quinta-feira, 27 de abril de 2023

Está feito...

Está tudo cheirosinho, dá para ver que teve o cuidado de lavar, deixar secar bem estendido no sol, e até dobrou, mas sem cuidado com alinhar as pontas, dar um bom acabamento ao trabalho realizado. Do jeito que ficou enfiou no armário, uma massaroca no meio de outras massarocas. Tive que tirar tudo estava socado dentro do armário e dobrar de novo, e enquanto o fazia fiquei pensando se ela repete o mesmo cuidado parcial no seu trabalho. Se sim, pena porque ocupa uma posição profissional invejável.

Claro que tem profissionais de alto gabarito que conseguem realizar seus trabalhos com alta qualidade, mas não tem a mesma habilidade com outras coisas da vida. É muito comum, se não a regra. Não sei ao certo se é resultado da mudança dos tempos onde no passado as tarefas eram divididas e quem colocava a mão na massa sabia o que estava fazendo e por isto tinha prazer de deixar tudo o melhor e mais arrumado possível. Hoje todo mundo faz tudo, ou é obrigado a fazer tudo, e neste novo viver entra a obrigação de fazer coisas que não agradam. Coloco aqui o minha culpa: minha cama é feita o mais esticada possível, mas não tenho o mesmo prazer de tirar poeira, que é uma desgraça. Talvez por ter a mesma preocupação com o armário é que esteja fazendo este comentário sobre o bem lavado, secado, mas dobrado de qualquer jeito em questão.

A questão de fato é que tenho a sensação que a geração dela e a mais nova conceitua o fazer em geral de uma forma completamente diferente da minha e de nossos antepassados. A geração de meus avós tinha muita preocupação com entregar o produto final com o máximo de qualidade que pudessem alcançar. Talvez fosse muito mais fácil porque as pessoas tinham muito mais tempo disponível e viviam com muitíssimo menos bens que se vive hoje, não sei quanto a menos, mas uma diferença enorme de itens. Basta assistir qualquer filme rodado dentro de uma casa ou até palácio antes dos anos 70 para ver que não era atulhado como são nossas casas, salas, quartos, armários ou até o chão. Lidamos diariamente com um absurdo de coisas, muitas delas absolutamente inúteis, dispensáveis. Cuidar de uma unidade que lhe importa e faz bem é uma coisa, cuidar de muitas unidades fruto de compulsão, que você acredita que sejam (todas) muito importantes, é outra. É uma questão de tempo e estado mental.

Como será a qualidade dela no trabalho? Como será o nível de aceitação de seu chefe? Com afeta o produto final que chega para o grande público? Qual os impactos sociais e ambientais?
 
A minha geração continuou com os mesmos princípios de fazer e acabar, um pouco mais relaxado, mas ainda tendo disciplina para o princípio, meio e fim. Havia muita cobrança em tudo, da caligrafia ao sair engomado, do escovar os dentes ao tomar o banho e ter atrás da orelha limpo. Engomado, para quem não sabe, é estar com as roupas limpas e passadas. Ontem lendo dei com "senti o cheiro do ferro quente de passar roupa..." algo que a maioria não faz ideia do que seja. Não que passar roupa seja ambientalmente correto, muito pelo contrário, mas foi socialmente correto, e este é o ponto aqui.

O que será a essência de fazer bem para estas novas gerações? Qual o conceito de acabamento, da qualidade do produto final? Guardo o direito, e tenho muitas razões para tanto, de achar que está um tanto esculhambado, um tanto do jeito que está está bom, um enfia aí e fecha. Virou uma festa.
Está feito...

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