens, não raro em condomínios.

Condomínios fechados remetem a idade média, ao poder centralizado que define o que e quem está dentro ou fora não só dos muros. Remetem ao sonho dos bairros periféricos do American Dream. É a realização de realidades obsoletas, há muito questionáveis, dependendo do nível cultural consideradas inapropriadas.

"Unidos venceremos"; ou pelo menos deveria ser. Mesmo com todas as bagunças que vivemos aqui e acolá parece que a sabedoria comum diz que a lógica é diminuir diferenças, diminuir distâncias, concentrar. A discordância está na insegurança geral o que leva a unir os nossos: meu lugar, minha vida, minha comunidade. E no meio disto a cidade.

Urbanismo! Urbanismo? Vá até os poucos locais onde se pode ter uma visão ampla da cidade e veja o agulheiro espalhado disforme que sombreia a vizinhança e muda os ventos. Quem tem dinheiro que compre um apartamento nos últimos andares e terá direito a luz, menos barulho e poderá ver o que acontece lá em baixo, na cidade, controlar se quiser. De lá poderá ser rei em castelo murado de pedras e guardas, inexpugnável, soberano. Com direito a piscina e academia, impensáveis na Idade Média; mais que rei, imperador de seus próprios prazeres.

Se for pobre circule caminhando e olho para o alto. Novos "empreendimentos imobiliários", cada vez maiores, mais altos, imponentes, mais seguros, mais privativos, mais desconectados de seus vizinhos lá em baixo, pipocam por todos lados. Serão favela ou comunidade?

Plano Diretor?        papel

No meio deste descompasso das cidades brasileiras veio a pandemia...



Nada foi previsto. Tudo foi pensado, isto não pode ser negado.

Com o café e o aumento da riqueza a cidade de São Paulo passou a ter um crescimento rápido, a princípio ordenado, de certa forma planejado.

A partir da década de 70 com a necessária mão de obra, qualquer que fosse, o crescimento desordenado e pobre da periferia disparou. O Centro, o coração da cidade, foi aos poucos sendo deslocado para a av. Paulista, seguido para a novíssima av. Faria Lima (1967), Berrine, Centro Empresarial e outros pontos desconectos. O Centro foi sendo largado para trás sem qualquer planejamento, até chegar ao horroroso abandono que temos hoje. O mercado imobiliário fez o que quis com a cidade, praticamente sem qualquer controle ou planejamento urbano, sem piedade, olhando o próprio umbigo.

Com plano diretor que se pode dizer sem plano diretor, com planejamento de curto prazo que se pode dizer curtíssimo prazo para uma metrópole, “a” capital do Brasil, mais rica e pujante, a vida das pessoas virou um inferno diário. A cidade perdeu sua memória, sua referência, com isto as tensões sociais aumentaram, a violência disparou. Surgiram as soluções mágicas segregando, aumentando o abismo social, distorcendo mais ainda os objetivos históricos da função da cidade: habitação, trabalho, cultura, lazer, saúde e mobilidade; de preferência com sentido de unidade, portanto força.

Estes anos de crescimento desordenado foram para os que tinham melhor condição social e decidiam não só seus futuros, mas de toda a cidade, foi uma festa, os anos de ouro. Boa parte deles eram filhos ou netos de europeus que fugiram da miséria ou das guerras. O Brasil era a terra do futuro, da esperança, do crescimento, São Paulo sua locomotiva. A periferia estava longe, descolada da realidade destes que quando muito ouviam alguma história sobre as agruras dos pobres e imigrantes nordestinos vindos para trabalhar por aqui. Agruras difíceis de entender pelos que fugiram da maior barbárie que a história produziu; a Segunda Guerra Mundial.

O então Prefeito de São Paulo (de 1971 a 1973) Figueiredo Ferraz teve coragem e disse que "São Paulo tem que parar". Não parou. Quis fazer da avenida Paulista, o novo centro da cidade, um boulevard, com trânsito rápido passando por baixo, numa via subterrânea, e o trânsito local e livre circulação dos cidadãos por cima, no boulevard. Figueiredo Ferraz quis olhar para o futuro, não foi o único a sonhar. Paulo Maluf, o Prefeito anterior, com suas obras duvidosas, cheio de suspeitas e críticas, teve mais apoio. Figueiredo Ferraz, dentre outros, é praticamente esquecido. A cidade se abre não ao futuro, mas ao mais puro populismo.


Como eu me diverti!
A ignorância é uma dádiva.
“A ignorância é uma benção. Se você não sabe não existe dor” - John Lennon
Eu pude usar o automóvel como brinquedo, diversão pura. Guiava a milhão

São Paulo, a cidade sem freios, serviu de referência para outras cidades do país.
As tentativas de soluções são pontuais, individualizadas e desconectadas. A cidade é una. Vai-se de mágica em mágica.

Em 19 de fevereiro de 2021, às 06:02, o jornal Bom dia São Paulo da TV Globo mostrou uma matéria sobre as dificuldades que o pedestre tem para caminhar pela cidade. São muitas e não raro absurdamente anacrônicas, de uma pobreza sem fim. Falaram sobre um pequeno dificultador para que as calçadas melhorem: quem é o responsável legal pela calçada. Quem é? O responsável pela construção, manutenção e qualidade da calçada é o proprietário do lote lindeiro; ou seja, o poder público não tem nada a ver com a calçada e os percalços dos pedestres, os cidadãos. É o símbolo máximo de nossa verdade.

E no meio deste descompasso das cidades brasileiras veio a pandemia. Se o futuro das cidades mais organizadas do planeta traz muitas incertezas, imagine o de cidades que já tinham futuro incerto.

Eles não dizem, mas está na cara que é “foda-se o pedestre”. Para bom entendedor é foda-se o cidadão, portanto foda-se a cidade. Fodemo-nos todos.


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