No almoço saiu de novo a conversa sobre a importância de Haddad e seu pessoal ter implantado os 400 km de vias para ciclistas. “Sem isto não teríamos tantos ciclistas nas ruas” disse a interlocutora. Concordo em parte.
Ciclovias e ciclofaixas fazem crescer o número de ciclistas circulando uns 30% em média, diz todo e qualquer manual ou documento sério editado nas principais línguas e em seus países respectivos sobre sistemas cicloviários. Um pequeno detalhe: aumenta na ciclovia, ciclofaixa e entorno onde foram implantadas.
Já escrevi várias vezes que tínhamos em 2005 na cidade de São Paulo uma demanda reprimida de mais de 500 ciclistas, que era a diferença do número de ciclistas em fins de semana, 700 mil (SVMA SP), e os que já circulavam na cidade em dias de trabalho, um pouco mais de 65 mil oficiais (Pesquisa O. D. Metro) ou pelo menos 150 mil segundo o setor da bicicleta. Quantos destes iriam pedalar nas ruas para trabalho ou estudo só especulávamos. De qualquer forma entre 2005 e 2012, nos anos Serra - Kassab, mesmo com falhas de contagem, era claro que o número de ciclistas nos dias de semana vinha crescendo rapidamente, isto por diversas razões. A primeira delas era o trânsito que andava muito devagar e entrava em colapso com frequência também por diversas razões, mas principalmente por conta do absurdo aumento do número de veículos circulando em razão dos incentivos dados pelo Governo Federal para a compra de veículos. E aí, como sempre repetia Renata Falzoni na Rádio Eldorado, "Carro parado não mata", um ótimo slogan para estimular novos ciclistas.
Ainda em 2005, numa reunião do Projeto GEF Banco Mundial para bicicletas, Meli Malatesta apareceu com um mapa da CET SP de contagem aleatória de veículos onde aparecia bicicleta. Constrangida porque achava que os números apresentados de ciclistas circulando eram muito baixos abriu o mapa numa mesa e eu quase cai de costas com o que vi. Os números foram coletados nos horários de pico do trânsito motorizado, de 8:00 h às 10:00 h, e de 18:00 h às 20:00 h, e em pontos tão aleatórios como Al. Gabriel Monteiro da Silva esquina com rua Maria Carolina, onde era bem pouco provável encontrar ciclistas, mesmo assim estavam lá. Foi aquele mapa que deixou claro que já estava acontecendo um fenômeno desconhecido em São Paulo: os ciclistas dos bairros mais ricos estavam saindo para as ruas mesmo sem qualquer estímulo das autoridades, fosse campanha educativa, sinalização específica ou vias segregadas.
Sempre foi usada a contagem realizada pelo Metro, a Pesquisa Origem Destino (O. D.), muito precisa, mas que é direcionada para ver qual a possível demanda de usuários do Metro. Há um filtro aí, o que dá diferença para menos no número de ciclistas circulando, mas para uso oficial era o que valia.
Quando Haddad começou a implantar os 400 km havia uma pressão muito forte dos ciclistas, uma barulheira danada, o que não só chama atenção para o tema - bicicletas - como gera notícias. Gerando notícias mais e mais dados e informações começam a vir à tona. Os ciclistas que estavam espalhados pela cidade começaram a ser vistos, mais, a ser contados, não só por conta das notícias, mas também porque eram mais frequentes. E a administração Haddad começou a implantar freneticamente ciclovias e ciclofaixas, o que gerou mais notícia ainda, o que aumentou mais ainda o foco de atenção nos ciclistas e bicicletas. Num determinado momento propaganda boa tinha que ter um ciclista ou uma bicicleta. Por outro lado, a Ciclo Faixa de Domingo lotava, muitos motoristas e pais de família saindo para participar da festa, o que fez com que estes quando dirigindo seus automóveis ficassem mais atentos a qualquer ciclista. As críticas a implantação “sem critério” das ciclofaixas só aumentaram a visibilidade dos ciclistas; o que leva aquela matemática rasa: eu vi mais, portanto tem mais. Quando uma ciclovia é implantada os ciclistas vão para ela, concentrando-se num único local, o que os torna mais visíveis ainda. É lógico que com estímulos a sensação de aumento do número de ciclistas nas ruas se fortalece, a imprensa tem matéria e noticia, o diz que diz na população cresce... Em suma, a cidade entrou num ciclo vicioso do bem, por assim dizer. Aconteceu aqui como em todas as partes do planeta.
O fato é que a bicicleta sempre esteve por aí, mesmo antes dos 400 km de Haddad. A diferença é que a bicicleta aparecia em extensas áreas não periféricas de São Paulo, e esta era a grande novidade. Na periferia a bicicleta sempre esteve presente, muito antes de Haddad. Aí é estranho que as esquerdas nunca tenham falado uma palavra sobre estes ciclistas, a maioria trabalhadores.
Saudoso Sérgio Luiz Bianco numa vistoria em Grajaú para o GEF Banco Mundial |
O que falta é uma política de estado para as mobilidades, ou seja, ter continuidade. Personalizar, politizar, ou pior, ideologizar só arrebenta este país.
Desculpe se não cito o projeto "Pró-Ciclista" dos anos Maluf e Pitta, que foi muito atuou forte, mas praticamente não fez diferença. Gunter Bantel, seu diretor, teve importância sim na redação do novo CTB, onde incluiu várias leis relativas às bicicletas e ciclistas. Mas praticamente não mudou o número de ciclistas circulando em São Paulo.
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