Fui a uma pizzaria muito bem montada e frequentada em Ribeirão Preto e comi a pior pizza de minha vida. Olhando em volta a arquitetura agradável, as excelentes cadeiras e mesas com espaço farto entre elas, pratos e talheres bem-postos, vendo o público de classe média alta entrando e se acomodando feliz, não pude deixar de pensar na total incongruência com a péssima qualidade da pizza que seria servida, repito: péssima. Perguntarão: se você (eu) sabia que a pizza era tão ruim por que foi comer lá? Experimentar, principalmente. O que não esperava é que o jantar fosse virar um redemoinho de pensamentos sobre quem somos, nós brasileiros e principalmente, aquele povo que se deliciava lá com aquilo que ofende todas as pizzas do mundo. De fato, esta pizza vai ficar 'famosa'.
A pizzaria foi recomendada por uma senhora de classe média alta, com um ótimo nível de educação, casada com reconhecido e respeitado professor universitário. Por causa deles tive a oportunidade de comer n'a' pior trattoria de minha vida, disparado. Confesso que nunca imaginei que um restaurante fosse tão ruim, que erros tão grosseiros pudessem passar desapercebidos por aquele povo. Aliás, com o mesmo casal tive a sorte (?) de comer nos cinco piores restaurantes italianos de toda minha vida, incluindo 'a' trattoria. O impressionante é que todos, incluindo 'a' trattoria, têm público cativo e são tidos como referência de comida italiana; pior, muito pior, recebem elogios e são recomendados.
"Nós é que somos bestas!" me foi dito. Não, definitivamente não! Não é o caso, definitivamente não é o caso. Mesmo que haja alguma bestice, vai muito, muito, muito mais além de nossa bestice, estes 'restaurantes, cantinas e trattorias' embutem em si fatores sociais e culturais que apontam o que é de nossas vidas. Gastronomia é reflexo de seu povo, de sua cultura, de suas tradições, e principalmente de seu modo de vida. Melhor, o simples comer, se alimentar, nem isto é respeitado. Não é besta quem se auto respeita. Comer porcaria de vez em quando vai, mas mesmo a porcaria tem limites.
A pizzaria em questão, a que me leva a todos estas reflexões, está em Ribeirão Preto, num dos melhores pontos de um dos mais ricos bairros de uma das cidades mais ricas do estado mais rico do país, no país mais rico da América do Sul e América Latina; este é o ponto, é o que muda tudo e descarta a bestice. Aquela coisa que chamam de pizza tem toda uma simbologia que não deve é impossível de ser descartada. Como pode um povo tão 'rico' achar bom algo que é tão ruim, que desrespeita princípios básicos da cultura e educação? A dita pizza não está isolada neste ponto. Como pode um povo tão rico achar normal tantas barbaridades, tantas estupidezes, que fazem parte do seu dia a dia? Como podem cometer erros tão grotescos com suas vidas?
- Não me interessa. Adoro este lugar, é o melhor lugar do mundo e daqui não saio.
- Mas você conhece outros lugares?
- Não conheço e não quero conhecer. Não me interessa.
A resposta, que já ouvi inúmeras vezes na vida, é muito parecida com a de meu neto quando tinha 2 anos de idade e se recusava a experimentar qualquer sorvete que não fosse de morango.
Alto da Boa Vista em Ribeirão Preto é um bairro construído não faz muito, com um planejamento tipicamente americano, avenidas largas, arborizadas, edifícios altos, espaçados entre si, várias praças, um comércio de rua rico, um dos melhores shoppings, grandes revendas de BMW, Porsche, Audi e marcas nacionais, ótima hotelaria, bons restaurantes, parques, condomínios de casas murados, enfim, padrão classe média alta e alta, como de Miami, o que aliás lembra muito, se não me falha a memória acho que a SW 3rd Ave e redondezas. Não sei qual é o PIB local, mas com certeza é alto, bem alto.
Esta forma de urbanismo hoje é considerado um erro grosseiro e está sendo pesadamente criticado inclusive em inúmeras cidades americanas, que tentam reverter o desastre, vide NY. A horrível pizza em certa forma reflete o bairro ou bairro reflete a pizza?
