terça-feira, 27 de setembro de 2022

Entrega de manifesto para políticos ontem e hoje

Fórum do Leitor
O Estado de São Paulo

Entre 1986 e 2006 participei de um movimento de ciclistas e cidadãos que entregaram para praticamente todos candidatos a presidente, governador, prefeito e cargos dos legislativos, manifesto de pedidos sobre demandas dos ciclistas, pedestres e pessoas com necessidades especiais, só estes últimos pelo menos 15% da população brasileira. O que manifestávamos tinha começo, meio e fim, apontando a realidade (então desconhecida) e mantendo-se no possível, no factível e principalmente no urgente. Em alguns casos fomos bem recebidos, noutros fomos recebidos, houve quando encontramos portas fechadas. Algumas campanhas pediram que participássemos de algum ato de campanha, o que fizemos para marcar posição pela nossa causa, incluídos entre os nossos até quem votava no partido oposto. A prioridade era a causa, não nossas diferenças. O capotar sem consequências de Rita Camata pedalando no nosso grupo, com imagens publicadas em primeira página no Estadão, foi memorável. Boas épocas de uma luta à frente de seu tempo que demorou, mas passou a ser ouvida e trabalhada. Não chegamos a tudo que demandávamos, mas fomos ouvidos. As incongruências do Brasil de então eram muito menos intensas que as que temos hoje, as campanhas via de regra tinham um programa, propostas e projetos apresentados a público, e seus interlocutores no geral mostravam bom preparo e civilidade, até para dizer não. Bons tempos! Não é de hoje que entregar manifestos ou manifestar-se por uma causa complicou muito, quando não virou possível risco a integridade. O primeiro sinal de mudança dos tempos foi a quase 20 anos quando para receber um manifesto a candidata apareceu com seguranças com cara de "some daqui". O manifesto foi retirado de nossas mãos e imediatamente passado para um segurança e conversa encerrada, prenuncio do que vivemos hoje. O Brasil é feito de diferentes que mais que querer, precisam se manifestar o que é convenientemente obturado pelo "nós ou eles". O Brasil que não era para iniciantes daqueles tempos se transformou numa briga de foice obscura de intenções mui particulares. Manifestar-se virou terreno perigoso, quando não de alto risco.


Como curiosidade no passeio de bicicleta eu era o responsável pela Rita Camata (de amarelo segurando o braço dela). Por estar exausta pedalava com dificuldade. Avisei que iríamos parar no semáforo a frente e Rita estancou a mão no freio, capotando por cima do guidão, tombo sem consequências a não ser o susto. Dois dias depois fui até a central de campanha para pedir desculpas com medo de apanhar e fui recebido com festa. O tombo de Rita Camata havia saído em todos os jornais e o patético tombo havia dado um forte impulso a campanha.

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