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O Estado de São Paulo
Nada mudará a cidade brasileira, nem mesmo as esperanças vindas da pandemia. Razões não faltam; temos um feroz corporativismo de funcionários públicos concursados com instrumentos legais obsoletos em mãos, um jogo de interesses particulares, interno e externo ao funcionarismo, que são pétreos, as leis mais modernas do planeta que de tão perfeitas são pouco ou nada funcionais, e em cima de tudo isto uma população, inclusive boa parte da educada, que não faz ideia do que deveria ser de fato uma cidade. A referência que a imensa maioria dos brasileiros tem de urbanismo e urbanidade, comparada até com a de países mais pobres, é para lá de precária. O bem público aqui no Brasil, incluindo equipamentos urbanos, não é entendido como bem coletivo, mas como terra de ninguém que cada um pode usurpar da forma que bem entender. Nosso coletivo começa pelo "eu tenho direito", dificilmente chega no "meu dever", o que dizer "zelar".
Os índices básicos de qualidade de vida das cidades brasileiras são baixos, com raríssimas exceções em raros locais. Faltam água encanada de qualidade, esgoto, calçadas, sombreamento, verde, praças, iluminação, segurança, espaços públicos de convívio e lazer, e nesta pandemia que colocou todos em casa fica mais claro a precariedade de nossas comunicações que correm a céu aberto, penduradas em postes, arrebentadas por caminhões ou usurpadas por quem não quer ou não pode pagar pelos serviços. Mesmo em bairros ricos há uma variação de sinal simplesmente inaceitável num mundo cada dia mais digital.
O planejamento urbano desde sempre teve um braço forte das incorporadoras, construtoras, e até mesmo de loteamentos ilegais. Daí os fortes apaches, as muralhas medievais, os muros, grades, segurança privada, segurança particular. Aliás, empresas de segurança são o negócio que mais cresce e mais rentável neste país.
Agora se fala sobre as mudanças mágicas que poderão acontecer em consequência da pandemia. Vale aqui a pergunta de Garrincha ao técnico na preleção sobre como seria aquela partida da Copa do Mundo: "Mas o senhor já combinou com os russos?" Os que falam sobre estas mudanças combinaram com a coisa pública brasileira, com os interesses pétreos, as leis e o povão? Já se perguntaram porque a modernização de nossas cidades e de nossas vidas sempre foi tão morosa? Quero lembra-los que o mundo é digital e lá fora as coisas acontecem ontem.
Um dos mais experientes respeitados e sérios políticos brasileiros, daqueles que tem trânsito em toda sociedade, independente do posicionamento partidário ou social, depois de ouvir a história sobre mais um projeto que tinha morrido na praia disse: "Insiste porque aqui (no Brasil) é comum demorar 10 anos para acontecer". Pior: esta para acontecer, 10 anos depois.
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