quinta-feira, 7 de março de 2024

Viver a delícia do trânsito paulistano dirigindo

SP Reclama
O Estado de São Paulo
(pretendo resumir o texto para enviar)

Tive a horrorosa experiência de dirigir encalacrado a passo de tartaruga no trânsito da pista local da Marginal Tiete por 10 km, entre a av. do Estado e a entrada para a Dutra. Como não sou usuário habitual de automóvel, para mim aquilo é simplesmente irracional. Sou bem viajado, já dirigi bastante fora do Brasil, e nunca vivi uma insensatez igual. Olhando pela janela fiquei chocado como todo aquele povo metido no que é o mesmo congestionamento diário. Estou cansado de ir como passageiro para o aeroporto, mas como passageiro a loucura passa meio desapercebida pelo uso do celular. Como todos aqueles motoristas conseguem viver repetindo obrigatoriamente a mesma loucura sem buscar alternativa? "Não há alternativa", responderá de bate pronto a maioria. De fato, a curtíssimo prazo 'parece' não haver alternativa que não seja treinar a paciência, engolir o que é ruim, e seguir a vida em frente. Nos acostumamos com o ruim, esta é uma verdade difícil de questionar. Em todo planeta as cidades grandes estão construindo saídas para esta situação, e está dando resultado. "Não há alternativa" é uma verdade que atende a vários interesses particulares, não os da maioria da população brasileira. A história prova que não existe este "Não há alternativa". Sempre houve, sempre há, e sempre haverá alternativa.

O alargamento da Marginal Tiete se mostrou um investimento caro, de curto prazo e que em vez de melhorar, piorou tudo. Simples, estimulou mais ainda o uso do automóvel. O problema não é o automóvel em si, mas a forma de seu uso numa cidade disfuncional. Responderão todos de bate pronto "Eu uso o carro porque tenho que usar, não tenho outra opção", e eu concordo para não ir muito a fundo na discussão. 
Nos falta é a pratica de se perguntar: "E o que mais? O que pode ser diferente?". Na insanidade mental que estamos a pergunta correta é 'O que tem que mudar já?'. A resposta é simples: olhar a forma como o trânsito flui em toda cidade, e não numa área específica. Pouco adianta corrigir um problema local se este não for integrado a correção dos problemas periféricos e correlatos. Todo sistema viário deveria estar integrado, e não está. A marginal é o caminho mais reto, portanto mais rápido, o que é e não é uma verdade. "O trânsito nos bairros é imprevisível e geralmente mais demorado". Estas e outras verdades interessa a quem? Quem tira proveito dela? Quem é prejudicado não resta dúvidas, está lá diariamente para quem quiser ver.

O trânsito que temos nos come a vida, nos deixa exaustos, nos tira a capacidade de pensar livre, daí não procuramos saída. Nos deitamos na cama, "amanhã tem mais", acordamos e repetimos exatamente a mesma coisa dia após dia. "Eu tenho família", "Preciso trabalhar", "Tenho contas a pagar"... Eu concordo plenamente, mas e o que mais? O que pode ser diferente? O que centenas de milhões de habitantes de grandes cidades pelo mundo fizeram e continuam fazendo para reverter o caos e melhorar suas vidas? Esta é fácil de responder usando os dados que estão aí para quem quiser ver: pararam de construir vias novas para desafogar o trânsito, estou falando de um processo de mais de 40 anos. Cidadãos de boa parte do mundo iguais a nós, brasileiros, começaram a pensar no futuro da vida de seus filhos e netos. Qual é o legado que deixarei para eles, filhos e netos? Eles herdarão esta cidade que vivemos que só piora? 

Precisamos minimamente questionar  o que está ruim, desapegar do ruim e aprender as vantagens de se acostumar com o que é bom. Não dá para continuar esta viagem tapando os olhos ou olhando o próprio umbigo, o que São Paulo vem fazendo a quase um século. Acreditem, somos todos humanos, podemos aprender com os outros.



Pinheiros, São Paulo - São José dos Campos
Não poderia imaginar, mas deveria... Santa inocência.  Sai de casa às 15h15 para ir a São José dos Campos imaginando que seria uma viagem tranquila, um pouco de trânsito para sair de São Paulo e estrada livre. Doce ilusão. Vivi dentro de um carro o mesmo horror que milhões de paulistanos e brasileiros vivem todos dias.

Foi uma das experiências mais desagradáveis dos meus últimos anos, principalmente pelo que vi em volta. Sei que o caos no trânsito é assim, mas nunca tinha vivenciado de dentro de um carro, e pior, dirigindo. Dependendo do local e horário, até mesmo pedalando está muito ruim, mas dentro de um carro é um horror. Já peguei trânsito assim, mas em situações diferentes, causado por um acidente, enchente, semáforo quebrado... Agora, sem nada de excepcional, com o trânsito fluindo (fluindo?) "lenta, mas normalmente" como dizem, aí não, foi uma experiência completamente nova e que dá o que pensar. 
Fiquei olhando em volta me perguntando como toda aquela massa de motoristas e passageiros conseguem aguentar todos dia a mesma loucura. "Não tenho alternativa", já ouvi muito. "Tenho família" ou "tenho filhos", também já ouvi. Mas como aguentam?

Nos acostumamos com o ruim, com o mal, é a verdade mais pura, líquida e certa. Nós, humanos, temos a terrível capacidade de adaptabilidade quase interminável. Adaptar-se é bom, mas, como tudo, tem que haver um limite. Chegar e ficar nos extremos nunca dá muito certo ou tem uma forte tendência a dar ruim para valer. Eu disse ficar, bem diferente de passar pelos extremos, de experimentar os limites, de vivenciar para saber o que é, o que não foi o caso. Nós, cidadãos das cidades brasileiras, entramos e estamos vivendo dentro de limites não aceitáveis faz muito tempo e aceitamos tudo tranquilamente como fato consumado e imutável. Estamos loucos. 

Até quando vamos esticar esta corda que já não aguenta mais? Quando vai cair a ficha que da forma como estamos vivendo nas cidades não está funcionando? Quando vamos agir para mudar de fato esta baderna?

Entrei na Marginal Tiete e perdi o acesso para a pista central, a expressa. Tive que continuar na pista local da Marginal Tiete até conseguir entrar na Dutra. O "pequeno" deslise custou quase 45 minutos do carro andando a 10 km/h. A bem da verdade, o pequeno deslise me levou a um congestionamento atrás do outro até a exaustiva chegada em São José dos Campos. Eu deveria ter ido pedalando, não tenho dúvida.
   
A continuação da Marginal Pinheiros até Jurubatuba é a mais nova ideia "genial" da Prefeitura para desafogar o trânsito, no caso da zona sul. A ideia é de uma mediocridade sem tamanho. O exemplo alargamento a Marginal Tiete provou e segue provando (mais uma vez) que abrir vias novas não dá certo. A questão é que o prolongamento da Marginal Pinheiros até Jurubatuba, caso seja realizado, trará problemas muito maiores do que 'simples' congestionamentos. Naquela zona sul de São Paulo estão as duas represas, leia-se água, e nossa maior reserva florestal, Capivari Monos. Eu não brincaria com tudo isto.   

Nenhum comentário:

Postar um comentário