O menino de uns 5 ou 6 anos não parava de dar voltas com sua bicicleta na pequena praça. Confiante em sua ótima habilidade passava pelos pais uma hora abanando a mão esquerda num alegre tchau outra volta abanando a mão direita com segurança e tranquilidade que poucos adultos têm. A mãe, no gramado com a cachorra que cheirava, estava mais despreocupada com as piruetas do filho que o pai. O menino deu várias voltas e parou em frente ao pai com um soberbo sorriso.
- Agora você vai dar a volta completa e para na minha frente sem tirar os pés do pedal....
- Mas aí eu vou cair
- Só vai tirar os pés do pedal quando a bicicleta parar por completo, tá bom?
E deu mais uma volta e cumpriu exatamente o que o pai pediu. Parou em silêncio e ficou olhando para o pai que começava uma conversa com um senhor que por ali passava passeando seu cachorro. Quieto ouviu a conversa dos dois sobre a situação do mercado, inflação, custo das coisas e ganhar dinheiro. Sem que os dois percebessem deitou cuidadosamente a bicicleta no chão para não atrapalhar a conversa e, segundo o olhar dos dois adultos, foi brincar com umas pedrinhas que cobrem as raízes de uma palmeira. Os dois seguiram a conversa olhando para que a criança não fosse para rua. O menino selecionou e tirou algumas pedras do jardim, trouxe as para o cimento, cuidadosamente as alinhou e posicionou, levantou-se, parou entre os dois, esperou que fizessem uma pausa na conversa e perguntou:
- O senhor não quer comprar uma pedra?
- Comprar uma pedra? respondeu admirado com a proposta o senhor.
- É. Hoje é domingo, e sábados e domingos as pedras estão num preço especial. Quer comprar?
- Não meu filho... interveio o pai; que história é esta de vender pedras?
- Por favor deixa, disse o senhor. Gostei da proposta de seu filho. E olhando para o menino iniciou a negociação. Me conta mais, quanto sai cada pedra?
- R$ 10,00 cada pedra.
- Filho, como assim, R$ 10,00 cada pedra? Por favor, me desculpe..., disse o pai para o senhor. Esticando a mão num gesto para o pai não se preocupar o senhor foi até as pedras e sentou-se no chão, olhou o bom arranjadas, coisa de vendedor profissional. Deu um tempo admirando, tirou a carteira do bolso e negociou, olhou-a detalhadamente para ver a reação do menino, que continuava impassível.
- Tenho R$ 7,00, vai, negócio fechado?
- Tá bom faço por R$ 7,00. O senhor só vai levar uma? Não quer comprar duas?
- Uma só
- Filho, por favor; disse o pai entre o rindo e o sem jeito
- Deixa, estou achando ótimo. O que você faz? Com que trabalha? perguntou o senhor ao pai
- Trabalho com vendas, respondeu.
- Está aí, completou o senhor olhando com carinho para o menino
E a mãe apareceu por trás em silêncio e com um largo sorriso de orgulho.
- Ele está querendo comprar um brinquedo e está economizando; contou ela sendo interrompida pelo pai
- Outro dia tive que dar uma gorjeta e não tinha dinheiro na carteira. Fui até ele e pedi para pegar uns trocados do dinheiro dele. Me disse que tudo bem, mas que precisava devolver com juros; contou o pai agora com certo orgulho.
Negócio fechado o senhor se afastou admirado com a iniciativa do menino. Como se comportaria jogando "Banco Imobiliário"? Já teria jogado com os pais? Como é ele no comprar, vender e negociar? "Qual vai ser o futuro deste garoto? Ciclista já é. E o garoto ouve, incrível, ouve e responde muito bem ao que foi dito. Os pais deixaram o moleque solto confiando nele, estimulando suas ações. Educação de verdade!", pensou o senhor enquanto caminhava. Um filme passou sobre sua infância. Quase esquece que na coleira estava a cachorrinha. Parou um segundo, olhou a peluda com ternura, agachou-se e fez um cafuné nela. Parou para cruzar a rua, parou de pensar no acontecido, dois carros passaram, ele deu um último olhar admirado para o menino e seus pais que seguiam na praça antes de cruzar a rua e caminhou para casa intrigado. "O que vai dar aquela venda de pedras? No que dará aquela esperteza toda?" Lembrou-se de sua infância quando construía pequenos carrinhos de madeira com rodinhas de tampa de garrafa. Vendeu um único, fato inesquecível. Na realidade não vendeu, o carrinho foi comprado por algum adulto que por mais que se esforce não lembra quem que admirado com a infantil iniciativa pagou com um sorriso. Lembra-se do sorriso, de estar sentado na porta da garagem, do susto de ter o carrinho vendido, de olhar o dinheiro na mão, fazer planos, de quando se afastou o comprador iniciou logo a construção de um outro carrinho de rodas de tampinha. Não se lembra mais do que aconteceu com os carrinhos ou com o dinheiro ganho. Virou pirulito? Provavelmente. Olhou para sua vida e pensou no menino vendedor de pedras, voltou a se olhar, como num espelho da vida com certa melancolia. "Bem, nunca tive jeito para negócios - e riu. Nunca tive jeito para ganhar dinheiro - e riu alto. Espero que este menino leve jeito" terminou seu pensamento feliz. Pegou a pedra comprada no bolso, a afagou com os dedos como se fosse uma lambada mágica, abriu a mão, olhou-a com muito carinho fazendo os melhores votos para o futuro que esperava aquela vida. "Melhor vender pedras que ter um caminho de pedras pela vida. Boa sorte menino".
Nenhum comentário:
Postar um comentário