O PIB da cidade de Ribeirão Preto é dos mais altos do Brasil, mas quando se coloca na conta a Região de Ribeirão Preto o volume de dinheiro circulando na cidade aumenta e muito. Enfim, é muito alto. Pelo que parece não se reflete na busca do conhecimento do que de fato há de melhor mundo afora, a maior riqueza que um povo pode ter, diz a história.
Um desastre gastronômico naquele lugar pode ser facilmente justificado pelo que parece e é, mas não é exatamente o que parece. Infelizmente ter preocupação com cultura é comumente confundido com "bestice". Saber comer, muito além do prazer, é uma questão de formação cultural, de compreender quem somos, onde estamos, para onde vamos, o que pretendemos. Por favor não fazer confusão simplória com refinamentos bobos ou bestices. A boa cozinha, a boa culinária, não necessariamente está ligada a assinatura Michelin, muito menos com pagar uma conta astronômica. Estou cansado de comer porcaria em restaurante caro ou da moda. Recomendaram estes, estou fora. Por sinal, a segunda pior pizza que comi na vida foi numa pizzaria que só se encontra nos melhores pontos dos Jardins e também lá no Alto da Boa Vista de Ribeirão Preto. Péssima! Péssima! Mesmo feita com trigo, tomates e muçarela importados de Napoli, segundo o gerente, o resultado é muito pior que a maioria das pizzas de padaria amanhecidas. Péssima! Mas tem gente que adora, vai fazer o que, está no direito deles. Só não consigo definir se batem o pé que a pizza é ótima pelo lugar chique (?) da moda ou se o paladar não funciona. Aposto no primeiro, lugar chique.
Um pouco mais a frente um pequeno e excelente mercado gastronômico tem pequeno público cativo e tenta formar novos consumidores. Segundo um dos donos o problema é que o povo mais abastado prefere viajar 300 km para comer e fazer suas compras, quando não voa para o exterior para gastar o rico dinheirinho. Causa muito mais impacto na conversa social. Chique no último!
Do outro lado da avenida onde está a pizzaria de Ribeirão tem uma loja de roupas femininas muito bem montada, grande, vitrine para a rua, onde está exposta um conjuntinho para jovens que remete a completa falta de refinamento da famosa pizza. Quase cai sentado quando a noite parei e olhei a qualidade do corte e principalmente da costura, completamente enrugada. Para piorar, colocaram uma iluminação nas peças que só acentua os defeitos. Não gosto de fazer compras, mas por uma questão de cultura passei a gostar olhar vitrines e, dependendo, entrar nas lojas e xeretear. Confesso que nunca vi um erro tão grosseiro. Como pode uma coisa destas dentro do contexto daquele bairro?
Nunca entendi como a população de operários que trabalha sob o sistema ISO de qualidade não replica as mesmas práticas em seus bairros, suas casas, suas famílias, nas escolas de seus filhos...
Como entender que uma sociedade intimamente ligada a cultura da cana de açúcar, que hoje tem uma Embrapa por trás, empresa referência internacional de avanço, não tenha tido um incremento geral de cultura.
Pizza e roupa feminina de péssima qualidade parecem detalhes, mas denunciam uma coisa líquida e certa: independente do abismo social, o nível cultural geral é muito muito baixo.
Exclusividade nossa, dos brasileiros? Definitivamente não. Mal mundial. Vide nossos hermanos, que já foram uma das referências mundiais de educação e hoje... Ou os redneck, ou algumas populações europeias, ou... ou... ou... Não importa o ambiente riquíssimo e o dito ótimo nível cultural, o produto final no geral é de completa incoerência.
"Eu me orgulho de quem sou e não vou mudar".
Sem dúvida, a terra é plana.
Urge aplicação de inteligência, de uso de toda cultura possível existente, para não entrarmos em colapso. A famosa pizza que aqui descrevo avisa: 'temo mal!
São inúmeros os artigos científicos que quase imploram para que façamos o correto. Faremos? Duvido.
BRASILSUSTENTABILIDADE
Mudanças climáticas chegaram a um ponto ‘sem retorno’, diz estudo
Pesquisadores encontraram 55 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa no solo
O Globo
02/12/2016 - 08:15 / Atualizado em 02/12/2016 - 10:54
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