Num passado distante, lá por 2005, nos reunimos para discutir o que fazer no 22 de setembro, Dia Mundial sem Carro, que viria. Uma das ideias apresentadas foi instalar uma vaga-viva na lateral do Conjunto Nacional, Avenida Paulista. Na época poucos sabiam o que era uma vaga-viva, o tirar uma ou mais vagas de estacionamento de carros para transformá-la em um espaço para as pessoas conviverem sentadas, bebendo, comendo ou simplesmente lendo. Creio que algo semelhante já existia em Paris, mas foi a ação de San Francisco, Califórnia, que deu o pontapé para outras cidades adotarem a boa ideia.
A questão foi levantada já quase no fim da reunião e agradou a todos. O passo seguinte foi apresentação de sugestões de como fazer, já que o local, Conjunto Nacional, rua Padre João Manuel, praticamente Avenida Paulista, estava definido por sua importância estratégica. Coloca banco e mesas, cerca o espaço como, areia ou grama...? E foi aí que sugeri que se colocasse uma "vaca viva", ideia que foi recebida com risos e gargalhadas por uns e pesadas críticas por outros. A ideia foi recusada porque "coitada da vaca".
Hoje a conversa voltou a baila, não me lembro porque, e de novo ouvi "coitada da vaca", a ideia foi considerada um absurdo. Ainda considero que minha vaca viva na Paulista teria sido uma ótima ação.
O número de vagas-vivas na cidade cresceu e muito, mas a ideia demorou para colar e decolar. A pergunta que ainda faço é: qual teria sido a diferença de impacto na sociedade se em vez de instalar uma uma vaga-viva demonstração, com foi feito, tivessem instalado o espaço com uma vaca - múuu - viva para as pessoas verem, tocarem, sentisse o cheiro, e pudessem sentar-se ao lado, no banco grudado na cerca? Será que o impacto teria sido maior, que mais pessoas teriam se interessado, ficariam mais atentas para a instalação de futuras vagas-vivas? Maior a propaganda, talvez maior a ideia de se lutar pela racionalização do espaço público, a rua? Ajudaria a chamar a atenção para a pergunta chave de nossas vidas: Que cidade queremos?
Coitada da vaca. Coitada da vaca? Por favor, explique. Sei, sei, o transporte do campo até São Paulo, ficar no meio da confusão dos carros passando, da poluição, de pessoas em volta...
Para fazer o sucesso desejado a vaca teria que ser bonitinha, apresentável, quanto mais melhor. Uma vaca avacalhada iria depor contra o excelente projeto "vaga-viva".
Supondo que fosse trazida fosse uma vaca hiper sadia, hiper bonita, hiper bem cuidada, provavelmente ela, a vaca, seria tirada de uma fazenda de alto padrão, portanto com aplicação de tecnologia pecuária de alto nível. Saindo de um lugar destes provavelmente os cuidadores da vaca saberiam qual trazer levando em consideração inúmeros fatores clínicos. Eu concordo plenamente que vacas não foram feitas para passear de caminhão e muito menos ruminar na avenida Paulista, mas que faria sucesso, isto faria, creio que ninguém duvida. E, pelo que já disse, a segurança e a saúde dela certamente estariam muito bem controladas. É bem provável que a vaca em exposição tivesse momentos mais agradáveis, para ela, que a maioria das vacas brasileiras.
Uma coisa eu garanto: a vaca, caso ela tivesse ido para a Paulista, teria tido cuidados com o transporte que matariam de inveja os milhões de trabalhadores que no mesmo dia enlatados estavam no transporte coletivo, mas o que importa, os trabalhadores que se danem, o que importa é uma vaca sadia.
Se os mesmos trabalhadores enlatados no transporte coletivo tivessem a noção que uma cidade com uma vaga de estacionamento a menos significaria uma cidade com menos carros, portanto uma cidade menos congestionada, portanto um transporte público melhor, talvez não só teriam forçado a presença da vaca na Paulista como depois teriam feito um churrasco com ela.
Olhem em volta e vejam a cidade que temos hoje. Caminhem pelas ruas onde foram criadas vagas-vivas, vejam se quem usufrui delas está feliz com elas, se a vida parece melhor que com um carro estacionado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário