domingo, 11 de junho de 2023

Cidades da Itália e suas vidas

Bom dia Itália...

A foto abaixo é do largo do centro histórico de San Salvo, pequena cidade no Adriático. Foi tirada em frente à farmácia, uma loja de revistas, jornais e bugigangas, e um bar, a uns passos da praça central e da igreja, logo depois do fim da primeira missa, que para minha surpresa estava praticamente lotada em plena segunda-feira. Era bem cedo, a maioria dos negócios ainda estavam fechados, o frio era intenso, dos de fazer vapor ao falar, mesmo assim homens se reuniram em pequenos grupos espalhados ao ar livre e algumas mulheres no café em frente a igreja.

Até San Salvo só tinha estado em cidades grandes italianas ou com muito turismo. Nestas também ocorrem pequenas reuniões, mas dentro de cafés e mais apressadas. 
Em San Salvo acordamos bem cedo e saímos para tomar café na rua. Fomos ao centro, chegamos a uma praça ainda praticamente deserta. Porta aberta, entramos na igreja para ver e aquecer os corpos, e demos com a missa cheia. Assistimos um pouco deliciando nos com o afinadíssimo coral e saímos. Veio cruzando a praça um senhor que nos indicou o único café aberto ali, na nossa cara, que não tínhamos visto. Uma construção comum, com uma parede de vidro olhando para a praça, uma porta lateral fechada por causa do frio. Entramos e demos com um grupo de mulheres sentadas em círculo conversando junto à janela. Demos bom dia e fomos cumprimentados, nos sentamos, pedimos café e ficamos ouvindo a conversa que não parava em um dialeto incompreensível. Pela janela vimos quando terminou a missa, o povo saindo e se dispersando, e um grupo veio em direção ao café e entrou. Bom dia para cá e para lá, se sentaram no fundo do café, nos deixando no meio de dois grupos. Ficamos nos deliciando um bom tempo com o entusiasmo das conversas que não paravam dos dois lados, nos dois grupos, e nos que entraram e ficaram em pé no balcão. O pouco que entendi a conversa era sobre os temas mais variados. Pagamos, saímos, andamos um pouco e demos com este espaço público, uma praça criada sobre o que deve ter sido rua, com vários grupos de homens conversando animadamente, uns no sol que aparecia, outros encostados junto a um outro café, a farmácia e o mercado. Havia uma pequena feira de verduras e frutas armada, poucos compradores e compradoras naquele frio, mas a conversa em volta seguia animada.
Olhando uns legumes fomos abordados por um senhor todo enrolado em um cachecol e de toca que mal deixava ver seu rosto. Vinha com algo na mão esticada que demoramos para identificar e a princípio reagimos como brasileiros abordados por um pedinte. Era o dono do café que veio atrás de nós com uma caixinha de remédios que deixamos cair no chão. De seu café não se podia ver onde estávamos. Provavelmente ele saiu pela rua perguntando onde estavam os turistas. Ou seja, todos ali se conhecem. Como todas outras pequenas cidades da Itália, a bem dizer as maiores ou mais importantes, vive-se numa comuna, num lugar onde conhecer o outro faz parte da vida.
Bem vindo a Itália!    

Matera:

Desde muito cedo as pessoas vão se reunindo nas praças e cafés para conversar. Confirmação do hábito sadio praticado em praticamente toda cidade pequena da Itália. A foto acima foi tirada na praça principal de Matera, nas primeiras horas do dia, o sol sequer batia no chão da praça, antes das 7:00h, frio intenso, e até mesmo antes das primeiras missas sempre concorridas. Pouco mais tarde a praça ficou cheia de pequenos grupos que levaram a animada conversa por horas. A maioria é de aposentados, a maioria homens, mas não só.

Bari:

A foto ao lado é da cidade velha, um pequeno burgo secular preservado inclusive em suas culturas, uma delas a produção de massas feitas em casa e mão por senhoras que trabalham de porta aberta e deixam sua produção a venda na rua. Enfiei a cara para dentro de várias portas e as vi trabalhando, amassando, enrolando, cortando e fazendo movimentos precisos com os dedos para criar dois tipos de massa, o oricchiette e um outro que tem o formato de um grão de arroz, mas bem maior. Infelizmente não provei suas cozinhas, seus pratos prontos que algumas delas também servem na hora do almoço. Numa pequena praça vi um grupo de mulheres em longa fofoca entre trabalhos e cuidados de netos. Conversavam ou gritavam saudações com todos que passavam, todos conhecidos, é claro. Praticamente não vi homens, os mais jovens provavelmente tinham ido trabalhar e os poucos mais velhos estavam reunidos em cafés ou outro local fechado. Talvez caminhem um pouco, saiam da Bari Vecchia, e se encontrem em algum lugar da rua comercial de Bari. No pequeno porto e pobre mercado de pescadores, não muito longe de lá, haviam vários homens conversando. 
A Bari moderna tem como centro da vida a rua principal, só para pedestres. Vem em linha reta da estação ferroviária até a cidade velha, onde em vários cafés se vê a população conversando longamente.

Em praticamente todas as cidades que passei na Itália a vida comunal é intensa. Até há grades e portas com trancas muito seguras, mas a população sabe que são uma coletividade. Os idosos tem vida própria, não ficam trancados em casa. As crianças brincam livres, as menores em parquinhos, sem grades, suas mães cuidam não só dos seus, mas de todos.   
Leonardo, que tem 3 anos, entrou no metrô no carrinho de bebe segurando o celular da mãe e saiu do metrô segurando o celular da mãe, e voltou para casa com o celular da mãe nas mãos. Bel, a mãe, não tem medo de sair na rua à noite, mesmo morando a uns 500 metros da estação central de trem de Roma, uma área que em todas as partes do mundo é considerada mais tensa. São brasileiros, mudaram-se para Roma, alugaram um apartamento. Logo depois da chegada vizinhos deram as boas vindas e se ofereceram para ajudar. 
Aqui em São Paulo moravam num bom apartamento, num edifício com porteiro, grades, segurança na padaria, segurança no clube, no shopping....  

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