quarta-feira, 21 de junho de 2023

Matera, a cidade de mais de 8 mil anos


A preocupação com a preservação dos centros, urbanismo, construções e elementos históricos das cidades italianas, e porque não dizer de qualquer país ou região que respeite sua cultura, visa preservar a identidade local e fortalecer os laços entre os cidadãos, nem que seja pela fofoca, o que óbvio deve acontecer. Vai muito além da importância do turismo para a economia tocando diretamente na estabilidade social, na paz.

Definitivamente estas pequenas cidades não são um rejuntamento de pessoas que vivem lá em volta de um comércio, mas comunidades que preservam tradições, mesmo que estas mudem constantemente, se transformem com o tempo ou até caiam em desuso. Sem esta referência histórica é difícil ter uma perspectiva de futuro, de norte social, e fica muito mais difícil manter o equilíbrio básico para fazer tudo funcionar com harmonia, repito, tudo.

Vale lembrar que muitos destes centros e de seus prédios históricos, suas igrejas, casas, parques, praças foram reconstruídas, algumas completamente restauradas, depois da Segunda Guerra Mundial ou de terremotos, comuns em algumas áreas.
A revolução do turismo como negócio para ganhar a escala que temos hoje veio muito depois da Segunda Guerra Mundial. A reconstrução se deveu a respeitar laços passados, a não piorar a brutal ruptura social causada pela guerra. Mesmo em cidades ou locais onde a reconstrução teve que ser quase total houve um extremo cuidado de preservar qualquer laço de memória social restante. Foi e continua sendo impensável arrasar para construir um outro futuro, uma nova realidade. Na cabeça das pessoas e da sociedade uma ruptura com o passado definitivamente não acontece. A vida é um moto contínuo. 

Matera.



Matera, no sul da Itália, deveria ser destino obrigatório. É uma das cidades mais antigas do mundo, com mais de 8.000 anos de existência. No início foi habitada em cavernas que hoje servem só para o turismo. Sua formação rochosa, fácil de ser escavada e trabalhada, acabou se transformando em residências, primeiro simples aprimoramento das cavernas, logo se transformando em casas como as que conhecemos hoje, sala com cozinha, quarto, banheiro, paredes, teto e piso lisos, porta, janela ou janelas; algumas com nicho pagão ou religioso, algumas com espaço interno para a lida de animais domésticos, incluindo animais de grande porte, cavalo, burro, vaca ou cabra, tudo escavado na rocha.
A área foi escolhida por sua topografia, um vale fechado com um rio correndo em baixo, o que dificulta possíveis ataques. Segundo seus moradores a topografia facilita a captação e a retenção de água da chuva, portanto deve haver cisternas. Com a evolução, o aumento da população, o aumento da riqueza e melhora nas técnicas construtivas a cidade deixou para trás as escavações na rocha para iniciar a construção de uma cidade como hoje conhecemos, com paredes feitas de blocos retirados da mesma rocha, tetos com estrutura de madeira e telhas, vielas, ruas, muitas escadarias, praças, etc... Com o seguido aumento da riqueza se transformou numa vila com palácios, igrejas, estrutura administrativa bem mais organizada, trabalho, comércio, educação... Óbvio que estou fazendo um resumo para lá de simplista.
Com o tempo e a evolução econômica da cidade a área primitiva, as cavernas e as primeiras casas construídas ainda aproveitando-se de escavações acabaram se transformando em residências de necessitados e os mais pobres, e todo este patrimônio histórico passou a deteriorar. Em 1956 o governo Italiano decidiu recuperar a Materal primitiva iniciando um processo construção de residências populares para a retirada de seus moradores. Três décadas depois, com todo patrimônio histórico recuperado, iniciou-se um programa de reocupação das cavernas e casas, num projeto que incluiu residências familiares, comércio, bares, restaurantes, até hotéis.
Hoje Matera é uma cidade que se auto sustenta, tem um turismo intenso, mas não só. A qualidade de vida é muito boa. O detalhe importante é que a cidade não conta nem com estação de trem nem com aeroporto, o que para alguns moradores é um empecilho para o turismo, rica fonte de renda, mas talvez seja a razão da manutenção de sua magia.

Matera me deixou a imagem de um projeto de cidade que para sua população que deu certo. Pelo que ouvi fica o óbvio: bom senso e respeito... durante toda sua história.

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